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Patrícia Nunes 1 www.psicologia.com.pt Documento produzido em 26-09-2008 [Trabalho de Licenciatura] PSICOLOGIA POSITIVA (2007) Patrícia Nunes Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Portugal Contactos: [email protected] RESUMO Na Psicologia, surge um “novo” paradigma de investigação, ou seja, há uma mudança de perspectiva - do negativo para o positivo. A Psicologia Positiva passa a abordar o funcionamento positivo da personalidade, o bem-estar subjectivo e o ensino da resiliência. As emoções e sentimentos têm um papel crucial na forma como as pessoas reagem às circunstâncias do meio. Há ainda algumas actividades que favorecem o bem-estar psíquico e consequentemente, a forma de ver o mundo. As diferenças individuais desempenham também uma função importante ao longo de todo este processo. Palavras-chave: Bem-estar, emoções positivas, optimismo, psicologia positiva, resiliência, saúde mental 1. CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS: A PSICOLOGIA POSITIVA A psicologia positiva é descrita como um movimento que nos últimos anos tem ganho terreno dentro das ciências sociais e do comportamento, considerando, entre outros, aspectos como a felicidade e outras emoções positivas, os seus benefícios e as formas de os desenvolver. A psicologia positiva pretende ser uma disciplina científica, rigorosa e baseada na evidência, identificando intervenções que promovam o bem-estar e a qualidade de vida. O movimento da Psicologia Positiva emerge como tentativa de romper o viés negativo sobre o desenvolvimento humano através do estudo dos aspectos positivos presentes nos indivíduos. Nesse sentido, temáticas como as emoções positivas destacam-se nos actuais estudos

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[Trabalho de Licenciatura]

PSICOLOGIA POSITIVA

(2007)

Patrícia Nunes

Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Portugal

Contactos: [email protected]

RESUMO

Na Psicologia, surge um “novo” paradigma de investigação, ou seja, há uma mudança de perspectiva - do negativo para o positivo. A Psicologia Positiva passa a abordar o funcionamento positivo da personalidade, o bem-estar subjectivo e o ensino da resiliência. As emoções e sentimentos têm um papel crucial na forma como as pessoas reagem às circunstâncias do meio.

Há ainda algumas actividades que favorecem o bem-estar psíquico e consequentemente, a forma de ver o mundo. As diferenças individuais desempenham também uma função importante ao longo de todo este processo.

Palavras-chave: Bem-estar, emoções positivas, optimismo, psicologia positiva, resiliência, saúde mental

1. CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS: A PSICOLOGIA POSITIVA

A psicologia positiva é descrita como um movimento que nos últimos anos tem ganho terreno dentro das ciências sociais e do comportamento, considerando, entre outros, aspectos como a felicidade e outras emoções positivas, os seus benefícios e as formas de os desenvolver. A psicologia positiva pretende ser uma disciplina científica, rigorosa e baseada na evidência, identificando intervenções que promovam o bem-estar e a qualidade de vida.

O movimento da Psicologia Positiva emerge como tentativa de romper o viés negativo sobre o desenvolvimento humano através do estudo dos aspectos positivos presentes nos indivíduos. Nesse sentido, temáticas como as emoções positivas destacam-se nos actuais estudos

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científicos da psicologia. Tendo ganho destaque na última década, a psicologia positiva é o estudo científico dos factores e processos que conduzem à optimização do funcionamento humano, focando a atenção nas forças, em vez de se debruçar sobre as fraquezas; construindo e solidificando o que de melhor a vida oferece, em vez de tentar reparar o pior; e preocupando-se em promover na pessoa comum a forma mais proveitosa de viver a vida, em vez de se concentrar num processo de cura de pessoas perturbadas. Desta forma, e desviando-se da tendência da psicologia clínica, de se concentrar na patologia, este recanto da psicologia trata os traços positivos que incorporam o nosso repertório humano. Tendo por base o conceito de resiliência, a psicologia positiva pretende explicar como em situações benignas do dia-a-dia as pessoas usufruem do melhor da sua vida e de si mesmas. Este interesse não é, contudo, novo.

Em 1902, William James escrevia sobre a “determinação da mente em ser saudável”; em 1958, Allport manifestava interesse pelas características positivas que compunham o repertório humano; Maslow (1968) focou o estudo da pessoa saudável e, mais recentemente, refere-se como exemplo a investigação que Cowan (2000) tem desenvolvido na área da resiliência em crianças e adolescentes. Em termos de intervenção, a psicologia positiva preconiza que tratar “não é apenas arranjar o que está danificado; é também cuidar de algo ou alguém e fomentar o que temos de melhor” (Seligman & Csikszentmihalyi, 2000). Desta forma, amplificam-se forças, em vez de se corrigirem fraquezas, o que tem sido um dos principais objectivos desta disciplina.

A psicologia positiva trata do estudo das experiências positivas subjectivas, dos traços positivos do ser humano e das instituições que permitem a experiência e a manifestação destes traços positivos. A psicologia positiva tenta levar os psicólogos a adoptarem uma postura mais apreciativa dos potenciais, das motivações e das capacidades dos indivíduos, procurando transformar as antigas questões em novas oportunidades de compreender eventos psicológicos como optimismo, altruísmo, esperança, alegria, satisfação, e outros tão importantes para a investigação quanto depressão, ansiedade, angústia e agressividade.

Chama-se a atenção para o estudo do conceito de resiliência enquanto capacidade profunda para a superação de crises em situações adversas, estando presente em indivíduos, comunidades e instituições.

Pensando no porquê da psicologia positiva ser ainda tão nova (como corpo teórico), podem mencionar-se três razões. Primeiro, a perturbação e o sofrimento apelam de uma maneira mais pungente à atenção da ciência do que um estado de saúde e bem-estar que não inspira cuidado (a patologia constitui-se, desta forma, como o foco de investimento clínico). A segunda razão é de ordem pragmática e histórica: com a Segunda Guerra Mundial e com o regresso dos ex-combatentes a casa, muitos deles com enorme sofrimento físico e psíquico, o estudo da psicopatologia vê a sua importância aumentar, sendo que os diagnósticos e os tratamentos tomam o caminho do modelo médico. A terceira (questionável) é, se o destaque atribuído ao negativo não estará, porventura, relacionado com a nossa própria natureza e com as nossas teorias sobre os processos psicológicos. Neste sentido, a literatura tem documentado que os acontecimentos

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negativos têm um maior impacto que os positivos e que a informação que concerne aos eventos negativos é processada de forma mais pormenorizada do que a que remete para as experiências positivas.

Se temos esta disciplina à qual chamamos positiva, tal implicará então que a “demais Psicologia” é negativa? A resposta é óbvia: é apenas devido ao sucesso que a ciência, à qual chamamos Psicologia, tem tido desde o seu início em diagnosticar, medir e tratar o ‘negativo’ da experiência humana, que se abre neste momento um espaço para dedicar ao estudo das forças e virtudes humanas. E, de muitos desafios que assomam o trilho da psicologia positiva, um que pede atenção é precisamente o de continuar a definir o que é ‘positivo’ e ‘bom’ em termos de experiência humana, estando esta tarefa longe de ser simples.

Diener e Suh (1997) sugerem três directrizes para definir ‘positivo/bom’. É algo que é escolhido de forma sistemática, que é vista como fonte de satisfação (seja um objecto, acontecimento, processo ou resultado); é algo que é julgado de uma maneira positiva/boa e tem como base um sistema de valores ou um conjunto de normas culturais.

Em Janeiro de 2000, Martin Seligman e Mihaly Csikszentmihalyi afirmam, numa edição especial da revista American Psychologist, que “a psicologia não está a produzir suficiente conhecimento sobre o que faz a vida valer a pena ser vivida”. Desta forma, parece que a promoção da experiência de uma existência o mais completa e gratificante possível deverá constar também da competência da Psicologia.

A Psicologia Positiva veio abrir novas perspectivas para a investigação e intervenção. Apoia os esforços para minorar os problemas sociais, tais como a toxicodependência, a criminalidade e a doença mental. Incentiva o estudo dos factores protectores e dos factores de risco. Para além disso mobiliza a compreensão das emoções e dos traços positivos que podem ser mobilizados para a resolução de problemas.

A Psicologia Positiva vem trazer uma mensagem de esperança em vez de medo, atente-se nos exemplos, “a maior parte das pessoas não abusa de bebida” e “a maior parte das pessoas que joga a dinheiro consegue controlar-se”. Esta mudança da afirmação de não focar o negativo mas sim o positivo apresenta a ideia base da Psicologia Positiva.

Há uma grande aposta na prevenção em vez do tratamento. A Psicologia Positiva procura mudar a centralidade do tratamento para a prevenção. Ajudam-se mais as pessoas se pudermos prevenir os problemas antes de acontecerem (prevenção primária), ou intervir antes que piorem (prevenção secundária). Por último, se as outras estratégias não funcionarem vai-se para o tratamento (prevenção terciária).

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2. BREVE RESENHA HISTÓRICA

A história da psicologia confunde-se com estudos voltados à patologia e ao seu tratamento – a atmosfera biomédica cartesiana vigente no período do nascimento da psicologia contribuiu nessa direcção. Isso resultou em olhares muito bem treinados em identificar padrões de problemas e míopes para o “lado positivo” das pessoas. Como tentativa de romper esse viés negativo sobre o desenvolvimento humano, surgiu, na última década do século XX, com raízes na Psicologia Humanista, o movimento da Psicologia Positiva.

Calçado em um novo paradigma epistemológico, este novo campo científico apontou como principal objecto de estudo da psicologia o funcionamento saudável e adaptativo do ser humano, interessando-se pelos traços psicológicos e experiências consideradas positivas tais como optimismo, satisfação, bem-estar, felicidade, gratidão, esperança, resiliência, empatia. Martin Seligman, um dos expoentes da Psicologia Positiva, chama a atenção para essa mudança de foco, defendendo que, sem deixar de lado ter como objecto de estudo a patologia e seu tratamento, a psicologia deve abrir espaço para o estudo das “habilidades positivas” do ser humano, redireccionando o enfoque para a promoção da qualidade de vida.

3. IMPORTÂNCIA DO CONCEITO DE RESILIÊNCIA PARA A PSICOLOGIA POSITIVA

A psicologia positiva é apresentada como um movimento de investigação de aspectos potencialmente saudáveis dos seres humanos, em oposição à psicologia tradicional e à sua ênfase nos aspectos psicopatológicos. Entre os fenómenos indicativos de vida saudável destaca-se a resiliência, por referir-se a processos que explicam a superação de adversidades, cujo discurso hegemónico foca o indivíduo.

Resiliência é frequentemente referida por processos que explicam a "superação" de crises e adversidades em indivíduos, grupos e organizações (Yunes & Szymanski, 2001, Yunes, 2001, Tavares, 2001). Por tratar-se de um conceito relativamente novo no campo da Psicologia, a resiliência vem sendo bastante discutida do ponto de vista teórico e metodológico pela comunidade científica.

Alguns estudiosos reconhecem a resiliência como um fenómeno comum e presente no desenvolvimento de qualquer ser humano (Masten, 2001), e outros enfatizam a necessidade de cautela no uso "naturalizado" do termo.

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A noção de resiliência vem sendo utilizada há muito tempo pela Física e Engenharia, sendo um dos seus precursores o cientista inglês Thomas Young, que, em 1807, considerando tensão e compressão, introduz pela primeira vez a noção de módulo de elasticidade. Young descrevia experimentos sobre tensão e compressão de barras, buscando a relação entre a força que era aplicada num corpo e a deformação que esta força produzia. Esse cientista foi também o pioneiro na análise de stress trazido pelo impacto, tendo elaborado um método para o cálculo dessas forças (Timosheibo, 1983). Silva Jr. (1972) denomina como resiliência de um material, correspondente a determinada solicitação, a energia de deformação máxima que ele é capaz de armazenar sem sofrer deformações permanentes. Dita de uma outra maneira, a resiliência refere-se à capacidade de um material absorver energia sem sofrer deformação plástica ou permanente. Nos materiais, portanto, o módulo de resiliência pode ser obtido em laboratório através de medições sucessivas ou da utilização de uma fórmula matemática que relaciona tensão e deformação e fornece com precisão a resiliência dos materiais.

É importante ressaltar que diferentes materiais apresentam diferentes módulos de resiliência.

Em Psicologia, o estudo do fenómeno da resiliência é relativamente recente. Vem sendo pesquisado há cerca de trinta anos, mas apenas nos últimos cinco anos os encontros internacionais têm trazido este constructo para discussão. A sua definição não é clara, tão-pouco precisa quanto na Física ou na Engenharia, e nem poderia sê-lo, haja vista a complexidade e multiplicidade de factores e variáveis que devem ser tidos em conta no estudo dos fenómenos humanos.

Os precursores do termo resiliência na Psicologia são os termos invencibilidade ou invulnerabilidade, ainda bastante referidos na literatura. Vários autores (Masten & Garmezy, 1985; Rutter, 1985; Werner & Smith, 1992) relatam que "em 1974, o psiquiatra infantil E. J. Anthony introduziu o termo invulnerabilidade na literatura da psicopatologia do desenvolvimento para descrever crianças que, apesar de prolongados períodos de adversidades e stress psicológico, apresentavam saúde emocional e alta competência" (Werner & Smith, 1992).

Alguns anos depois, já se discutia a aplicação do termo, que parecia sugerir que as crianças seriam totalmente imunes a qualquer tipo de desordem, independentemente das circunstâncias. Como afirmaram Masten e Garmezy (1985): "um termo menos olímpico como resiliência ou resistência ao stress, era necessário". Segundo Rutter (1985, 1993), um dos pioneiros no estudo da resiliência no campo da Psicologia, invulnerabilidade passa uma ideia de resistência absoluta ao stress, de uma característica imutável, como se fossemos intocáveis e sem limites para suportar o sofrimento. Rutter (1993) considera que invulnerabilidade passa somente a ideia de uma característica intrínseca do indivíduo, e as pesquisas mais recentes têm indicado que a resiliência ou resistência ao stress é relativa, que as suas bases são tanto constitucionais como ambientais, e que o grau de resistência não tem uma quantidade fixa, mas sim, varia de acordo com as circunstâncias (Rutter, 1985). Resiliência e invulnerabilidade não são termos

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equivalentes, afirmam Zimmerman e Arunkumar (1994). Segundo estes autores, resiliência refere-se a uma "habilidade de superar adversidades, o que não significa que o indivíduo saia da crise ileso, como implica o termo invulnerabilidade". Apesar destas considerações, é esta versão inicial de resiliência como invulnerabilidade ou resistência às adversidades que ainda vem orientando a produção científica de muitos pesquisadores da área. Tal perspectiva tem dado lugar à construção de um conceito que define a resiliência como um conjunto de traços e condições que podem ser replicados, conforme afirma Martineau (1999) na sua análise crítica sobre o discurso dos, denominados por ela, experts no assunto. A autora detectou três perspectivas distintas nos discursos vigentes sobre resiliência.

Em primeiro lugar, cita o discurso dominante e bem-documentado dos especialistas, resultante de elaborados estudos psicométricos e da análise estatística dos dados obtidos por medidas e em ambientes controlados através de resultados de testes, notas de escola e perfis de personalidade ou temperamento. Estes são alguns exemplos de instrumentos utilizados para se chegar a um conjunto de características e traços que identificam a "criança/pessoa resiliente". Martineau sumariza que os principais traços vistos como características fixas da resiliência, que formam um consenso na opinião de diversos autores são: sociabilidade, criatividade na resolução de problemas e um senso de autonomia e de proposta. Estas medidas do observável e de alguma maneira mensurável acabam por definir o que os autores (experts) chamam de resiliência.

Em segundo lugar, a autora analisa o discurso experiencial, menos valorizado e subordinado ao discurso dos especialistas, cuja base são os estudos qualitativos, com dados obtidos a partir de histórias de vida de adultos relatadas a psicoterapeutas (e identificados por outras pessoas como "resilientes"), nas quais "estão embutidas as idiossincrasias de memória, narrativa, identidade, interpretação e subjectividade" (Martineau, 1999, p. 73). São histórias de vida construídas e reconstruídas através das múltiplas interpretações do indivíduo.

Em terceiro lugar, Martineau apresenta o discurso de pessoas que trabalham directamente com crianças e adolescentes (educadores, psicólogos, assistentes sociais), uma perspectiva de resiliência ainda em construção, que sintetiza aspectos dos dois discursos, dos experts e do experiencial. Ao posicionar-se, Martineau afirma que reificar/replicar as características de uma determinada criança como "resiliente" (através da mensuração de um conjunto de traços) é negar que resiliência é contingente, imprevisível e dinâmica.

O quadro seguinte apresenta um sumário dos processos-chave da resiliência segundo Walsh (1998).

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PROCESSOS-CHAVE DA RESILIÊNCIA SISTEMA DE CRENÇAS (o coração e a alma da resiliência) 1. Atribuir sentido à adversidade: · Valorização das relações interpessoais · Sentido de coerência das crises: como desafios administráveis · Percepção da situação de crise: crenças facilitadoras ou constrangedoras 2. Olhar positivo · Iniciativa (acção) e perseverança · Coragem e encorajamento (foco no potencial) · Esperança e optimismo: confiança na superação das adversidades · Confrontar o que é possível: aceitar o que não pode ser mudado 3. Transcendência e espiritualidade · Valores, propostas e objectivos de vida · Espiritualidade: fé, comunhão e rituais · Inspiração: criatividade e visualização de novas possibilidades · Transformação: aprender e crescer através das adversidades PADRÕES DE ORGANIZAÇÃO 4. Flexibilidade · Capacidade para mudanças: reformulação, reorganização e adaptação · Estabilidade: sentido de continuidade e rotinas 5. Coesão · Apoio mútuo, colaboração e compromisso · Respeito das diferenças, necessidades e limites individuais · Forte liderança: prover, proteger e guiar crianças e membros vulneráveis · Busca de reconciliação e reunião em casos de relacionamentos problemáticos 6. Recursos sociais e económicos · Mobilização da família extensa e da rede de apoio social · Construção de uma rede de trabalho comunitário · Construção de segurança financeira PROCESSOS DE COMUNICAÇÃO 7. Clareza · Mensagens claras e consistentes (palavras e acções) · Esclarecimentos de informações ambíguas 8. Expressões emocionais “abertas” · Sentimentos variados são compartilhados (felicidade e dor; esperança e medo) · Empatia nas relações: tolerar as diferenças · Responsabilidade pelos próprios sentimentos e comportamentos, sem busca do “culpado” · Interacções prazerosas e bem-humoradas 9. Colaboração na solução de problemas · Identificação de problemas, opções · “Explosão de ideias” com criatividade · Tomada de decisões compartilhada: negociação, reciprocidade e justiça · Foco nos objectivos: dar passos concretos; aprender através dos erros · Postura proactiva: prevenção de problemas, resolução de crises, preparação para futuros desafios.

(Walsh, 1998)

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4. NOÇÃO DE BEM-ESTAR SUBJECTIVO NA PSICOLOGIA POSITIVA

O bem-estar subjectivo consiste na reacção avaliativa das pessoas à sua própria vida, quer em termos de satisfação com a mesma (avaliação cognitiva), quer em termos de afectividade (reacções emocionais estáveis) (Diener & Diener, 1995).

A abrangência do conceito coloca-o numa posição de intersecção de vários domínios da Psicologia, designadamente, a Psicologia Social, a Psicologia da Saúde e a Psicologia Clínica. A história do conceito, analisada por diferentes investigadores, aponta heranças históricas distintas, relacionadas com a convergência de origens teóricas diversas. Nesse sentido, identifica-se uma primeira herança nos movimentos sociais inspirados no Iluminismo e no Utilitarismo, que impulsionaram a investigação na área da Qualidade de Vida. Uma segunda herança, relaciona-se com os desenvolvimentos no campo da Saúde, designadamente, a Segunda Revolução da Saúde, na década de 70, cujos princípios centrais consistiram em defender o retorno a uma perspectiva ecológica na saúde e mudar o enfoque das questões da doença para as questões da saúde. Recentemente, a Psicologia Clínica vem abraçar o conceito de Bem- -Estar Subjectivo, no contexto da chamada Psicologia Positiva. Qualquer das heranças socio-históricas contribuiu para o desenvolvimento da investigação na área de Bem--Estar Subjectivo, nas suas várias facetas e aplicações. Paralelamente, o conceito de Bem-Estar Subjectivo evoluiu através de limites difusos, atravessando dois momentos críticos na sua definição: a distinção Bem-Estar Material versus Bem-Estar Global; e a distinção Bem-Estar Psicológico versus Bem-Estar Subjectivo.

Definimos o Bem-Estar Subjectivo, como é entendido actualmente, a partir dos principais investigadores da área e observamos um consenso na aceitação de uma dimensão cognitiva e de uma dimensão afectiva do conceito. Estas dimensões constituem, elas mesmas, conceitos abrangentes, domínios de estudo – o conceito de qualidade de vida e o conceito de afecto.

O Bem-Estar Subjectivo é uma dimensão positiva da Saúde. É considerado, simultaneamente, um conceito complexo, que integra uma dimensão cognitiva e uma dimensão afectiva, e um campo de estudo que abrange outros grandes conceitos e domínios de estudo como são a qualidade de vida, o afecto positivo e o afecto negativo. É um conceito recente, que tem suscitado, nas últimas décadas, o interesse generalizado de muitas vertentes da Psicologia e que tem vindo a reforçar a sua identidade, à medida que os estudos vão confirmando a sua estrutura e sistema de conceitos associados.

A história do conceito de Bem-Estar Subjectivo é recente. O conceito terá cerca de 45 anos de vida, se considerarmos a tese de Wilson (1960) como marco do seu nascimento, uma vez que estuda pela primeira vez o termo de Bem-estar, como o conhecemos hoje (Diener, Suh, Lucas, & Smith, 1999). Wilson (1967) propôs-se estudar duas hipóteses do bem-estar, onde relacionou os conceitos de Satisfação e de Felicidade numa perspectiva Base-Topo (Bottom Up) – a Satisfação

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imediata de necessidades produz felicidade, enquanto a persistência de necessidades por satisfazer causa infelicidade – e Topo-Base (Top Down) – o grau de Satisfação necessário para produzir felicidade depende da adaptação ou nível de aspiração, que é influenciado pelas experiências do passado, pelas comparações com outros, pelos valores pessoais e por outros factores – como ainda, actualmente, se discute na área do Bem-Estar Subjectivo.

Recentemente, em 1998, cerca de trinta anos decorridos da Segunda Revolução da Saúde, Martin Seligman, enquanto presidente da American Psychologycal Association (APA), afirma que a prática da Psicologia se encontra incompleta. A Psicologia Clínica ainda trabalha, essencialmente, no sentido de trazer os indivíduos de um estado doente, negativo, para um estado neutral normal; de um estado “menos cinco” da Saúde Mental para um nível zero. Refere que não é suficiente anular as condições incapacitantes dos indivíduos e chegar ao nível zero (Wallis, 2005). Definiu como objectivo para a APA, no ano da sua presidência, explorar a região norte do nível zero, procurar o que activamente faz as pessoas sentirem-se preenchidas, envolvidas e significativamente felizes. A Saúde Mental deveria ser mais do que a ausência de perturbação mental deveria ser algo próximo de um estado vibrante de tonicidade muscular da mente e do espírito humano. Segundo conta Seligman (Wallis, 2005), no sentido de incentivar e promover a dimensão positiva da Saúde Mental, convidou Ray Fowler e Mihaly Csikszentmihalyi para uma reunião na praia paradisíaca de Akumal, no México. Deste encontro, resultou a organização da primeira conferência em Psicologia Positiva, actualmente um evento anual. Na sequência do seu trabalho, como Presidente da APA, outro acontecimento externo veio impulsionar o campo da Psicologia Positiva. A Fundação Templeton criou prémios monetários para a investigação científica realizada nesta área.

Após este facto, seguiu-se um verdadeiro “boom” de investigação sobre a Felicidade, o Optimismo, as Emoções Positivas e os Traços de Personalidade mais saudáveis. Esta explosão da investigação inclui como um dos conceitos centrais o Bem-Estar Subjectivo, que não só tem mobilizado a comunidade científica, como tem despertado a atenção da comunidade em geral. Embora com uma história recente o conceito de Bem-Estar Subjectivo e as suas dimensões têm atraído a atenção da comunidade científica. Diener (1984) refere que mais de setecentos estudos sobre o Bem-Estar Subjectivo apareceram entre 1968 e 1983. Andrews e Robinson (1991) referem que em duas décadas, entre 1970 e 1990, vários milhares de novos estudos relevantes para o Bem-Estar foram publicados. Lucas, Diener, e Suh (1996) identificam que desde 1980 a investigação sobre os factores antecedentes e correlacionados com o Bem-Estar Subjectivo tem estado particularmente activa. Michalos (1986) refere que apenas entre 1979 e 1982, a pesquisa para títulos com a palavra satisfação ou Felicidade resultou em dois mil quinhentos e quarenta e cinco títulos. Fazendo essa pesquisa actualmente encontramos oito mil seiscentos e oitenta e sete títulos com um destes termos. Em Portugal, a investigação sobre o Bem-Estar Subjectivo é ainda restrita. No entanto, destacam-se os trabalhos de revisão sobre o Bem-Estar Subjectivo, de

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Simões, Ferreira, Lima, Pinheiro, Vieira, Matos, e Oliveira (2000), sobre a Qualidade de Vida, de Pais Ribeiro (1994, 2002, 2004), e sobre a Felicidade, de Oliveira (2000).

4.1. Componentes

Para Diener, Suh e Oishi (1997), o campo de pesquisa sobre o tema da felicidade, bem estar-subjectivo, satisfação com a vida e qualidade de vida tem investigado como as pessoas avaliam as suas vidas e inclui o estudo de variáveis como vida satisfatória, satisfação no casamento, ausência de depressão e ansiedade, emoções e estados de humor positivos e está interessado em sentimentos de bem-estar relativamente duradouros, e não em emoções passageiras.

O termo ‘felicidade’ tem sido utilizado abrangendo significados distintos, entre os quais se inclui a alegria momentânea, a satisfação com a vida e o prazer a longo prazo, além de ser utilizado pelo senso comum representando o bem-estar subjectivo. Embora a felicidade, o bem-estar subjectivo, a satisfação com a vida e o prazer a longo prazo sejam estados subjectivos inter-relacionados, podem ser discriminados, grosso modo, da seguinte forma, felicidade: como o estado subjectivo em que há a preponderância dos afectos positivos sobre os afectos negativos; bem-estar subjectivo: como o sentimento de conforto e harmonia; satisfação: como o sentimento experimentado quando da conquista de um objectivo, através do uso e da ampliação de conhecimentos; e qualidade de vida, de acordo com a Organização Mundial de Saúde: como a percepção do indivíduo da sua posição na vida, no contexto de cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objectivos, expectativas, padrões e preocupações (Whoqol, 2004).

Na literatura têm-se utilizado alguns termos com o objectivo de fazer referência ao domínio de estudo: felicidade, moral, satisfação com a vida. Pode-se falar então de uma multidimensionalidade do bem-estar subjectivo: dimensão afectiva e dimensão cognitiva. A dimensão afectiva representa dois factores independentes: a afectividade positiva e a afectividade negativa.

A afectividade positiva traduz-se na tendência a experimentar sentimentos e emoções agradáveis (como sejam a alegria, o entusiasmo, o orgulho, a felicidade). Reflecte o quanto uma pessoa se está a sentir entusiasmada, activa e alerta. Altos níveis de afecto positivo representam um estado de alta energia, total concentração e satisfação, enquanto baixos níveis de afecto positivo são caracterizados por tristeza e letargia.

A afectividade negativa exprime-se pela disposição para experimentar sentimentos e emoções desagradáveis (do tipo da culpabilidade ou vergonha, da tristeza, ansiedade, depressão).

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O afecto negativo é uma dimensão geral da angústia e insatisfação que incluem uma variedade de estados de humor aversivos, como raiva, culpa, desgosto e medo.

Segundo Tellegen (1985) esses dois factores representam dimensões do estado afectivo que se relacionam com as dimensões de traços afectivos emocionalmente positivos ou negativos (Giacomoni, 2002).

O bem-estar subjectivo na dimensão cognitiva parece ser representado por um único factor – a satisfação com a vida – que alguns estudos mostraram ser distintos da afectividade positiva e negativa.

5. CONCEPTUALIZAÇÕES

5.1 Martin Seligman

Martin Seligman, o mentor da Psicologia Positiva, refere a importância de ensinar a resiliência, a esperança, o optimismo, para tornar o homem mais resistente à depressão e capaz de levar uma vida mais feliz e produtiva.

A influência das emoções sobre a saúde intriga os médicos desde a Antiguidade. A maior parte dos tratados e pesquisas investiga os efeitos deletérios dos sentimentos negativos, como a tristeza, a angústia e a raiva. Há cerca de vinte anos, no entanto, psicólogos e psiquiatras inauguraram uma nova corrente, a "psicologia positiva", que visa a determinar o peso das emoções boas no equilíbrio físico e mental.

Um dos principais representantes desse movimento é o psicólogo Martin Seligman, de 61 anos, professor da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos. Seligman, que por quase trinta anos lidou com pacientes deprimidos, resolveu inverter o curso dos seus estudos. Em vez de se dedicar a entender as fraquezas humanas, ele procurou respostas para compreender quais são as raízes da felicidade - "Sabia-se muito a respeito da depressão, mas quase nada sobre a essência comum das pessoas felizes". Alguns críticos argumentam que os termos da psicologia positiva são muito vagos e superficiais. Mas o facto é que, com as suas ideias, Martin Seligman, ex-presidente da Associação Americana de Psicologia, tornou-se um autor best-seller. Ele propõe que a conquista da felicidade seja um exercício diário, feito com gentileza, originalidade, humor, optimismo e generosidade.

Segundo Seligman, a psicologia convencional nasceu para tentar entender o que torna alguém neurótico, deprimido, ansioso, de mal com o mundo. Durante mais de duas décadas dedicou-se a esse tipo de estudo. Mas, depois de vários anos, achou melhor procurar

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compreender o que faz alguém feliz. Descobriu que os homens e mulheres satisfeitos têm uma vida social mais rica e produtiva.

Os muito felizes passam o mínimo de tempos sozinhos e mantêm óptimos relacionamentos. Cultivam mais as amizades e permanecem casados por mais tempo. Sobre isto, o estudo mais notável feito até hoje sobre felicidade e longevidade analisou o quotidiano de cento e oitenta freiras. Todas tinham a mesma dieta, leve e balanceada, e estavam livres, é claro, de drogas, álcool e cigarro. Como também convém a freiras, elas não eram susceptíveis a doenças sexualmente transmissíveis. Pois bem, mesmo assim, foi constatada uma diferença sensível de longevidade entre as mais e as menos alegres. Entre as primeiras, 90% ultrapassaram os oitenta anos. Do outro grupo, apenas 34% chegaram a essa idade.

Seligman apresenta os três pilares de Psicologia Positiva:

- Estados positivos de bem-estar subjectivo (satisfação com a vida, felicidade, optimismo)

- Traços individuais/ psicológicos positivos (criatividade, coragem, compaixão, integridade, sabedoria, auto-controlo, espiritualidade)

- Instituições Positivas (famílias saudáveis, comunidade, escola, ambientes de trabalho, mass media).

5.2 Fredrickson

Fredrickson (2001) considera que compete à Psicologia Positiva entender e promover os factores que permitam aos indivíduos, comunidades e sociedades, florescer. Vivemos numa época em que não podemos evitar experimentar emoções negativas. São até úteis, porém, quando prolongadas ou em contexto impróprio podem disparar graves problemas para o indivíduo e para a sociedade.

O medo e a ansiedade alimentam fobias e junto com o stress crónico podem comprometer o sistema imune. A tristeza e o pesar severos também conduzem à perda de produtividade e ao suicídio.

A raiva está associada às doenças cardíacas (mostrada por J.C. Barefoot, W.G. Dahlstrom, e R.B. Williams Jr.), a alguns tipos de cancro (H.J.Eysenck), à agressão e violência, particularmente em rapazes e homens (D.M. Buss).

Num artigo para a American Scientist, Fredrickson menciona pesquisas que sugerem que as emoções positivas promovem a longevidade, o funcionamento individual e colectivo, o bem-estar psicológico e a saúde física.

As emoções positivas promovem a saúde física, intelectual e psicossocial, que perdura “muito depois de a emoção positiva haver desaparecido”, sugere Fredrickson. Esse efeito

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positivo prevê um aumento da capacidade de recuperação e do optimismo, que podem ajudar a desfazer os efeitos danosos das emoções negativas sobre a mente e o corpo.

Os cientistas têm se preocupado com as emoções negativas e como prever e tratar as doenças e sofrimentos gerados por elas. Porém, agora, Fredrickson, da Universidade de Michigan, mostra uma nova visão: utilizar as emoções positivas como a alegria, o interesse e a satisfação, para prevenir ou resolver os problemas das emoções negativas.

Ainda há uma variedade de definições para emoção, o consenso é que a emoção é uma resposta intensa e breve a algum evento que provoca uma mudança psicológica e da expressão facial. Diferem do humor, pois o humor é independente de um objecto. A emoção é associada a uma específica tendência à acção. Por exemplo, o medo é motivador da fuga, a raiva ao ataque, a náusea ao vómito. Assim, as emoções estão relacionadas às necessidades evolutivas de sobreviver.

Estreitar o pensamento ajuda a agir rapidamente. Ao que parece, enquanto as emoções negativas conduzem necessariamente a uma acção física, as positivas conduzem a acções de pensamento.

A alegria aparece em contextos avaliados como seguros e familiares ou pela realização de algum objectivo, motiva a brincar, a ser divertido, também física, social (amizade), intelectual e artisticamente. Não podemos esquecer a imaginação, que envolve exploração e invenção. E relacionado à alegria ainda, temos o riso e o entretenimento.

O interesse e os seus estados emocionais relacionados (curiosidade, o maravilhar-se) aparecem em contextos seguros, que ofereçam novidades, curiosidades, oportunidades, desafios, ou mistério. O interesse constrói na pessoa um acervo de conhecimento e de habilidades cognitivas.

A satisfação e outras emoções relacionadas (serenidade, tranquilidade e alívio) aparecem em situações de segurança e que tenham um alto grau de certeza e baixo grau de esforço. É diferente dos prazeres que encontram as necessidades corpóreas, como de uma boa refeição. Envolve completa consciência, receptividade, integração e percepção. Fredrickson observou que essas emoções positivas têm a habilidade única de reduzir a pulsação do coração, resultado da ansiedade e do medo. Pessoas que sorriem durante um filme triste experimentam uma recuperação cardiovascular mais rápida que aquelas que não sorriem. Sorrir afecta o coração.

As emoções negativas estreitam o pensamento, as positivas ampliam-no, criando uma espiral crescente que dá ao indivíduo resistência, flexibilidade e bem-estar. Além de ser mais duradouro, também elevam o nível de dopamina.

O estudo de casais infelizes revela que a sua interacção é previsível e rígida. Em suma, têm um relacionamento chato. Os casais felizes, ao contrário, interagem de maneira imprevisível e

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acumulam um excedente de sentimentos positivos em relação ao cônjuge. Isso reprime a agressividade quando entram em conflito.

Para se obter as emoções positivas diversas técnicas foram testadas e aprovadas. O relaxamento, a meditação e yoga são eficientes até mesmo para combater a dor de cabeça e a hipertensão. A técnica da imagem consiste em imaginar uma paisagem tranquila, actual, sendo um triunfo da infância ou uma boa experiência recente. Outra técnica eficiente consiste em achar um ponto positivo no que acontece, tal qual faz a religião que sempre encontra um ponto de vista consolador.

5.3 Scheier e Carver - Optimismo Disposicional

Uma abordagem ao estudo do optimismo, é a de Scheier e Carver (1992), que estudaram uma variável da personalidade, que identificaram como optimismo disposicional, que diz respeito a uma expectativa global, de acordo com a qual se esperam acontecimentos positivos para o futuro.

Esta perspectiva baseia-se na forma como as pessoas tentam cumprir os objectivos a que se propõem: com uma postura de confiança e persistência, mesmo perante dificuldades, ou com uma atitude de dúvida e hesitação. Os autores designam o seu modelo como sendo de auto-regulação, tendo subjacente a ideia de que a pessoa optimista persiste em atingir os seus objectivos, ao passo que a pessoa pessimista evidencia uma tendência para desistir dos objectivos que se colocou (Scheier & Carver, 1992).

A noção de estilo explicativo apresenta três dimensões fundamentais, cada uma delas com dois pólos extremos: permanente versus temporária; universal versus específica; interna versus externa. Assim, as pessoas pessimistas percepcionam as causas dos acontecimentos negativos como sendo permanentes (e.g. O meu chefe terrível.), ao passo que o optimista perspectiva essas causas como temporárias (e.g. Hoje o meu chefe não estava nos seus dias.). A situação inversa ocorre, quando estamos perante um acontecimento positivo: para o pessimista a causa desse acontecimento será temporária (e.g. Hoje estou com sorte.), e para o optimista será considerada como permanente (e.g. Tenho os meus talentos.). No que respeita à segunda dimensão, refira- -se que as pessoas pessimistas encaram como universais as causas dos acontecimentos negativos (e.g. Os professores são todos injustos.), enquanto que o indivíduo optimista percepciona essas causas como sendo específicas a um determinado contexto (e.g. O professor de Psicologia foi injusto.). Quanto aos acontecimentos positivos, também aqui o inverso se verifica: o pessimista vê como específicas as causas desse tipo de acontecimentos (e.g. Eu sou inteligente a Matemática.), ao passo que o optimista as dimensiona como universais (e.g. Eu sou inteligente.) (Scheier & Carver, 1992).

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Finalmente, no que concerne à terceira das dimensões atrás enunciadas, refira-se que a pessoa pessimista apresenta uma tendência para se culpabilizar dos acontecimentos negativos, isto é, faz uma atribuição interna relativamente ao que aconteceu (e.g. Não tenho jeito nenhum para este jogo.), enquanto que o optimista fará uma atribuição externa perante esse tipo de acontecimentos, não se culpabilizando pela sua ocorrência (e.g. Tive azar neste jogo.) (Scheier & Carver, 1992).

À semelhança do que se descreveu para as dimensões anteriores, quando falamos de acontecimentos positivos, o inverso irá ocorrer, ou seja, a pessoa que é pessimista recorre a uma atribuição externa para explicar a causalidade do que lhe aconteceu (e.g. Foi sorte.), e a pessoa optimista irá fazer uma atribuição interna para o mesmo tipo de acontecimentos (e.g. O meu talento foi importante.). Esta última dimensão está muito relacionada com o conceito de auto-estima, visto que uma baixa auto-estima tem por base, usualmente, um processo de internalização dos acontecimentos negativos, e a atribuição de causas externas a acontecimentos positivos (Seligman, 2004).

De uma forma geral, podemos, pois, afirmar que uma pessoa optimista é aquela que encara as dificuldades como sendo temporárias, pontuais, e não se culpabiliza pela sua ocorrência; quando confrontada com uma situação difícil, percebe-a como um desafio e esforça-se para a ultrapassar. Por seu lado, a pessoa pessimista acredita que os acontecimentos negativos vão perdurar e minar todas as suas acções, demonstrando uma tendência para se culpabilizar de tais acontecimentos (Scheier & Carver, 1992).

6. EMOÇÕES / SENTIMENTOS POSITIVOS

As emoções positivas podem ser consideradas como factores de protecção contra as doenças, uma vez que, de uma forma complexa, fortalecem o sistema imunitário (sistema responsável pela protecção do organismo contra qualquer fenómeno estranho ao mesmo). Pessoas que sentem regularmente emoções positivas são, de alguma forma, erguidas numa “espiral ascendente” de contínuo crescimento e realização. Elas “tornam-se mais úteis aos outros” e podem “transformar as comunidades em organizações sociais mais coesas e harmoniosas, e de moral mais elevado”.

As emoções positivas não partilham apenas o facto de alargarem os repertórios momentâneos de pensamento-acção, como também partilham a tarefa de construir os recursos pessoais, desde os recursos físicos e intelectuais, até aos recursos sociais. O mais importante é que estes recursos tendem a ser duradouros.

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6.1 Alegria

“Alegria” provém do vocábulo latino alecritas (fogo, ardor, vivacidade). Trata-se de um sentimento de contentamento e de satisfação interior proveniente de algum facto positivo que a pessoa provou. Por seu lado, “prazer”deriva do verbo latino placere (gozar, sentir deleite) e significa possuir ou sentir algo muito relacionado com a dimensão física ou corporal. Assim, enquanto a alegria é mais objectiva, mais profunda, mais espiritual, mais duradoura e mais altruísta, o prazer é mais subjectivo, mais superficial, mais somático, mais efémero e mais egoísta. Todavia, também existem prazeres espirituais ou gozos interiores. Alegria, prazer, júbilo, contentamento ou felicidade representa um sentimento humano de bem-estar, euforia, empolgação, paz interna. A alegria surge em contextos considerados como seguros e familiares, por acontecimentos interpretados como realização ou progresso em direcção aos objectivos de uma pessoa. A alegria cria o desejo de brincar, não apenas o brincar físico e social, como também o brincar intelectual e artístico. Brincar, especialmente a brincadeira imaginária, é, em grande parte, criativo. Envolve exploração, invenção e apenas brincadeira livre. Dirigido não apenas a um tipo de acção, brincar pode tomar várias formas. O desejo de brincar representa uma tendência bastante genérica e não específica de pensamento-acção. A alegria é uma disposição para realizar.

Várias pesquisas têm-se debruçado sobre a alegria em relação a outras expressões emotivas, mais ou menos paralelas (como o contentamento) ou contrárias (como a tristeza). Batson et al. (1991), na sequência de outros investigadores, procuraram saber se a atitude empática com quem sofre (e também com quem se alegra) tem uma conotação tendencialmente egoísta ou altruísta, inclinando-se os autores pela segunda hipótese, mas não sendo ainda os resultados concludentes. Outros estudos centram-se nas diferenças por sexo, como Brebner (2003) que constatou um maior índice de alegria nas mulheres

Segundo Senise (1950) a alegria é “um estado de ânimo particular que se forma a partir de um prazer físico, moral ou intelectual e se exterioriza habitualmente com o riso”. Porém, “nem sempre o riso exprime alegria, nem todas as experiências se exprimem com riso”.

6.2 Amor

O amor é um fenómeno complexo, uma emoção essencial, certamente a dimensão mais poderosa e misteriosa da vida humana. É tão antigo quanto o homem. Desde sempre, o homem conheceu-se com capacidade para amar e ser amado. Porém, é difícil defini-lo. É uma emoção particular, que não prescinde da cognição e que se expressa numa grande variedade de

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comportamentos (palavras, expressões não verbais, expressões físicas, prendas). O amor foi sempre cantado e estudado. É com certeza o tema mais versado pelos poetas, juntamente com a morte. Segundo Platão, o amor “faz-nos passar do não ser ao ser” (Mina, 1996).

Toda a gente fala de amor, os jovens escrevem-no em toda a parte ou então desenham corações. Porém, é mais fácil vivê-lo, identificá-lo, senti-lo, do que defini-lo. Há amores que soam a falso, que de amor têm pouco ou nada. Se for verdadeiro, trata-se de um sentimento ou de uma atitude que se expressa em gestos de bem para com os outros. Pascal diz que o amor é o “conhecimento do coração”. Como afirma Nietzsche, “só do amor surge o conhecimento mais profundo” (Mina, 1996). O amor penetra todas as coisas e chega à sua essência. A pessoa que ama é intuitiva, adivinha as necessidades dos outros, porque não está fechada em si mesma.

Segundo Rojas (1988), o amor é “uma realidade complexa e incomensurável”, difícil de definir. O autor apresenta quatro significados do termo “amor”: na linguagem comum (pode ter múltiplos sentidos), na linguagem filosófica (desde os gregos que se estudou o amor, havendo vários filósofos que o aproximaram mais da verdade, da vontade, de emoção), na linguagem psicológica (como motivação, tendo esta múltiplas interpretações) e na linguagem social (que frequentemente identifica o amor com o sexo). Certamente que o amor não se reduz à expressão sexual, mas também tem a ver com o enamoramento. O amor é um acto de vontade que empenha e exige fidelidade, conduzindo, através de diversas etapas, à união conjugal.

O amor é uma força de unificação e de crescimento. Neste amor há uma dialéctica entre autonomia e intimidade, entre individualização e integração ou quase fusão.

O amor é a grande força ou íman de aproximação das pessoas. O amor satisfaz as necessidades fundamentais porque a necessidade fundamental é a necessidade de amar. O amor está presente ao longo de todo o desenvolvimento pessoal, embora com intensidades e cambiantes diferentes.

Os diversos autores classificam as várias classes de amor das formas mais variadas e mais ou menos exaustivamente, como Lewis (1997) que distingue essencialmente quatro espécies: afecto, amizade, eros, caridade, e fala do amor-dom, do amor-necessidade, do amor-paixão. Porém, a classificação de Lee (1973) é mais exaustiva distinguindo seis “cores” ou estilos de amor, sendo três primários (eros-paixão, ludus-jogo, storgê-amizade) e três secundários (pragma-prático, mania-possessão, agapê-altruísmo). Os primários são comparados às três cores principais (vermelho, amarelo e azul) e os secundários podem identificar-se com as cores mistas. Podemos descrevê-los num crescendo valorativo. Mania corresponde ao amor obsessivo, ciumento, incapaz de tolerar a perda do amado, podendo desenvolver doenças. Esta espécie de amor está associada a um baixo auto-conceito e auto-estima. É típico de pessoas num estádio de desenvolvimento do eu impulsivo e autoprotectivo. O ludus corresponde ao amante que joga aos amores procurando obter o máximo lucro com o mínimo custo e abstendo-se de qualquer dependência ou compromisso. Tal amor é mais típico das pessoas num estádio de

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desenvolvimento autoprotectivo. Pragma equivale ao amor prático, sensível, consciente, realista, provocando ou desfazendo a relação por razões práticas. Tais pessoas denotam um estádio de desenvolvimento do eu autoprotectivo, com aspectos também conformistas, mas em vias de superação. Eros é o amor romântico ou apaixonado que idealiza o amado e procura agradar-lhe. Fixa-se sobretudo nas características de beleza física. Denota um estádio conformista. Storgê corresponde ao amor de ternura, afeição, relação, interdependência, mútua abertura e realização, comprometido a longo prazo, próprio de amigos íntimos ou de casais que atingiram um estádio de desenvolvimento onde prevalece a autonomia. Agapê é o amor puro, oblativo, altruísta, gratuito, desinteressado. O amante quer e procura o melhor para o amado que corresponde da mesma forma desinteressada e incondicional, sem olhar a sacrifícios e recompensas. Pode encontrar-se eventualmente num casal que atingiu a maturidade e é símbolo sobretudo do amor maternal e mais ainda do amor divino (Lasswell & Lasswell, 1976; Lee, 1977).

Sternberg (1986,1987) distingue três dimensões fundamentais no amor, propondo uma modelo triangular, ou “teoria triangular do amor”. Sternberg considera em cada vértice do triângulo um dos elementos principais do amor: intimidade, paixão, decisão/compromisso.

A intimidade corresponde a sentimentos de proximidade e de união entre os amantes e que geram alegria e entusiasmo. A paixão equivale aos impulsos que levam à atracção e à união física dos amantes. Por último, há a decisão/compromisso de assumir eventualmente uma relação a longo prazo.

A intimidade é a componente principal do amor, enquanto a paixão é a menos nobre e duradoura, embora na maior parte dos casos, sobretudo entre jovens enamorados, seja a única a estar presente. Se quiséssemos aproximar estas dimensões dos tipos de amor apontados por Lee, poderíamos dizer que a intimidade e o compromisso afectam sobretudo o amor storgê e agapê, enquanto a paixão está particularmente presente no amor erótico e de algum modo no maníaco. Cada uma das três componentes pode exprimir-se de diversas maneiras: a intimidade através de comunicação e sentimentos interiores, da promoção do bem-estar do outro, da partilha de bens; a paixão através de diversas expressões físicas (beijar, abraçar); o compromisso através de fidelidade, mesmo em momentos difíceis.

Sternberg aponta ainda algumas propriedades do amor (estabilidade, controlabilidade) mais ou menos presentes em cada uma das três componentes. Por exemplo, quanto à estabilidade, a intimidade e o compromisso desempenham um papel fundamental nas relações a longo prazo, enquanto a componente passional está mais presente a curto prazo, podendo com o tempo desaparecer.

Sternberg, analisando as três componentes do amor, identificou oito espécies de amor, dependendo da presença ou da ausência de cada componente. A sua taxonomia é constituída por: não-amor, amor de gosto, amor louco, amor vazio, amor romântico, amor companheiro, amor insensato, amor perfeito. Por exemplo, uma relação envolvendo compromisso, mas não

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intimidade nem paixão, é um “amor vazio”; uma relação envolvendo intimidade e compromisso mas não paixão é um “amor companheiro”; um amor com as três componentes seria um “amor perfeito” que pode estar presente nos casais e mesmo na relação pais-filhos (Neto, 2000).

Esta catalogação e interpretação do amor, segundo Sternberg, pode ser objecto de crítica, carecendo de confirmação empírica, havendo tentativas nesse sentido, como o estudo de Lemieux e Hale (2002).

Há ainda que ter em conta as diversas variáveis que dão coloridos particulares ao amor, como a idade e o sexo, a personalidade ou idiossincrasia de cada um, para além de determinantes contextuais e interculturais.

6.3 Bem-estar

O conceito de Bem-Estar / Wellness apresenta-se como uma filosofia de “bem- estar”, que tem como base o desejo de uma vida mais sã e serena, permitindo ultrapassar as “batalhas diárias”, fontes de preocupação de tudo o que nos rodeia, relembrando que a “chave da solução” para os problemas pode estar dentro de Nós (Albuquerque, 2005). Actualmente, o Bem-Estar está associado a vários conceitos, dependendo a sua definição da área geográfica e social, em que os centros que prestam tais serviços estão inseridos.

O Bem-Estar (Albuquerque, 2005) é um conceito de prática que engloba todos os aspectos do indivíduo, assim, envolve a manutenção de uma boa nutrição, exercício, boas relações pessoais, familiares e sociais, e o controlo do stress. Este pode ser considerado um tipo de medicina preventiva associada ao estilo de vida de cada um, podendo assim contemplar programas ou benefícios que são introduzidos para encorajar a aptidão física, a prevenção e a detecção precoce de doenças para ajudar a reduzir a utilização e os custos de futuros cuidados de saúde.

Este processo de cuidados de saúde implica uma tomada de consciência e alteração de atitudes em direcção a estilos de vida saudáveis, de modo a que os indivíduos possam fazer escolhas informadas para atingir uma saúde física e mental óptima através de serviços focados na promoção ou manutenção da Saúde em vez da correcção da doença. Os programas de Bem Estar muitas vezes incluem rastreios da tensão arterial e outros, bem como educação para a Saúde.

O Bem-Estar apresenta-se assim como um estado dinâmico de saúde no qual o indivíduo progride em direcção a um nível elevado de funcionalidade, atingindo um equilíbrio óptimo entre o meio interno e externo.

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6.4 Contentamento (serenidade/tranquilidade/alívio)

O contentamento e as suas emoções relativas (serenidade, tranquilidade, e alívio) surgem em situações consideradas como seguras e como tendo um alto grau de certeza e um baixo grau de esforço. Esta emoção prepara o indivíduo para apreciar o momento ou sentir-se “a si próprio”com os outros ou o mundo à sua volta, e integrar experiências quotidianas recentes no seu próprio auto-conceito e visão do mundo. O contentamento traduz um alargamento da perspectiva sobre si mesmo e o mundo.

O contentamento é uma jóia preciosa, muito mais valiosa do que a posse de bens inestimáveis. Acima de tudo, o contentamento é aquilo que realmente procuramos quando tentamos satisfazer os nossos desejos. E um estado que já conhecemos. Lembre-se de quando você se sentiu feliz e sereno no meio de um engarrafamento, ou diante de uma inundação na cozinha. Externamente, a situação era ruim. Porém, internamente, você se sentia bem. Considere agora a situação oposta: em uma festa com pessoas que você ama, você não conseguia alegrar-se porque uma briga recente com uma pessoa amada ainda o preocupava. O que provam essas experiências? Que condições externas não nos tornam felizes ou infelizes. Elas afectam-nos nas nossas predisposições internas, nos nossos estados subjectivos, sendo estes os determinantes primários das qualidades das nossas experiências. As outras pessoas não podem forçar-nos a ter sentimentos bons ou maus, embora possam-nos agradar ou frustrar. Podemos optar pela indiferença diante de suas atitudes agradáveis, e nos colocar acima de qualquer frustração. Se entendermos e dominarmos as forças responsáveis pelos nossos estados de espírito, podemos assegurar que estaremos sempre de bom humor, sejam quais forem as circunstâncias.

Contentamento não é, apenas, uma manifestação de alegria; é um princípio bíblico. Não depende de circunstâncias externas, mas de uma ampla visão espiritual da realidade. Não encontra-se atrelado a determinado tipo de personalidade, geralmente mais dócil; os mais empedernidos e críticos, também, precisam aquilatar o contentamento. A depender de determinadas situações ninguém ficará absolutamente satisfeito. Aliás o atendimento de necessidades materiais, psicológicas, até mesmo morais, não encerra o preenchimento das nossas carências. Há que ser vista a necessidade espiritual. É neste ponto que se estabelece o princípio do contentamento.

6.5 Esperança

Às várias definições de homem (como animal ou ser racional, ser político, ser religioso) pode acrescentar-se esta “ser que espera” ou “ser que vive da esperança” (Zavalloni, 1991).

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Trata-se de uma atitude, de uma emoção, de um valor, de uma virtude, ou como lhe quisermos chamar, das mais positivas ou necessárias para o ser humano. Os próprios símbolos ou sinais que a representam indicam essa qualidade: a cor verde; o sol nascente; a âncora; o ramo de oliveira; o farol; a Fénix.

Tillich (1965) afirma que “a esperança é simples para o louco, mas difícil para o sábio; qualquer um se pode perder com a esperança louca, mas a esperança genuína é algo raro e grande”. De qualquer modo é necessária para se poder viver. Não é uma ilusão compensatória das frustrações, uma alienação, uma panaceia, mas uma necessidade. A verdadeira e real esperança.

Uma das coisas mais importantes, senão a mais importante do homem, é encontrar sentido para a vida e para a morte. Isto significa ter esperança de que com a morte não acaba tudo, mas que, de qualquer forma, a sua pessoa e as acções se repercutem na eternidade. Até mesmo a matéria e o mundo caminham para um ponto Ómega, evoluem para uma plenitude (Theilhard). Além de uma dimensão antropológica, filosófica e psicológica, a esperança tem também uma inevitável dimensão e implicações sociais pois não é possível viver na comunidade humana sem um mínimo de esperança, embora cada corrente tenha a sua interpretação da esperança, como é o caso do marxismo que vê fundamentalmente a igualdade de classes (Zavalloni, 1991).

Snyder (1995) define a esperança como “um processo de pensamento sobre os objectivos da pessoa acompanhado com a motivação de actuar nesse sentido (agency) e de encontrar os meios (patways) para atingir os respectivos objectivos”. A esperança é ainda definida como uma “energia cognitiva e percursos para os objectivos”. Efectivamente, uma maior esperança reflecte um elevado sentido de energia mental e de meios para atingir os objectivos. Trata-se de uma esperança disposicional embora o autor admita que tal disposição possa mudar ao longo do tempo.

Esperança significa uma expectativa quanto ao futuro, mais ou menos justificada, atendendo um acontecimento agradável ou favorável. Na verdade, o optimismo é parente próximo da esperança, embora esta seja mais ampla e talvez com uma conotação mais afectivo-motivacional, enquanto no optimismo prevalece a dimensão cognitiva.

6.6 Felicidade

Falar de felicidade é tocar no coração do homem, pois todos nós desejamos ser felizes. Durante muito tempo os psicólogos não se dedicaram a este tema. Todavia, mais recentemente, tal tópico começou também a ser alvo de investigação a partir da perspectiva psicológica e é certamente o mais estudado juntamente com o bem-estar psicológico (subjectivo) e a satisfação com a vida.

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Ser ou não ser feliz é algo fundamental na vida das pessoas, nas famílias, no emprego, na educação, na política, no desporto e noutras manifestações socioculturais. A alegria é vida; a tristeza é morte. Pode dizer-se que a busca da felicidade constitui o último objectivo da existência humana. Sempre foi assim e mais actualmente onde há muitos factores promotores de bem-estar (como maior desenvolvimento económico, mais lazeres, melhor medicina) mas também novos perigos ameaçadores da alegria (novas doenças como a sida ou o cancro, maior fosso entre ricos e pobres, maior poluição atmosférica, mais competitividade) (Bus, 2000). Neste confronto urge promover a felicidade ou o bem-estar. Por isso, recentemente os psicólogos atentos à personalidade e ao comportamento humano, investigam esse constructo.

Desde os filósofos gregos, ao longo de dois milénios, pouco se progrediu na compreensão teórica da felicidade (Wilson, 1967). E se é difícil compreender em que consiste a felicidade, mais difícil é ser feliz. Não obstante, este é o objectivo mais profundo e último do ser humano. É, por isso, também um problema de educação das novas gerações. Mas, durante muito tempo, os psicólogos menosprezaram este constructo, talvez por ser menos apreensível empiricamente ou porque estavam mais centrados na terapia do que na profilaxia, no remediar do que no prevenir.

A felicidade trata-se de uma emoção positiva fundamental, muito versada na literatura, na filosofia e recentemente na psicologia (Izard, 1977). É um construto muito individualizado ou diferenciado, podendo dizer-se que cada pessoa é feliz ou infeliz à sua maneira, baseada nas mais diversas razões. Assim, para uma pessoa religiosa, a felicidade consiste em viver conforme a sua fé, enquanto para um hedonista a busca do prazer é o primeiro constituinte da felicidade, para um capitalista é o dinheiro ou para um político o poder ou o prestígio. Para uma pessoa homossexual, a “alegria” consiste em encontrar um par à altura.

Para uns, a felicidade depende da eficácia, para outros da integridade ou dos valores; para uns é algo de muito pessoal e íntimo, para outros baseia-se na saúde, nos rendimentos, nos acontecimentos; para uns é algo de duradouro, para outros de efémero. Mas parece que a felicidade deve ser considerada mais como um traço estável do que um estado emocional transitório (Veenhoven, 1984).

Segundo Rojas (1988) a tentativa de produzir uma teoria sobre a felicidade é como pretender buscar o sentido da vida, que deve ser comum a todos os homens. E daí a felicidade ser “vocação de todos”, pois “todo o homem é chamado a ser feliz”, embora poucos a atinjam, parecendo que a felicidade não é deste mundo, que se trata de um “impossível necessário”. Este autor insiste na tendência universal do homem à felicidade e procura compreender a sua essência, detendo-se sobre a natureza e o objecto da felicidade, aproximando-a do amor, do trabalho e da cultura, três colunas onde se apoia a sua teoria da felicidade. Rojas considera que o objecto da felicidade “é a plena realização de si mesmo”. O homem feliz é aquele que cumpre paulatinamente o princípio de Píndaro: “sê aquilo que és, isto é, sê tu mesmo, desenvolve tudo o que há dentro de ti, realizando a tua personalidade e o teu projecto”. Hegel dizia “feliz é aquele que goza de si mesmo na própria existência”.

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A cultura leva ao conhecimento, este à verdade e a verdade à liberdade. O mal é que a cultura actual é difusa e, de qualquer modo, está doente, afectando outros termos. São abordados outros temas que ajudam a compreender melhor, pela positiva ou pela negativa, a natureza da felicidade, como o amor, a esperança, a alegria, a prudência, a liberdade, e também o sofrimento, a inveja, o ressentimento, o desespero. Enfim, o homem constitui um problema e enigma de difícil solução; em todo o caso, para ser verdadeiramente feliz, deve descer-se à profundidade de si mesmo e não se limitar à superfície (Rojas, 1988).

Wilson (1967) descreveu a pessoa feliz como jovem, saudável, bem-educada, bem paga, extrovertida, optimista, livre de preocupações, religiosa, casada, com elevada auto-estima e com elevada moral no trabalho, com aspirações modestas e uma boa inteligência. Para Argyle (1987), a pessoa feliz possui também alta auto-estima, relações bem sucedidas com outras pessoas e satisfação sexual. Mas descrições deste género não são concludentes, faltando-lhes uma teoria sólida de base. Hoje os autores não focam tanto quem é feliz, mas quando e porquê se é feliz.

Wilson (1967) descreveu a pessoa feliz como jovem, saudável, bem-educada, bem paga, extrovertida, optimista, livre de preocupações, religiosa, casada, com elevada auto-estima e com elevada moral no trabalho, com aspirações modestas e uma boa inteligência. Para Argyle (1987) a pessoa feliz possui também alta auto-estima, relações bem sucedidas com outras pessoas e satisfação sexual. Mas descrições deste género não são concludentes, faltando-lhes uma teoria sólida de base (Campbell, 1976).

A felicidade é um conceito intercultural e as variáveis que contribuem para a felicidade ou os diversos mediadores em causa, como por exemplo, a situação familiar ou financeira, podem ter pesos diferentes conforme as diversas culturas.

A própria terminologia usada (alegria, contentamento, satisfação, bem-estar) indica as dificuldades em definir e controlar a felicidade, termo que expressa uma grande carga emotiva, mas que tem também uma dimensão cognitiva, pois cada uma representa a felicidade e seu modo. O termo “satisfação na/com a vida” realça a componente cognitiva. A expressão “bem-estar (subjectivo) ” pode ser mais abrangente, incluindo a satisfação e pressupondo a felicidade. Geralmente os autores consideram equivalentes ou sinónimos o bem-estar e a felicidade, enquanto vêem a satisfação como um factor sobretudo cognitivo do bem-estar.

Segundo Waterman (1993) deu-se atenção ao funcionamento positivo da personalidade, mas sem se definir claramente os termos, particularmente em relação a quatro construtos mais usados: sentido de identidade pessoal – teoria analítica do eu (Erikson, 1963), auto-realização – teoria humanista (Maslow, 1968), locus de controlo interno – teoria da aprendizagem social (Rotter, 1966), raciocínio moral – teoria do desenvolvimento cognitivo (Gilligan, 1982; Kohlberg, 1969).

Bradburn (1969) vê a felicidade como equilíbrio entre afectos positivos e negativos, devendo considerar-se a frequência e a intensidade de ambos, manifestando-se a frequência das

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emoções mais determinantes para a felicidade do que a sua intensidade; esta pode dar um prazer momentâneo, mas a longo prazo pode mostrar-se desgastante. Os psicólogos sociais dão mais importância à satisfação da vida, perspectiva mais cognitiva e que complementa a felicidade, que por sua vez, se mostra como a dimensão mais afectiva do funcionamento positivo (Ryff e Keyes, 1995).

Há diversas perspectivas filosóficas sobre a felicidade. Muitos, particularmente no mundo de hoje, atribuem à felicidade um significado predominantemente hedonista, referindo-se a uma experiência subjectiva que inclui a crença de se obter as coisas importantes que se desejam, bem como certos afectos agradáveis que normalmente acompanham esta crença. Este sentido hedonista da felicidade, ou o prazer pelo prazer, como única coisa boa, já era defendido por algumas escolas da antiga Grécia que Aristóteles critica dizendo que se trataria de uma felicidade animalesca. Ao contrário, para ele, a eudaima refere-se essencialmente à virtude, que é a melhor coisa, não devido ao prazer que provoca mas ao seu valor.

Tem-se assim delineado duas concepções diversas de felicidade: uma mais de ordem espiritual e outra mais de ordem física. Todavia, estas duas concepções de felicidade não se opõem totalmente, antes se correlacionam positivamente, embora se trate de coisas distintas, sendo a expressividade pessoal ou eudaimónica a que contribui para a auto-realização e não propriamente o prazer hedonístico. Patrício (1993), tratando dos valores hedonistas, contrapõe a concepção de prazer em Epicuro e em Aristóteles, procurando este o meio-termo entre os Cirenaicos que consideravam o prazer como sumo bem, e os Cínicos que o consideravam como um mal (Barros, 1997).

Ryff (1989) aponta alguns indicadores de maturidade e de equilíbrio psíquico. Auto-aceitação corresponde a uma dimensão fundamental de saúde mental, na linha da auto-realização de Maslow e da definição de personalidade adulta. Ter uma atitude positiva para consigo mesmo emerge como uma característica central do funcionamento psicológico positivo. Realizações positivas com os outros corresponde à capacidade de relações interpessoais calorosas, de empatia e de intimidade, as capacidades de amar e de fazer amizades são consideradas também como componentes principais de saúde mental, de bem-estar e de maturidade. Autonomia equivale ao sentido de autodeterminação, de liberdade e de independência, de autocontrolo do comportamento, não se deixando levar pelo convencional ou pela pressão social. Controlo do ambiente corresponde à capacidade de adaptação mas também de domínio e até mudança nos condicionamentos ambientais. Projecto de vida equivale à capacidade de ter um sentido ou um projecto para a vida, de ter uma direcção e intencionalidade. Por fim, o crescimento pessoal corresponde ao facto de o funcionamento ideal da personalidade requerer não apenas a posse das características anteriores, mas a sua continuação e expansão, numa constante actualização e desenvolvimento.

Higgins (1987) refere que a felicidade reflecte a congruência entre os diversos “eus”, em particular a congruência entre a representação mental do eu num dado evento e a sua

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representação ideal. A felicidade depende da consciência de que o eu em presença possui os atributos que a pessoa deseja idealmente possuir. A felicidade reflecte a presença de resultados positivos ou a consecução dos próprios valores e desejos. Mais em concreto, quando o autoconhecimento é congruente com a representação do eu ideal, gera-se uma sensação de satisfação e nasce a felicidade.

6.7 Optimismo

Segundo Peterson (2000), o optimismo “promete ser um dos importantes tópicos de interesse para a ciência social positiva”.

O termo “optimismo” apareceu nos primeiros anos do século XVIII numa revista dirigida pelos jesuítas de Trévoux falando da Teodiceia de Leibnitz que defendia que o mundo actual é o melhor que pode ser criado onde mesmo o mal contribui para o triunfo do bem (Canova, 1989).

Uma definição corrente de optimismo é da autoria do antropólogo Tiger (1979): “uma disposição ou atitude associada a uma expectativa sobre o futuro material ou social que o avaliador olha como socialmente desejável para o seu proveito ou prazer”. O optimismo é visto como uma característica cognitiva (um objecto, uma expectativa, uma crença ou uma atribuição causal) em relação ao futuro desejado e sentido como sucesso. Mas o optimismo não provém unicamente da inteligência ou da cognição mas tem também uma grande componente emocional e motivacional (Carver & Scheier, 1990).

O optimismo é uma característica ou dimensão importante da personalidade e mais em concreto um estilo cognitivo-afectivo sobre como o sujeito processa a informação quanto ao futuro. Muitos estudos têm sido feitos sobre este traço cognitivo da personalidade ou (pré) disposição do sujeito. Normalmente deve entender-se como uma característica ou tendência mais ou menos estável da pessoa, em circunstâncias normais da vida, e que tende a prevalecer mesmo em circunstâncias adversas.

Normalmente os autores distinguem entre optimismo pessoal (disposicional) e optimismo social (situacional). Segundo Scheier e Carver (1985), entende-se por optimismo pessoal uma expectativa generalizada de um resultado positivo mais directamente referente à pessoa, ao seu comportamento ou saúde. Se essa expectativa positiva diz respeito mais directamente a questões específicas ou ao ambiente social ou ecológico, está em causa o optimismo social. Estas duas classes ou expressões de optimismo podem não andar juntas. Apesar de muitas vezes os acontecimentos político-sociais tenderem a gerar pessimismo e serem frequentemente dramatizados nos meios de comunicação social, o optimista tende e manter-se confiante a seu respeito e eventualmente a respeito do mundo, defendendo-se do pessimismo, usando os seus mecanismos de defesa (Schweitzer e Schneider, 1997). Está provado que tendemos a ser mais

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realistas a respeito dos outros e das diversas circunstâncias do que nós mesmos, podendo o optimismo pessoal ser menos realista do que o social.

6.8 Perdão

Trata-se de um tema transversal a quase todas as religiões e espiritualidades, à teologia e à filosofia, o tema foi abordado das mais diversas perspectivas.

O perdão é a fina flor do amor-compaixão, libertando quem perdoa e quem é perdoado e renovando a alegria. Sendo tão importante o perdão, não apenas do ponto de vista teológico ou religioso como também do humano e social, não admira que as diversas Ciências do Homem, a começar pela Psicologia, se tenham ultimamente debruçado sobre o assunto.

Efectivamente todos os indivíduos e instituições precisam de perdoar e ser perdoados, sob pena de alimentarem contínuas guerras e guerrilhas: o próprio indivíduo deve saber perdoar a si mesmo; no seio da família só o mútuo perdão a pode fazer perdurável e feliz; nas escolas o perdão entre docentes e discentes é necessário para o bom entendimento e para a aprendizagem, na vida política, a nível nacional e internacional, os governantes têm de ser tolerantes e saber perdoar.

Perdão vem do latim tardio perdonum que comporta o prefixo per (pode significar perfeição da acção e também afastamento, bem como instrumentalidade: “através de”, “por”) e o substantivo donum (dom). Assim, perdoar significa entregar um dom, sem querer nada em troca, distanciando-se, por assim dizer, desse donativo, em sentido local e temporal, ou também um dom entregue através de outro ou servindo-se de alguém (como intermediário). No latim clássico não existe o verbo perdonare mas sim perdere (per-dare) com o sentido de “perder” mas também de “dar”. Em todo o caso, está implícito no perdão um “dom” ou a capacidade de doar sem reservas, o que não é fácil, mas conforta e pacifica o espírito. Esta base etimológica mantém-se nas línguas anglo-saxonónicas e germânicas: forgive – vergeban. Em vez de forgiveness, Roberts (1995) prefere usar forgivingness (perdoabilidade), neologismo usado também por outros autores.

Perdão é sinónimo de paz, alegria, libertação. Ao contrário, não perdoar leva consigo orgulho ferido, amargura, ressentimento, cólera, acusação, desejo de vingança, ódio, espiral de violência, perda de liberdade. É difícil perdoar, sobretudo à luz humana (à luz da fé cristã pode tornar-se mais fácil, dado que Cristo também perdoou e mandou perdoar), mas o perdão compensa, a curto ou a longo prazo. O perdão é interpretado como capacidade de ultrapassar a mágoa, o ressentimento ou a vingança que o ofensor merecia, através da compaixão ou da benevolência (North, 1987).

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Não se confunde o perdão com a justiça, a misericórdia, a reconciliação, a tolerância, embora se trate de construtos afins. Segundo Subkoviak et al. (1992), no perdão está sempre presente a dor de quem foi ofendido e que se pode traduzir em ressentimento, o direito a sentir ressentimento mas a ultrapassá-lo, a resposta ao ofensor através da compaixão; esta resposta é gratuita, pois não existe a obrigação de o fazer.

Com o perdão lucramos ao nível da saúde física (os sentimentos de cólera provocam um aumento de pressão sanguínea e prejudicam o coração) e psíquica (libertamos o espírito de pensamentos negativos, povoando-o de pensamentos positivos e magnânimos), ao nível das relações sociais (o ressentimento, o ódio e a vingança azedam as relações comunitárias, enquanto o espírito de tolerância e de perdão constroem a paz e a fraternidade) e sobretudo deve-se perdoar por motivos ético-religiosos (é um dever particularmente dos cristãos que, se não perdoam, não se podem minimamente identificar com a doutrina).

Perdoar implica um processo gradual em quatro fases distintas. Reconhecer a cólera corresponde à primeira fase. Não fechar os olhos à “ofensa” que, como o próprio nome indica, fere ou ofende os sentimentos e auto-estima, particularmente se proveniente de pessoas amigas. A segunda fase é decidir perdoar; apesar de o sujeito se sentir ferido, deliberadamente prefere deixar que a compaixão e o amor prevaleçam sobre o ressentimento e a vingança, embora isso não seja fácil, necessitando de reflexão e treino e, para os crentes, de recorrer à fé e à oração. A terceira fase consiste em elaborar o perdão, isto é, colocar em marcha acções concretas que realmente o tornem efectivo, como distinguir entre a ofensa e o ofensor, tentado de algum modo compreendê-lo, podendo mesmo fazer-lhe em presente que quebra o poder que ele exercia sobre o ofendido e que liberta também a quem o oferece. Por fim, aprofundar o perdão, que significa crescer psicológica e espiritualmente a partir do sofrimento que inflige, compreender melhor a miséria mas também a grandeza de todo o ser humano, encontrar mais sentido à vida e liberdade interior.

Deve ponderar-se a capacidade de pedir perdão. Se o ofendido caminhar em direcção ao ofensor, embora por vezes dolorosamente e por etapas sucessivas, também o ofensor deve empreender idêntico caminho, reconhecendo a sua culpa, decidindo-se a pedir perdão, elaborando e aprofundando o sentido de ser perdoado por quem tanto sofreu com a ofensa, libertando-se progressivamente da culpa e do remorso em direcção a uma vida mais livre e empenhada no amor.

6.9 Sabedoria

A sabedoria é um conceito complexo, multidimensional, denotando níveis de desenvolvimento cognitivo-afectivo muito elevados. Este tópico foi valorizado pelos psicólogos do desenvolvimento, dento da linha do life span ou do ciclo de vida, que começaram a estudar a

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idade adulta e a velhice, considerando esta o cume da sabedoria, idade mais dada à contemplação, às coisas espirituais, à capacidade de aconselhamento e outras manifestações da sabedoria. De qualquer forma, uns autores insistem mais na dimensão cognitiva, como Baltes (1987) ou Strenberg (1985), enquanto outros dão maior ênfase à dimensão afectiva, procurando integrá-la com a cognição e as experiências de vida. Mckee e Barber (1999) preferem uma definição a priori ou “real” às definições “empíricas” normalmente usadas pelos autores.

Podem ser identificadas algumas propriedades da sabedoria: nível superior de conhecimento e julgamento, capacidade de dar sentido à vida, sinergia entre a inteligência e a vida. Sternberg (1998) conceptualiza a sabedoria como aplicação do conhecimento tácito sobre a realização do bem comum através do equilíbrio entre múltiplos interesses pessoais (intra, inter, extrapessoais) e as condições ambientais. A pessoa sábia tenta ir além das banalidades da vida e pensar nos “mistérios” que a envolvem: a íntima unidade psicossomática do homem, o sentido profundo da vida e da morte, a vida do além, a existência de Deus.

Há uma grande dificuldade em definir este conceito tão complexo e, para além disso, a sabedoria pode ser interpretada diferentemente por um ocidental ou um oriental, tratando-se de um conceito multicultural. Daí haver também estudos feitos em diversas nações e contrastando diversos povos.

Bales e Staudinger (2000) apontam cinco critérios de avaliação da qualidade da sabedoria, dois mais básicos e gerais (factual e processual) e três metacritérios no âmbito da psicologia da cognição e personalidade. Os autores distinguem ainda três categorias e condições que se mostram relevantes para o desenvolvimento da sabedoria, umas mais gerais, outras mais específicas e ainda outras mais cro-estruturais.

6.10 Sentido da vida

Embora não se possa considerar o “sentido da vida” uma emoção ou sentimento, este constitui uma meta de convergência do processo de crescimento espiritual do homem. Só procurando o significado para a vida (e encontrando-o), é que o homem pode sentir-se feliz e realizado. As emoções e sentimentos já apresentados (alegria, amor, bem-estar, contentamento) contribuem para dar sentido à vida, ao mesmo tempo que ganham plenitude quando esse sentido é encontrado. Na verdade, ninguém ama sem sentido, ninguém espera sem sentido, mas antes porque existe uma razão para amar e esperar. Por outro lado, quem ama e espera, contribui para a busca e encontro de sentido.

Ter significado na vida é perseguir objectivos de valor, sentindo ao mesmo tempo uma vida em plenitude (Reker & Wong, 1988).

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A procura de sentido para a vida é uma variável cognitivo-afectivo-motivacional muito importante para a qualidade de vida psicológica.

O valor da vida está justamente no facto de ela ser limitada e transitória. A imortalidade, caso fosse possível provavelmente faria da vida, em não muito pouco tempo, algo sem graça e sem vida, por paradoxal que pareça a afirmativa.

A vida apresenta-se pois, como uma “morte adiada”, e é a sensação de impotência diante desse fim inevitável que nos impulsiona a viver e, por meio das realizações e da plenitude desse viver, tentar vencer a morte.

Encontrar um sentido para a vida é o único meio de encontrar um sentido para a morte e, por essa via, encarar o fim com maior tranquilidade e menos angústia. Se entendermos o universo como um todo – e a vida dentro dele -, como um complexo sistema em constante evolução, é mais fácil aceitar a nossa própria trajectória de vida como um processo que tem por finalidade a evolução, entendida como crescimento e desenvolvimento. O crescimento de uma pessoa ao longo da vida é, fundamentalmente, um processo de crescimento interior, de amadurecimento. Esse processo tem muito a ver com a relação que conseguimos manter com as outras pessoas. Tem a ver, em suma, com o amor.

7. CAMINHOS PARA A FELICIDADE

São apresentados três caminhos para a felicidade: vida de prazer (pleasant life), vida boa (good life or engaged life) ou vida com sentido/significado (meaningful life).

A vida de prazer corresponde a encontrar a felicidade através do prazer de emoções positivas. Alguns dos conceitos chave consiste em apreciar, saborear as ‘dádivas’ do dia-a-dia e ter um sentido de resiliência. Dentro de limites podemos aumentar as nossas emoções positivas sobre o passado (gratidão, perdão), sobre o presente e sobre o futuro (esperança, optimismo).

A vida boa significa encontrar a felicidade através da utilização das nossas principais forças de carácter. Este segundo caminho empreendido tendo em vista a felicidade envolve a busca de gratificação. A característica chave da gratificação é o envolvimento total da pessoa. Absorve-nos. Esta busca de gratificações requer o uso das forças de carácter, tais como a criatividade, a inteligência social, o sentido de humor, a perseverança, a apreciação da beleza e da excelência.

Por último, atingir a felicidade através de uma vida com sentido constitui encontrar uma ligação com algo para além do nosso self e usar as nossas principais forças ao serviço de alguma coisa muito maior que nós próprios (conhecimento, família, comunidade, justiça, espiritualidade).

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Peterson et al. (2005) sugere que as pessoas diferem na tendência para seguirem uma ou outra via na busca da felicidade. Há uma tendência para atingir a felicidade pela via do prazer (emoções positivas); pela via das gratificações e pela via da utilização das forças de carácter para algo maior que nós. Uma pessoa que utilize as três vias para a felicidade levaria uma vida plena, cheia, preenchida.

7.1 Forças de Carácter

Dahlsgaard, Peterson e Seligman examinaram as tradições de muitas culturas para identificar quais as forças de carácter que eram mais valorizadas em todas, ou quase todas, as culturas. Identificaram um total de vinte e quatro forças de carácter que sugerem ser universais.

Os resultados de várias investigações têm sugerido que estas forças de carácter ao serem usadas podem contribuir para um sentimento global de felicidade e de bem-estar nas pessoas.

Segundo Peterson e Seligman (2004), a força de carácter é algo que contribui para realizar uma vida percepcionada como boa para o próprio e para os outros e, apesar das forças humanas desempenharem um papel importante na forma como a pessoa lida com situações adversas, a psicologia positiva interessa-se antes de tudo pelo modo como estas forças promovem a optimização de todo o potencial humano da pessoa. Salienta-se ainda que o exercício das forças não resulta no condicionamento de outras pessoas próximas; destaca-se também que estas forças humanas são mensuráveis, através do auto-relato de pensamentos, emoções e/ou acções, podendo ser avaliadas. A investigação desenvolvida na área documentada que estas características são estáveis ao longo do tempo e têm um grau significativo de generalização nas várias situações, sendo assim definidas como traço.

Podem ser identificadas sete forças centrais: a sabedoria, o conhecimento, a coragem, a humanidade, a justiça, a temperança e a transcendência. É à volta destas forças que se organizam, depois, vinte e quatro traços. São, contudo, necessárias considerações culturais: existe uma enorme variabilidade nas diferentes culturas no que concerne às características que cada cultura mais valoriza, ou seja, desta forma, alguma das forças vistas como adequadas ou até mesmo necessárias para uma vida bem vivida, diferem de cultura para cultura.

8. ESTUDOS CIENTÍFICOS REALIZADOS

Perante a mudança de estudar o negativo para estudar o positivo, alguns autores dedicaram-se à investigação. Os métodos utilizados por eles são científicos e rigorosos o que remete para a ideia de que a Psicologia Positiva não é uma psicologia “barata”.

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Os estudos baseiam-se em amostras numerosas e diversificadas. Os resultados referem-se a padrões gerais. Coloca-se então a questão “serão as pessoas felizes?”. De 75% a 80% dos inquiridos, provenientes de todas as partes do mundo, afirmam que sim. Sentem-se alegres, confiantes, orgulhosos, contentes, satisfeitos. A felicidade pode ser genética e passado um ano de um acontecimento muito positivo ou muito negativo, os níveis de felicidade regressam aos níveis anteriores ao acontecimento. A felicidade não está associada à idade, ao género, ao grupo étnico, à educação, ao meio onde a pessoa vive (rural ou urbano). A felicidade não está também associada à riqueza, ou seja, países mais ricos não são mais felizes que os mais pobres. Em qualquer país do mundo, as pessoas mais ricas não são mais felizes que as outras pessoas. Pode-se então dizer que a felicidade está relacionada com a auto-estima elevada, à sensação de controlo sobre a vida, ao optimismo, à extroversão, à saúde e ao exercício físico.

Para responder às questões “como é que as pessoas felizes se comportam?” e “o que fazem para serem felizes?”, Diener & Seligman (2002) procederam a uma comparação entre pessoas felizes e infelizes. Os participantes responderam de acordo com alguns itens nomeadamente satisfação com a vida, estados emocionais, informação sobre as relações de amizade e traços de personalidade. Os autores compararam pessoas com os resultados mais elevados na felicidade (“muito felizes”) com pessoas com os resultados mais baixos na felicidade (“muito infelizes”). Verificou-se então que os resultados das pessoas muito felizes diferiam das pessoas muito infelizes em várias variáveis. As pessoas muito felizes apresentavam relações interpessoais gratificantes e muito satisfatórias. Eram mais extrovertidas, agradáveis e bem-dispostas. Nunca referiam sentimentos de êxtase ou de euforia. Por outro lado, as pessoas infelizes referiram ter poucos amigos, poucos relacionamentos íntimos ao longo das suas vidas e relações familiares pouco satisfatórias. Referiram também mais emoções negativas que as pessoas felizes.

Sobre a forma como as pessoas felizes lidam com a rejeição, ou não terem aquilo que querem, foi realizado uma investigação ao nível da escolha de instituição do ensino superior. Estudantes do 12º ano avaliaram a instituição de ensino superior depois de concorrem e outra vez depois de saberem quais as instituições que os aceitaram e seleccionaram. Os estudantes felizes mostraram-se mais satisfeitos que os infelizes com as instituições que escolheram e também mais satisfeitos que os infelizes com as instituições que os aceitaram mas que acabaram por não serem escolhidas. Os estudantes felizes desvalorizaram, de forma muito acentuada, as instituições que os tinham rejeitado. Por outro lado, os estudantes infelizes apresentaram-se menos satisfeitos com as instituições que acabaram por escolher e estavam menos predispostos e desvalorizar as instituições que os tinham rejeitado.

Lyubomirsky e Ross (1999) concluíram que pessoas felizes, em geral, tendem a usar somente comparações em direcção inferior, enquanto pessoas infelizes tendem a fazer comparações em ambos os sentidos.

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Em suma, vários estudos mostram como as pessoas felizes diferem das infelizes em muitas maneiras. As pessoas felizes e infelizes lidam de maneiras diferentes com a escolha (tomada de decisão) e a rejeição.

9. ACTIVIDADES QUE FAVORECEM A SAÚDE PSÍQUICA

9.1 Actividades Desportivas

O conceito de Bem-Estar / Wellness apresenta-se como uma filosofia que tem como base o desejo de uma vida mais sã e serena, permitindo ultrapassar as “batalhas diárias”, fontes de preocupação de tudo o que nos rodeia, relembrando que a “chave da solução” para os problemas pode estar dentro de nós (Albuquerque, 2005). O Bem-Estar é um conceito de prática que engloba todos os aspectos do indivíduo, assim, envolve a manutenção de uma boa nutrição, exercício, boas relações pessoais, familiares e sociais, e o controlo do stress. Este pode ser considerado um tipo de medicina preventiva associada ao estilo de vida de cada um, podendo assim contemplar programas ou benefícios que são introduzidos para encorajar a aptidão física, a prevenção e a detecção precoce de doenças para ajudar a reduzir a utilização e os custos de futuros cuidados de saúde.

Este processo de cuidados de saúde implica uma tomada de consciência e alteração de atitudes em direcção a estilos de vida saudáveis, de modo a que os indivíduos possam fazer escolhas informadas para atingir uma saúde física e mental óptima através de serviços focados na promoção ou manutenção da saúde em vez da correcção da doença. Os programas de Bem Estar, muitas vezes, incluem rastreios da tensão arterial e outros, bem como educação para a Saúde.

O Bem-Estar apresenta-se assim como um estado dinâmico de saúde no qual o indivíduo progride em direcção a um nível elevado de funcionalidade, atingindo um equilíbrio óptimo entre o meio interno e externo.

A célebre frase latina “mens sana in corpore sano” (mente sã em corpo são) ilustra o facto de que o homem sempre sentiu a necessidade de exercitar seu corpo para poder alcançar um equilíbrio psíquico completo.

Contudo, são várias as doenças que podem afectar o equilíbrio psíquico, uma das doenças que mais afecta o bem-estar psíquico é a depressão conhecida como uma das doenças psiquiátricas mais frequentes. Uma em cada quatro mulheres e um em cada dez homens, podem vir a ter crises depressivas durante a vida desde a juventude até à terceira idade.

A prática de exercício físico é uma boa forma de prevenir e combater as doenças. O exercício físico constante e moderado tem efeitos benéficos na saúde em geral e ao nível

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psicológico pode reduzir a ansiedade, melhorar a auto-estima e auto-confiança, melhorar a cognição e diminuir o stress.

O exercício físico liberta no cérebro substâncias que proporcionam uma sensação de paz e de tranquilidade. São as endorfinas, neuromediadores ligados à génese do bem-estar e do prazer. Por ser um potente libertador de endorfina o exercício físico cria a boa dependência quando praticado regularmente e faz falta como faria qualquer outra substância associada ao prazer. O exercício físico é altamente eficaz no combate ao stress e ansiedade e quando é moderado e regular, descontrai o corpo e activa o sistema imunitário.

O desporto pode ajudar a tratar depressões e esgotamentos nervosos quando praticado regularmente e com alguns cuidados especiais.

A libertação de endorfina, somada à melhora da auto-estima proveniente da sensação de estar fazendo algo em benefício da própria saúde e bem-estar, provoca um estado de plenitude que o praticante regular de actividade física experimenta e lhe traz benefícios a todos os níveis.

O exercício físico é muito eficaz para combater o stress, por ter um efeito relaxante e por favorecer uma descontracção mental e ajudar a pessoa a afastar-se temporariamente dos problemas e da tensão.

A prática regular de exercício físico traz resultados positivos aos distúrbios de sono, aos aspectos psicológicos e aos transtornos de humor, de ansiedade, depressão, e melhora os aspectos cognitivos, como a memória e a aprendizagem. O exercício físico sistematizado traz benefícios tanto na esfera física quanto mental do ser humano ao proporcionar uma melhor qualidade de vida.

É importante incluir a actividade física como uma forma de prevenção e tratamento para uma vida mais feliz e harmoniosa. Transformar o treino diário num acto de prazer e aproveitar ao máximo o bem-estar que a prática do desporto proporciona, tentando conciliar o lado físico (melhora da performance) ao estético (ter um corpo modelado), sem esquecer que o emocional precisa estar bem e sentir que está a praticar uma actividade adequada.

O segredo da longevidade e do bem-estar físico e psicológico está principalmente em ter uma alimentação adequada, tipo mediterrânea de baixas calorias e praticar exercício físico regular.

9.1.1 Aeróbica

As actividades aeróbicas, em particular, podem reduzir a ansiedade, a depressão e a tensão. Uma caminhada rápida ou ciclismo por vinte a trinta minutos, três a cinco vezes por semana, pode ser uma grande ajuda para gerir melhor o stress.

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É necessário, contudo que o ritmo de exercício seja adequado. Deve-se começar lentamente, com elevações graduais. Um programa de exercício muito rígido e exigente, pode deixar a pessoa ainda mais stressada. O exercício físico moderado produz um efeito benéfico geral sobre o organismo.

O segredo do sucesso é seleccionar um programa que seja agradável à pessoa e que seja realizado com estratégias para tornar o exercício menos monótono, com músicas animadas e por tempo, intensidade e frequência suficientes para produzir efeitos positivos.

As modalidades mais adequadas quando se sofre de algumas patologias, nomeadamente a depressão são aquelas mais calmas, menos exigentes, de fácil realização e que trabalhem com a concentração, respiração e relaxamento.

O melhor é evitar iniciar novas modalidades, optar por treinos de dificuldade média, nos quais a pessoa se sinta segura e capaz de desenvolver e avançar com sucesso. Iniciando sempre com um treino mais fácil para um mais difícil e terminando com um treino no qual a pessoa esteja habituada e tenha um desempenho bom a excelente.

Após um período de 3-4 semanas a pessoa sentirá os efeitos na sua auto-estima, primeiramente pelo simples motivo de ter conseguido cumprir o objectivo de realizar actividade física e paralelamente ao sentir os efeitos objectivos como o bem-estar físico, as mudanças estéticas e os bons resultados médicos. Com esse efeito a pessoa mantém-se estimulada e motivada a manter o programa de actividade física, o que por sua vez influirá positivamente no humor.

9.1.2 Ioga, Pilates, Tai-chi Chuan – Body Balance

O Ioga, o Pilates e o Taichi, são modalidades que exercitam a concentração, a respiração e a meditação o que leva a uma melhoria na forma de lidar com o stress e com o bem estar mental, actuando de forma positiva também por distanciar momentaneamente a pessoa do problema.

O Yoga é uma prática de disciplina do corpo e da mente. Hoje em dia o Yoga está mais focado nas técnicas corporais ou posturas chamadas “asanas” e exercícios de respiração chamados “pranayamas” e também a meditação. A palavra Yoga quer dizer “união”, união individual do ser no seu absoluto. Melhora a flexibilidade, a clareza mental. Promove um melhor auto-conhecimento das suas capacidades, um controlo do stress e aumento da concentração.

O Método Pilates oferece-lhe uma forma diferente de pensar sobre o seu corpo. Através da prática de exercícios de Pilates terá uma maior consciência corporal, combinando o controlo do corpo com a mente. Sobretudo para prevenir problemas nas costas; para ter um corpo firme e tonificado; para treinar melhor no ginásio, nas aulas de grupo e outras actividades diárias.

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Melhora a postura e flexibilidade, aumenta a força nos músculos dorsais e abdominais, maior equilíbrio e coordenação geral.

O Tai-chi chuan é uma arte milenar de origem oriental, com um sistema de práticas que beneficiam as pessoas num todo, equilibrando tanto a mente quanto o corpo. É composto por movimentos relaxados, designados a estabilizar o equilíbrio das forças vitais do organismo (a união entre as forças vitais Yin e Yang). Adquire-se o conhecimento de como exercitar-se correctamente e com determinação e disciplina e assim adquire-se a saúde mental desejada.

O Body Balance é um programa dinâmico de alongamentos baseado em técnicas de yoga, tai-chi e pilates que o deixa relaxado e revigorado. Combina os princípios e práticas fundamentais do yoga e pilates tais como a respiração controlada, concentração, flexibilidade e força de modo a criar uma sessão holística que confere um estado de equilíbrio e harmonia ao seu corpo, mente e alma. O Body Balance revitaliza e tonifica, libertando os músculos contraídos e tensos e deixando-o num estado de calma energizada. Você experimentará um nível mais profundo de relaxamento e começará a desfrutar dos benefícios de uma mente clara e organizada.

9.1.3 Desporto de competição

O desporto de competição pode ser uma boa solução somente nos casos da pessoa se sentir motivada para isso e gostar do desporto que pratica.

Devendo ter em conta que um exercício físico baseado em fortes competições desportivas, pode resultar em aumento de stress que poderá ser prejudicial, é melhor optar por uma modalidade mais tranquila e não competitiva.

9.1.4 Dança

Uma modalidade que tem vindo a ganhar bastante importância nesta área é a dança já que nem só de corridas, flexões, abdominais e alongamentos se faz o processo pelo qual o exercício físico contribui para o desenvolvimento intelectual e cognitivo. Os benefícios da dança ultrapassam o bem-estar físico. Alegria, disposição e um círculo de amizades que não pára de crescer são apenas algumas das transformações que ela proporciona.

Os benefícios da dança como uma actividade física são bem conhecidos: flexibilidade, melhora do condicionamento aeróbico, aprimoramento da coordenação motora e perda de peso, entre tantos outros. Mas pouco se fala da dança como uma terapia para a alma. Basta observar com um pouco mais de atenção para perceber que os resultados vão muito além do bem-estar físico. Socialização, combate à depressão e à timidez, alegria, auto-estima elevada e disposição

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para encarar as dificuldades do dia-a-dia são apenas algumas das transformações que se nota em quem se arrisca a entrar o mágico mundo da dança.

Ao ensaiar os primeiros passos, a pessoa se desprende dos medos e preconceitos e vê seu estilo de vida ser transformado pouco a pouco. “A dança é mesmo uma forma de terapia. E qualquer pessoa pode dançar, não existem restrições, nem mesmo de idade. Os passos podem – e devem – ser adaptações às limitações físicas de cada um, mas não existe impedimento. Além de dar um sentido bem mais alegre à vida, a dança também é óptima aliada para manter a cumplicidade de um casal.

Tonificação muscular, combate às gorduras extras, aumento da flexibilidade, melhora da coordenação motora, da postura, da memória e do controle da respiração, mais disciplina. A lista de benefícios que a dança proporciona parece não ter fim. E é em primeiríssimo lugar a preocupação com a saúde que leva muita gente a arriscar seus primeiros passos em diferentes coreografias. Dançar conforme a música não faz bem apenas ao corpo. Piruetas, rodopios e afins são puro deleite. Outro incentivo que fideliza os dançarinos é a possibilidade de conhecer gente e de espantar o stress.

9.2 Actividades Lúdicas

O lazer e a recreação fazem mais do que nunca parte integrante da vida das comunidades. Nos domínios da cultura, da educação, do desporto, da economia, da ciência, das actividades sociais, da saúde, etc... eles representam um inegável desafio para as sociedades de hoje.

De toda uma panóplia de opções para ocupar o tempo livre, as actividades de lazer recreo-desportivo na natureza, contam-se entre as que a priori encerram factores mais positivos, nomeadamente, as oportunidades para fazer a ligação ao meio natural através do conhecimento dos ecossistemas; da apropriação de novas culturas e do contacto com outras gentes; do aumento da consciência ambiental; da criação de novos mercados para as economias locais e regionais; ou da potencialização do valor de conservação frente a outros usos do espaço. Todavia, as mesmas não deixam também de se apresentar como um fenómeno ambivalente pois podem também gerar impactos negativos nos meios natural, económico e social.

As actividades de lazer activo representam actualmente um elemento de importância crescente no tempo livre das populações. O aumento do tempo de lazer (especialmente aos fins-de-semana) da mobilidade, do poder de aquisição dos jovens, da erupção do mercado de produtos e complementos desportivos para todo o tipo de actividades, da moda pelo verde e da necessidade das populações urbanas entrarem em contacto com espaços abertos, livres e naturais, está a gerar fluxos muito importantes em direcção ao meio rural e aos espaços naturais.

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Podem-se tipificar presentemente mais de meia centena de actividades (tradicionais ou novas) de neve, terrestres, ar e aquáticas que nos dias de hoje se praticam permanentemente em vários países da Europa. O impacto ambiental destas actividades depende de muitos factores: características da própria actividade, número de pessoas que as praticam, lugar e frequência da sua realização, educação e sensibilidade para a prática do desporto em meio natural, educação ambiental.

Solicitam-nos estas entidades e instituições uma simbiose entre o bem-estar e a qualidade de vida que é dada pela prática desportiva em contacto com a natureza. Procura-se que as imposições relativas aos problemas ambientais acentuados nas últimas décadas de maneira alarmante, não tenham que se repetir agora, noutros campos da actividade humana, nomeadamente no acesso e nas limitações das actividades de lazer activo em contacto com a natureza

9.2.1 Jogos Tradicionais

Jogos de carácter simples são muito apreciados pois possuem uma forte componente dinâmica que valoriza o espírito de equipa, a comunicação, a relação interpessoal e até a liderança. As equipas são confrontadas com vários obstáculos que têm de solucionar em conjunto.

Proporcionam uma sensação de prazer e alegria. Incentivam o convívio e o relacionamento entre as diferentes comunidades. Servem também para dinamizar e incentivar os mais sedentários, promovendo a actividade física desportiva de forma acessível e lúdica. Desenvolve nos participantes capacidades a nível fisiológico, social, cultural, psicológico positivas. Proporcionam um contacto, convívio saudável entre as populações, aprofundando as relações de amizade.

Os Jogos Tradicionais, ancestrais costumes populares tomam ao longo do tempo e de região para região diferentes formas. Todos têm em comum o entretenimento, a boa disposição e competição saudável. A estes jogos têm-se juntado a prática de actividades de índole social, sem cumprimentos de normas impostas, e apenas como recreação e com regras definidas de forma simples.

9.2.2 Leitura

Ler é essencial. Através da leitura, testamos os nossos próprios valores e experiências com as dos outros. No final de cada livro ficamos enriquecidos com novas experiências, novas

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ideias, novas pessoas. Eventualmente, ficaremos a conhecer melhor o mundo e um pouco melhor de nós próprios.

Ler é estimulante. Tal como as pessoas, os livros podem ser intrigantes, melancólicos, assustadores, e por vezes, complicados. Os livros partilham sentimentos e pensamentos, feitios e interesses. Os livros colocam-nos em outros tempos, outros lugares, outras culturas. Os livros colocam-nos em situações e dilemas que nós nunca poderíamos imaginar que encontrássemos. Os livros ajudam-nos a sonhar, fazem-nos pensar.

Nada desenvolve mais a capacidade verbal que a leitura de livros. Na escola aprendemos gramática e vocabulário. Contudo, essa aprendizagem nada é comparada com o que se pode absorver de forma natural e sem custo através da leitura regular de livros.

Alguns livros são simplesmente melhores que outros. Alguns autores vêem com mais profundidade o interior de personagens estranhas, e descrevem o que eles vêem e sentem de uma forma mais real e efectiva. As suas obras podem exigir mais dos leitores: consciência das coisas implicadas em vez de meramente descritas, sensibilidade às nuances da linguagem, paciência com situações ambíguas e personagens complicadas, vontade de pensar mais profundamente sobre determinados assuntos. Mas esse esforço vale a pena, pois estes autores podem proporcionar-nos aventuras que ficam na nossa memória para toda a vida.

Relativamente aos escritores em si, é difícil muitas vezes começar a ler livros de um novo escritor, o que nos leva a desistir ao fim de poucas páginas. É essencial perseverar. A maioria da boa escrita é multi-facetada e complexa. É precisamente essa diversidade e complexidade que faz da literatura uma actividade compensatória e estimulante.

Muitas vezes um livro tem que ser lido mais de uma vez e com abordagens diferentes. Estas abordagens podem incluir: uma primeira leitura superficial e relaxada para ficar com as principais ideias e narrativa; uma leitura mais lenta e detalhada, focando as nuances do texto, concentrando-nos no que nos parece ser as passagens chave; e ler o texto de forma aleatória, andando para trás e para a frente através do texto para examinar características particulares tais como temas, narrativa, e caracterização dos personagens. Todo o leitor tem a sua abordagem individual mas o melhor método, sem dúvida, de extrair o máximo de um livro é lê-lo várias vezes.

Pesquisas científicas enfatizam que a leitura oxigena o cérebro e mantém a máquina que é o ser humano reciclável.

10. ORGANIZAÇÕES POSITIVAS

A psicologia, recentemente, tem fornecido um novo enfoque na sua área de actuação. Desde os grandes filósofos da Grécia antiga o estudo do bem-estar, qualidade de vida e felicidade tem

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sido conduzido, porém ao longo da história, fruto de factores como conflitos das mais diversas ordens, armados ou não, e a crescente industrialização, fez com que o foco de compreensão do indivíduo se alojasse em aspectos negativos que começaram a surgir, como neurose, depressão, stress, entre outros. É natural que este tipo de abordagem orientasse outras áreas do conhecimento e oferecesse teorias muito diversas. Como resultado, se procurarmos no meio científico as produções que analisam a origem de doenças e patologias mentais teremos um grande número de artigos e estudos, extremamente maior do que aquelas que procuram compreender o que proporciona o bem-estar e a felicidade individual. Isto é incongruente, até mesmo, com a natureza humana, pois temos a necessidade de nos sentirmos bem. A Psicologia Positiva, movimento criado em 2000 tenta compreender os aspectos positivos do ser humano e o que o leva a sentir-se bem e fornece significado à sua vida. Como é natural, este conceito chegou às empresas e organizações e ofereceu achados importantes. Em estudos de avaliação, realizados junto a duzentos e setenta e dois funcionários, foram avaliados quanto às suas emoções positivas e o seu desempenho foi acompanhado ao longo de 18 meses.

O afecto positivo consiste num domínio muito importante na construção do bem-estar e satisfação com a vida, pois envolvem estados mentais como afeição, amizade, solidariedade, entre outros. Aqueles que apresentaram maior marca desta característica obtiveram melhores avaliações de seus superiores e remunerações diferenciadas.

Pesquisas demonstram claramente a relação entre a percepção existente no ambiente de trabalho e os resultados obtidos pela organização (Harter, Keyes e cols, 2003). A presença de emoções e sentimentos positivos na unidade de negócio está associada com maior satisfação do cliente, maior lucro e menor rotatividade de profissionais.

Não há dúvida quanto ao facto de que a busca pela excelência depende dos indivíduos da organização num aspecto sistémico. Indivíduos possuem deferentes virtudes e forças; e por consequência diferenças em percepções. A excelência é multifacetada e por essa razão devemos compreendê-la a três níveis:

Indivíduos (comprometimento, adaptabilidade, bem estar);

Grupos (contribuição entre os membros, promoção de capacidade, padrão de interacção);

Organização (qualidade e quantidade de resultados, capacidade do processo de aprendizado da organização, crescimento individual das pessoas ao longo do tempo).

Os níveis acima interagem e afectam-se mutuamente. Assim, de uma forma geral, excelência é compreender o que desperta “as pessoas à acção”, o que as motiva colectivamente, direccioná-las e alinhá-las à visão de excelência da organização, e reflectindo como liderança, como podemos despertá-las individual e sistemicamente. Para isso, a empresa deve promover

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uma “revolução positiva”, isto é, deixar de atender à metáfora de que a organização é composta de problemas a serem solucionados para ser um centro abrangente de forças e virtudes com grande potencial visionário criador de um futuro altamente promissor. Mas como mudar? Qual o caminho para semear esta nova e promissora cultura? A organização é um ecossistema: muitas vezes nos deparamos com situações onde este habitat é corrosivo e poluído, deprime talentos e impossibilita o florescimento individual e colectivo.

Instituições positivas, tais como confiança mútua, ética do trabalho, reciprocidade, senso comunitário, valorização social do mérito e do esforço individual, respeito à propriedade, cumprimento fiel dos contratos (mesmo que apenas verbais) - entre inúmeras outras - contribuem para a coesão e a interacção harmónica da sociedade. Despertam também a autoconfiança e o espírito empreendedor dos indivíduos, a convicção da viabilidade do esforço individual e colectivo e diversos outros valores que, em conjunto, levam naturalmente ao progresso e à prosperidade.

Coragem, esperança, optimismo, resiliência, cooperação, criatividade, energia, emoções positivas, confiança, cidadania, sabedoria – eis alguns dos ingredientes da nova corrente de estudos científicos designada «estudos organizacionais positivos». Esta linha procura dar resposta a questões como: Por que tendem as pessoas a dar mais atenção aos acontecimentos negativos do que aos positivos? Como contrariar essa tendência? Ou seja, como abandonar a lógica da «loja de reparações» daquilo que «está mal», a favor da lógica assente nas forças das pessoas e na energia positiva? Por que deve o vocabulário das deficiências ser substituído pelo vocabulário da construção positiva? Como se constrói e destrói a confiança entre pessoas e organizações? O que é a resiliência e que vantagens lhe estão associadas? O que faz de um chefe uma fonte de toxicidade para as suas equipas? Como lidar com chefes tóxicos? Por que são algumas organizações campos de energia positiva, enquanto outras são verdadeiras arenas de negatividade? O que é uma organização «verdadeiramente saudável»?

Existe hoje diversa literatura que não se baseia na fé, na experiência individual ou na moda - mas no método científico. Diversos trabalhos desta natureza focalizam-se na vida organizacional, preconizando o desenvolvimento de "organizações positivas". Nas organizações, as pessoas despoletam colectivamente processos que podem ser de apoio social ou de vulnerabilidade psicológica. Podem despertar energia colectiva ou preguiça social. Trabalhar numa organização pode ser um travão às potencialidades individuais ou, pelo contrário, um espaço de superação individual e de desenvolvimento de forças virtuosas como a sabedoria, a coragem, o amor, a justiça e a temperança.

Trabalhar em organizações deflagradoras de experiências negativas não gera apenas custos laborais. Também degrada a vida pessoal e a familiar. Uma pessoa que vive situações laborais intensas de medo ou stress pode não ser capaz de afastar da sua vida privada esses sentimentos. Essas situações podem decorrer da inadaptação à função, da decepção com a carreira, de uma liderança tóxica ou, globalmente, de um clima organizacional cínico e "doentio". Os efeitos

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podem ser a fadiga, a preocupação, a irritabilidade e diversas doenças cardiovasculares ou endocrinológicas. Distintamente, uma vida de trabalho saudável promove uma vida integralmente sã.

Nas organizações em que vigora a gestão positiva há equilíbrio entre as necessidades económicas e as práticas de um colectivo social saudável: encorajamento aos mais fracos, recompensa da lealdade, estímulo da competição justa, gestão apropriada do stress. A gestão positiva origina, pois, organizações com dinâmicas sociais saudáveis. Nelas é aplicado um princípio básico do comportamento organizacional positivo: as forças e as capacidades psicológicas positivas podem ser geridas em prol do desempenho organizacional e da realização pessoal dos colaboradores.

A abordagem positiva poderá, pois, ser usada como alavanca para estimular uma forma construtiva de (re)pensar a gestão. Incentivar virtudes, respeitar a dignidade humana, prezar a excelência, velar pela busca de felicidade, promover a cooperação e a confiança - eis aspectos que poderão gerar consequências desejáveis nos indivíduos e nas organizações. Os efeitos da positividade organizacional podem mesmo transcorrer para o exterior - gerando impacto positivo na satisfação dos clientes e na comunidade circundante.

As empresas portuguesas poderão beneficiar com esta abordagem. Discursos pessimistas e culpabilizadores não serão o modo mais apropriado de elevar o País ao patamar de desenvolvimento desejado.

É no quotidiano organizacional que o futuro se constrói, desenvolvendo a tenacidade, a honestidade, o espírito de rigor, a firmeza, a perseverança, a generosidade, a criatividade, a gratidão, o optimismo - e a sabedoria realista! Gerir pessoas não é apenas reparar o que está errado nelas - mas sobretudo identificar e desenvolver as suas forças.

11. PSICOTERAPIA POSITIVA

Fundada há cerca de cinco décadas pelo psiquiatra germânico-persa Nossrat Peseschkian, a Psicoterapia Positiva surge como um modelo que tenta conciliar os mais diversos aspectos das várias correntes de pensamento psicológico.

O termo ‘positivo’ vem do positum, que significa factual, dado, que entre outras coisas, pode ser aquilo que nos é dado para agir com o paciente, pois em consulta “o paciente traz consigo não somente a doença mas também a habilidade para superá-la” (Peseschkian, 1992). É esta mesma visão positiva da realidade que faz com que este modelo se revista de aspectos multiculturais, como o próprio Peseschkian salienta: frequentemente o Ocidente e o Oriente não são complementares como “as flores de um só jardim” multicolorido, cuja beleza se encontra nas diferenças. É desta complementaridade que ele tenta conciliar a sabedoria popular oriental com o

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conhecimento científico ocidental. Daí a utilização de métodos e técnicas de origem mais cientificas (como a observação e a inventariação) à utilização de histórias e metáforas que possam servir de instrumentos terapêuticos.

É esta visão completa da humanidade que permite que a Psicoterapia Positiva preconize uma imagem de ser humano pleno e completo, tentando trabalhar sobre os quatro domínios da vida: as sensações corporais, a realização laboral, as relações sociais e a incapacidade transcendental de intuição e fantasia. Acreditando na articulação entre as capacidades espirituais e materiais, bem como na visão do ser humano como um diamante em bruto que precisa de ser lapidado, este modelo consegue ver para além da doença e da culpa, vendo a capacidade humana de constante evolução.

11.1 Logoterapia

A Logoterapia é um sistema teórico – prático de psicologia, criado pelo psiquiatra vienense Viktor Emil Frankl, que se tornou mundialmente conhecido a partir de seu livro "Em Busca de Sentido" (Um Psicólogo no Campo de Concentração) no qual expõe as suas experiências nas prisões nazis e lança as bases de sua teoria. Ele viveu durante três anos no campo de concentração em Auschwitz, onde pereceram todos os seus familiares e que, apesar de tudo, não perdeu o sentido da vida, embora de algum modo quase se sentisse culpado de sair desse campo de morte com vida. Com essa trágica lição da história procurou novos caminhos e razões de viver. Convenceu-se ainda que, mesmo em circunstâncias absolutamente trágicas ou situações-limite entre a vida e a morte, não se deve perder o sentido da vida. É nessa busca e encontro de sentido que funda a sua logoterapia, introduzindo na psicologia e na psicoterapia a dimensão espiritual. Assim, a logoterapia surge como uma “re-humanização da psicoterapia” que deve contar também com a capacidade de autodistanciamento e de autotranscendência da pessoa humana.

De acordo com Allport, "trata–se do movimento psicológico mais importante dos nossos dias".

A Logoterapia é conhecida como a Terceira Escola Vienense de Psicoterapia, sendo a Psicanálise Freudiana a primeira e a Psicologia Individual de Adler a segunda. O termo "logos" é uma palavra grega que significa "sentido". Assim, a "Logoterapia concentra-se no sentido da existência humana, bem como na busca da pessoa por este sentido". "Para a Logoterapia, a busca de sentido na vida da pessoa é a principal força motivadora no ser humano. É considerada e desenhada como a terapia centrada no sentido - vê o homem como um ser orientado para o sentido". Mas no mundo actual o homem sente-se frustrado por não encontrar esse sentido e por isso sente a “tríade trágica”: sofrimento, culpa, morte. É então necessário dar sentido aos aspectos

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negativos, “transformar o sofrimento em prestação, a culpa em transformação, a morte num incentivo a agir responsavelmente” (Frankl, 2001).

O homem sempre procurou dar um sentido à sua vida e aprofundar-se na sua existência. A frustração dessa necessidade é um sintoma do nosso tempo. O sofrimento e a falta de sentido configuram o vazio existencial que muitos experimentam. Para esse mal, Frankl foi desenvolvendo durante décadas a Logoterapia.

Frankl não pretendeu "suplantar a Psicoterapia vigente, mas complementá-la e completar também o conceito de ser humano – mais indispensável às ciências do homem do que o método e técnicas correctas". A Logoterapia busca restituir a imagem do homem superando reducionismos. Faz uma proposta que não se limita à Psicologia, mas abrange todas as áreas da actividade humana, e busca resgatar aquilo que é especificamente humano na pessoa.

A logoterapia olha para o futuro procurando dar lugar à esperança na busca constante de um sentido para a vida.

11.2 Risoterapia

Desde crianças ouve-se a expressão "rir é o melhor remédio". Mas este conceito nunca foi tão levado a sério como nos últimos tempos. O riso, agora, é considerado terapia, comprovada por estudos médicos e com resultados surpreendentes. A risoterapia como método terapêutico existe desde a década de 60. Quem assistiu ao filme Patch Adams conhece bem a história. O americano Hunter Adams, conhecido como Patch Adams já implantava o método em hospitais e escolas desde a sua época de estudante. Era comum vê-lo atender seus pacientes com nariz vermelho ou peruca de palhaço. Partidário à eficiência do método é o médico clínico geral e homeopata Eduardo Lambert, especializado em terapias sistémicas e autor do livro Terapia do Riso - A Cura pela Alegria, da Editora Pensamento. Ele considera o riso como uma terapia complementar que auxilia na melhoria do estado emocional e orgânico das pessoas, em pacientes dos mais diferentes tipos de enfermidades. "

Cientificamente, considera-se o riso como um grande estimulador. É o riso o responsável por mandar a ordem para o seu cérebro, através do hipotálamo, que sintetiza as endorfinas, mais precisamente as betas endorfinas. Essas substâncias, que são produzidas nos momentos de bom humor e consequentemente do riso, são analgésicas, similares às morfinas, mas com potência cem vezes maior.

"O simples esboçar de um sorriso, o riso ou uma gargalhada - e quanto mais intensa melhor - cria uma onda vibratória que propicia de imediato um relaxamento corporal que se estende para todo o corpo, dando uma sensação de bem-estar físico, mental e emocional. Protege ajudando-nos a prevenir de várias enfermidades".

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O médico avisa que quanto mais intenso, melhor. Mas que um simples sorriso, uma graça, situações cómicas, bons pensamentos, bons sentimentos, boas lembranças, pensamentos positivos, palavras de apoio e incentivo já são factores importantes à síntese das endorfinas. "É bom lembrar que sorrir nas adversidades é privilégio dos fortes." É uma técnica mental que ensina a recuperar a nossa capacidade inata de rir e ser felizes e é, segundo dizem os seus defensores, uma fonte inesgotável de saúde e bem-estar.

Na verdade a risoterapia como método terapêutico, já existe há muitos anos e nasceu na Índia, com Madan Kataria, mas a sua verdadeira importância apenas agora está ser objecto da devida atenção. Cientificamente está comprovado, que o riso franco, a gargalhada, têm múltiplos e variados benefícios para a saúde.

Por se tratar da expressão mais explícita do bom humor e da positividade, o riso tem sido o principal objecto da maioria destes estudos, além de que a sua interferência no funcionamento do corpo é mais fácil de ser avaliada. O psiquiatra americano William Fry, da Universidade de Stanford, afirma: «Quando rimos, rimos com o corpo todo», e por isso libertamos menos hormonas associadas ao stress, como cortisol e adrenalina. A libertação, em excesso, dessas substâncias enfraquece as defesas do organismo e aumenta a pressão arterial, predispondo o indivíduo ao desenvolvimento de infecções ou até mesmo a sofrer um enfarte. Lee Berk, patologista e director do Centro de Neuro-Imunologia da Universidade de Loma Linda, na Califórnia, levou a cabo um estudo sobre os benefícios do bom humor para a saúde do coração. Durante um ano, Berk e a sua equipa acompanharam 100 homens que já tinham sido vítimas de enfarte, controlando diariamente a pressão arterial, as taxas de adrenalina e as doses de medicamentos de cada um deles. Dividiram os pacientes em dois grupos, um dos quais era obrigado a assistir diariamente a uma comédia televisiva durante meia hora. O resultado foi surpreendente: os que foram submetidos às sessões de gargalhadas sofreram menos episódios de arritmia, baixaram a pressão arterial e passaram a tomar menos remédios contra a angina de peito. A recorrência de enfarte no grupo dos que assistiam à comédia foi de 8%. No outro grupo, de 42%.

Outro trabalho fascinante sobre a influência das emoções positivas na saúde é o de David Snowdon. Desde 1986, e durante 15 anos, o médico da Universidade do Kentucky acompanhou 678 freiras com idade superior a 75 anos. Interessado em estudar a doença de Alzheimer, debruçou-se sobre a história pessoal e médica de cada uma delas. Curiosamente, o «ouro» da pesquisa estava em 200 diários escritos na época em que as religiosas ainda eram noviças e tinham, em média, 22 anos. Durante a sua análise, Snowdon percebeu que as que utilizavam nos seus relatos mais palavras ligadas a emoções positivas — como «felicidade», «amor», «gratidão» e «esperança» — tinham chegado à velhice mais saudáveis que as que costumavam usar com frequência palavras negativas — «tristeza», «indecisão» e «vergonha». As optimistas apresentaram mais longevidade, com uma variação de 6 a 10 anos, face às menos optimistas.

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Snowdon concluiu ainda que as autoras dos textos mais elaborados, ricos em ideias, vocabulário e conhecimentos gerais exibiam um grau de demência senil menor; outra prova de que manter-se intelectualmente activo desde jovem pode evitar doenças cerebrais. Uma actividade mental mais intensa fortifica as ligações entre os neurónios e forma novas redes. Quanto mais densa e maior for essa rede, mais saudável é o cérebro.

A risoterapia apresenta vários benefícios. Antes de mais, é benéfico para o cérebro e, através, dele, a todo organismo, despoletando o sistema endocrinológico. Rindo às gargalhadas, é estimulado o córtex cerebral que produz numerosas hormonas como as catecolaminas que estimulam os anticorpos para defender o organismo de vírus e inflamações. O riso estimula de modo particular o hipotálamo, na base do cérebro, que liberta endorfinas com propriedades calmantes e analgésicas. As endorfinas são hormonas de euforia ou de prazer que ajudam a combater o stresse, possuindo também uma acção antidepressiva e analgésica. Por isso, o riso “anestesia” o sofrimento físico e também psíquico. As endorfinas ajudam ainda o cérebro a não perder neurónios à medida que se vai envelhecendo, mantendo a inteligência mais lúcida e a memória intacta.

O riso é também um aliado do sono, despoletando a serotonina que é uma substância calmante. O riso põe ainda em funcionamento mecanismos musculares e respiratórios. Quando rimos, produz-se como que uma onde de choque que se transmite, de músculo em músculo, aumentando de intensidade, sobretudo os músculos da face, mas também do pescoço e dos ombros, ajudando a descarregar a tensão. Os pulmões também se dilatam. Esta ginástica respiratória é benéfica para todos, principalmente para os ansiosos e para os asmáticos. O coração acelera e as artérias dilatam-se gerando uma sensação de bem-estar.

De igual modo, os músculos abdominais contraindo-se ajudam a digestão e o trânsito intestinal. A ginástica abdominal produzida pelo riso acelera a produção de sucos gástricos e de enzimas necessárias à digestão, desopilando também o fígado. Segundo os entendidos, um minuto de riso pode equivaler a meia hora de relaxamento ou de ginásio.

12. DIFERENÇAS INDIVIDUAIS NA PSICOLOGIA POSITIVA

Na Psicologia Positiva as diferenças individuais de cada pessoa manifestam-se na forma como elas encaram e vivenciam emoções positivas. Esta área é avaliada segundo experiências subjectivas como o bem-estar, contentamento, satisfação (com o passado), esperança e optimismo (para o futuro), felicidade (no presente). Ao nível individual, isto está relacionado com os traços positivos: capacidade de amar, habilidade interpessoal, estética, sensibilidade, perseverança, perdão, originalidade, espiritualidade, talento e sabedoria.

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Características que parecem ser condições de felicidade ou de bem-estar psicológico têm a ver mais com a pessoa em si ou com a relação com os outros e com o ambiente. Evidentemente que há factores de infelicidade que muitas vezes ultrapassam a pessoa, como a doença física ou psicológica ou as condições ambientais muito adversas.

Mas mesmo em condições adversas, há pessoas que resistem mais e conseguem ser relativamente felizes, enquanto outras, em boas condições, se mostram sempre insatisfeitas consigo e com os outros. Todavia, os factores extrínsecos à pessoa também têm o seu peso. Anteriormente podia ter-se um conceito de bem-estar muito afectivo e subjectivo, incapaz de confrontar-se com a dureza da vida. Realizar os objectivos que nos propomos na vida nem sempre é fácil e requer grande força de vontade. Mas pode trazer maior felicidade do que uma vida cómoda e que não enfrenta as dificuldades. Isto significa que cada indivíduo dispõe de características inatas que, expostas ao meio, se podem inibir ou desenvolver.

Diferentes pessoas reagem de diferentes formas perante as mesmas circunstâncias. Isto está relacionado com variáveis como o sexo, a idade, as experiências de vida, o grupo de pares.

Atente-se, por exemplo, ao nível da idade. As idades compreendidas entre os 15-24 e mais de 65 anos consideram-se mais felizes que as restantes faixas etárias. Dos 45 aos 64 anos os indivíduos manifestam-se menos satisfeitos com a vida.

Perante a questão “quem são os mais felizes?”, não há diferenças estatisticamente significativas entre homens e mulheres.

Nas diferenças individuais ao nível do bem-estar e do casamento, confere-se que os sujeitos que nunca casaram apresentam um nível de bem-estar inferior àqueles que se casaram. Têm ocorrido algumas oscilações ao longo dos anos, porém os indivíduos que se casaram ostentaram sempre um nível de bem-estar superior.

Ainda nesta linha de análise, é de notar que os sujeitos casados apresentam níveis diferentes de felicidade. 57,6% dos inquiridos consideram-se muito felizes, 11% consideram-se bastante felizes e apenas 4,6% se consideram pouco felizes.

No que diz respeito às diferenças individuais ao nível de felicidade e da relação com a espiritualidade verifica-se que, quanto maior o compromisso espiritual, maior a percentagem de pessoas “muito felizes”.

Na relação de sentimento de proximidade a Deus e percentagem de indivíduos muito felizes constata-se que quanto maior a proximidade, maior o sentimento de felicidade. Por outro lado, quanto menos a proximidade ou não creditação em Deus, menos o sentimento de felicidade. Assim, verifica-se que, quanto maior a participação religiosa (semanal), maior a percentagem de indivíduos felizes. Assim sendo, os indivíduos que nunca participam em cerimónias religiosas têm uma percentagem menor de felicidade.

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Em suma, podemos considerar que existem várias variáveis que influenciam a forma como os indivíduos encaram os acontecimentos. Ao nível individual, considera-se que os traços desempenham um papel preponderante para a visualização positiva das experiências pessoais.

13. CONCLUSÃO

A Psicologia Positiva surge como uma nova vertente da Psicologia que a pouco e pouco, vai conquistando o seu próprio campo de investigação, de análise. Vai-se também começando a expandir às diversas áreas da sociedade, tais como as instituições organizacionais. Esta temática abrange uma complexa “filosofia” de vida que foca a vertente positiva dos acontecimentos, dos traços, da qualidade de vida.

Este trabalho, após todas as reflexões efectuadas tendo por base as pesquisas levadas a cabo, foi bastante gratificante na medida em que contribuiu para um maior conhecimento sobre a importância que os sentimentos/emoções positivas desempenham no quotidiano de cada indivíduo.

De facto, a realização deste trabalho, apesar de a informação ainda ser um pouco escassa, constituiu uma enorme satisfação pois adquiri conhecimentos numa área que me agrada bastante e sobre a qual vai incidir grande parte das investigações do futuro.

Deste modo, pode-se depreender a existência de uma relação entre o contexto contemporâneo e a existência de diferenças individuais que se poderão manifestar, nomeadamente, através da forma como os sujeitos reagem às condições do meio e que influenciam a sua própria vida, sendo objecto de interesse pela Psicologia, em especial, pela Psicologia Diferencial.

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