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C APÍTULO APÍTULO 1 1 SANÇÕES ADMINISTRATIVAS: NOÇÕES PRELIMINARES SANÇÕES ADMINISTRATIVAS: NOÇÕES PRELIMINARES 1.1 - PROBLEMÁTICA O Código de Defesa do Consumidor – CDC - lei 8.078/90 foi promulgada por determinação Constitucional. Assim como a Constituição Federal (CF 1988), o CDC, vinha sendo elaborado havia tempo e foi projetado para o presente e futuro, pois mesmo após quase 14 anos de sua promulgação, passou por poucas modificações, continua atual e cada vez mais utilizado e conhecido. Um novo cenário de oferta de produtos e serviços vem tomando forma na economia brasileira desde 1990. O mundo atual, dinâmico, agressivo, mais especializado, exige constante modificação nos métodos produtivos, na oferta e na divulgação de produtos e serviços. O Estado, não pode, como não ficou alheio a essas mudanças; e como um dos maiores fornecedores de serviços, passou, num primeiro momento a delegar a responsabilidade pela oferta e comercialização, e num segundo momento delegou também a fiscalização dessa oferta e suas consequências, restringindo-se apenas a elaborar políticas estratégicas.

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CCAPÍTULOAPÍTULO 1 1

SANÇÕES ADMINISTRATIVAS: NOÇÕESSANÇÕES ADMINISTRATIVAS: NOÇÕES

PRELIMINARESPRELIMINARES

1.1 - PROBLEMÁTICA

O Código de Defesa do Consumidor – CDC - lei 8.078/90 foi

promulgada por determinação Constitucional. Assim como a Constituição

Federal (CF 1988), o CDC, vinha sendo elaborado havia tempo e foi projetado

para o presente e futuro, pois mesmo após quase 14 anos de sua

promulgação, passou por poucas modificações, continua atual e cada vez mais

utilizado e conhecido.

Um novo cenário de oferta de produtos e serviços vem tomando

forma na economia brasileira desde 1990. O mundo atual, dinâmico, agressivo,

mais especializado, exige constante modificação nos métodos produtivos, na

oferta e na divulgação de produtos e serviços.

O Estado, não pode, como não ficou alheio a essas mudanças; e

como um dos maiores fornecedores de serviços, passou, num primeiro

momento a delegar a responsabilidade pela oferta e comercialização, e num

segundo momento delegou também a fiscalização dessa oferta e suas

consequências, restringindo-se apenas a elaborar políticas estratégicas.

Surge assim, sob grande influencia norte-americana, a Política

Econômica Neoliberal, encabeçada pelas “privatizações” que tecnicamente

significam, apenas, concessão do direito de exploração da atividade

econômica, por um certo período, antes exercida pelo Estado que receberá

valores das concessionárias como contraprestação da concessão.

Tal possibilidade está prevista no artigo 175 da CF de 1988 que

prevê incumbir ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime

de concessão ou permissão, mas sempre através de licitação, a prestação de

serviços públicos.

O parágrafo único do mesmo artigo dispõe que a lei disporá sobre o

regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos,

o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as

condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;

disporá sobre os direitos dos usuários, sobre política tarifária, e a obrigação de

manter serviço adequado.

Desse modo, serviços como telefonia fixa e logo depois celular,

energia elétrica, fornecimento de águas, administração das rodovias estaduais

e federais, saúde, além de outros, passaram a ser fornecidos por empresas

privadas, sendo algumas multinacionais ou estrangeiras, sob a égide de

contratos. A escolha dessas empresas foi realizada através de licitação pública,

mas não se levando em conta o menor preço dos serviços ao consumidor, mas

o melhor preço pago pelas concessionárias ao Estado pela concessão.

Diante dessa nova dicotomia, Fornecedor x Consumidor, alguns

serviços e produtos, já citados, despontam como, além de necessários,

essenciais à vida, à vida digna do ser humano e por esse motivo devem ser

fornecidos em condições que respeitem o ser humano.

Restou ao Estado, ainda, a responsabilidade pela fiscalização, o que

prontamente foi solucionado pela criação das agências reguladoras a quem

compete, hoje, a fiscalização das concessionárias fornecedoras de serviços.

Essas agências, criadas por lei, foram dotadas de poder normativo

administrativo intervencionista, ou seja, através de portarias, resoluções e

outras determinações fazem valer normas infralegais que regram a relação

entre consumidor e fornecedor. O Estado, ainda, passou a intervir através

dessas agências em setores privados mas que ensejam grande interesse

público pela importância e abragência social.

Nosso país vive um momento de transição do modo de produção da

vida social, o qual reclama um novo modo de regramento, de estrutura, de

fiscalização etc. Este novo direito reclamado, necessário ao equilíbrio entre

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Fornecedor e Consumidor, foi traduzido pelo artigo 4º e 5º do Código de

Defesa do Consumidor – CDC – em Política Nacional de Defesa do

Consumidor. Esta política implementada pelo Estado através dos vários órgãos

– Agências Reguladoras, Procon’s nacionais e estaduais, IPEM’s, etc, vêm

fiscalizando o fornecimento de produtos e serviços.

São fiscalizados não só aqueles de relevância social ou sob a

responsabilidade do Estado, mas todo e qualquer produto e serviço que, por

exemplo, diga respeito à saúde, segurança e bem estar do consumidor.

Estes órgãos fiscalizadores são autarquias federais, estaduais e

municipais, coordenados pelo Departamento de Proteção e Defesa do

Consumidor (vinculado à SDE – Secretaria de Direito Econômico do Ministério

da Justiça), que lançam mão de sanções, na sua maioria multas pecuniárias,

para reprimir o abuso por parte dos fornecedores de produtos e serviços, seja

em relação à qualidade ou quantidade dos produtos e serviços, à informação

pertinente a eles, aos aumentos dos preços etc.

Estas sanções, chamadas administrativas, pois aplicadas por órgãos

da administração indireta do Estado estão elencadas no artigo 56 do CDC e

regulamentadas pelo Decreto 2.181/97 e constituem verdadeira novidade no

direito e na economia brasileira, gerando grandes controvérsias em relação à

aplicabilidade, competência, abrangência, territorialidade, cumulatividade,

dentre outras.

Por ser tema recente, apaixonante, criando nova área de atuação no

direito, pendente de regulamentações, além de extremamente importante e

atual para o país e seus integrantes, reclama nossa atenção e estudo.

1.2 - OBJETIVO

Diante do momento histórico em que vivemos, da economia, do

modo de produção da vida social (na realidade são vários os modos de

produção sociais que coexistem) este trabalho objetiva propor idéias que

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possam ajudar a solucionar a questão da aplicabilidade das sanções

administrativas previstas no CDC e no Decreto 2.181/97.

Para tanto traçaremos parâmetros, além dos já existentes, sobre a

classificação das sanções administrativas que podem auxiliar clareando a

aplicabilidade desse novo ramo do direito.

Muito pouco foi debatido e escrito sobre o tema considerando os

quase 14 anos de vigência do CDC. Área árdua, complexa, que reclama

ponderações lógicas, sendo algumas inéditas, coloca operadores do direito,

empresários, consumidores, e toda a sociedade diante de situações nunca

antes vistas ou cogitadas.

O próprio CDC ainda é uma codificação recente, nova, pouco

utilizada e despida de interesse se comparada com o Código Civil, mais

conhecido que a própria Constituição Federal.

Talvez com a entrada em vigor do Código Civil de 2002 que trouxe

dentre suas inovações algumas idéias já consagradas no CDC, como a função

social do contrato, a desconsideração da personalidade jurídica, a

responsabilidade objetiva, a boa-fé, a excessiva onerosidade e outras, ele

CDC, seja melhor compreendido e aceito tanto por nós operadores do direito

como pela sociedade que desconhece sua importância e força.

1.3 - METODOLOGIA

Interessante o que nos motiva a conhecer, a saber. Todos desejam

possuir as melhores e mais recentes informações. O dia a dia da vida cotidiana

impulsiona o motor do interesse que cada um tem, para além da realidade

aparente das coisas. Ninguém começaria a procurar, a pesquisar algo que se

ignora totalmente ou algo que fosse inatingível ou desnecessário.

A possibilidade de uma resposta, e, além disso, de uma resposta

útil, que possa melhorar nossa condição particular de vida ou de uma

coletividade retira-nos da inércia e coloca-nos a percorrer o caminho do

conhecimento.

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O mundo complexo e cada vez dinâmico força-nos a ceder e rever

nosso modo de viver e de conhecer. Foi a partir da vida cotidiana e da

constatação repentina de que não nos é possível ter controle sobre nossas

vidas de forma a evitar tropeços que iniciamos a pesquisa sobre nossa

exposição. Além do conhecimento geral, da prática da advocacia, das leituras

de revistas, periódicos, conversas informais, da exposição da mídia, cursos e

debates, da Internet, desenvolvemos, principalmente, uma busca bibliográfica

de informações e constatações históricas, filosóficas, científicas, culturais, e

atuais a respeito do tema que pudessem embasar nossas considerações e

conclusões.

1.4 – DESCRIÇÃO SUMÁRIA

No presente capítulo, situamos o leitor a respeito da problemática que

motivou nossa pesquisa expondo o objetivo da mesma e realizando uma breve

descrição de cada capítulo.

No capítulo 2 faremos a exposição do contexto histórico jurídico-

econômico que se encontra o CDC, esclarecendo e diferenciando política

Liberal e Neoliberal, bem como o surgimento desta última e as modificações

que nossa Constituição Federal sofreu para sua implementação. Abordaremos

também o significado e a necessidade de regular a economia, bem como o

método escolhido e utilizado pelo Estado para implementar tal intento.

No capítulo 3 faremos breves comentários sobre a Política Nacional

de Defesa do Consumidor e sobre o Sistema Nacional de Defesa do

Consumidor. Trataremos ainda da competência para legislar e fiscalizar as

relações de consumo, enfatizando a perfeita subsunção do CDC à Constituição

Federal de 1988, tanto em relação à competência quanto em relação aos

objetivos e fundamentos de nossa magna Carta.

No capítulo 4 adentraremos no ápice do trabalho e abordaremos

especificamente as sanções administrativas previstas no CDC e no Decreto

2.181/97, bem como as classificaremos levando em consideração o

enquadramento da prática infrativa conforme dispõe o CDC.

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No capítulo 5, concluiremos nosso trabalho com esperança de ter

contribuído para a consecução de respostas às exigências interpretativas sobre

a aplicabilidade das sanções administrativas no âmbito do Código de Defesa

do Consumidor e do Decreto 2.181/97.

No capítulo 6 disponibilizaremos os anexos, que serão úteis e

complementares a este trabalho, e servirão de ferramenta argumentativa e

reflexiva sobre o tema e sua importância como nova área do direito, e como

forma de regulação e regulamentação da economia brasileira.

Esperamos ainda que todas nossas considerações sejam úteis e

despertem tanto os operadores do direito quanto a comunidade para a

importância e relevância do tema, sua inevitabilidade e contribuições para o

modo de produção da vida social que elegemos e conduzimos.

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CCAPÍTULOAPÍTULO 2 2

A ECONOMIA BRASILEIRA

CCONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES I INICIAISNICIAIS

Antes da Política Neoliberal vivemos o liberalismo que

consubstanciou, num primeiro momento, um movimento de reação ao

corporativismo estatal (Revolução Francesa de 1789), ensejado por

circunstâncias de ordem econômica, política e social. Através dele, a burguesia

como um todo e principalmente a francesa garante sua hegemonia e ascensão

ao poder, destituindo o sistema feudal como modo de produção e fonte de

riqueza. Nesse primeiro momento o Estado tem poderes limitados de

intervenção na economia.

Num segundo momento o Estado passa de conduzido a condutor,

porém tem como principal função garantir a liberdade de livre concorrência à

iniciativa privada. O Estado passa a regrar a economia de maneira tímida e

crescente sempre garantindo margem segura para uma auto-regulação

contratual nos negócios jurídicos (“pacta sunt servanda” – vale o que se

pactuou). A economia é governada por uma mão invisível (deixe-se fazer) que

lhe permite que “sempre funcione bem” (para os capitalistas).

No terceiro momento, diante das grandes mudanças no modo de

produção da vida social (como se vive, se adquire produtos e serviços, como

são comercializados etc), o Estado percebe que a economia necessita de uma

intervenção mais profunda, mas diante das limitações da máquina estatal (falta

de recursos, ineficiência e outras preocupações de ordem estrutural e

financeira), tem que fazê-la de modo a não se comprometer e piorar sua

situação.

Nesse momento, descentralização e política fiscal agressiva, onde

impostos são criados e aumentados, surgem como soluções a todos seus

problemas.

2.1 - NEOLIBERALISMO

O Brasil como é um país governado através de leis (legalista), não

poderia implementar uma Política Neoliberalista sem antes modificar as regras

do jogo, sob pena de ver os esforços e tempo perdidos no poder judiciário e

fora dele também.

Até 1994 o texto constitucional havia sido alterado quatro vezes:

– Emenda Constitucional nº 1, de 31/03/1992 que tratava da

remuneração dos deputados estaduais e vereadores;

- Emenda Constitucional nº 2, de 25/08/1992 que tratou do plebiscito

do Art. 2º dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT);

- Emenda Constitucional nº 3, de 17/03/1993 que tratou de

aposentadoria e pensões dos servidores públicos, ação direta de

inconstitucionalidade e tributação;

- Emenda Constitucional nº 4, de 14/09/1993 que tratou de matéria

eleitoral.

A reforma constitucional de 1994, inicialmente operada como revisão

(Emenda Constitucional de Revisão é diferente de Emenda Constitucional),

também não comprometeu a base da ordem econômica.

Cinco anos após a promulgação da CF 1988 (Art. 3º ADCT) cogitou-

se enfaticamente da necessidade de revisão do texto constitucional. A idéia

difundida era que a CF 1988 estaria inviabilizando o crescimento e o

desenvolvimento econômico tornando o país ingovernável. Essas afirmações

não eram questionadas e não se sabia exatamente por que, como, quando ou

onde a CF 1988 comprometia a sociedade.

No entanto, apenas seis emendas de revisão foram promulgadas

entre 01/03 e 07/06 de 1994:

– Emenda Constitucional de Revisão nº 1 instituiu o Fundo Social de

Emergência;

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– Emenda Constitucional de Revisão nº 2 referiu-se às Comissões

Parlamentares de Inquérito;

– Emenda Constitucional de Revisão nº 3 tratou da nacionalidade

das pessoas naturais;

– Emenda Constitucional de Revisão nº 4 tratou de matéria de

inelegibilidade;

– Emenda Constitucional de Revisão nº 5 reduziu o mandato do

Presidente da República de cinco para quatro anos;

– Emenda Constitucional de Revisão nº 6 tratou da perda de

mandato de deputado e senador.

Nenhuma emenda mencionou a ordem econômica e / ou financeira e

/ ou tratou do crescimento e desenvolvimento econômico ou social ou ainda da

governabilidade do país.

O Presidente da época, Fernando Henrique Cardoso, desde que

tomou posse, patrocinou a reforma de nossa Carta Magna. A proposta era

muito parecida à do Ex-Presidente Fernando Collor de Mello.

As emendas constitucionais promulgadas a partir de agosto de 1995

postularam e instituíram o Capitalismo Neoliberal, abrindo a economia

brasileira ao capitalismo internacional que se tornara, pelo menos nos países

desenvolvidos Europeus e nos Estados Unidos, Neoliberal.

O Estado do bem-estar, que antes, aparentemente, protegia mais

eficazmente a coletividade, institucionalmente e constitucionalmente (para

erradicarmos, efetivamente, o modelo econômico de bem estar consagrado na

CF 1988 deve-se previamente alterar os artigos 1º, 3º e 170 da CF 1988) da

iniciativa privada nacional e internacional, passa, sob o manto da necessidade

de desenvolvimento e acompanhamento da evolução mundial (todos

lembramos da afirmação do Ex-Presidente Collor de que nossos carros eram

carroças) a expor a sociedade brasileira (nossas empresas principalmente) à

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agressividade contumaz característica do Capitalismo Neoliberal, já em pleno

vigor em alguns países da Europa e nos EUA – Estados Unidos da América.

A ideologia neoliberal é colocada em prática, no Brasil, através dos

ajustes estruturais, que começam a ser implementados, timidamente, no início

da década de 1990 com a abertura de importações, incentivada pelo

rebaixamento dos impostos de produtos importados, conduzindo muitas

indústrias, como a de calçados, têxtil, brinquedos dentre outras, à falência.

Com o parque industrial tecnologicamente obsoleto e desprotegido

repentinamente, nossos produtos tornaram-se mais caros e inferiores, na

qualidade, frente aos importados.

Vejamos algumas alterações que foram realizadas:

O § 2º do art. 25 da CF foi mudado com a Emenda Constitucional nº

5 de 15/08/1995, permanecendo o caput inalterado.

Antes da emenda in verbis: § 2º - Cabe aos Estados explorar

diretamente, ou mediante concessão, a empresa estatal, com exclusividade de

distribuição, os serviços locais de gás canalizado.

Depois da emenda in verbis: Art. 25 - Os Estados organizam-se e

regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios

desta Constituição.

§ 1º - São reservadas aos Estados as competências que não lhes

sejam vedadas por esta Constituição.

§ 2º - Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante

concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a

edição de medida provisória para a sua regulamentação.

Assim, verificamos que o que antes era exclusivo e só poderia ser

fornecido por empresa estatal, passou a poder ser fornecido por empresas

privadas, inclusive por empresas estrangeiras (não brasileiras), como veremos

adiante. É o Estado saindo de cena e deixando o fornecimento de produtos e

serviços a cargo da iniciativa privada como preceitua o manual Neoliberal.

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Foi com a Emenda Constitucional n. 6, também de 15/08/1995,

que conferiu nova redação ao inciso IX do Art. 170, ao § 1º do art. 176 e

revogou o art. 171 (este que tratava de diferenciar empresa brasileira da não

brasileira), que ocorreram as maiores modificações na Constituição brasileira.

Antes da emenda: Art. 170, IX - tratamento favorecido para as

empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte.

Depois da emenda: IX - tratamento favorecido para as empresas de

pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e

administração no País.

Essa mudança por si só de nada adiantaria sem a revogação do art.

171 da CF.

Antes da emenda: Art. 171 – São consideradas:

I - empresa brasileira a constituída sob as leis brasileiras e que

tenha sua sede e administração no País;

II - empresa brasileira de capital nacional aquela cujo controle efetivo

esteja em caráter permanente sob a titularidade direta ou indireta de pessoas

físicas domiciliadas e residentes no País ou de entidades de direito público

interno, entendendo-se por controle efetivo da empresa a titularidade da

maioria de seu capital votante e o exercício, de fato e de direito, do poder

decisório para gerir suas atividades.

§ 1º - A lei poderá, em relação à empresa brasileira de capital

nacional:

I - conceder proteção e benefícios especiais temporários para

desenvolver atividades consideradas estratégicas para a defesa nacional ou

imprescindíveis ao desenvolvimento do País;

II - estabelecer, sempre que considerar um setor imprescindível ao

desenvolvimento tecnológico nacional, entre outras condições e requisitos:

a) a exigência de que o controle referido no inciso II do "caput" se

estenda às atividades tecnológicas da empresa, assim entendido o exercício,

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de fato e de direito, do poder decisório para desenvolver ou absorver

tecnologia;

b) percentuais de participação, no capital, de pessoas físicas

domiciliadas e residentes no País ou entidades de direito público interno.

§ 2º - Na aquisição de bens e serviços, o Poder Público dará

tratamento preferencial, nos termos da lei, à empresa brasileira de capital

nacional.

Depois da emenda: FOI REVOGADO

Reside aqui o cerne da reforma neoliberal. A partir da revogação do

art. 171 da Constituição Federal, não há mais distinção (muito menos proteção)

ente empresa brasileira de capital nacional e de capital estrangeiro.

Empresa brasileira, agora, ao que parece (Art. 170 IX e 176 § 1º,

além de outros), é aquela constituída sob as leis brasileiras e que tenha sede,

administração em território brasileiro, podendo o capital e tecnologia ser

estrangeiros o que concede enorme desvantagem às empresas nacionais

(antigas de capital nacional).

O principal é que não havendo incentivos, proteção, favorecimento

(o que os países desenvolvidos realizam muito bem alegando proteção da

soberania nacional) e distinção entre capital (origem do investimento)

estrangeiro e nacional (brasileiro) abrem-se às portas aos investimentos

externos, de países desenvolvidos que estão mais bem preparados e

aparelhados tecnologicamente e conseguem trazer (abertura das importações,

principalmente no governo Collor de Mello) a baixos custos alfandegários seus

equipamentos, mais avançados que o nosso parque instalado, e, por

conseguinte produzem a um custo menor concorrendo de forma desigual (não

utilizaremos o termo desleal por haver legalidade e constitucionalidade nesse

processo) com nossas empresas.

A revogação do art. 171 da CF 1988 desmantelou as indústrias de

tecnologia outrora surgidas.

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A inclusão do conteúdo deste artigo (revogado com a emenda

constitucional n. 6) deveu-se, na época (1988) à discussão da Política Nacional

de Informática, instituída pela lei 7232/84 perfeitamente recepcionada pela

nossa Constituição Federal de 1988. Esta lei permitiu a criação de

aproximadamente quatrocentas empresas de tecnologia e informática com

faturamento, em 1987, estimado em $ 1,8 bilhões de dólares.

Na queda de braço entre os diversos setores na Assembléia

Constituinte (incluindo a pressão norte-americana) venceu o desenvolvimento

nacional e o art. 12 da lei 7232/84 foi incluído na CF 1988 (art. 171). Naquela

época, como nos dias de hoje, já se sabia que o fator determinante do

crescimento econômico que, por sua vez, corresponde a uma parcela

significativa do desenvolvimento nacional, não era e não é apenas o acúmulo

de capital, mas também o acúmulo de saber e tecnologia próprias,

característicos e voltados à nossa cultura e modo de produção social da vida.

No art. 171 revogado havia uma proteção, um incentivo à empresa

de capital nacional que desenvolvesse tecnologia, informática e técnicas de

tratamento da informação. Iniciada em 1971 por um grupo de engenheiros

brasileiros, a indústria brasileira de computadores viu e sentiu o início do seu

fim, após 24 anos de luta, na emenda constitucional n. 6 de 1995.

Continuamos a ser um país de capitalismo tardio e meros

intermediários e usuários de tecnologia de informática e processos de

informação.

Os investimentos, em pesquisa científica, deixados para trás, além

da importação de técnicas avançadas, geraram a produção de tecnologias de

capital intensivo e pouco uso de mão de obra qualificada (o que não acontecia,

pois a participação nacional das empresas de tecnologia nacionais era superior

a 50% até o governo Collor e um terço da mão de obra era composta por

profissionais de nível superior). A robótica, a informática, a dinamização dos

meios de transporte, impulsionados pelo desmonte da tecnologia nacional, bem

como da avalanche de tecnologias importadas significou uma profunda crise

nos níveis de emprego e salário.

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A crise pode ser constatada a partir da realidade social que nosso

país vive nos níveis informais de emprego (trabalho sem Carteira Registrada),

na reforma da CLT (informalização), nos regimes de cooperativas, atualmente

em plena moda (Advogados laboram assim, sem 13º, férias, FGTs etc;

atualmente há uma Universidade na cidade de São Paulo que tenta implantar

tal regime para seus professores, o que gera alta rotatividade e

desqualificação).

A Política fiscal (a carga tributária imposta aos cidadãos está por

volta de 40% do PIB – Produto Interno Bruto) e a necessidade de equilíbrio das

contas públicas conduzem a uma redução dos gastos do governo,

determinando diminuição do financiamento de serviços sociais e melhorias na

infra-estrutura pública (lembremos da crise energética em 2000/2001 por falta

de investimento na geração e transmissão de energia elétrica que até hoje é

pago pela sociedade e conhecido como seguro apagão) e aumento dos

tributos. Todos nós “lembramos” da instituição permanente da CPMF

(Contribuição Provisória de Movimentação Financeira) que antes fora destinada

provisoriamente (emenda constitucional n. 12) para custeio da saúde. Como

poderíamos esquecer do aumento da carga dos tributos, principalmente

federais, como o Cofins (Contribuição para Financiamento da Seguridade

Social) existente desde 1991 - Lei Complementar 70 -, que iniciou sua

incidência com alíquota de 2% e hoje está em 7,6% (A MP 135 – Medida

provisória 135 de 10/2003 aumentou de 3%1 para 7,6% a alíquota vedando a

cumulatividade – o que antes não ocorria -, desonerando o setor de produtos e

onerando o setor de serviços e importados que antes não pagavam esse

imposto). Recentemente, o IR (Imposto de Renda) que há muito não elevara o

limite de isenção e parcela dedutível (a tabela estava congelada desde 1995 e

em Janeiro de 2002 passou a ser isento deste imposto quem percebe até R$

1.058,00 / mês). Os impostos municipais também seguiram a mesma política.

Tivemos a instituição, pelo governo de Marta Suplicy, da taxa do Lixo, da taxa

1 Até 31 de janeiro de 1999 a alíquota era de 2% sobre a base de cálculo (Lei Complementar nº 70, de 1991, art. 2º). A partir de 1º de fevereiro de 1999 passou a ser de 3% (art. 8º da Lei 9.718/1998, a qual resultou da conversão da Medida Provisória nº 1724) sobre a base de cálculo que também foi modificada para maior (art. 2º e 3º da Lei 9.718/1998).

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de iluminação pública e do IPTU (Imposto Predial Territorial Urbano)

progressivo em 2002.

A reforma previdenciária (emenda constitucional n. 20 de 15/12/1998

e n. 41 de 19/12/2003) eliminou o acúmulo de duas aposentadorias e passou a

não distinguir aposentadoria pela iniciativa privada (INSS – Instituto Nacional

de Seguridade Social) e aposentadoria de funcionalismo público, conforme Art.

40 da CF. A pessoa aposentada que continua trabalhando (o que é comum em

nosso país) recebe sua remuneração descontada a contribuição da

Previdência, sendo que esta contribuição nem ao menos pode ser considerada

para um novo cálculo da sua aposentadoria, ou seja, não há contra-prestação e

há um “bis in idem”, uma dupla incidência. Outra questão importante diz

respeito ao valor da aposentadoria do funcionalismo público que não será mais

integral, ou seja o funcionário público não pode mais se aposentar com

vencimentos integrais; há, agora um teto, um limite. Há ainda a contribuição à

previdência dos inativos e pensionistas que antes não existia (EC 41 – Emenda

Constitucional 41, de 19 de dezembro de 2003, determinou a incidência de

contribuição previdenciária sobre aposentadorias e pensões concedidas após

sua publicação) e recentemente julgado pelo STF – Supremo Tribunal Federal

determinou a constitucionalidade da EC 41 alterando a base de incidência de

R$ 1.200,00 para R$ 2.400,002; temos também a correção dos vencimentos do

funcionalismo público aposentado e pensionista que, agora, será na forma da

lei e não mais correspondente aos vencimentos dos que estão na ativa (as

regras de aposentadoria e correção monetária são aplicáveis para aqueles que

ingressarem no funcionalismo público após a emenda 41/2003) etc. Sob este

aspecto nossa constituição engessava a legislação infraconstitucional. Se

compararmos o disposto antes das emendas com o que agora consta na CF

1988 veremos que nossa Carta Magna traça linhas gerais, programáticas

deixando para lei complementar e principalmente para a ordinária a

regulamentação das diversas situações do mundo do ser. É muito mais fácil e

cômodo modificar a legislação ordinária que a Constituição Federal (o que vem

sendo realizado freneticamente), o que confere flexibilidade ao governo na

administração da previdência social.

2 Anexo 1 – Resumo da Decisão do STF sobre a Constitucionalidade da Emenda Constitucional 41/2003.

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Desse modo, parece que a emenda constitucional n. 6 seria

inconstitucional quanto à revogação do art. 171 da CF 1988 e seus reflexos,

pois atenta com a dignidade da pessoa humana (art.1º, III da CF 1988), não

constrói uma sociedade justa, livre e solidária (Art. 3º I CF 1988), não

garante o desenvolvimento nacional (Art. 3º II CF 1988), não erradica a

pobreza nem reduz as desigualdades sociais nem regionais (Art. 3º III e

170 VII CF 1988), e muito menos promove o bem de todos (Art. 3º IV CF

1988), e também não busca o pleno emprego e não cumpre a função social

da propriedade já que elimina a propriedade dos bens de produção de

informática e tecnologia (Art. 170 III, VIII CF 1988).

A soberania econômica nacional é instrumento destinado a realizar e

assegurar a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país existência

digna, podendo e devendo ser implementada através de políticas públicas

destinadas à viabilização da participação da sociedade nacional, em condições

de igualdade, no mercado internacional. Essa participação depende da

possibilidade de geração de tecnologia, capacitação e desenvolvimento

nacional delas.

Outro não é o entendimento do professor Eros Roberto Grau3

“... conclusão de que afirmar a soberania econômica nacional como

instrumento destinado à realização do fim de assegurar a toda a

existência digna e como objetivo particular a ser alcançado é definir

políticas públicas voltadas à viabilização da participação da

sociedade nacional, em condições de igualdade, no mercado

internacional. Essa participação depende da possibilidade local de

geração de tecnologia”.

Outra modificação ocorreu no art. 176 § 1º da CF 1988 (exploração

de recursos minerais) retirou-se a expressão “empresa brasileira de capital

nacional” e inseriu-se a expressão “empresa constituída sob as leis brasileiras

3 Grau, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (interpretação e crítica). São Paulo: Ed. Malheiros, 8ª ed. rev. atual., 2003, p. 33.

16

e que tenha sua sede e administração no País” em decorrência da mudança do

art. 171.

A emenda n. 43 modifica o inciso VI do art. 170 da CF 1988.

Antes da emenda: VI – defesa do meio ambiente

Depois da emenda: VI – defesa do meio ambiente, inclusive

mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos

e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.

A emenda n. 43 insere novo dever / responsabilidade aos

proprietários dos meios de produção no que diz respeito ao impacto ambiental

dos processos produtivos e prestação de serviços, bem como o impacto

ambiental do resultado destes processos, ou seja, produtos e serviços.

Outras emendas constitucionais foram editadas (Emenda n. 7 a 10,

12 a 15 etc), porém, não é objetivo de nosso estudo esmiuçar cada uma delas,

senão as essenciais para que possamos situar a economia brasileira e analisar

a administração dela através do controle administrativo exercido pelo Estado

através de seus entes autárquicos.

2.2 – A TEORIA DA REGULAÇÃO E DESREGULAÇÃO

O Brasil, na última década, vem se adequando a uma “nova forma

de modelo de Estado”. Ela é baseada em um modelo mediador e regulador.

Assim, ele se desprende das amarras do monopólio estatal, resquício de

modelos interventores, de que são exemplos a época de Getúlio Vargas

(Presidente em meados do século XX) e mais recentemente o regime militar

(golpe militar de 1964).

É sabido que o Estado (âmbito Federal, Estadual e Municipal)

regula, regulamenta a economia através da “imposição” de regras, de leis

(Constituição Federal, Leis ordinárias, complementares, decretos, Constituição

Estadual, Leis e Decretos estaduais, leis e decretos municipais, portarias,

resoluções, instruções normativas etc), cada um dentro de sua competência.

17

Assim, uma das finalidades das leis (sentido latu, abrangente), sem

dúvida, é regrar os diversos modos de produção social (há sempre um modo

de produção social característico) de uma determinada sociedade, a nossa.

Roscoe Pound4, citado pelo professor Franco Montoro, faz um bom

apanhado dos vários conceitos e finalidades da lei no contexto evolutivo da

história. Grifamos cada uma das doze conceituações. Desse modo

transcrevemos “in verbis”:

"Elaborar, descobrir ou fazer a lei, chamem-lhe como quiserem

pressupõe uma imagem mental do que estamos fazendo e por que o

estamos fazendo. Assim, a natureza da lei tem sido o principal campo de

batalha da jurisprudência, desde que os filósofos gregos principiaram a

discutir sobre a base a atribuir à autoridade da lei. Mas a finalidade da

lei tem sido mais debatida na política do que na jurisprudência. Na

fase de equidade e direito natural, a teoria predominante sobre a

natureza da lei parecia responder à questão, quanto à sua finalidade.

Na maturidade do direito, pensava-se na lei como algo auto-suficiente,

a ser julgada por uma forma ideal de si mesma, e como algo que não

podia ser feito, ou, se pudesse sê-lo, seria sempre algo escasso e

insatisfatório. A idéia dos direitos naturais parecia explicar,

incidentalmente, para que era a lei e mostrar que devia haver o

mínimo possível dela, visto constituir uma restrição à liberdade e até

a menor dessas restrições exigia uma justificação afirmativa. Assim,

à parte a simples melhoria sistemática e formal, a teoria de

legislação, na fase de maturidade, foi negativa. Disse-nos,

principalmente, como não devíamos legislar e sobre que assunto

devíamos evitar qualquer legislação. Não possuindo uma teoria

positiva de legislação criadora, o último século não estava muito

convicto da necessidade de requerer ou manter uma teoria sobre a

finalidade da lei. Mas, de fato, mantinha tal teoria, e, o que é mais,

mant inha-a solidamente.

4 Pound, Roscoe. Introdução à filosofia do Direito. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 1965, pp. 34 a 39, apud Montoro, André Franco. Introdução à Ciência do Direito. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 23ª ed., 1995, pp. 314-18.

18

Como as idéias sobre para que é a lei estão amplamente implícitas

nas idéias sobre o que é a lei, um breve exame dos vários conceitos

de natureza da lei será útil, partindo dessa posição. Podem

distinguir-se nada menos de doze concepções sobre o que é a lei.

Primeiro, podemos indicar a idéia de uma norma ou conjunto de

normas divinamente ordenadas para a ação humana, como, por

exemplo, a Lei de Moisés ou o Código de Hamurabi, que lhe foi

transmitido pronto e acabado pelo Deus-sol, ou Manu, ditado pelos

sábios por Brigo, filho de Manu, na presença deste e sob sua direção.

Segundo, existe uma idéia de lei como tradição dos velhos, remotos

costumes que estavam provados serem aceitáveis pelos deuses e,

assim, apontavam o caminho que o homem poderia percorrer com

segurança. Pois o homem primitivo, cercado pelo que parecem ser

vingativos e caprichosos poderes da natureza, está em contínuo temor

de ofender esses poderes e de fazer, assim, desencadear a ira deles

sobre si e seus companheiros. A segurança geral requer que os

homens façam unicamente aquelas coisas e só aquelas que um

costume bastante antigo demonstrou, pelo menos, não desagradar aos

deuses. A lei é o corpo tradicional ou registrado de preceitos em que

os costumes tradicionais são conservados e expressos. Sempre que

encontramos um corpo de lei primitiva, possuído como tradição de

classe por uma oligarquia política, é provável pensar na lei dessa

maneira, tal como um corpo de tradição semelhante, sob custódia de

um sacerdócio, é certo pensar nele como divinamente revelado.

Uma terceira idéia, estreitamente relacionada com a anterior,

concebe a lei como a prudência ou sabedoria registrada de sábios

antigos, que aprenderam o caminho mais seguro ou o curso

divinamente aprovado para a conduta humana. Quando uma decisão

de costume tradicional e costumes de ação for reduzida à escrita num

código primitivo, é provável que façamos da lei uma idéia

consentânea com esta versão, e Demóstenes, no século IV a.C., podia

descrever a lei de Atenas nesses termos.

Quarto, a lei pode ser concebida como um sistema de princípios

filosoficamente descobertos, que exprimem a natureza das coisas e

19

aos quais, portanto, o homem deve conformar seu comportamento.

Tal idéia era a do jurisconsulto romano, incrustada, é certo, na

segunda e terceira idéias e numa teoria política do Direito como

ordem imperativa do povo romano, mas reconciliada com elas ao

conceber a tradição, a sabedoria registrada e o comando da massa

como simples declarações ou reflexões dos princípios filosoficamente

averiguados, a serem aferidas, configuradas, interpretadas, e

melhoradas em obediência a esses Quarto, a lei pode ser concebida

como um sistema de princípios filosoficamente descobertos, que

exprimem a natureza das coisas e aos quais, portanto, o homem deve

conformar seu comportamento. Tal idéia era a do jurisconsulto

romano, incrustada, é certo, na segunda e terceira idéias e numa

teoria política do Direito como ordem imperativa do povo romano,

mas reconciliada com elas ao conceber a tradição, a sabedoria

registrada e o comando da massa como simples declarações ou

reflexões dos princípios filosoficamente averiguados, a serem

aferidas, configuradas, interpretadas, e melhoradas em obediência a

esses mesmos princípios. Nas mãos dos filósofos, o precedente conceito

de lei assume, freqüentemente, outra forma, de modo que. quinto, a lei

é encarada como um corpo de investigações e declarações sobre um

código moral imutável e eterno. Sexto, existe uma idéia de lei como um

corpo de acordos de homens numa sociedade politicamente

organizada, no tocante a suas relações mútuas. Esta é uma versão

democrática da identificação do Direito com as normas do Direito e,

portanto, com as leis e decretos da cidade-Estado que se discute no

Minos platônico. Não deixa de ser natural que Demóstenes o sugira a

um júri ateniense. Muito provavelmente, em tal teoria, uma idéia

filosófica daria apoio à idéia política, e a inerente obrigação moral

de uma promessa seria invocada para demonstrar por que os homens

devem respeitar os acordos ratificados em suas assembléias populares.

Sétimo, concebeu-se a lei como um reflexo da razão divina que

governa o universo; um reflexo daquela parte que determina o "deve

ser" endereçado por aquela razão aos seres humanos como entidades

morais, em contraste com o "deve" imperativo que se endereça a todo

20

o resto da criação. Tal era a concepção de S. Tomás de Aquino, que

teve enorme circulação até o século XVII e, a partir de então, vem

exercendo muita e constante influência.

Oitavo, a lei foi concebida como um conjunto de ordenações da

autoridade soberana numa sociedade politicamente organizada,

estipulando como os homens se devem conduzir nela; tal concepção

assenta, em última análise, na espécie de base — seja qual for — que

apóia a autoridade do soberano. Assim pensaram os juristas romanos

da República e do período clássico, com respeito ao direito positivo. E

como o imperador tinha a soberania do povo romano investida nele, as

Institutas de Justiniano podiam deixar lavrado que a vontade do

imperador tinha forças de lei. Tal maneira de pensar era natural nos

homens de leis que ativamente apoiavam a autoridade real na

monarquia centralizada francesa dos séculos XVI e XVII, através deles

passando para o Direito Público. Parecia adaptar-se às circunstâncias

da supremacia parlamentar em Inglaterra, depois de 1688, e acabou

por tornar-se a teoria jurídica ortodoxa inglesa. Também podia-se fazer

com que servisse a uma teoria política de soberania popular, em que

se pensasse no povo como sucessor da soberania do parlamento, caso da

Revolução Americana, ou sucessor da soberania do rei, caso da

Revolução Francesa.

Uma nona idéia de lei considera-a um sistema de preceitos

descobertos pela experiência humana, através do qual a vontade

humana individual pode realizar a liberdade mais completa possível,

apenas condicionada pela liberdade da vontade dos outros. Essa idéia,

sustentada sob uma ou outra forma pela escola histórica, dividiu as

preferências dos juristas, optando uns por ela e os restantes pela teoria

da lei como ordem do soberano, durante quase todo o século passado.

Partiu da suposição de que a experiência humana, pela qual foram

descobertos os princípios legais, era determinada de um modo

inevitável. Não se tratava de um esforço humano consciente. O

processo era determinado pelo desdobramento de uma idéia de direito

e justiça ou uma idéia de liberdade que a si mesma se realizava

mediante a administração humana de justiça; ou, então, pela atuação

21

de leis biológicas ou psicológicas, bem como de caracteres raciais, cujo

resultado necessário foi o sistema de direito do tempo e povo em

questão.

Décimo, os homens pensaram ainda na lei como um sistema de

princípios descobertos filosoficamente e desenvolvidos em pormenor

por escritura jurídica e decisão judicial, donde resulta ser a vida

externa ou homem medida pela razão ou, em outra fase, ser a vontade

do indivíduo em ação harmonizada com a de seus semelhantes. Essa

forma de pensamento apareceu no século XIX, depois da teoria de

direito natural, em cujos moldes predominara por dois séculos, ter

sido abandonada, solicitando-se à Filosofia que fornecesse uma

crítica para o arranjo e desenvolvimento sistemáticos dos delalhes.

Segundo a décima - primeira modalidade, a lei foi considerada um

corpo ou sistema de normas impostas aos homens em sociedade pela

classe dominante do tempo, para aplicação, consciente ou

inconsciente, de seu próprio interesse. Essa interpretação econômica da

lei assumiu múltiplas formas. Na forma idealista, cogita-se de um

inevitável desenvolvimento da idéia econômica. Na forma mecânico -

sociológica, prevê-se uma luta de classes ou uma luta pela existência

em termos de Economia, e um direito resultante da atuação de forças

ou, leis envolvidas em tais lutas ou determinando-as. Numa forma

analítico-positivista, a lei é concebida como ordem imperativa do

soberano, mas sendo esse comando determinado, em seu conteúdo

econômico, pela vontade da classe social dominante, a qual, por seu

turno, é determinada por seu próprio interesse. Todas essas formas

pertencem à transição do período de estabilidade da maturidade da

lei para um novo período de crescimento. Quando a idéia de auto-

suficiência da lei dá passagem a outras Ciências Sociais, e os homens

procuram relacionar a jurisprudência com aquelas, a relação com a

Economia chama nossa atenção, imediatamente. Além disso, numa

época de copiosa legislação, a norma promulgada é facilmente aceita

como o tipo de preceito legal, ao passo que a tentativa de

estruturação de uma teoria de legislação é considerada como se

refletisse a orientação geral do Direito.

22

Finalmente, a décima - segunda noção da lei baseia-se nos ditames de

ordem econômica e social, relativamente à conduta do homem em

sociedade, revelados pela observação e expressos em preceitos

elaborados através da experiência humana sobre o que funcionaria e

o que não funcionaria na administração de justiça. Esse tipo de teoria

pertence também ao final do século XIX, quando os homens

começaram a buscar bases físicas ou biológicas, suscetíveis de serem

descobertas pela observação, em lugar de bases metafísicas, aduzíveis

por reflexão filosófica. Outra forma averigua certos fatos sociais

considerados básicos, mediante a observação direta, e desenvolve as

implicações lógicas dos mesmos, segundo um critério muito semelhante

ao dos juristas metafísicos. Isso resulta ainda da tendência, em anos

recentes, para unificar as Ciências Sociais, com a atenção voltada,

conseqüentemente, para as teorias sociológicas.

A digressão valeu a pena, para se notar que cada uma das precedentes

teorias do Direito foi, em primeiro lugar, uma tentativa de explicação

racional da lei do tempo e lugar, ou de alguns elementos relevantes nela

contidos. Assim, a lei quando se desenvolveu através da atividade

jurídica, obteve-se uma teoria filosófica do Direito, como declaratório

de princípios filosoficamente averiguáveis. Quando e onde o ponto de

desenvolvimento se situou na legislação, prevaleceu uma teoria política

do Direito baseada no comando do soberano. Quando a lei assimilava

os resultados de um período prévio de crescimento, a tendência

dominante era para uma teoria histórica do Direito, fundada na

experiência, ou para uma teoria metafísica do Direito, no sentido de

uma idéia de direito ou de liberdade realizada por meio do

desenvolvimento social e jurídico. Com efeito, os juristas e filósofos não

elaboram essas teorias, como simples questões de lógica, mediante o

desenvolvimento inexorável dos fundamentos filosóficos. Tendo algo

para explicar ou expor, esforçam-se por compreender e afirmar

racionalmente suas concepções de lei e, ao fazê-lo, estabelecem uma

teoria do que ela é, a teoria reflete, necessariamente, a instituição que

foi ideada para racionalizar, ainda que universalmente estabelecida. É

uma tentativa para afirmar a lei ou as instituições legais do tempo e

23

lugar em termos universais. É possível que sua real utilidade esteja no

fato de habilitar-se a compreender esse corpo de lei ou essa instituição,

e aí percebemos o que os homens desse tempo estavam procurando fazer

delas ou com elas. Assim, a análise dessas teorias é um dos processos de

se chegar a finalidades por que os homens têm vindo lutando através da

ordem legal.”"

Em consonância com a evolução da finalidade da lei, ou suas

finalidades na medida que não há marco de início ou término de uma dada

finalidade em específico, o Estado (União, Estado e Município) através da

privatização dos serviços públicos (concessões, permissões, terceirizações) se

retira da economia em sentido estrito. As mais importantes figuras desta nova

fase “moderna” são as Autarquias, sob a forma de Agências Reguladoras,

Órgãos de Fiscalização, Órgãos de elaboração, implementação e execução de

políticas Públicas Sociais e Econômicas. Nossa constituição trata do assunto

em seu artigo 173.

Art.173 da CF 1988:

“Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração

direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida

quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou o

relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à

dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao

aumento arbitrário dos lucros.

§ 5º - A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos

dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta,

sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos

praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a

economia popular.”

24

A criação dessas autarquias é resultado direto do processo de

retirada do Estado da economia, conforme cartilha Neoliberal, iniciado com a

edição da Lei 8.031/90 que instituiu o Programa Nacional de Desestatização,

passando pela Lei 9.491/97 (que trata do mesmo assunto e revogou a

8.031/90) alterada pelas leis 9.635/98 e Lei 9.700/98 e alterada também pela

MP - Medida Provisória 2.071-32/2001e pelo Decreto 5.070 de 06/05/2004 que

trata da licitação das linhas de transmissão de energia elétrica.

Estas autarquias são criadas com o escopo de normatizar (através

de portarias e resoluções), fiscalizar os setores dos serviços públicos

delegados e alguns privados (produtos e serviços) no sentido de buscar

equilíbrio e harmonia entre o Estado, consumidores e fornecedores públicos e

privados (concessionária, permissionária e iniciativa privada propriamente dita).

São entidades com independência administrativa, autonomia própria,

ausência de subordinação hierárquica, estabilidade dos dirigentes e autonomia

financeira, criadas por lei e regulamentadas por decreto.

De acordo com o Decreto-lei 200/67 em seu art. 5º: "Autarquia é o

serviço autônomo criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e

receitas próprios para executar atividades típicas da Administração Pública,

que requeiram para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e

financeira descentralizada".

 Diante dessa definição, facilmente se percebe o porquê da escolha

dessa modalidade de entidade administrativa para a estrutura das agências

reguladoras.

Pela definição supracitada, constatamos que a autarquia é uma

entidade autônoma, à medida que goza de autonomia administrativa e

financeira, não estando subordinada ao ente estatal que lhe deu vida, porém

sob a supervisão ministerial competente (art. 20º e 26º do decreto – lei 200/67).

A ausência dessa subordinação hierárquica e administrativa é, sem

dúvida, uma condição indispensável para que ela agência bem desempenhe

suas funções.

25

Entretanto a definição acima se trata de autarquia comum, e as

Agências Reguladoras Federais são Autarquias Especiais, como se pode notar

das leis que as instituíram.

Desse modo, “Autarquia de Regime Especial” é aquela assim

qualificada por sua lei de criação, em virtude de características especificas a

ela atribuídas por essa mesma lei, conferindo-lhe uma autonomia excepcional,

incomum (acabará por ser comum com o advento temporal).

A figura da Autarquia de Regime Especial tem sido utilizada,

particularmente objetivando o estabelecimento, para ela, de quadro próprio de

pessoal, diferenciado, melhor adaptado às características das atividades que

lhes são atribuídas.

Em nosso país, cada Agência Federal foi concebida mediante uma

lei. Inicialmente foram constituídas 3 agências: ANP5 – Agência Nacional do

Petróleo – lei 9.478/97; ANATEL6 – Agência Nacional de Telecomunicações –

lei 9.472/97 e ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica - lei 9.427/96.

Posteriormente a estas, foram criadas a ANVISA7 – Agência Nacional de

Vigilância Sanitária – lei 9782/1999 e a ANS8 – Agência Nacional de Saúde –

lei 9.961/2000. A ANA – Agência Nacional de Águas – lei 9.984/2000, ANTT -

Agência Nacional de Transportes Terrestres e ANTAQ - Agência Nacional de

Transportes Aquaviários – lei 10.233/2001, além de outras.

Em alguns Estados, como Rio Grande do Sul (AGERGS – Agência

Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do

Sul, instituído pela Lei Estadual 10.931/97), Rio Grande do Norte, Bahia, Pará,

Ceará, Goiás (AGR – Agencia Goiana de regulação, controle e fiscalização de

serviços públicos, criada em 1999 e regulamentada em 2000), Rio de Janeiro,

Sergipe, Pernambuco, São Paulo, Alagoas (ARSAL – Agencia Reguladora de

Serviços do Estado de Alagoas – lei estadual 6.267/2001 e regulamentada pelo

decreto 520/2002) foram criadas agências que visam, da mesma forma que as

nacionais, regular, normatizar, fiscalizar e mediar serviços públicos delegados.

5 Site http://www.anp.gov.br/, acessado em 25/09/2004.6 Site http://www.anatel.gov.br/home/default.asp, acessado em 25/09/2004.7 Site http://www.anvisa.gov.br/, acessado em 25/09/2004.8 Site http://www.ans.gov.br/portal/site/home/index.asp, acessado em 25/09/2004.

26

Além de suas funções específicas em relação aos serviços

delegados dos estados, as agências estaduais podem firmar convênios com as

agências nacionais, com o objetivo de realizar os serviços de regulação

nacional dentro de seu território. Por exemplo, a ANTT realizou seu primeiro

convênio desse tipo com a AGR de Goiás.

Os Procon’s (Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor)

recentemente também foram erigidos a autarquias cada um seu Estado

membro.

Em São Paulo a Lei 9.129/95 e o Decreto 41.170/96 ambos

estaduais instituíram a autarquia. A Lei nº 5.966 de 11 de dezembro de 1973,

instituiu o SINMETRO - Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e

Qualidade Industrial. Foram criados o CONMETRO e INMETRO (3 autarquias),

os quais foram regulamentados através dos Decretos nº 74.209/74, 79.206/77

e 81.128/77. A Lei nº 9.933 de 20 de dezembro de 1999 complementa suas

atribuições. São criados os IPEM’s (Instituto de Peso e Medidas), que em São

Paulo foi erigido a entidade autárquica pela lei 9286/95.

O CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica criado

pela Lei 4.137/62, foi transformado em autarquia federal (vinculado ao

Ministério da Justiça) pela lei 8.884/1994 (esta lei revogou a 4.137/62), a qual

dispõe também sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem

econômica, corroborando a tendência brasileira.

Contudo, há controvérsias quanto à natureza jurídica dessa

instituição, ou seja, é agência reguladora ou simplesmente autarquia comum?

Temos, que se trata de autarquia comum. O CADE foi eleito a

autarquia federal – lei 8.884/19949 art. 3º - e não a autarquia federal especial

como podemos depreender das legislações que instituíram as agências

reguladoras (ANATEL, ANEEL etc).

Ademais, não é sua competência regular determinada atividade

econômica como ocorre com as Agências Reguladoras que baixam resoluções

9 Esta lei Transforma o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em Autarquia, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica e dá outras providências.

27

para normatizar essa determinada atividade econômica. O CADE é órgão

consultivo e deve ser provocado através do informe de uma possível infração à

ordem econômica nos termos da lei 8.884/1994.

Esclarecida a questão relativa ao CADE, passemos a abordar a

questão da Regulação.

Constatamos inicialmente, no Brasil, 2 tipos de Agências

Reguladoras: 1 – Setorial, e 2 - Multissetorial.

A União adotou o sistema Setorial. Nesse sistema cada Agência é

responsável por uma determinada atividade da economia. Desse modo atuam

as Agências Federais como ANATEL (Telecomunicações), ANEEL (Energia

Elétrica) ANA (Águas) etc.

No entanto, cada Estado membro adota o tipo que melhor se adapta

a sua estrutura econômica e sua complexidade. Até Setembro de 2004, 18 de

um total de 27 Estados criaram as suas Agências.

O Estado de São Paulo, no entanto, foi o único que optou pelo

modelo setorial, mas mesmo assim somente para o setor elétrico (CSPE –

Comissão de Serviços Públicos de Energia – Lei Complementar 833 de 18 de

Outubro de 1997) e de Transportes (ARTESP – Lei Estadual 914 de Janeiro de

2002).

Os demais Estados optaram por agências multi-setoriais que

regularam vários setores (Energia Elétrica, Água, Gás, transportes etc).

Até o momento apenas 3 Municípios, de um total de mais de 5.000

municípios, no Brasil, criaram as suas Agências Reguladoras. O Município de

Cachoeira do Itapemirim no Espirito Santos, o de Joinvile em Santa Catarina e

de Campo Grande no Mato Grosso do Sul.

Logo abaixo encontramos um Mapa do Brasil que traz a maioria das

Agências Reguladoras do País, as quais são associadas a ABAR – Associação

Brasileira de Agências Reguladoras. Neste mapa não encontramos as

28

Agências Reguladoras ANA10, ANATEL, ANVISA, ANS e ANP, bem como

nenhuma das 3 Agências Reguladoras municipais.

Figura 1 – Mapa das Agências Reguladoras associadas à ABAR – Associação Brasileira de Agências Reguladoras11

Embora recentes na Administração Pública brasileira, as Agências

Reguladoras ou suas equivalentes operam em vários países, por exemplo:

Estados Unidos da América com 70 entidades (algumas já com maiôs de cem

anos), sendo uma por Estado e o restante na esfera federal; Canadá com 15,

Dinamarca com 9, Austrália, Reino Unido e Espanha com 8 Agências cada

uma, Holanda com 7, Alemanha e Suíça com 6 cada, Suécia e China com 5,

França com 4 e na América do Sul a Argentina que possui 11 Agências, e o

Chile com 512.

10 Site http://www.ana.gov.br/, acessado em 25/09/2004.11 Site http://www.abar.org.br/, acessado em 25/09/2004.12 Villela, Guilherme Socias. Marco Regulatório - Introdução. Porto Alegre: Revista Marco Regulatório nº 1 da AGERGS, p. 6-7, 1999. Disponível no Site http://www.agergs.rs.gov.br/, acessado em 25/09/2004.

29

O conceito de Regulação (tomando a palavra como expressão de

Administrar no sentido mais amplo) é uma novidade para o Brasil.

Ainda não existe conceituação clara a respeito, embora o Conselho

Superior da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados

do Rio Grande do Sul - AGERGS, definiu (considerando que definição e

conceito não são e não significam a mesma coisa) Regulação da seguinte

forma:

“Entende-se por regulação, para os efeitos desta lei (Lei

10.931/98 - RGS), os atos de controle, fiscalização,

normatização e padronização dos serviços públicos delegados,

bem como os de fixação, reajustamento e revisão ou

homologação de suas tarifas”.

Embora não seja nosso intuito conceituar ou definir Regulação ou

ainda nos prolongarmos no que vem sendo chamado de Direito Regulatório ou

de Regulação, não podemos nos furtar ao assunto, pois intimamente ligado ao

nosso tema.

Ousaremos, então, conceituar Regulação no âmbito brasileiro:

“São ações voltadas ao controle do fornecimento de produtos e

serviços públicos delegados ou de interesse coletivo, em todas as esferas de

Administração, exercidas direta ou indiretamente pelo Estado através de

autarquias instituídas por lei, considerando as características, necessidades e

especificidades de desenvolvimento de cada região ou Estado”.

Fato é que a teoria da regulação, ou desregulação como alguns

preferem, pressupõe que a sociedade seja auto-sustentável, dispensado a

participação direta do Estado como agente de produção substituindo a base:

“interesse público” por “interesse social”.

Não podemos nos enganar, o Estado, em realidade, não está saindo

de cena (isto é apenas aparência), desregulamentando a economia, mas sim

regulamentando de outra forma. Como já exposto, o capitalismo necessita para

30

sobreviver, do Estado. E Este por sua vez, nas palavras do Professor Eros

Roberto Grau defende o capitalismo dos capitalistas.

Vejamos:

Art.174 da CF 1988:

“Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o

Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização,

incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor

público e indicativo para o setor privado.”

Como podemos observar do Art. 174 da CF 1988 é o Estado que

exerce, na forma da lei as funções de fiscalização, incentivo e planejamento.

Ora, o sistema capitalista reclama o amplo fornecimento de

prestação de serviços públicos à sociedade sob a égide do Estado, que regula

o mercado e protege os interesses dos capitalistas. A regulação ou

desregulação que está sendo levada a cabo pelos neoliberais deixa claro que o

Estado deve desenvolver apenas atividades que não interessam ao setor

privado (sob esse prisma os capitalistas é que ditam as regras

sorrateiramente). Assim não interessa ao setor privado atividades econômicas

que demandem grandes investimentos ou aportes de capital e tecnologia;

também não interessa ao setor privado as atividades que não sejam lucrativas,

rentáveis (hoje vivemos o caos no setor elétrico e de telecomunicações –

desorganizado, desestruturado, burocrático etc; no Brasil justamente por esse

motivo não é rentável investir nesses setores); além de outras de exclusividade

do Estado como Forças Armadas, policias, saúde, previdência etc (não

obstante os setores correspondentes privados).

Regular e desregular significam a mesma coisa na medida em que

desregular é uma nova forma de regular. A proposta dos neoliberais de

regulação através do mercado (retirada do Estado da economia) não faz

sentido, ou os capitalistas estariam dispostos a renunciar aos subsídios

estatais?13

13 Grau, Eros Roberto. O Direito Posto e Pressuposto. São Paulo: Ed. Malheiros, 5ª ed., 2003.

31

A grande transformação que passamos no modo de produção da

vida social diz respeito à informática, microeletrônica, velocidade de

transmissão de informações, imagens etc, o que reclama uma regulamentação,

uma regulação, um direito; certo então dizer mais uma vez ser necessária a

presença do Estado como regulamentador, regulador e mediador, inclusive

protegendo o capitalismo dos capitalistas.

Visto o panorama econômico e político em que estamos inseridos e

que portanto influencia a vida de cada indivíduo e da comunidade como um

todo, passemos a analisar quais são as bases e princípios constitucionais em

que a relação de consumo está inserida.

32

CCAPÍTULOAPÍTULO 3 3

O CDC E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

CCONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES I INICIAISNICIAIS

Não obstante à previsão constitucional ter determinado inclusive

prazo para a promulgação do Código de Defesa do Consumidor, ele nasceu,

coincidência ou não, concomitantemente à institucionalização do

Neoliberalismo (forma de capitalismo agressivo). Alguns dizem que, o momento

histórico, propício para sua aprovação no congresso nacional, e posterior

promulgação, foi fator determinante para que ele, CDC, fosse criado,

sustentando ainda que tal legislação jamais “vingaria” nos dias de hoje, face às

forças políticas e econômicas envolvidas.

Fato é que o CDC existe e veio para equilibrar, regular as relações

de consumo contrapondo-se, de certa forma, ao Neoliberalismo e ao

Ultraliberalismo. A grande questão é como será instrumentalizada e

operacionalizada a Política Nacional de Defesa do Consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor, a Lei n. 8.078, de 11 de

setembro de 1990, disciplinou no Art. 105 e 106 o Sistema Nacional de Defesa

do Consumidor apresentando um modelo a ser seguido, obedecido pelos

órgãos públicos e pela sociedade como um todo, estabelecendo ainda, uma

estrutura, um organograma, a ser preenchido por todos os integrantes desse

sistema.

No CDC, propositadamente, comandos normativos ficaram

incompletos. A forma de planejamento, coordenação, implementação e

execução da Política Nacional de Relações de Consumo têm que respeitar as

características regionais, sociais, naturais e econômicas de cada região do

país, bem como as políticas dos órgãos e entidades que o integram.

A política Nacional das Relações de Consumo – Art. 4º e 5º do CDC

–será implementada e executada a partir da organização e atuação dos

integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor – Arts. 105 e 106

do CDC.

3.1 – A POLÍTICA NACIONAL DAS RELAÇÕES DE CONSUMO

Apesar dessa lacuna proposital e necessária, estabeleceu-se metas

a serem alcançadas pelo sistema, além de uma estratégia disciplinada pelo

próprio Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 4º e artigo 5º:

Art. 4º do CDC:

“A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o

atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à

sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus

interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida,

bem como a transparência e harmonia das relações de

consumo, atendidos os seguintes princípios14:

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de

consumo;

II - ação governamental no sentido de proteger efetivamente o

consumidor:

a) por iniciativa direta;

b) por incentivos à criação e desenvolvimento de associações

representativas;

c) pela presença do Estado no mercado de consumo;

d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de

qualidade, segurança, durabilidade e desempenho.

III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de

consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a

14 Artigo com redação dada pela Lei 9.008, de 21 de Março de 1995.

34

necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo

a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica

(art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e

equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto

aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de

consumo;

V - incentivo à criação pelos fornecedores de meios eficientes de

controle de qualidade e segurança de produtos e serviços, assim

como de mecanismos alternativos de solução de conflitos de

consumo;

VI - coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados

no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e

utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e

nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos

aos consumidores;

VII - racionalização e melhoria dos serviços públicos;

VIII - estudo constante das modificações do mercado de consumo.”

Art. 5º do CDC:

“Para a execução da Política Nacional das Relações de Consumo,

contará o poder público com os seguintes instrumentos, entre outros:

I - manutenção de assistência jurídica, integral e gratuita para o

consumidor carente;

II - instituição de Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor,

no âmbito do Ministério Público;

III - criação de delegacias de polícia especializadas no atendimento

de consumidores vítimas de infrações penais de consumo;

IV - criação de Juizados Especiais de Pequenas Causas e Varas

Especializadas para a solução de litígios de consumo;

V - concessão de estímulos à criação e desenvolvimento das

Associações de Defesa do Consumidor.

35

§ 1° (Vetado).

§ 2º (Vetado).”

E não poderia ser diferente, pois o sistema do CDC está em perfeita

consonância com a Constituição Federal de 1988:

Art 1º da CF 1988:

“A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel

dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em

Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V - o pluralismo político.

Parágrafo único - Todo o poder emana do povo, que o exerce por

meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta

Constituição.”

Art. 3º da CF 1988:

“Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do

Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as

desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem,

raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de

discriminação.”

Art. 5º da CF 1988:

36

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,

garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no

País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade,

à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa

senão em virtude de lei;

V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além

da indenização por dano material, moral ou à imagem;

X – São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem

das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material

ou moral decorrente de sua violação;

XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o

sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;

XXII – é garantido o direito de propriedade;

XXIII – a propriedade atenderá sua função social;

XXXII – o Estado promoverá na forma da lei a defesa do

consumidor;”

Art. 6º da CF 1988:

“São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o

lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade

e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta

Constituição.”

Art. 170 da CF 1988:

“A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e

na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência

digna, conforme os ditames da justiça social, observados os

seguintes princípios:

I - soberania nacional;

37

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade;

IV - livre concorrência;

V - defesa do consumidor;

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento

diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços

e de seus processos de elaboração e prestação;

Inciso com redação data pela Emenda Constitucional nº 42 de

19.12.2003

VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

VIII - busca do pleno emprego;

IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte

constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e

administração no País.

Inciso com redação dada pela Emenda Constitucional nº 6 de 1995”

Da análise dos artigos do CDC e da CF 1988 transcritos acima

podemos concluir que há um perfeito enquadramento da lei 8.078/90 nos

ditames de nossa Carta Magna.

O Artigo 6º e 225º de nossa Carta Magna asseguram o que o

Professor Celso Antonio Pacheco Fiorillo15 chama de piso vital mínimo, ou seja,

o mínimo necessário para viver dignamente.

Desse modo, nas palavras do Professor Rizzatto Nunes16, a

Dignidade da Pessoa Humana é um dever social; é um supraprincípio

constitucional que ilumina todos os outros, inclusive os infraconstitucionais.

Esse entendimento, ao contrário do que muitos imaginam, tem sido

aplicado, e não só em casos de relação de consumo. Vejamos como se

15 Fiorillo, Celso Antonio Pacheco. O Direito de Antena em Face do Direito Ambiental no Brasil. São Paulo: Ed. Saraiva, 2000.16 Rizzatto Nunes, Luiz Antonio. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. São Paulo: Ed. Saraiva, 2002, p. 50.

38

pronunciou a respeito do tema a 4ª Câmara do 1º Tribunal de Alçada Civil de São

Paulo17“in verbis”:

“... Ora, o sistema democrático jurídico constitucional brasileiro

veio, nos últimos anos, concretizando as garantias trazidas em

05/10/1988 pelo constituinte, com a edição de nossa Carta Magna.

Dela é de se anotar que a dignidade da pessoa humana é um bem

intangível (art. 1°, III, CF), sendo que, nos vários e demais princípios

e garantias constitucionais, estão consignados os meios de

concretização da possibilidade da pessoa viver dignamente. Para tal,

o caput do art. 6° estabelece um piso vital mínimo:

"Art. 6° São direitos sociais a educação, a saúde, trabalho, a

moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à

maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma

desta Constituição.”

A doutrina estabelece esse piso vital mínimo como base do sistema.

Diz, com acerto o professor Celso Antonio Pacheco Fiorillo que, para

começar-se a respeitar a dignidade da pessoa humana, tem-se que

assegurar concretamente os direitos sociais previstos no artigo 6° da

Carta Magna, que, por sua vez, está atrelado ao caput do artigo 225.

Vida digna, vale dizer, direito de ser respeitado como pessoa e

protegido nas circunstâncias adversas, o que inclui a saúde, o bem

estar, a moradia etc. É importante aqui realçar a necessidade de

buscar-se concretamente a implementação do respeito à dignidade,

para que ela não seja apenas uma espécie de enfeite abstratamente

considerado, mas sem eficácia. O princípio da dignidade é vivo, real,

pleno e está em vigor para ser sempre levado em consideração

...”

17 Agravo de Instrumento nº 1.254.177-2 julgado em 15/09/2004. Por votação unânime foi dado provimento. Voto 4769. Comarca de São Paulo: 5ª Vara Cível do Fórum Regional do Jabaquara. Num. de 1ª Instância 200300013678. Acórdão Publicado em 15/10/2004.

39

Ora, o CDC ao instituir a Política Nacional das Relações de

Consumo, bem como seus instrumentos e objetivos o fez levando-se em

consideração a base da República Federativa do Brasil constante da CF 1988

e transcrita acima, bem como os direitos fundamentais individuais e coletivos e

os princípios da ordem econômica elencados, exemplificativamente, no artigo

170 da CF 1988.

Sendo a dignidade da pessoa humana a base, o fundamento, o

objetivo da República Federativa do Brasil outra não poderia ser a

interpretação nem a disposição contida no CDC.

Violar esse princípio mestre significa muito mais que violar uma

regra ou uma norma; significa no mínimo, desprestigiar a vida humana e isso o

CDC certamente não prescreve.

Nesse sentido Celso Antonio Bandeira de Melo18 esclarece:

“"Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma

qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um

específico mandamento obrigatório mas a todo o sistema de comandos.

É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade.

Conforme o escalão do princípio atingido, pode representar

insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores

fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e

corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo,

abatem- se as vigas que o sustêm e alui-se toda a estrutura nelas

esforçada"”

No mesmo sentido observamos Geraldo Ataliba19:

“"...princípios são linhas mestras, os grandes nortes, as diretrizes magnas

do sistema jurídico. Apontam os rumos a serem seguidos por toda a

18 Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Ed. Malheiros, 4ª ed., 1993, p. 409, apud Rizzatto Nunes, Luiz Antonio. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Ed. Saraiva, 2000, p. 2-3.19 Ataliba, Geraldo. República e Constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985, p. 6-7, apud Rizzatto Nunes, Luiz Antonio. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Ed. Saraiva, 2000, p. 3

40

sociedade e obrigatoriamente perseguidos pelos órgãos do governo

(poderes constituídos).

Eles expressam a substância última do querer popular, seus objetivos e

desígnios, as linhas mestras da legislação, da administração e da

jurisdição. Por estas não podem ser contrariados; têm que ser

prestigiados até as últimas conseqüências “".

Konrad Hesse20 com base numa lição de Walter Burckhard21 ressalta a

importância do respeito aos princípios constitucionais:

“"...aquilo que é identificado como vontade da Constituição deve ser

honestamente preservado, mesmo que, para isso, tenhamos de renunciar a

alguns benefícios, ou até a algumas vantagens justas. Quem se mostra

disposto a sacrificar um interesse em favor da preservação de um princípio

constitucional fortalece o respeito à Constituição e garante um bem da vida

indispensável à essência do Estado democrático. Aquele que, ao contrário,

não se dispõe a esse sacrifício, malbarata, pouco a pouco, um capital que

significa muito mais do que todas as vantagens angariadas, e que,

desperdiçado, não mais será recuperado"”.

Por conseqüência a Política Nacional de Defesa do Consumidor está

embasada no princípio da Dignidade da Pessoa Humana; consumidor que

precisa de produtos e serviços apropriados para suprir suas necessidades de

sobrevivência digna.

Outro não poderia ser o entendimento, afinal as regras, as normas e

as leis existem com a finalidade de pacificar a existência conjunta dos seres

humanos. Os produtos e serviços são produzidos e oferecidos com um único

20 Hesse, Konrad. A força normativa da Cosntituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio A. Fabris, Editor, 1991, p. 22, apud Rizzatto Nunes, Luiz Antonio. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Ed. Saraiva, 2000, p. 4.21 A obra de Walter Burckhardt citada pelo jurista alemão é Kommentar der Schweizerichen Bundesverfassung, apud Rizzatto Nunes, Luiz Antonio. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Ed. Saraiva, 2000, p. 4, nota.

41

propósito, mesmo que indireto, satisfazer as necessidades de cada indivíduo,

proporcionando uma vida, uma existência confortável e digna.

3.2 – COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR E FISCALIZAR AS RELAÇÕES

DE CONSUMO

O Código de Defesa do Consumidor, sendo um micro-sistema

jurídico próprio, ao tratar das sanções administrativas também fixou

competências, e o fez no primeiro artigo do capítulo que trata das sanções

administrativas. Vejamos:

Art. 55 do CDC:

“A União, os Estados e o Distrito Federal, em caráter

concorrente e nas suas respectivas áreas de atuação

administrativa, baixarão normas relativas à produção,

industrialização, distribuição e consumo de produtos e

serviços.

§ 1º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios

fiscalizarão e controlarão a produção, industrialização, distribuição,

a publicidade de produtos e serviços e o mercado de consumo, no

interesse da preservação da vida, da saúde, da segurança, da

informação e do bem-estar do consumidor, baixando as normas

que se fizerem necessárias.

§ 2º (Vetado).

§ 3º Os órgãos federais, estaduais, do distrito federal e

municipais com atribuições para fiscalizar e controlar o mercado

de consumo manterão comissões permanentes para elaboração,

revisão e atualização das normas referidas no § 1º, sendo

obrigatória a participação dos consumidores e fornecedores.

§ 4º Os órgãos oficiais poderão expedir notificações aos

fornecedores para que, sob pena de desobediência, prestem

informações sobre questões de interesse do consumidor,

resguardado o segredo industrial.”

42

Verifica-se que foi deferida à União, aos Estados, ao Distrito Federal,

e aos municípios, em caráter concorrente, a fixação de normas administrativas

no que respeita à produção, industrialização, distribuição e consumo de

produtos e serviços, obedecidas as respectivas áreas de atuação.

O art. 55 e parágrafos estão em perfeita consonância com os artigos

4º, 5º, e 6º do CDC, bem como com a CF de 1988.

As normas a que se refere são normas gerais, ou seja, normas

procedimentais, de acordo com o espírito da Constituição Federal (art. 24, I e

VIII e §.§ 1º e 2º, e art. 30) que assim determina:

Art.24 da CF 1988:

“Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar

concorrentemente sobre:

I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e

urbanístico;

V - produção e consumo;

VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a

bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e

paisagístico;

§ 1º - No âmbito da legislação concorrente, a competência da

União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

§ 2º - A competência da União para legislar sobre normas gerais não

exclui a competência suplementar dos Estados.

§ 3º - Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados

exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas

peculiaridades.

§ 4º - A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende

a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.”

Art.30 da CF 1988:

“Compete aos Municípios:

43

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de

concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse

local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter

essencial; ”

Percebe-se que o legislador do Código de Defesa do Consumidor foi

extremamente preocupado em seguir os princípios constitucionais a respeito da

distribuição da competência legislativa. E de outra forma não poderia ser, posto

que a Constituição Federal é clara a respeito do tema.

Impõe ressaltar que apesar do CDC em seu artigo 55 estabelecer

que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios para fiscalizar e

controlar tais atividades podem baixar normas, elas devem obedecer ao

disposto no art. 24 da CF 1988, ou seja, cabe à União baixar normas gerais (e

não específicas) e aos Estados, Distrito Federal e Municípios cabe baixar

normas específicas (e não gerais).

Nesse sentido, sustenta Zelmo Denari que o disposto no “caput” do

art. 55 é mera reprodução do art. 24 da Constituição Federal22.

Assim, a União pode legislar sobre normas gerais e assim o fez ao

ser promulgado o CDC. No que diz respeito às sanções administrativas optou-

se por fixar normas gerais, e instituiu-se o SNDC – Sistema Nacional de Defesa

do Consumidor – no art. 105:

TÍTULO IV

Do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor

Art. 105. Integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor

(SNDC), os órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal e

municipais e as entidades privadas de defesa do consumidor.

22 Nery Jr., Nelson; Denari, Zelmo e. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: Comentado Pelos Autores do Anteprojeto. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária , 2001, p. 578.

44

Art. 106. O Departamento Nacional de Defesa do Consumidor, da

Secretaria Nacional de Direito Econômico (MJ – Ministério da

Justiça), ou órgão federal que venha substituí-lo, é organismo de

coordenação da política do Sistema Nacional de Defesa do

Consumidor, cabendo-lhe:

I - planejar, elaborar, propor, coordenar e executar a política nacional

de proteção ao consumidor;

II - receber, analisar, avaliar e encaminhar consultas, denúncias ou

sugestões apresentadas por entidades representativas ou pessoas

jurídicas de direito público ou privado;

III - prestar aos consumidores orientação permanente sobre seus

direitos e garantias;

IV - informar, conscientizar e motivar o consumidor através dos

diferentes meios de comunicação;

V - solicitar à polícia judiciária a instauração de inquérito policial para

a apreciação de delito contra os consumidores, nos termos da

legislação vigente;

VI - representar ao Ministério Público competente para fins de

adoção de medidas processuais no âmbito de suas atribuições;

VII - levar ao conhecimento dos órgãos competentes as infrações de

ordem administrativa que violarem os interesses difusos, coletivos,

ou individuais dos consumidores;

VIII - solicitar o concurso de órgãos e entidades da União, Estados,

do Distrito Federal e Municípios, bem como auxiliar a fiscalização de

preços, abastecimento, quantidade e segurança de bens e serviços;

IX - incentivar, inclusive com recursos financeiros e outros

programas especiais, a formação de entidades de defesa do

consumidor pela população e pelos órgãos públicos estaduais e

municipais;

X - (Vetado).

XI - (Vetado).

XII - (Vetado).

45

XIII - desenvolver outras atividades compatíveis com suas

finalidades.

Parágrafo único. Para a consecução de seus objetivos, o

Departamento Nacional de Defesa do Consumidor poderá solicitar o

concurso de órgãos e entidades de notória especialização

técnico-científica.

Não obstante também foi criado, no Estado de São Paulo, um

Sistema Estadual de Defesa do Consumidor, previsto na Constituição Estadual:

Art. 276:

“O Sistema Estadual de Defesa do Consumidor, integrado por

órgãos públicos das áreas de saúde, alimentação, abastecimento,

assistência judiciária, crédito, habitação, segurança e educação,

com atribuições de tutela e promoção dos consumidores de bens e

serviços, terá como órgão consultivo e deliberativo o Conselho

Estadual de Defesa do Consumidor, com atribuições e composição

definidas em lei”.

Destaca-se, assim, que o capítulo relativo às sanções

administrativas, em sua integralidade, é constituído por normas gerais de

consumo, cujo destinatário é o legislador, e não o consumidor ou o fornecedor

de serviços23 e para as sanções administrativas terem eficácia necessitam de

regulamentação que veio na forma do Decreto 2.181/97.

Importante dizer que aos Estados, Distrito Federal e Municípios é

lícito e possível estabelecer normas gerais em caráter suplementar, desde que

não haja sido estabelecida pela União. Extraímos ainda do artigo 24 § 4º da CF

1988 que havendo normas gerais estaduais ou municipais e sobrevindo norma

23 Nery Jr., Nelson; Denari, Zelmo e. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: Comentado Pelos Autores do Anteprojeto. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária , 2001, p. 571.

46

geral da União – lei federal - que trata do mesmo assunto, a lei estadual ou

municipal é revogada naquilo que contrariar a lei federal.

Dessa forma, a divisão das competências concorrentes próprias

ocorre em três níveis: no federal, onde foi conferido à União o poder de edição

de normas gerais; no estadual, em que foi outorgada competência suplementar

aos Estados – membros; e municipal, onde os Municípios ficaram

encarregados da suplementação das normas gerais e estaduais em nível local

todas as vezes em que for de interesse local.

As designadas normas gerais surgem, portanto, como decorrência

natural do regime federativo, pois sempre que interessar à nação imprimir

uniformidade de orientação ou emprestar tratamento isonômico à regulação de

qualquer matéria de interesse político – administrativo poderá recorrer ao

comentado tipo normativo.24

Nesse sentido é o posicionamento do Supremo Tribunal Federal25,

em votação unânime, “in verbis”:

Normas de proteção do consumidor - Competência concorrente

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - AÇÃO

DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI 12.420, DE

13.01.1999, DO ESTADO DO PARANÁ, QUE ASSEGURA AO

CONSUMIDOR O DIREITO DE OBTER INFORMAÇÕES SOBRE

NATUREZA, PROCEDÊNCIA E QUALIDADE DOS PRODUTOS

COMBUSTÍVEIS, COMERCIALIZADOS NOS POSTOS

REVENDEDORES SITUADOS NAQUELA UNIDADE DA

FEDERAÇÃO - ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 22,1,1V e XII,

177, §§ l.° e 2.°, I e III, 238 e 170, IV, DA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL - MEDIDA CAUTELAR

1. A plausibilidade jurídica da Ação Diretade Inconstitucionalidade

ficou consideravelmente abalada, sobretudo diante das informações

do Exmo. Sr. Governador do Estado do Paraná.24 Ibid., p. 57625 Acórdão encontrado no Site http://www.stf.gov.br/, acessado 17/09/2004.

47

2. Com efeito, a Constituição Federal, no art. 24, V e VIII, atribui

competência concorrente à União, aos Estados e ao Distrito Federal

para legislar sobre produção e consumo e responsabilidade por dano

ao consumidor. O § l.° desse artigo esclarece que, no âmbito da

legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a

estabelecer normas gerais. E o § 2.°, que a competência da União

para as normas gerais não exclui a suplementar dos Estados.

3. No caso, a um primeiro exame, o Estado do Paraná, na Lei

impugnada, parece haver exercido essa competência suplementar,

sem invadir a esfera de competência da União, para normas gerais.

Aliás, o próprio Código do Consumidor, instituído pela Lei federal

8.078, de 1990, no art. 55, a estabeleceu.

4. E. como ficou dito, o diploma acoimado de inconstitucional não

aparenta haver exorbitado dos limites da competência legislativa

estadual (suplementar), nem ter invadido a esfera de competência

concorrente da União, seja a que ficou expressa no Código do

Consumidor, seja na legislação correlata, inclusive aquela

concernente à proteção do consumidor no específico comércio de

combustíveis.

5. É claro que um exame mais aprofundado, por ocasião do

julgamento de mérito da ação, poderá detectar alguns excessos da lei

em questão, em face dos limites constitucionais que se lhe impõem,

mas, por ora, não são eles vislumbrados, neste âmbito de cognição

sumária, superficial, para efeito de concessão de medida cautelar.

6. Ausente o requisito da plausibilidade jurídica, nem é preciso

verificar se o do periculum in mora está preenchido. Ademais, se

tivesse de ser examinado, é bem provável que houvesse de militar no

sentido da preservação temporária da eficácia das normas em foco.

7. Medida cautelar indeferida. Plenário: votação unânime (STF - TP

– MC / ADIn 1980 - rei. Min. Sydney Sanches - j. 04.08.1999).

48

Em relação ao § 1º já realizamos os devidos comentários no que

tange a dignidade da pessoa humana e remetemos o leitor ao item 3.1 que

trata da perfeita consonância do CDC com o objetivo e fundamento da

República Federativa do Brasil – CF 1988, arts. 1º, 3º, 5º, 6º, 170, 225 etc.

De outro lado o § 1º do art. 55 prevê que a todos os entes federativos

cabe fiscalizar a produção, industrialização, distribuição, a publicidade de

produtos e serviços e o mercado de consumo, que o realizam através de seus

órgãos.

Nesse sentido, o Decreto 2.181/97 em seu artigo 9º e 10º dispõe que

a relação de consumo será fiscalizada em todo o território nacional pela SDE –

Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, por meio do DPDC –

Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor e pelos órgãos de defesa

do consumidor dos Estados, Municípios e Distrito Federal.

Neste contexto, o Decreto. 2.181, de 20 de março de 1997, que

atualmente regulamenta a aplicação das sanções administrativas previstas no

CDC, autoriza no seu art. 5º a apuração e punição das infrações aos seus

dispositivos a todos os entes da federação, inclusive às autarquias, vejamos:

Art. 5º do Dec. 2.181/97:

“Qualquer entidade ou órgão da Administração Pública federal,

estadual e municipal, destinado à defesa dos interesses e direitos do

consumidor tem, no âmbito de suas respectivas competências,

atribuições para apurar e punir infrações a este Decreto e à

legislação das relações de consumo.

Parágrafo único – Se instaurado mais de um processo

administrativo por pessoas jurídicas de direito público distintas, para

apuração de infração decorrente de um mesmo fato imputado ao

mesmo fornecedor, eventual conflito de competência será dirimido

pelo DPDC, que poderá ouvir a Comissão Nacional Permanente de

Defesa do Consumidor – CNPDC, levando sempre em consideração

49

a competência federativa para legislar sobre a respectiva atividade

econômica.”

Na hipótese de duplicidade de processos, instaurados por entes

públicos distintos, o conflito de competência será dirimido pelo Departamento

de Proteção e Defesa do Consumidor – DPDC, órgão subordinado ao

Ministério da Justiça.26

Outra questão importante a ressaltar no § 1º do art. 55 do CDC é que

ele se referiu a normas e não a leis. A distinção entre lei e norma jurídica, para

uma melhor compreensão do alcance das disposições do CDC, permite a

aplicação das sanções administrativas por todos os entes federativos de forma

bem abrangente.

Esclarece Zelmo Denari27, in verbis:

“Em primeira aproximação o cultor do Direito não pode confundir lei

e norma jurídica. A palavra lei designa o ato através do qual o

Estado, da forma mais solene possível, vale dizer, através do seu

Poder Legislativo, manifesta a sua vontade. Por sua vez, norma

jurídica é um preceito que, de modo geral, regula o comportamento

das pessoas (regras de conduta), bem como os procedimentos

normativos, vale dizer, os próprios meios de produção normativa

(regras de competência). ”

Destarte, as normas jurídicas, quanto aos seus destinatários,

classificam-se em normas de conduta e normas de competência ou de

estrutura. Enquanto àquelas são dirigidas aos súditos da nação, as normas de

competência, ou de estrutura, ou procedimentais são destinadas aos próprios

legisladores.28

26 Nery Jr., Nelson; Denari, Zelmo e. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: Comentado Pelos Autores do Anteprojeto. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária , 2001, p. 573.27 Ibid., mesma página.28 Ibid., p. 575 a 577.

50

Assim, o significado de normas abrange também atos menos

solenes, pois toda lei é norma jurídica, mas nem toda norma jurídica é lei, de

modo que norma é gênero da qual lei, portaria, resolução são espécies.

Vale dizer que os entes federativos podem baixar normas (leis,

decretos, portarias, resoluções, instruções normativas etc) e o fazem através

de seus órgãos e autarquias (Administração Indireta), respeitadas as devidas

competências e hierarquias.

O texto do § 2º que foi vetado possuía a seguinte redação: “as

normas referidas no parágrafo anterior deverão ser uniformizadas, revistas e

atualizadas, a cada dois anos”. A despeito do veto presidencial não podem os

entes políticos perder de vista o intuito do legislador de garantir uniformidade,

devendo os mesmos estar sempre atentos para as normas que editarem,

buscando sempre a concretização dos princípios fixados no Código.

O art. 55, § 3º, exige dos órgãos públicos, encarregados de fiscalizar

e controlar as relações de consumo, a manutenção de comissões permanentes

para elaboração, revisão e atualização das normas consumeiristas. Por uma

questão de equilíbrio, transparência, justiça e isonomia o § 3º também exige a

participação dos representantes dos fornecedores e consumidores (Ministério

Público, Associações, etc).

Face à constante e ágil mudança, atualização e criação de novos

métodos de fornecimento, oferta e contratação de produtos e serviços tornou-

se necessário manter comissões permanentemente ativas prontas a reagir a

qualquer tipologia nova de abuso seja por parte dos fornecedores ou

consumidores ou, por que não, aprovar novos métodos. Essas comissões

funcionam na esfera de cada competência em que atuam, respeitando as

devidas hierarquias verticais e horizontais.

Em sequência, podemos ver que o § 4º do art. 55 do CDC permite

que os órgãos oficiais expeçam notificações e requisitem informações aos

fornecedores no interesse dos consumidores, sob pena de desobediência.

Ora, não parece crível que tais órgãos destinados a fiscalizar e

controlar as relações de consumo não pudessem requisitar informações dos

51

fornecedores. Há aqui uma decorrência lógica da função de controlar e

fiscalizar, pois não se controla nem fiscaliza se não há informações. Por

conseqüência lógica também advém a pena de desobediência. Havendo

possibilidade, por parte dos fornecedores, de negar informações, sejam elas

quais forem, inviabilizaria a fiscalização e o controle.

Por outro lado há que se respeitar o segredo industrial, bem como

toda e qualquer informação que possa afetar o desempenho do fornecedor no

mercado de consumo relacionado ao segredo industrial, desde que

devidamente em consonância com a legalidade, respeitando assim os princípio

da harmonização das relações de consumo, da propriedade privada e da livre

iniciativa, além de outros.

Sendo a solicitação de informações, por parte do órgão oficial, não

atendida, fica sujeito o administrado às penas da lei pela sua recusa (multas

etc), cabendo ainda ao órgão prejudicado notificar o Ministério Público para que

se apure eventual crime de desobediência.

Nesse sentido esclarece a Prof. Cláudia Lima Marques29:

“Ao cominar a pena de desobediência ao descumprimento das

notificações administrativas, o legislador procurou resguardar o

exercício do poder de polícia de defesa do consumidor. ...O titular do

órgão prejudicado, pela desobediência, deverá oficiar ao Ministério

Público para que este tome as devidas providências”.

Percebemos que o CDC e o decreto que o regulamenta estão em

perfeita consonância com a CF de 1988, tanto no que diz respeito à questão

material como a processual. As regras e os princípios norteadores

constitucionais e legais são suficientemente claros e determinam claramente as

devidas competências hierárquicas, de fiscalização e de controle da atividade

destinada ao fornecimento de produtos e serviços aos consumidores.

29 Lima Marques, Claudia; V. Benjamim, Antonio Herman; Miragem, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor: arts. 1 a 74: aspectos materiais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003, p.739.

52

Por todo o exposto, nota-se que através das normas gerais contidas

no Capítulo VII do CDC e das normas que o regulamenta presentes no Dec.

2.181/97, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios já possuem o

aparato legislativo necessário para controlar, fiscalizar e apurar as infrações

administrativas, bem como aplicar as sanções cabíveis.

Entretanto, ainda falta uma certa organização quanto à

aplicabilidade prática desse aparato.

Determinado o cenário econômico, os princípios norteadores das

sanções administrativas, as competências para fixar normas gerais e

específicas, passemos a analisar as sanções administrativas insculpidas nos

artigos 56 a 60 do CDC e 18 e seguintes do Decreto 2.181/97.

53

CCAPÍTULOAPÍTULO 4 4

SANÇÕES ADMINISTRATIVAS NO CDC E NO DECRETO

2.181/1997

CCONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES I INICIAISNICIAIS

Verificamos que com a nova política econômica de regulação ou

desregulação (como alguns preferem) toma forma um “novo” sistema

capitalista, mais especializado e descentralizado, exercitado através das

concessionárias, fiscalizados por Agências Autárquicas e órgãos

hierarquicamente subordinados, mas autônomos, em relação ao Estado.

Quando nos referimos ao sistema capitalista, estamos fazendo

menção não só ao sistema adotado no decorrer da história, mas também ao

modo de produção da vida social.

Esta novíssima forma de gerir a vida econômica ganhou grande

impulso após 1995 e necessita ter mecanismos de coerção para poder

efetivamente atuar, fiscalizar e exigir dos fornecedores de produtos e serviços o

respeito às regras coerentes, formalmente justas e dignas.

Independentemente da responsabilidade civil ou penal, decorrente

de fatos que componham suporte qualificável como infração civil ou penal,

prevê o CDC e o Decreto 2.181/97 a possibilidade de imposição de sanções

administrativas àquelas condutas que venham a infringir normas de defesa do

consumidor e não só as elencadas nos Artigos 12, 20 e 22 do Decreto 2181/97,

onde o rol é exemplificativo e não taxativo.

4.1 – INFRAÇÕES ÀS NORMAS DE DEFESA DO CONSUMIDOR

No início de nosso trabalho expusemos, em linhas gerais, o objetivo,

a finalidade da lei, do direito posto. Mas a lei por si só nada significa se não

considerada e inserida num determinado contexto fático de aplicabilidade à

realidade.

Não podemos nos esquecer que nosso estudo trata da dicotomia

Consumidor / Fornecedor, Empresas (na sua maioria) / Clientes e nesse

sentido nosso ordenamento jurídico possui uma gama enorme de leis

(legislações), as quais se aplicam diretamente e indiretamente a essa

dicotomia. Falamos de dicotomia, pois um não existe sem outro. Impossível

falarmos de fornecedor (todo e qualquer tipo, seja empresa, indústria,

comércio, sociedade civil, profissional autônomo etc) sem mentalizarmos o

outro pólo, o consumidor.

É trabalho árduo do operador do direito harmonizar de maneira

lógica e sistêmica todas as legislações que tratam do assunto.

Tanto o CDC quanto o Decreto 2181/97 fazem menção a normas de

defesa do consumidor e não especificamente a uma lei ou outra. Ora, o que

vem a ser norma de defesa do consumidor?

Nosso legislador, como em muitos países, possui uma linguagem

técnica e devido à grande heterogeneidade de nossas casas legislativas,

peculiar de um sistema de governo democrático (médicos, advogados,

operários etc) torna-se impossível um pré-ordenamento lógico e sistêmico da

legislação que ingressa em nosso sistema, ainda mais levando-se em conta a

necessidade e rapidez com que são elaboradas e aprovadas; não obstante as

diversas comissões técnicas responsáveis pela observância da juridicidade nas

diversas esferas.

Considerando uma acepção ampla do significado da palavra

“Legislador” devemos enfatizar que se inclui no significado não só os membros

das casas legislativas, as manifestações emanadas do poder judiciário (além

de outros), mas também as disposições emanadas das Autarquias que tem o

dever legal de “administrar”, fiscalizar e controlar a produção de produtos e

serviços de determinada área de nossa economia.

55

Nesse sentido, como já salientado, é importante frisar que existe

uma hierarquia entre as diversas tipologias de legislações, sendo considerada

a Lei maior a CF 1988. O CDC, assim como qualquer outro tipo de legislação

deve estar em consonância com a CF de 1988. Exemplificadamente, o Decreto

2181/97 deve estar em perfeita consonância com o CDC e as portarias,

resoluções e decisões tomadas pelas autarquias devem estar em conformidade

com esses diplomas. Ressalte-se que cada Autarquia, como já citado, foi

instituída por uma lei que deve obedecer e estar em perfeita harmonia com a

Constituição Federal, com o Código de Defesa do Consumidor e com o decreto

2181/97, sendo que, havendo confronto com a Constituição Federal e / ou o

Código de Defesa do Consumidor, estes últimos prevalecerão sob pena de

desvirtuamento do sistema jurídico adotado.

Tal posicionamento é deveras claro, pois é a base de nosso sistema

jurídico a Dignidade da Pessoa Humana que engloba a vida em todas as suas

formas, sendo que essa vida deve ser digna, ou seja, observar as

necessidades de cada pessoa humana no que tange a saúde, segurança,

alimentação, vestuário, moradia etc; todos direitos insculpidos no art. 6º da CF

de 1988. Direitos estes que o CDC respeita e protege e, portanto, não podem

ser violados em hipótese nenhuma sob pena de descumprimento do objetivo

maior.

Assim, entendemos por Norma o significado que colhemos e damos

ao texto objetivo da lei harmonizado preferencialmente e prevalente na CF de

1988 e no CDC se não harmonizados, por serem estes princípios a serem

seguidos por outras normas.

O art. 18 do decreto 2181/97 é claro e fornece o supedâneo de

sustentação à nossa assertiva ao dispor que: “A inobservância das normas

contidas na Lei no 8.078 de 1990, e das demais normas de defesa do

consumidor constituirá prática infrativa e...”

Ora, ele mesmo reconhece a existência de outras normas de defesa

do consumidor, e sendo o CDC derivado de mandamento constitucional e

sendo a defesa do consumidor um direito fundamental (art. 5º CF 1988) e

sendo também um dos princípios a serem observados pela Ordem Econômica

56

(Art. 170, inc. V da CF 1988) claramente podemos abstrair, sem sombra de

dúvida, a existência de um Direito Constitucional do Consumidor.

Desse modo, normas de defesa do consumidor são todas as

disposições destinadas à proteção do consumidor, estejam elas previstas em

lei ou emanadas de órgãos autárquicos, desde que em perfeita consonância

com a CF 1988 e com o CDC, respeitando a hierarquia do sistema jurídico de

que fazem parte.

4.2 – ARTIGO 56 E 57 DO CDC E O DECRETO 2.181/97

Após o art. 55 do CDC fixar as competências verificaremos quais

são os tipos de sanções previstas pelo CDC e pelo Decreto 2.181/97.

Art. 56 do CDC:

“As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas,

conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem

prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas

específicas:

I-multa;

II - apreensão do produto;

II - inutilização do produto;

IV - cassação do registro do produto junto ao órgão competente;

V - proibição de fabricação do produto;

VI - suspensão de fornecimento de produtos ou serviço;

VII - suspensão temporária de atividade;

VIII - revogação de concessão ou permissão de uso;

IX - cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;

X - interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de

atividade;

XI - intervenção administrativa;

XII - imposição de contrapropaganda.

57

Parágrafo único. As sanções previstas neste artigo serão aplicadas

pela autoridade administrativa, no âmbito de sua atribuição, podendo

ser aplicadas cumulativamente, inclusive por medida cautelar

antecedente ou incidente de procedimento administrativo.”

Art. 18 do Decreto 2.181/97:

“A inobservância das normas contidas na Lei no 8.078 de 1990, e

das demais normas de defesa do consumidor constituirá prática

infrativa e sujeitará o fornecedor às seguintes penalidades, que

poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, inclusive de

forma cautelar, antecedente ou incidente no processo administrativo,

sem prejuízo das de natureza cível, penal e das definidas em

normas específicas:

 I - multa;

II - apreensão do produto;

III - inutilização do produto;

IV - cassação do registro do produto junto ao órgão competente;

V - proibição de fabricação do produto;

VI - suspensão de fornecimento de produtos ou serviços;

VII - suspensão temporária de atividade;

VIII - revogação de concessão ou permissão de uso;

IX - cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;

X - interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de

atividade;

XI - intervenção administrativa;

XII - imposição de contrapropaganda.

§ 1º Responderá pela prática infrativa, sujeitando-se às sanções

administrativas previstas neste decreto, quem por ação ou omissão

lhe der causa, concorrer para sua prática ou dela se beneficiar.

 § 2º As penalidades previstas neste artigo serão aplicadas pelos

órgãos oficiais integrantes do SNDC, sem prejuízo das atribuições

58

do órgão normativo ou regulador da atividade, na forma da

legislação vigente.

 § 3º As penalidades previstas nos incisos III a XI deste artigo

sujeitam-se a posterior confirmação pelo órgão normativo ou

regulador da atividade, nos limites de sua competência.”

Nota-se que o art. 56 do CDC e o 18 do decreto elencam diversas

espécies de sanções, as quais “foram divididas e classificadas em três

grupos30”:

a) sanções pecuniárias;

b)sanções objetivas; e

c) sanções subjetivas

Mais adiante apresentaremos uma outra classificação, semelhante,

possível, disposta pela própria estrutura dos artigos no CDC.

Caracterizam-se como sanções pecuniárias aquelas impostas ao

infrator no inciso I - pena de multa. Aplica-se a sanção de multa às infrações

contidas nos artigos 12, 20 e 22 do Decreto 2.181/97 além de outras que por

exclusão não se encaixarem na previsão dos arts. 58, 59 e 60 do CDC.

O art. 57 do CDC prevê aplicação da multa mediante processo

administrativo, assegurado ampla defesa e contraditório, conforme prevê nossa

Carta Magna em seu Art. 5º, inciso LV:

Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos

acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla

defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

30 Nery Jr., Nelson; Denari, Zelmo e. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: Comentado Pelos Autores do Anteprojeto. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária , 2001, p. 581 a 582.? Lima Marques, Claudia; V. Benjamim, Antonio Herman; Miragem, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor: arts. 1 a 74: aspectos materiais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003, p.756.

59

Prevê o art. 57 ainda que a graduação será conforme a gravidade da

infração, a vantagem auferida e condição econômica do fornecedor. Tal

valoração, entretanto é subjetiva e discricionária por parte da autoridade que

autua.

Assim podemos observar da decisão abaixo colacionada, “in verbis”31

(grifos nossos):

Critérios para determinação da sanção de multa - Aplicação pela

autoridade administrativa.

Consta dos autos denúncia contra a GTAL, por motivo de uso do

serviço de telefonia de prefixo 0300 para a venda e reserva de

passagens aéreas, sem informar ao cliente que estava sendo cobrada

uma tarifa de R$ 0,27 (vinte e sete centavos) por minuto sobre a

ligação telefônica, para apuração de suposta infração aos arts. 6.°,

III, e 30 da Lei 8.078/90. Após conclusão das investigações

preliminares, este departamento instaurou processo administrativo

contra a representada por infração aos arts. 6.°, III, e 31 da Lei

8.078/90. A representada apresentou defesa (fls 06/08), alegando, em

síntese, que oferece um serviço gratuito de atendimento ao

consumidor através do prefixo 0800, para dirimir eventuais

reclamações e anotar as sugestões efetuadas pêlos consumidores e

utiliza o serviço de prefixo 0300 apenas para venda e reserva de

bilhetes aéreos. Afirma, ainda, que o custo do serviço de venda e de

reserva é ampla e diretamente proporcional à quantidade de

propaganda veiculada, na medida em que todo o material utilizado

com esta finalidade contém expressamente o mencionado valor

cobrado por minuto. Notificada novamente por esse Departamento

para prestar informações sobre a quantidade de bilhetes vendidos

sem a informação adequada de seus custos ao consumidor, a

31 Lima Marques, Claudia; V. Benjamim, Antonio Herman; Miragem, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor: arts. 1 a 74: aspectos materiais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003, p.773-74.

60

representada informou, à fl 69: "A informação da cobrança da tarifa

de 0,27 (vinte e sete centavos) começou a ser efetivamente fornecida

pelo telefone ao usuário que procedesse à ligação para o serviço

0300 a partir da data de 11 de setembro de 2001. Até a data de 11 de

setembro de 2001 foram vendidos pelo serviço 0300, isto é, no

período em que não era fornecida a informação pelo telefone de que

aquele serviço estava sendo tarifado, o total de 411.085 bilhetes,

incluindo-se nesse número o total do mês de setembro, e não apenas

até o dia 11 de setembro". Dessa forma, não há como invalidar o

enquadramento da conduta da representada aos dispositivos

supracitados, porquanto ela omitiu importante dado do serviço,

referente a seu custo. Tal informação é essencial e relevante por ter

o condão de influenciar decisivamente no juízo de escolha do

consumidor. É imperativo que seja influído um juízo exato ao

consumidor relativamente aos aspectos de preço, eis que o objetivo da

Lei 8.078/90 é o de protegê-lo na fase pré-contratutal, quando

somente a informação transparente proporciona o consumo livre e

consciente. Com efeito, deixou a representada de prestar

adequadamente uma imprescindível informação pré-contratual,

relativa ao custo do serviço. Portanto, não houve o cumprimento do

seu dever de informar. A falta de informação adequada implica clara

lesão ao direito fundamental do consumidor: o de informação,

previsto no art. 6.°, III, e no art. 31 da Lei 8.078/90. Acolho, pois, a

nota da Coordenação Geral de Assuntos Jurídicos do DPDC, cujos

fundamentos de fato e de direito passam a fazer parte integrante

dessa decisão, nos termos do § l.° do art. 50 da Lei 9.784/99. Assim,

considerando a gravidade e a extensão da lesão causada a milhares

de consumidores em todo o país, a vantagem auferida e a condição

econômica da Representada, empresa de grande porte e poder

econômico (art. 57 do CDC), a ocorrência das hipóteses elencadas

no art. 26 do Dec. 2.181/97, VI (ocasionar a prática infrativa dano

coletivo), e art. 25,11 (ser o infrator primário) e III (ter o infrator

adotado as providências pertinentes para minimizar ou de imediato

reparar os efeitos do ato lesivo), determino a aplicação da multa

61

pecuniária em desfavor da empresa GTAL, no valor de R$ 97.626,60

(noventa e sete mil, seiscentos e vinte e seis reais e sessenta

centavos), devendo tal importância ser depositada em favor do Fundo

de Defesa dos Direitos Difusos; à conta do Banco do Brasil S/ A, n.

170.500-8, Agência 3602-1, Código 200107.20905.003-X, consoante

determina o art. 29 do Dec. 2.181/97. Intime-se a representada para,

querendo, apresentar recurso no prazo estabelecido pelo art. 49 do

Dec. 2.181/97. Determino, por fim, a expedição de ofício, nos termos

do art. 106 da Lei 8.078/90, aos Ministérios Públicos, com cópia da

presente decisão, para conhecimento e providências que entenderem

pertinentes, aos PROCONS estaduais e municipais das capitais e

Fórum das Entidades Civis de Defesa do Consumidor, para

conhecimento. Publique-se (Decisão da Diretora 7/2002 - PA MJ /

SDE / DPDC 08012.004398/2001-15 - Representante: DPDC Ex

Officio - Representada: Gol Transportes Aéreos Ltda. - Decisão:

23.09.2002).

Nesse ponto, encontra a sanção algumas limitações importantes,

sendo uma delas a sobrevivência do fornecedor, sua continuidade no mercado,

bem como sua boa-fé e intenções. Entendemos que a multa não pode ser de

tal vulto que inviabilize a continuidade do negócio o que seria mais danoso

ainda. Na prática essa avaliação é de extrema dificuldade ficando, num

primeiro momento, a cargo da autoridade que aplica a sanção a escolha dos

critérios para fixar o valor.

O art. 17 do Decreto 2.181/97 diz que as penalidades são

classificadas em leves (só possuem circunstâncias atenuantes) e graves

(possua circunstâncias agravantes, mesmo que haja atenuantes).

O art. 24 do decreto 2.181/97 ainda determina que se leve em conta

as atenuantes e agravantes, a primariedade (não sendo primário é agravante),

e as providências tomadas pelo fornecedor para minimizar as repercussões e /

ou reparar o ato lesivo. E os arts. 25 e 26 do Decreto 2.181/97 elencam,

62

respectivamente o que se consideram atenuantes e agravantes, de modo que,

data vênia, é quase impossível não se enquadrar em nenhuma circunstância

agravante, sendo a primeira delas a reincidência. O art. 27 do Decreto 2.181/97

considera reincidência qualquer repetição de prática infrativa, ou seja, qualquer

ato que atente contra as regras das relações de consumo.

O Procon de São Paulo32 utilizando o caráter geral do decreto

2.181/97 baixou a Portaria nº 6 de 14 de Junho de 200033, na qual Dispõe

sobre os critérios de fixação dos valores das penas de multa nas infrações ao

Código de Defesa do Consumidor.

Diz a portaria no caput do artigo 6º:

“Em função da natureza da infração, vantagem auferida e condição

econômica do infrator, os limites mínimo e máximo para a pena serão

calculados em UFIR para cada situação por meio das fórmulas abaixo:

Pmáx = 3 PmínondePmáx = pena máxima em UFIR;Pmín = pena mínima em UFIR;fn = fator de natureza da infração;fv = fator de vantagem auferida; er = receita mensal média em UFIR.”

O órgão de defesa do consumidor tenta colocar de forma mais

objetiva e aferível a quantificação da pena de multa (principal sanção por ele

aplicada) considerando o mais amplamente possível as infrações e suas

circunstâncias atenuantes e agravantes, respeitando o que os limites que

acima expusemos – continuidade da empresa no mercado. Nesse sentido a

portaria prevê um desconto de até 60% se o pagamento ocorrer em 30 dias da

notificação pessoal ou da juntada do AR no auto de infração (§ 3º do Art. 6º da 32 Portaria retirada do Site do Procon de São Paulo: http://www.procon.sp.gov.br .33 Anexo 2 – Portaria nº 06/2000 do Procon de São Paulo / SP.

63

portaria). É possível parcelar em até 24 meses com pagamento mínimo de R$

500,00, conforme preceitua a Portaria nº 4/99 do mesmo órgão.

O parágrafo único do Art. 56 do CDC e do artigo 22 do decreto

2.181/97 prevêem a possibilidade de cumulação da multa com as outras

sanções previstas no caput do art. 56 do CDC e art. 18 do decreto.

O § 2º e 3º do art. 18 do decreto estabelecem limites à aplicação das

sanções em favor das agências reguladoras e estipulam ainda que há

possibilidade de aplicação cumulativa das sanções entre os entes federativos.

A cumulação é perfeitamente possível e todos os entes federativos,

através de seus órgãos, podem aplicar as sanções previstas no CDC e decreto

2.181/97 e no caso da multa cobrar seus devidos valores, lembrando que isso

só será possível quando se tratar de multa e apreensão de produtos (incisos I II

e XII do Art. 56 CDC e art. 18 do decreto), pois o § 3º do art. 18 limita a

aplicação das outras sanções previstas nos incisos seguintes às agências

reguladoras.

No caso de várias pessoas jurídicas de direito público distintas

instaurarem processos administrativos caberá ao DPDC – Departamento de

Proteção e Defesa do Consumidor, por força do parágrafo único do Art. 5º do

Decreto 2.181/97, dirimir a questão e se pronunciar sobre qual competência

prevaleceria, podendo haver, ainda assim, cumulatividade de infrações

diferentes ou iguais (várias multas), por se tratar, por exemplo de vários tipos

de danos ou de várias regiões geográficas.

A questão relativa ao excesso de punições, ou como alguns

preferem, a ocorrência de “bis in idem”, que uma empresa pode sofrer dada à

possibilidade de vários órgãos nas diversas esferas administrativas atuarem,

deverá ser verificada no caso concreto, não comportando aqui verificarmos

todas as possibilidades de ocorrência. Contudo, tal cumulação excessiva ou

não é possível, pois, podem ocorrer diversas circunstância e fatos (mesmo fato

ou fatos diferentes) que afetem uma única área ou coletividade ou várias áreas

e várias coletividades, causando um único dano ou vários danos (mais de um)

e de diversos tipos (patrimonial, moral, estético, à imagem). Ressaltamos que a

64

imposição de sanções deve sempre respeitar a capacidade de sobrevivência e

continuidade no mercado de cada empresa, desde que sua retirada do

mercado não seja a melhor e mais acertada medida.

A destinação da penalidade pecuniária é o Fundo de Defesa dos

Direitos Difusos previsto na Lei 7.347/85 – Lei da Ação Civil Pública:

Art. 1º

“Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação

popular, as ações de responsabilidade por danos morais e

patrimoniais causados34:

I - ao meio ambiente;

II - ao consumidor;

III - a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e

paisagístico;

IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;

(inciso acrescentado pela Lei 8078 de 11 de setembro de 1990)

V - por infração da ordem econômica e da economia popular;

(Inciso acrescentado pela Lei nº 8.884 de 11.06.94).

VI – à ordem urbanística; ”

Art. 13

“Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano

causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou

por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o

Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus

recursos destinados à reconstituição dos bens lesados.”

Este Fundo de Direitos Difusos – FDD – foi regulamentado pelo

Decreto 1.306 de 09 de Novembro de 1994 e tem por finalidade a reparação

dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de

valor artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico, por infração à ordem

34 Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11/06/94.

65

econômica e a outros interesses difusos e coletivos (Art. 1º do Decreto). O

fundo é gerido de forma colegiada (Ministério Público, Entidades Civis,

Membros dos Órgãos Federais) pelo CFDD – Conselho Federal de Direitos

Difusos.

Havendo previsão de cumulatividade de aplicação da multa entre os

entes federativos (§ 2º e 3º do Decreto 2181/97), há, logicamente, possibilidade

de se reverter os recursos apurados através dessas sanções aos Fundos

Estaduais e / ou Municipais, que já existem há tempo.

O Decreto 2181/97 prevê a existência desses fundos Estaduais e

Municipais, bem como a possibilidade de reverter os valores arrecadados a

título de multa a eles:

Art. 29

“A multa de que trata o inciso I do art. 56 e caput do art. 57 da Lei nº

8.078, de 1990, reverterá para o Fundo pertinente à pessoa jurídica

de direito público que impuser a sanção, gerido pelo respectivo

Conselho Gestor.

Parágrafo único - As multas arrecadadas pela União e órgãos

federais reverterão para o Fundo de Direitos Difusos de que tratam a

Lei nº 7.347, de 1985, e Lei Nº 9.008, de 21 de março de 1995,

gerido pelo Conselho Federal Gestor do Fundo de Defesa dos

Direitos Difusos - CFDD.”

Art. 30

“As multas arrecadadas serão destinadas ao financiamento de

projetos relacionados com os objetivos da Política Nacional de

Relações de Consumo, com a defesa dos direitos básicos do

consumidor e com a modernização administrativa dos órgãos

públicos de defesa do consumidor, após aprovação pelo respectivo

Conselho Gestor, em cada unidade federativa.”

Art. 31

66

“Na ausência de Fundos municipais, os depositados no Fundo do

respectivo Estado e, faltando este, no Fundo federal.

Parágrafo único - O Conselho Federal Gestor do Fundo de Defesa

dos Direitos Difusos poderá apreciar e autorizar recursos para

projetos especiais de órgãos e entidades federais, estaduais e

municipais de defesa do consumidor.”

Art. 32

“Na hipótese de multa aplicada pelo órgão coordenador do SNDC

nos casos previstos pelo art. 15 deste Decreto, o Conselho Federal

Gestor do FDD restituirá aos fundos dos Estados envolvidos o

percentual de até oitenta por cento do valor arrecadado.”

Como exemplo citamos o caso do acidente radiológico com a bomba

de Césio 137, ocorrido em Goiânia, capital de Goiás, no mês de setembro de

198735.

O Ministério Público Federal – MPF – e o Ministério Público Estadual

de Goiás – MPE – ingressaram, em litisconsórcio ativo facultativo, pleiteando

indenização em dinheiro a ser revertida para o Fundo Estadual do Meio

Ambiente. O juiz que julgou a causa, mesmo não havendo pedido expresso

negou essa destinação corrigindo-a para o FDD – Fundo de Defesa dos

Direitos Difusos, previsto na Lei 7.347/85. Assim se pronunciou o magistrado

da 8ª Vara Federal- SJGO, “in verbis” (grifos nossos):

“...A) Preliminarmente

          As preliminares suscitadas pelos Réus, atinentes à inépcia da

inicial e à ilegitimidade passiva, já foram rebatidas na decisão

saneadora de fls. 5.827/5.836, o que dispensaria, nos termos do art.

471 do CPC, nova apreciação judicial.

35 O inteiro teor da Sentença pode ser encontrado no Site http://www1.jus.com.br/pecas/texto.asp?id=292, acessado em Março de 2004.

67

Contudo, algumas questões de ordem pública merecem ser reagitadas

(art. 267, §3º, do CPC).

A.1) Dos pedidos de indenização em dinheiro.

Consoante lê-se às fls. 26/27, a exordial veicula pedidos de

condenação ao pagamento de quantia certa a serem revertidos ao

Fundo Estadual do Meio Ambiente.

Acontece que, nos termos do art. 13 da Lei 7.437/85, regulamentado

pelo Decreto 1.306/94, a correta interpretação do pedido faz com que

o destino das quantias provenientes da eventual condenação seja o

FUNDO DE DEFESA DE DIREITOS DIFUSOS, ainda que não

haja pedido expresso nesse sentido, como aconteceu com o Réu

AMAURILLO MONTEIRO DE OLIVEIRA.

Ressalto que a correção dessa deficiência da inicial resume-se a

aspectos meramente acidentais do pedido (fundo ao qual serão

revertidos os valores). Desse modo, em caso de procedência do

pleito, a sentença não poderá ser taxada de extra petita, pois a

violação ao art. 460 do CPC pressupõe alteração do pedido em face

de sua original natureza (mantida condenatória), quantidade

(também inalterada) ou objeto (que remanesce como de entrega de

quantia certa).

...

Ação Civil Pública , Processo Nº 95.8505-4, Sentença

Prolatada em 17/03/2000.

O parágrafo único do artigo 57 do CDC prevê que a multa será

calculada em UFIR – Unidade Fiscal de Referência -, contudo ela não mais é

utilizada desde 26/10/2000 quando foi extinta pela MP – Medida Provisória –

1.973-67. Já prevendo este acontecimento o parágrafo único do art. 57 do CDC

possibilita, “in fine” a substituição de tal índice. Contudo alguns Procon´s ainda

continuam utilizando-a como referência de valor (congelado em R$ 1,0641) nas

infrações apenadas com multa.

As sanções objetivas, determinadas pelos incisos II a VI consistem

em providências concretas que buscam preservar o consumidor quanto a

68

eventuais riscos decorrentes do fornecimento dos produtos ou serviços. Estas

sanções têm por finalidade também a retirada do mercado, em caráter

temporário ou permanente, os produtos ou serviços que exponham o

consumidor a risco, em razão de defeitos ou vícios, cuja comercialização

caracterizem infrações as normas de proteção do consumidor. Estas sanções

são aplicadas mais freqüentemente buscando a preservação da saúde,

segurança e vida do consumidor.

As sanções subjetivas dizem respeito aos incisos VII a XII e incidem

na atividade do fornecedor em caráter provisório ou definitivo. Dizem respeito

ao processo produtivo ou de fornecimento de serviços, cuja licitude em face

das normas do CDC autoriza aplicação da sanção. Cabe ressaltar a

peculiaridade do inciso XII que impõe uma obrigação de fazer, um

comportamento ativo, no sentido de promover publicidade verdadeira. Estas

sanções objetivam afastar temporária ou definitivamente o fornecedor que

mantém conduta ilícita capaz de prejudicar o consumidor. Reconhece-se,

assim, o caráter preventivo e repressivo da aplicabilidade da sanção.

O parágrafo único do Art. 56 do CDC prevê a aplicação de sanções

cautelarmente, incidentemente no processo administrativo ou não como forma

de prevenção e obrigação de adequação do fornecedor a determinadas

condições. Tal previsão encontra embasamento no art. 45 da Lei 9.784/1999

que trata de risco iminente e no art. 6º VI do CDC. O exemplo mais conhecido

é o Recall (Portaria 789/2001 Ministério da Justiça36).

O requisito da cautelar, todavia, será a demonstração do risco de não

aproveitamento da atuação administrativa em razão do decurso do tempo até a

execução da futura decisão do processo. Este risco deve ser demonstrado de

alguma forma na justificativa da medida cautelar (perícia, presunções,

documentos etc), que pode se dar tanto na instauração do processo quanto em

qualquer das fases do seu desenvolvimento — sobretudo na hipótese do

aparecimento de risco durante o desenvolvimento, que justifique decisão

incidental.

36 Anexo 3 - Portaria 789/2001 – Ministério da Justiça - Recall

69

Assim, a motivação do ato que determina ao fornecedor a adoção

destas previdências é considerada condição da sua validade, justificando de modo

racional e razoável a adoção imediata de tais medidas. Esta justificativa está

submetida ao crivo de legalidade da própria Administração e do Poder Judiciário,

que devem analisar sua adequação, sobretudo às garantias dos administrados.

Já a contrapropaganda objetiva retificar e / ou restabelecer a verdade

em relação a uma publicidade enganosa ou abusiva. Não é nosso objetivo

discorrer detalhadamente sobre publicidade, mas é necessário e oportuno no

mínimo sabermos que existe diferença entre propaganda e publicidade, certo que

trataremos de publicidade.

4.2.1 – A CLASSIFICAÇÃO DAS SANÇÕES NO CDC -

CONSIDERAÇÕES

Não obstante à classificação das sanções administrativas no CDC

ora apresentadas pela doutrina dominante: Sanções Pecuniárias, Objetivas e

Subjetivas, o próprio CDC traz sua classificação. Consideremos os artigos 57,

58, 59 e 60.

O art. 57 do CDC trata das sanções pecuniárias.

O art. 58 do CDC elenca um 2º grupo de sanções, consistentes nos

incisos II a VI e VIII do art. 56 do CDC.

O art. 59, por sua vez, elenca um 3º grupo de sanções, previstas nos

incisos VII e IX a XI do art. 56 do CDC.

O art. 60 do CDC, assim como o art. 57, isoladamente trata de

apenas uma sanção, a contrapropaganda, prevista no inciso XII do art. 56 do

CDC.

Desse modo o CDC já fez sua classificação, dividindo também em 4

grupos:

A) Sanções Pecuniárias – Art. 57 do CDC;

B) Sanções por Vício – Art. 58 do CDC;

70

C) Sanções por Defeito – Art. 59 do CDC, e

D) Contrapropaganda – Art. 60 do CDC.

A diferenciação das classificações apresentadas diz respeito à

questão do significado da infração de maior gravidade prevista no art. 59 do

CDC. Há duas possibilidades de entendimento sobre o significado de infração

de maior gravidade.

A primeira, considerada na primeira classificação, é objetiva

(prevista na lei de maneira exemplificativa, porém especifica) e refere-se às

circunstâncias agravantes contidas no art. 26 do decreto 2.181/97.

A segunda, considera maior gravidade a ocorrência de defeito,

considerado assim o que cause dano ao consumidor ou terceiros; mas não

todo tipo de dano e nem se poderá limitar sempre a aplicação da sanção à

reincidência, por conta, esta última, dos princípios e fundamentos

constitucionais de nossa Carta de 1988 que irradiaram o CDC.

Assim, inicialmente, é essencial ao nosso estudo conhecermos o

significado jurídico de defeito no CDC. Defeito para o CDC não significa o

simples mau ou não funcionamento de um produto ou serviço (isto para o CDC

é vício), de modo que entendemos o defeito como um “plus” além do vício, um

dano, ou seja, além de não funcionar ou não funcionar como deveria, o produto

ou serviço causa um dano que pode ser patrimonial, moral, físico ou a imagem

(este último em tese).

Desse modo, entendemos que havendo defeito (dano ao consumidor

ou terceiro), e portanto infração ao Código de Defesa do Consumidor (às

normas de proteção do Consumidor), haverá infração de maior gravidade.

O professor Rizzatto Nunes37 aborda o tema relativo ao defeito, “in

verbis”:

37 Rizzatto Nunes, Luiz Antonio. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Ed. Saraiva, 2000, p. 214-15.

71

“O defeito, por sua vez, pressupõe vício. Há vício sem defeito, mas

não há defeito sem vício. O vício é uma característica inerente,

intrínseca do produto ou serviço em si.

O defeito é o vício acrescido de um problema extra, alguma coisa

extrínseca ao produto ou ao serviço, que causa um dano maior que

simplesmente o mau funcionamento, o não funcionamento, a

quantidade errada, a perda do valor pago – já que o produto ou o

serviço não cumpriram o fim ao qual se destinavam. O defeito causa,

além desse dano do vício, outro ou outros danos ao patrimônio

jurídico material e / ou moral do consumidor.

Logo, o defeito tem ligação com o vício, mas, em termos de dano

causado ao consumidor, ele é mais devastador.

Temos, então, que o vício pertence ao próprio produto ou serviço,

jamais atingindo a pessoa do consumidor em outros bens seus. O

defeito vai além do produto ou do serviço para atingir o consumidor

em seu patrimônio jurídico, seja moral e / ou material. Por isso

somente se fala propriamente em acidente, e, no caso acidente de

consumo,, na hipótese de defeito, pois é aí que o consumidor é

atingido.”

Na mesma linha o professor Zelmo Denari, “in verbis”:

“A responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço decorre da

exteriorização de um vício de qualidade, vale dizer, de um defeito

capaz de frustrar a legítima expectativa do consumidor quanto à sua

utilização ou fruição....

Entende-se por defeito ou vício de qualidade a qualificação de

desvalor atribuída a um produto ou serviço por não corresponder à

legítima expectativa do consumidor, quanto à sua utilização ou

fruição (falta de adequação), bem como por adicionar riscos à

integridade física (periculosidade) ou patrimonial (insegurança) do

consumidor ou de terceiros.

Partindo desse conceito, um produto ou serviço é defeituoso quando

não corresponde à legítima expectativa do consumidor a respeito de

72

sua utilização ou fruição, vale dizer, quando a desconformidade do

produto ou serviço compromete a sua prestabilidade ou servibilidade.

Nesta hipótese, podemos aludir a um vício ou defeito de adequação do

produto ou serviço.

Por outro lado, um produto ou serviço é defeituoso, da mesma sorte,

quando sua utilização ou fruição é capaz de adicionar riscos à

segurança do consumidor ou de terceiros. Nesta hipótese, podemos

aludir a um vício ou defeito de segurança do produto ou serviço.

...

O código distingue dois modelos de responsabilidade: por vícios de

qualidade ou quantidade dos produtos e serviços e por danos

causados aos consumidores, ditos acidentes de consumo.”

Mas, para o infrator ser apenado com as sanções previstas no Art.

59 do CDC deverá ele incorrer em reincidência e nas infrações de maior

gravidade, ou seja, causar dano em reincidência (Art. 27 do Decreto 2.181/97).

Contudo, pode ainda o infrator ser apenado nos termos do Art. 59 do

CDC mesmo não ocorrendo reincidência. É o que se depreende do Art. 1º,

inciso III, Art. 5º, 6º e 170 da CF 1988, combinado com o Art. 4º, inciso I, Art.

6º, incisos I e VI do CDC, além de outros (estes são os principais).

Ora, o princípio de nossa sociedade é baseado na Dignidade da

pessoa humana; o CDC tem como direito básico preservar a vida e prevenir

danos, e a reincidência condiciona a aplicação da sanção a um acontecimento

danoso, o que não se coaduna com o sistema preventivo do CDC e da CF

1988. O órgão que vai aplicar as sanções previstas no Art. 59 do CDC e

também a revogação de concessão e / ou permissão de uso prevista no Art. 58

não pode primeiramente aguardar a morte de uma pessoa, ou uma intoxicação

para depois fechar um estabelecimento que vende produtos contaminados, por

exemplo.

Assim, a reincidência só será considerada como limitadora da

aplicação das sanções previstas no Art. 59 e 58 do CDC quando não houver

73

risco à saúde e / ou à segurança do consumidor ou terceiros (de qualquer um,

inclusive animais, dependendo do caso).

O art. 57 que trata das sanções pecuniárias diz que estas serão

graduadas conforme sua gravidade e o art. 26 do decreto 2.181/97 elenca o

que considera situações agravantes.

Essa graduação prevista no art. 26 do decreto, com o devido respeito

às posições contrárias, só se aplica à sanção pecuniária (art. 57 do CDC), até

porque será quase impossível o fornecedor não cometer uma infração

considerada grave ou de maior gravidade o que pode ensejar, em caso de

reincidência, a aplicação desmedida do artigo 59 do CDC, o que seria

demasiado penoso e desproporcional.

Além, imaginemos o caos que seria revogar licenças, alvarás e

concessões no caso do inciso IX do Art. 26 do Decreto 2.181/97 que prevê

circunstância agravante se o fornecedor praticar infração e se favorecer em

decorrência de grave crise. Quando que o nosso país não está em crise?

Levemos em consideração a responsabilidade objetiva, a inversão do

ônus da prova, a vulnerabilidade do consumidor e todas as circunstâncias em

que os fornecedores estão expostos (porque assim desejam. É livre o exercício

de qualquer atividade, mas essa liberdade traz consigo o risco de desenvolvê-

la). Realmente é quase impossível não incorrer em reincidência (mesmo

considerado o art. 27 parágrafo único do Decreto 2.181/97 que dispõe não

ocorrer reincidência depois de decorridos 5 anos da prática infrativa anterior).

O art. 59 do CDC, na sua parte final, menciona que estas infrações

de maior gravidade podem estar previstas no CDC ou em qualquer legislação

que trate de relação de consumo, o que importa considerar não só o Decreto

2.181/97.

Temos ainda no Decreto 2.181/97 os seguintes artigos que

interpretados nos conduzem a classificar da maneira que elegemos: Art. 12, 13,

18 § 3º, 22 parágrafo único, além de outros já citados.

74

Os artigos 12 e 13 do Decreto 2.181/97 elencam uma gama de

infrações intermináveis o que praticamente deixa o fornecedor sem saída, a

não ser cometer infração (considerando a cultura brasileira e a praxe do

mercado).

O art. 18, § 3º, por sua vez, determina que as infrações previstas no

art. 18 incisos III a XI, para terem eficácia, deverão ser confirmadas pelo órgão

regulador da atividade econômica. Há dois motivos para isso. O primeiro reside

no fato de que é o órgão regulador (Agências Reguladoras) o responsável pelo

controle (sentido amplo) da atividade; o segundo, diz respeito às medidas

sancionadoras previstas no art. 59 do CDC que são demasiadamente

constritivas e refletem na economia como um todo, além dos reflexos

internacionais. Tais sanções só poderão ser aplicadas após uma profunda

apuração que comprove a efetiva necessidade para a correção do desvio na

relação de consumo ou então preventivamente através de cautelar

administrativa nos casos de risco à saúde e/ ou à segurança do consumidor ou

terceiros sem se considerar a questão relativa à reincidência.

Ressalte-se que embora a revogação de concessão e permissão de

uso estejam inseridas no art. 58 do CDC (trata dos vícios) são medidas

extremas que só poderão ser aplicadas em casos de última necessidade (como

é o caso do art. 59 do CDC) quando não houver outro tipo de sanção que seja

coerente com a infração e seja capaz de corrigir o desvio.

Essa posição por nós adotada está em perfeita consonância com o

caráter geral38 do CDC ao tratar as sanções administrativas, reforçando assim

nossa idéia de que infração de maior gravidade é aquela que causa dano ao

consumidor, sendo a reincidência uma limitadora à aplicação dessas sanções

apenas no caso de dano patrimonial exclusivo.

Já o artigo 22 do Decreto 2.181/97 em seu parágrafo único dispõe

que nos casos dos artigos 12, 13 e do próprio 22 a pena de multa, dependendo

da graduação poderá ser cumulada com as outras previstas no mesmo

diploma, o que nos informa que a graduação serve não só para critério de

avaliação de imposição de sanção pecuniária, mas também serve como critério

38 Remetemos o leitor ao Capítulo 3, item 3.2 de nossa exposição.

75

de cumulatividade e não como critério de graduação das hipóteses dispostas

nos artigos 58 a 60 do CDC, vistos que estes por si só se exaurem.

Cabe ressaltar que a parte final do art. 58 do CDC nos remete à

interpretação do arts. 6, 18 e 20 do mesmo diploma, os quais tratam dos vícios

de produtos e serviços.

Podemos entender, então, que o artigo 58 trata de infrações menos

graves na medida em que as sanções são aplicadas quando ocorrer vício (de

qualidade ou quantidade) por inadequação ou insegurança do produto ou

serviço (art. 18 e 20 do CDC – vícios de produto e serviço). Nesse sentido tem-

se que a pena de revogação de concessão e permissão de uso são muito

severas para as circunstâncias infrativas do art. 58 do CDC. Talvez o legislador

face à importância do fornecimento de determinados produtos e serviços

(serviços públicos, medicamentos, alimentos etc) as incluiu neste artigo de

maneira imprópria, mas com a melhor das intenções – a de prevenir.

Nas palavras de Celso Fiorillo39 encontram-se esclarecimentos sobre

vícios do produto e serviços. Vejamos, “in verbis” (grifos nossos):

“O Art. 18 diz respeito à responsabilidade solidária e, como regra,

objetiva dos fornecedores de produtos de consumo (tanto duráveis,

como não duráveis, terminologia absolutamente digna de desprezo na

ordem econômica do capitalismo, na medida em que todos os

produtos colocados no mercado de consumo pelos fornecedores não

são duráveis, via de regra) pelos vícios de qualidade (defeitos ou

mesmo imperfeições vinculadas aos atributos do produto,

distinguindo-os dos demais) ou pelos vícios de quantidade (defeitos

ou mesmo imperfeições vinculados à porção determinada ou mesmo

estimada do produto) que os tornem impróprios (que não diz respeito

aos atributos do produto) ou que os tornem inadequados (que não

estejam em conformidade no sentido de proporcionar a finalidade

39 O Professor Celso Antônio Pacheco Fiorillo realiza comentários ao Código de Defesa do Consumidor Eletrônico, da Revista Carta Maior - Informações Jurídicas que conta com o Desembargador Antonio Janyr Dall´Agnol como coordenador e também com a contribuição e comentários de Marcelo Gomes Sodré, Luis Antonio de Souza e Sérgio Porto.Texto retirado do Site http://cartamaior.uol.com.br/cartamaior.asp?coluna=cdc, acessado em Maio de 2004.

76

desejada) ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor.

Os fornecedores de produtos duráveis ou não respondem ainda de

forma solidária e objetiva pelos vícios de qualidade ou quantidade

que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo em

decorrência da disparidade (diferença ou mesmo dessemelhança) com

as indicações constantes do recipiente, embalagem, rotulagem,

mensagem publicitária, enfim, com toda e qualquer informação

necessária ao conhecimento do consumidor, observando-se, todavia,

as variações naturalmente vinculadas à natureza de todo e qualquer

produto”.

Desse modo, podemos também entender que as infrações do art. 59

do CDC que tratam de defeito (arts. 12 e 14 do CDC – Fato do produto ou

serviço) são mais graves que as do art. 58, o que convalida a posição de que

infrações de maior gravidade são aquelas que importem dano ao consumidor

ou terceiros, sendo que o dano, mesmo que potencial, à saúde e / ou à

segurança do consumidor e / ou terceiros será coibido com a aplicação das

sanções previstas no Art. 59 do CDC independente da ocorrência de

reincidência, conforme preceitua nossa Carta magna e o CDC.

Novamente, exigi-se, aqui, a presença de procedimento

administrativo assegurada a ampla defesa e contraditório, para a apuração de

práticas mais graves como as descritas no caput do art. 59 do CDC e aplicação

de suas referidas penalidades.

O procedimento é o também previsto no art. 33 e seguintes do

Decreto nº 2.181, de 20 de março de 1997. A questão referente ao processo

administrativo será tratada de maneira mais aprofundada adiante.

Importante dizer que o procedimento administrativo é previsto em

todas as situações, de modo a assegurar ampla defesa e contraditório nos

processos administrativos, em conformidade com a CF 1988 em seu art. 5º,

inciso LV, porém em alguns casos a aplicação da sanção só será efetivada

77

após o trânsito em julgado do processo administrativo e quiçá também após o

trânsito em julgado em processo judicial.

Para finalizar nossa posição em relação à aplicação e classificação

das sanções administravas (Pecuniárias, por Vício, por Defeito em reincidência

e Obrigação de Fazer - Contrapropaganda) há que se esclarecer uma questão

que aparentemente fica pendente.

Ora, se o art. 59 do CDC só é aplicável em caso de defeito e no que

tange ao dano patrimonial as sanções previstas neste diploma só poderão ser

impostas em caso de reincidência, qual sanção poderia ser aplicada no caso

de ocorrer defeito, dano patrimonial, e não incorrer em reincidência?

Sabemos que todo defeito enseja antes um vício. E sabemos que o

inverso não ocorre, um vício nem sempre enseja um defeito. Assim, quando

houver um defeito (fato que cause dano) nada impede que, nesses casos, seja

aplicada a pena de multa prevista no art. 56 inciso I e art. 57 ou, seja aplicada

as sanções do art. 58 ou, ainda, aplique-se o art. 60 do CDC, sempre

considerando o disposto no art. 18, § 3º do decreto 2.181/97 e a possibilidade

de cumulatividade das sanções.

Ademais na prática nenhum fornecedor perdeu sua concessão ou

permissão de uso por causar dano patrimonial ao consumidor ou terceiros, e

em alguns casos, nem causando dano à saúde ou à segurança do consumidor,

embora possam ter perdido alvará de licença, terem sido interditados etc em

decorrência de outras disposições legais que não o CDC e o decreto.

Temos que lembrar que nossa sociedade baseada no capitalismo,

num regime democrático de direito prevê a responsabilização de alguém por

ato danoso através de pecúnia primordialmente e nesse sentido todo dano

patrimonial pode ser restabelecido, mensurado e indenizado, guardadas as

devidas proporções.

Contudo o mesmo não ocorre quando o defeito causar dano à saúde

ou à segurança do consumidor e / ou terceiros. Como restabelecer o ”status

quo” de alguém que, por exemplo, perde um braço, uma perna, um dedo etc,

em um acidente de trânsito, numa das rodovias administradas por concessão

78

(considerando que o acidente ocorreu por responsabilidade da administradora,

o que acontece com certa freqüência em casos de má conservação, falta de

sinalização, de muros, de divisórias entre vias, de fiscalização etc)? Impossível

quantificar em dinheiro quanto vale um braço, perna, dedo etc. Nesses casos

em que não se pode restabelecer a condição anterior e refletindo na vida do

consumidor e / ou terceiros, a pecúnia apenas compensa, ameniza.

Ocorrendo tal acidente ou incidente a administradora, por exemplo,

não perde a concessão e indenizará (espontaneamente ou não) as vítimas.

De outro lado, a cassação e suspensão de atividade e a cassação

de alvará de funcionamento, são sanções que são aplicadas

independentemente do CDC e do decreto 2.181/97, pois previstas em outras

legislações pertinentes a cada caso em particular. Assim por exemplo o alvará

de funcionamento de casa noturna e as penalidades que são impostas pela aos

restaurantes e lanchonetes que estão sujeitos as leis Municipais 10.153/86

(prevê sanções administrativas de apreensão e inutilização) e Decreto

25.543/8840, além de outras.

Temos, portanto, pela análise do sistema jurídico considerado – CF

1988, CDC e Decreto 2.181/97 – quanto pela prática do dia a dia concluído que

as sanções previstas no Art. 58 do CDC, à exceção da revogação da

concessão ou permissão, se aplicam nos casos em que houver infração for por

vício de produto ou serviço ou por defeito (Fato do Produto ou Serviço) que

cause dano patrimonial e não recaia em reincidência. As sanções previstas no

Art. 59 do CDC, incluída aqui a revogação de concessão e permissão de uso

inseridas no art. 58 do CDC, serão aplicadas quando ocorrer prática infrativa

por defeito que cause dano à saúde e / ou à segurança do consumidor ou de

terceiros (incluído aqui o dano moral) mesmo que tal prática não seja

reincidente; e serão aplicadas também quando ocorrer dano patrimonial, mas

devendo incorrer a prática infrativa em reincidência. A reincidência vem limitar

a aplicação dessas sanções justamente por serem medidas extremas,

constritivas da livre iniciativa com reflexos na economia nacional, entretanto a

40 Apelação Cível nº 49.335-5/5 da Comarca de São Paulo / SP; 3ª Câm. Dir. Público do TJ / SP; decisão prolatada em 21/03/2000.

79

mesma livre iniciativa não pode sobrepujar a pessoa humana e sua dignidade,

já que a primeira existe em função da segunda.

4.3 – ARTIGO 58 DO CDC E O DECRETO 2.181/97

Este dispositivo tratará das sanções objetivas ou por vício, conforme,

respectivamente a primeira e segunda classificações, já que a polêmica refere-

se às sanções previstas no art. 59 do CDC.

Art. 58 do CDC:

As penas de apreensão, de inutilização de produtos, de proibição de

fabricação de produtos, de suspensão do fornecimento de produto

ou serviço, de cassação do registro do produto e revogação da

concessão ou permissão de uso serão aplicadas pela administração,

mediante procedimento administrativo, assegurada ampla defesa,

quando forem constatados vícios de quantidade ou de qualidade por

inadequação ou insegurança do produto ou serviço.

Também no art. 58 do CDC é garantido a ampla defesa e o

contraditório, contudo é possível apreensão de produtos como fase

preparatória de processo administrativo, ou seja, anterior a ele ou incidental, no

seu curso.

A apreensão de produtos, não pode, em regra, se submeter à

necessidade de prova dos riscos ou das características dos produtos que

determinem a possibilidade de prejuízo a saúde, segurança e vida do

consumidor. O fator tempo nesse caso é primordial. A Administração Pública,

através de seus órgãos autárquicos, tem o dever Constitucional e Legal de

preservar o interesse público e social no qual está inserida a proteção e defesa

do consumidor, assegurado também, como já vimos, pela CF de 1988.

Todavia, as providências urgentes ou cautelares eventualmente aplicadas,

consistentes na apreensão de produtos devem guardar os devidos princípios

da proporcionalidade, ponderação, bom senso e boa-fé, ressalvados os casos

de abuso os quais deverão ser apurados pelo poder judiciário mediante

80

provocação. Parte-se da premissa de que não havendo nenhuma

irregularidade com os produtos ofertados no mercado não há motivo para se

efetuar a apreensão, que se ilegal ou arbitrária, ensejará a devida indenização

material e / ou moral se houver, bem como a sanção penal prescrita na lei.

Há na verdade uma preferibildiade (princípio constitucional e

consumeirista) por parte do Poder Público em correr o risco de uma

arbitrariedade a omitir-se e causar dano à vida, à saúde ou a segurança do

consumidor que poderá ser, não apenas um indivíduo (o que por si só já

justificaria a apreensão), mas toda uma coletividade.

Nossa jurisprudência tem se posicionado no sentido de prevalecer,

nesses casos, o interesse público ao particular, “in verbis”:

“Apreensão de produto - Poder administrativo Cautela -Vigilância

Sanitária.

MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO - CONSTITUCIONAL

E ADMINISTRATIVO - AMEAÇA DE APREENSÃO DE

MEDICAMENTOS SUSPEITOS DE FRAUDE, COM SUSPENSÃO

DA AUTORIZAÇÃO DE FABRICAÇÃO - POLÍCIA SANITÁRIA -

PODER CAUTELAR ADMINISTRATIVO - SEGURANÇA

DENEGADA.

l. A Constituição Federal dá à Administração (Federal, Estadual e

Municipal) o poder de polícia, decorrente da supremacia geral do

interesse público sobre o privado, expressando-se em atos normativos

ou concretos, ora preventivos e ora repressivos, que condicionam a

liberdade e a propriedade dos indivíduos, impondo-lhes

coercivamente um dever de abstenção (nonfacere), a fim de

conformar-lhes os comportamentos aos interesses sociais

consagrados no sistema normativo.

2. Trata-se de um poder / dever de polícia que se manifesta em vários

setores da atividade social, inclusive no setor sanitário, devendo ser

81

exercido até cautelarmente, de forma antecedente ou incidental do

processo administrativo, à vista de fundada suspeita de ineficácia, por

erro ou fraude na fabricação de medicamentos, mesmo autorizados,

ao fito de coarctar possíveis efeitos nocivos à saúde humana e danos

à bolsa do consumidor (art. 196 da Constituição Federal c/c art. 8. "

do Dec. 79.094/77 e parágrafo único do art. 56 da Lei 8.078/90).

3. Segurança denegada

Decide a 1ª Turma, por maioria,vencido o Juiz Lindoval Marques de

Brito, dar provimento ao apelo da União, e à remessa oficial.

(TRF-1ª R. – 1ª T. - ApMS 96.01.15963-0/DF - Rel. Des. Lindoval

Marques de Brito - DJU 19.10.1998).”

Importante salientar que estamos tratando de direito pouco divulgado

e pouco utilizado, ainda; e nesse sentido transcrevemos parte do acórdão

(AMS 96.01.15963-0 / DF que tem como origem o processo nº 93.00.01116-2

da 5ª Vara do Distrito Federal), o qual não foi pacífico – houve voto vencido. Na

mesma linha um dos votos vencedores assim foi pronunciado41 (grifos

nossos), “in verbis”:

“...De outra plana, as medidas cautelares administrativas anunciadas

pela Vigilância Sanitária são decorrentes do Poder / Dever da Polícia

Sanitária, ante a comprovação preliminar, feita por órgão técnico,

especializado do Ministério da Saúde, de suspeita de fraude na

fabricação e ineficácia de medicamentos, mesmo registrados, e estão

autorizadas expressamente, quer pela Lei n° 6.360/76 e seu Decreto

Regulamentador de n° 79.094/77, como pelo Código do Consumidor,

Lei n° 8.078 de 11 de setembro de 1990, que têm a seguinte dicção:

Decreto n° 79.094/77

“Art. 8°. Como medida de segurança sanitária e à vista de razões

fundamentadas o órgão de vigilância sanitária competente do

41 Acórdão encontrado no Site http://www.trf1.gov.br/, acessado em 16/09/2004.

82

Ministério da Saúde poderá, a qualquer momento, suspender a

fabricação e venda de qualquer dos produtos de que trata este

Regulamento, o qual, embora registrado, se torne suspeito de ter

efeitos nocivos à saúde humana.”

Lei n° 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor)

“Art. 56. As infrações das normas de defesa do consumidor ficam

sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem

prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas

específicas:

I - multa;

II- apreensão do produto;

III- inutilização do produto junto ao órgão competente;

IV- cassação do registro do produto junto ao órgão competente;

V- proibição de fabricação do produto;

VI—suspensão de fornecimento de produtos e serviços;

VII- suspensão temporária de atividade;

VIII- revogação de concessão ou permissão de uso;

IX- cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;

X- interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de

atividade;

XI- intervenção administrativa;

XII- imposição de contrapropaganda

Parágrafo único. As sanções previstas neste artigo serão aplicadas

pela autoridade administrativa, no âmbito de sua atribuição, podendo

ser aplicadas cumulativamente, inclusive por medida cautelar

antecedente ou incidente de procedimento administrativo.”

E nem se diga que tais dispositivos são inconstitucionais, porquanto

estão eles em perfeita harmonia com o Poder de Polícia

Administrativa do Estado, garantido constitucionalmente, no caso

da saúde pública, pela norma do artigo 196 da Constituição Federal

de 1998, quando dispõe:

“Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido

mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco

83

de doença e de outros agravos e o acesso universal e igualitário às

ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.”

Sobre esse Poder de Polícia, leciona Celso Antônio Bandeira de Mello,

in Elementos de Direito Administrativo, págs. 245/246, que:

“Em face de todo o exposto, pode-se definir a Polícia Administrativa

como a atividade da Administração Pública, expressa em atos

normativos ou concretos, de condicionar, com fundamento em sua

supremacia geral e na forma da lei, a liberdade e a propriedade dos

indivíduos, mediante ação, ora fiscalizadora, ora preventiva, ora

repressiva, impondo coercitivamente aos particulares um dever de

abstenção (non facere) a fim de conformar-lhes os comportamentos

aos interesses sociais consagrados no sistema normativo.

A atividade de polícia envolve também atos fiscalizadores, através dos

quais a Administração Pública previamente acautela eventuais danos

que poderão advir da ação dos particulares.”

Sob o título “Setores da Polícia Administrativa”, continua o

publicista a sua lição (obra citada pág. 255)

“Polícia Sanitária, voltada à defesa da saúde pública e incidente em

vários campos, tais a polícia dos medicamentos, das condições de

higiene nas casas de pasto, dos índices acústicos toleráveis;”

Também o sempre lembrado Administrativamente Hely Lopes

Meireles, na sua obra clássica “Direito Administrativo Brasileiro,”

l8ª edição, pág. 126, pontifica sobre atuação da Polícia Sanitária:

“Em verdade, a polícia sanitária dispõe de um elastério muito amplo

e necessário à adoção de normas e medidas específicas, requeridas

por situações de perigo presente ou futuro que lesem ou ameacem

lesar a saúde e a segurança dos indivíduos e da comunidade. Por essa

razão, o Poder Público dispõe de largo discricionarismo na escolha e

imposição das limitações de higiene e segurança, em defesa da

população.”

84

Finalmente, comentando o Código de Defesa do Consumidor, sobre

os dispositivos acautelatórios, insculpidos no parágrafo único do art.

56, já transcritos, diz o professor Tupinambá Miguel Castro do

Nascimento:

“Há situações em que a urgência de aplicação de uma sanção

administrativa não se compatibiliza com a demora de um

procedimento administrativo para chegar à decisão final. A

apreensão de um produto deteriorado ou a sua fabricação, quando

possam representar prejuízos, por exemplo, à saúde do consumidor,

ou tem uma resposta sancionadora imediata ou nada significará de

proteção ao consumidor. A espera pelo término do procedimento

administrativo é, na verdade, cruzar os braços diante da infração. De

que adianta se determinar apreensão de produto com vício de

qualidade ou quantidade depois de ele ter sido comercializado,

traduzindo malefício ao consumidor ou a uma coletividade de

pessoas? A pronta resposta sancionatória é fundamental nestes

casos.

Toda cautelar, inclusive a administrativa, tem a finalidade de evitar

o perigo da demora da decisão final. Antecipa-se o julgamento

porque, se esperar o seu momento normal, a realização do direito,

ou da sanção, perde a importância, porque fica num plano

idealístico, simplesmente teórico, sem sentido prático. Suponha-se a

fabricação equivocada de produtos que, por falha em sua qualidade,

represente perigo à segurança do consumidor ou da coletividade de

pessoas que venha a adquiri-los. Uma decisão final no procedimento

administrativo pode encontrar a situação já consumada. Os produtos

já foram vendidos e até já causaram o malefício. De que adiantariam

as sanções de apreensão ou inutilização dos produtos, quando eles

não mais existem e já causaram o malefício aos consumidores? A

antecipação da sanção realiza satisfatoriamente o direito, o que não

aconteceria não havendo a antecipação.

(Aide Editora, 2 edição, 1991, págs. 125/126 e 128/129)”

85

Finalmente, como muito bem lembrou o representante do Ministério

Público de primeiro grau, na sua promoção de fls. 47/49 “a

autorização é modalidade do ato administrativo de permissão, que

não garante ao permissionário direito adquirido a mantê-lo”,

asseverando Hely L. Meirelles que a “autorização é ato

administrativo discricionário e precário”, por isso mesmo, “não há

qualquer direito subjetivo à obtenção ou à continuidade da

autorização, daí por que a Administração pode negá-la ao seu

talante, como pode cassar o alvará a qualquer momento sem

indenização alguma”. O mesmo ocorre com a permissão, que também

é deferida sempre em caráter precário (confira-se no autor, obra

citada, pág. 170/171).

Por esses fundamentos, resta claro que a anunciada ação

fiscalizadora da Secretaria de Vigilância Sanitária no presente caso,

longe de constituir-se em ameaça de ato ilegal e abusivo, capaz de

violar alegado direito líquido e certo do Laboratório Impetrante,

revela, isto sim, legítima e prudente atitude de proteção ao interesse

público, que não pode sofrer qualquer reparo pelo Poder Judiciário.

Eis os motivos pelos quais peço vênia ao Ilustre Juiz Relator para

dele divergir e, em conseqüência, dar provimento ao apelo da União

Federal e a remessa oficial para, reformando a sentença recorrida,

DENEGAR a ordem de segurança vindicada por NOVAQUÍMICA

LABOR S/A.

Custas ex lege. É como voto.”

Na mesma linha vêem atuando os Procon’s (órgãos de defesa do

consumidor), como é o caso da decisão do Procon de Minas Gerais42 em

29/11/2002, “in verbis” (grifos nossos):

“Procon Estadual apreende café impróprio para o consumo. Veja

aqui as decisões administrativas proferidas.

42 Decisão retirada do Site http://www.mp.mg.gov.br/procon/noticias/291129.htm, acessado em 20/10/2004.

86

AVISO PROCON ESTADUAL 094/2002

O Doutor Amauri Artimos da Matta, Promotor de Justiça do

Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor - PROCON

ESTADUAL, no uso de suas atribuições legais e em especial as

contidas no artigo 4º, II, VII e XII da Resolução PGJ nº 049/2002,

PUBLICA, para CONHECIMENTO dos Senhores Promotores de

Justiça de Defesa do Consumidor, Coordenadores dos Procons

Municipais e Consumidores, bem como para o CUMPRIMENTO das

determinações nela contidas, a Decisão Administrativa proferida nos

autos do Processo Administrativo nº 391/2002, em face de Comércio e

Indústria de Café Ltda., CNPJ 28.330.842/0001-93; Maria do

Socorro Alves Taquino da Silva (nome fantasia "Legal Tudo a Um

Real", CNPJ 04.349.687/0002-07 e Lojão Ramos e Ramos Ltda.,

situada na rua Goitacazes, nº 734/738, Bairro Centro, em Belo

Horizonte, como se segue:

Vistos etc.

Verifico, da representação do Sindicato da Indústria de Café do

Estado de Minas Gerais - SINDICAFÉ, ora embasada em laudo

laboratorial, a existência, no mercado mineiro, de café torrado e

moído, da marca "Seleção de Ouro" - contendo impurezas (cascas e

paus), e, portanto, impróprio ao uso e consumo (CDC, art. 18, § 6º).

Referido produto está sendo comercializado pelo estabelecimento "Ke

Legal Tudo a Um Real", situado na Rua Tupis, n. 703, no Bairro

Centro, em Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais. Por tal razão,

requer a tomada das providências cabíveis.

É o relatório. Decido.

Como pode ser visto do laudo de análise de n. 2076/02, Núcleo

Global de Análise e Pesquisa - NUGAP, acima referido, uma das

amostras do café torrado e moído da marca "Seleção de Ouro",

coletada pelo Sindicato reclamante, com data de fabricação de

09/11/2002 e validade até 09/01/2003, acusou o percentual de

17,99% (dezessete vírgula noventa e nove por cento) de impurezas

(cascas e paus), quando o permitido é apenas 1% (um por cento), a

teor do Regulamento Técnico para Fixação de Identificação e

87

Qualidade para Café, inserida na Resolução n. 377/99 da S.V.S. do

Ministério da Saúde).

 ISTO POSTO, considerando que a empresa Comércio e Indústria de

Café Ltda., inscrita no CNPJ/MF sob o n. 28.330.842/0001-93, com

sede na Rua Dr. Laureano, n. 1113/1123, no Bairro Dr. Laureano, em

Duque de Caxias, no Estado do Rio de Janeiro, telefones: 771.8289 e

771.4483, produziu e está comercializando, no mercado mineiro,

produto impróprio ao uso e consumo, determino:

     a) a abertura de processo administrativo para apuração dos fatos

e tomada das providências cabíveis;

     b) o registro e a autuação deste despacho como peça inicial do

procedimento;

     c) a notificação da reclamada, através de "fac-símile" e por

correspondência a ser enviada pelo correio, com aviso de

recebimento (AR), para, em 10 (dez) dias: 1) impugnar o processo

administrativo instaurado, a teor dos arts. 42 e 44 do Decreto n.

2.181/97, remetendo-lhe, em anexo, cópia desta decisão

administrativa cautelar e do laudo de análise n. 2076/02, do Núcleo

Global de Análise e Pesquisa - NUGAP, do Estado de Minas Gerais;

2) dizer se deseja a realização de perícia de contraprova nas

amostras que estão em poder do PROCON Estadual;

     d) a juntada, aos autos, pela empresa, em 10 (dez) dias, das

cópias de 1º) seu contrato social e/ou estatuto, atualizado, 2º) da

Demonstração do Resultado do Exercício de 2001;

     e) cautelarmente, nos termos dos arts. 56 e 58 do Código de

Defesa do Consumidor, para a garantia dos interesses dos

consumidores mineiros (CDC, arts. 4º, VI, 6º, I) a apreensão de

todos os produtos da marca "Seleção de Ouro", dentro do Estado de

Minas Gerais, fabricado pela empresa Comércio e Indústria de Café

Ltda., com data de fabricação em 09/11/2002 e prazo de validade

vencendo em 09/01/2003;

     f) o envio imediato de cópias desta decisão administrativa cautelar

e do laudo de análise acima referido ao Setor de Fiscalização, a fim

de que possa ser cumprida, com urgência, na Comarca de Belo

88

Horizonte, de início no estabelecimento comercial indicado na

representação;

     g) a expedição de ofícios ao PROCON de Belo Horizonte e às

VISAS Estadual e Municipal, através de "fac-símile", comunicando o

inteiro teor da decisão administrativa cautelar, e requisitando, na

forma legal, as providências que se fizerem necessárias para a

apreensão do produto, bem como a remessa, em 10 (dez) dias, de

informações sobre a existência de reclamações e/ou irregularidades

contra a reclamada;

     h) a publicação desta decisão cautelar, integralmente, no "Minas

Gerais" e no "site" do PROCON Estadual, para seu efetivo

cumprimento pelos órgãos públicos de defesa do consumidor.

Belo Horizonte, 21 de novembro de 2002.

Amauri Artimos da Matta, Promotor de Justiça do PROCON

Estadual, Especializado na Área de Alimentos.”

Como podemos observar o Procon de Minas Gerais utilizou todo o

aparato material e processual que o CDC e o Decreto 2.181/97 puderam

oferecer. Notemos que o promotor do órgão requisitou contrato social e

alterações, bem como a demonstração do resultado do exercício da empresa

par poder delimitar, graduar o valor da sanção pecuniária e determinou

medidas cautelares de apreensão do produto que estava muito alterado em

relação aos níveis mínimos considerados adequados ao consumo humano.

Conforme Art. 21 do Decreto 2181/97 a sanção prevista no inciso II

do art. 18 (apreensão de produtos) será aplicada, “também”, quando os

produtos forem comercializados em desacordo com as especificações técnicas

estabelecidas em legislação própria, na Lei nº 8.078, de 1990, no próprio

decreto 2181/97, o que se coaduna com a parte final do art. 58 do CDC. O

IPEM – Instituto de Pesos e Medidas – é um órgão estadual que realiza muitas

apreensões43, principalmente daqueles produtos que não possuem o selo do

43 Anexo 4 – Apreensão de Brinquedos pelo IPEM de São Paulo – Capital.

89

INMETRO – Instituto Nacional de Metrologia Normatização e Qualidade

Industrial -, apesar de estarem obrigados a ter certificação44.

Vale dizer aqui que existem legislações próprias de determinadas

áreas da atividade econômica. São exemplos delas, inclusive mencionadas no

acórdão acima transcrito, a área dos medicamentos, comercialização de

animais, corte, transporte e comercialização de madeira e outras. O Código de

Defesa do Consumidor, ainda pouco aplicado, parece que trouxe regras gerais,

as quais a maior parte da legislação específica se coaduna, o que só poderá

ser examinado caso a caso.

Quanto à sanção de inutilização do produto haverá necessidade da

instauração de processo administrativo sob pena de violação à garantia

constitucional do direito de propriedade e livre iniciativa (art. 1º, IV, art. 5º, XXII

e XXIII, e art. 170, II, da CF). A única hipótese em que a inutilização do produto

prescindiria do devido processo administrativo ocorrerá quando este acarretar

riscos diretos e / ou imediatos à saúde, a segurança ou à vida dos integrantes

da comunidade, como por exemplo, produtos contagiosos ou instáveis,

guardadas as devidas proporções que deverão ser verificadas caso a caso

concretamente.

Em relação à cassação do registro do produto junto ao órgão

competente, a qual deverá ser precedida necessariamente de processo

administrativo, assegurada a ampla defesa e contraditório do fornecedor, cabe

dizer que a responsabilidade para aplicação dessa sanção pertence a cada

órgão especificamente. Por exemplo, em se tratando de medicamentos a

competência é da ANVISA (Lei 6.360/76 e Dec. 7.9094/77).

Desta forma estará sendo observado o princípio constitucional da

livre iniciativa e o direito de propriedade.

A proibição de fabricação e a suspensão do fornecimento dos

produtos ou serviços correspondem, também, a uma limitação ao direito de

propriedade e livre iniciativa em favor da saúde e segurança da comunidade.

Tratando-se de uma sanção de caráter objetivo, como já mencionado buscam

44 Anexo 5 – Produtos de Certificação Compulsória.

preservar o consumidor quanto a eventuais riscos decorrentes do fornecimento

dos produtos ou serviços; e também podem ser aplicadas medidas cautelares e

urgentes, nos mesmos moldes já citados.

A revogação da concessão ou permissão de uso diz respeito de

forma mais abrangente às agências reguladoras. A própria Lei de Concessões

e Permissões de Serviços Públicos, Lei 8.987/95, indica as hipóteses em que

poderá ser aplicada esta sanção:

Art. 35

“Extingue-se a concessão por:

I - advento do termo contratual;

II - encampação;

III - caducidade;

IV - rescisão;

V - anulação; e

VI - falência ou extinção da empresa concessionária e falecimento

ou incapacidade do titular, no caso de empresa individual.

§ 1o Extinta a concessão, retornam ao poder concedente todos os

bens reversíveis, direitos e privilégios transferidos ao concessionário

conforme previsto no edital e estabelecido no contrato.

§ 2o Extinta a concessão, haverá a imediata assunção do serviço

pelo poder concedente, procedendo-se aos levantamentos,

avaliações e liquidações necessários.

§ 3o A assunção do serviço autoriza a ocupação das instalações e a

utilização, pelo poder concedente, de todos os bens reversíveis.

§ 4o Nos casos previstos nos incisos I e II deste artigo, o poder

concedente, antecipando-se à extinção da concessão, procederá

aos levantamentos e avaliações necessários à determinação dos

montantes da indenização que será devida à concessionária, na

forma dos arts. 36 e 37 desta Lei.”

Art. 37

“Considera-se encampação a retomada do serviço pelo poder

concedente durante o prazo da concessão, por motivo de interesse

público, mediante lei autorizativa específica e após prévio

pagamento da indenização, na forma do artigo anterior.”

Art. 38

“A inexecução total ou parcial do contrato acarretará, a critério do

poder concedente, a declaração de caducidade da concessão ou a

aplicação das sanções contratuais, respeitadas as disposições deste

artigo, do art. 27, e as normas convencionadas entre as partes.

§ 1o A caducidade da concessão poderá ser declarada pelo poder

concedente quando:

I - o serviço estiver sendo prestado de forma inadequada ou

deficiente, tendo por base as normas, critérios, indicadores e

parâmetros definidores da qualidade do serviço;

II - a concessionária descumprir cláusulas contratuais ou disposições

legais ou regulamentares concernentes à concessão;

III - a concessionária paralisar o serviço ou concorrer para tanto,

ressalvadas as hipóteses decorrentes de caso fortuito ou força

maior;

IV - a concessionária perder as condições econômicas, técnicas ou

operacionais para manter a adequada prestação do serviço

concedido;

V - a concessionária não cumprir as penalidades impostas por

infrações, nos devidos prazos;

VI - a concessionária não atender a intimação do poder concedente

no sentido de regularizar a prestação do serviço; e

VII - a concessionária for condenada em sentença transitada em

julgado por sonegação de tributos, inclusive contribuições sociais.

§ 2o A declaração da caducidade da concessão deverá ser

precedida da verificação da inadimplência da concessionária em

processo administrativo, assegurado o direito de ampla defesa.

§ 3o Não será instaurado processo administrativo de inadimplência

antes de comunicados à concessionária, detalhadamente, os

descumprimentos contratuais referidos no § 1º deste artigo, dando-

lhe um prazo para corrigir as falhas e transgressões apontadas e

para o enquadramento, nos termos contratuais.

§ 4o Instaurado o processo administrativo e comprovada a

inadimplência, a caducidade será declarada por decreto do poder

concedente, independentemente de indenização prévia, calculada

no decurso do processo.

§ 5o A indenização de que trata o parágrafo anterior, será devida na

forma do art. 36 desta Lei e do contrato, descontado o valor das

multas contratuais e dos danos causados pela concessionária.

§ 6o Declarada a caducidade, não resultará para o poder concedente

qualquer espécie de responsabilidade em relação aos encargos,

ônus, obrigações ou compromissos com terceiros ou com

empregados da concessionária.”

As agências reguladoras como órgãos integrantes do SNDC têm

competência no limite da atividade em que cada uma atua e desenvolve (por

exemplo ANATEL – telecomunicações; ANEEL - energia elétrica etc). Assim o

§ 1º do artigo 59 do CDC preceitua que esta pena será aplicada à

concessionária de serviço público.

Indagamos se é o § 1º do art. 59 do CDC que está incorretamente

inserido no art. 59 ou se a sanção de revogação de concessão e permissão de

uso que está incorretamente inserida no art. 58 do CDC.

Mister salientar que, embora o legislador, em nossa opinião, tenha

pretendido proteger o consumidor preventivamente dos abusos dos

fornecedores de produtos e serviços (concessionárias), no que diz respeito à

qualidade, quantidade por inadequação e insegurança, prescrevendo uma

sanção de cunho gravíssimo, ela, revogação de concessão ou permissão de

uso nunca foi aplicada, embora saibamos e seja notório a qualquer consumidor

desse país a falta de qualidade das telecomunicações, da qualidade e

quantidade de energia elétrica (lembremos do apagão, do seguro apagão,

conhecido como ECE – Encargo de Capacidade Emergencial), além de outros.

Temos que essa sanção administrativa, embora inserida no art. 58

do CDC não possui eficácia já que não é aplicada e mesmo que fosse causaria

mais problema que solução por diversos motivos e estaria melhor enquadrada

no art. 59 do CDC, já que o § 1º deste artigo faz menção a essa sanção.

Quem assumiria o controle? Em que condições? Por quanto tempo?

Resolveria o problema? Quais implicações políticas e econômicas de uma

sanção desta magnitude (revogação da concessão ou permissão de uso)? Os

investidores internacionais sentiriam-se seguros para investir no Brasil?

Considerando a classificação das sanções administrativas previstas

no CDC (nos seus quatro artigos - 57 a 60 -), expostas no item 4.2.1, temos

que a revogação da concessão ou permissão de uso prevista no artigo 58 é

demasiadamente grave e desproporcional para ser imposta em decorrência de

vício ou defeito sem reincidência (toda e qualquer empresa estará sujeita,

assim como todo e qualquer consumidor está sujeito às fatalidades) e / ou

violação de obrigação legal ou contratual (esta última prevista no artigo 59 do

CDC).

Esta sanção deve ser aplicada no caso de defeito em reincidência

em infração de maior gravidade, ou ainda quando afete a saúde ou a

segurança do consumidor individual ou coletivamente considerado

(prescindindo da ocorrência de reincidência), o que nos remete ao artigo 59

que na classificação do CDC trata de infrações de maior gravidade entendida

assim aquela que cause dano à saúde ou à segurança do consumidor (incluído

dano moral) ou dano patrimonial em reincidência.

O procedimento administrativo previsto no art. 58 do CDC a ser

adotado, está devidamente contido no art. 33 do Decreto nº 2.181/97 e

seguintes:

Art. 33

“As práticas infrativas às normas de proteção e defesa do

consumidor serão apuradas em processo administrativo, que

terá início mediante:

I - ato, por escrito, da autoridade competente;

II - lavratura de auto de infração;

III - reclamação.

§ 1º - Antecedendo à instaurado do processo administrativo,

poderá a autoridade competente abrir investigação

preliminar, cabendo, para tanto, requisitar dos fornecedores

informações sobre as questões investigadas, resguardado o

segredo industrial, na forma do disposto no § 4º do art. 55

da Lei nº 8.078, de 1990.

§ 2º - A recusa à prestação das informações ou o

desrespeito às determinações e convocações dos órgãos do

SNDC caracterizam desobediência, na forma do art. 330 do

Código Penal ficando a autoridade administrativa com

poderes para determinar a imediata cessação da prática,

além da imposição das sanções administrativas e civis

cabíveis.”

Tomando-se como exemplo a decisão anteriormente citada45 da

Diretoria do DPDC - Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - no

Processo 08012.004398/2001 envolvendo a empresa de transportes aéreos

Gol, verificamos que o órgão solicitou informações à empresa, que as prestou,

45 Capítulo 4, item 4.2, p. 60 de nossa exposição.

o que influenciou positivamente na fixação da multa pela infração cometida

(falta de informação essencial ao consumidor).

4.4 – ARTIGO 59 DO CDC E DECRETO 2.181/97

Passemos agora ao artigo 59 que trata de sanções mais graves,

constritivas da livre iniciativa.

Art. 59.

“As penas de cassação de alvará de licença, de interdição e de

suspensão temporária da atividade, bem como a de intervenção

administrativa, serão aplicadas mediante procedimento

administrativo, assegurada ampla defesa, quando o fornecedor

reincidir na prática das infrações de maior gravidade previstas neste

código e na legislação de consumo.

§ 1° A pena de cassação da concessão será aplicada à

concessionária de serviço público, quando violar obrigação legal ou

contratual.

§ 2° A pena de intervenção administrativa será aplicada sempre que

as circunstâncias de fato desaconselharem a cassação de licença, a

interdição ou suspensão da atividade.

§ 3° Pendendo ação judicial na qual se discuta a imposição de

penalidade administrativa, não haverá reincidência até o trânsito em

julgado da sentença.”

Importante neste artigo abordarmos o significado das infrações de

maior gravidade. Para tanto remetemos o leitor novamente ao item 4.2.1, além

de discorremos um pouco mais a respeito.

Há quem defenda a subjetividade do que seja infração de maior

gravidade lecionando que se trata de conceito aberto, indeterminado apenas

observável caso a caso e portanto deve ser balizada pelo art. 4º e 6º do CDC

que tratam, respectivamente da política nacional de relações de consumo e dos

direitos básicos do consumidor.

Com efeito, essa posição não se distancia tanto daquela que

adotamos (item 4.2.1) pois o art. 4º do CDC em seu caput preceitua que é

objetivo da política nacional de relações de consumo respeitar a dignidade, a

saúde e segurança do consumidor e dispõe objetivamente (reconhecido por lei

e não por situações fáticas) em seu inciso I o reconhecimento da

vulnerabilidade do consumidor perante o mercado de consumo.

Por outro lado, o inciso I do art. 6º do CDC preceitua que: “é direito

básico do consumidor a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos

provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados

perigosos e nocivos”. Já o inciso VI do mesmo diploma preceitua que: “é direito

básico do consumidor a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e

morais individuais, coletivos e difusos”.

Estamos assim diante, novamente, da aplicação das sanções

previstas no art. 59 do CDC quando ocorrer ou pelo menos pudermos

vislumbrar potencial lesivo de dano à saúde e / ou segurança do consumidor.

Desse modo, respeitando às posições contrárias, reafirmamos a

nossa no sentido de que infração de maior gravidade é aquela que atenta

contra a saúde e / ou segurança do consumidor mesmo que não haja

reincidência ou atente contra o patrimônio material do consumidor em práticas

repetitivas (em reincidência).

Poder-se-ia cogitar, os maiores defensores dos consumidores, que

ao adotarmos essa postura estamos assumindo, confirmando uma freqüente e

possível violação do patrimônio do consumidor e do ser humano, seja ele qual

for.

Ora, encaremos a realidade, harmonizar as relações de consumo

jamais significou erradicar os possíveis e eventuais danos ao consumidor, até

porque esse risco é inerente à vida e eventualmente acontece, basta estar vivo.

Não há empresa que forneça um produto ou serviço que não esteja correndo o

risco de, por um erro ou fatalidade, seja ele ou ela qual for, causar um dano

(patrimonial, moral, físico com ou sem morte etc). Teríamos então que proibir a

atividade da grande maioria das empresas, a começar pelas indústrias de

cigarro. Aviões caem, matam pessoas, crianças, idosos, homens, mulheres e

nem por isso as empresas aéreas são interditadas, fechadas ou perdem sua

concessão, ao contrário, continuam em pleno funcionamento e fazem uso do

sistema eleito para a produção da vida social: o capitalismo, para indenizar as

vítimas, ou seja pagam por suas vidas.

Portanto, os riscos são inerentes à vida, ao consumo e nos limites

de certos padrões os danos à vida e à segurança do consumidor são relevados

e aceitos em favorecimento do desenvolvimento nacional e da humanidade.

Não há como enganar a natureza da vida.

Seguindo, salientamos a dúvida já mencionada quanto à inserção

tanto da sanção de revogação de concessão / permissão de uso no art. 58

quanto a inserção do § 1º no art. 59 do CDC.

Embora a sanção de revogação de concessão e permissão de uso

tenha sido inserida no art. 58, ela mais se afeiçoa com a reincidência de

infrações de maior gravidade do art. 59, de modo que jamais será aplicada pela

ocorrência de vício como de fato constatamos.

A suspensão temporária de atividade e a interdição afeta toda

atividade exercida pelo fornecedor e também corresponde a uma limitação ao

direito de propriedade e livre iniciativa em favor da saúde e segurança da

comunidade e não incide sobre o produto ou serviço em si, mas sim sobre a

atividade ilícita que autoriza a aplicação da sanção.

Muitas interdições de estabelecimento, bem como a cassação da

atividade são impostas (apenadas) sem ao menos ser mencionado o decreto

2.181/97 ou ainda pior, sem mencionar o Código de Defesa do Consumidor. O

embasamento dessas decisões são realizados em legislações específicas que

foram publicadas ou entraram em vigor antes do CDC e do decreto, o que nos

mostra que ainda estamos iniciando um processo de mudança; não obstante a

esse detalhe o que importa são os efeitos, o alcance e a eficácia da decisão.

É o que observamos da decisão do Tribunal de Justiça do Estado de

São Paulo46, “in verbis”

“Voto n°2231

Apelação Cível n.° 73.846-5/8 Comarca de Nhandeara

Apelante: Juízo "Ex-officio".

Apelado: Ministério Público.

Ação Civil Pública - Interdição de abatedor municipal - Infringência

as leis sanitárias - Reexame necessário improvido.

Vistos.

I- O Ministério Público do Estado de São Paulo propôs ação civil

pública em face da Prefeitura Municipal de Monções, com escopo de

interditar o matadouro municipal, cominando-se multa para o caso de

descumprimento.

Em primeira instância foi proferida sentença que determinou a

abstenção do sacrifício de animais naquele local, com multa diária de

cinco salários mínimos (fls. 45/47).

Os autos subiram a este Tribunal em decorrência do reexame

necessário e a Procuradoria de Justiça propugnou pelo não

provimento (fls. 56/59).

Esse é o relatório que se soma ao da r. sentença.

II- No plano fático o presente processo não acarreta dificuldades,

haja vista a ausência de contestação, a farta prova documental e o

laudo trazido com a inicial.

Com efeito, restou demonstrada a falta de cuidados higiênicos e de

serviço de inspeção, que tornam o estabelecimento inadequado à

produção de carne destinada ao consumo humano. Nessa linha é

esclarecedor o laudo de fls. 12/13 e as respectivas fotografias.

46 Apelação Cível nº 73.846-5/8 - Comarca de Nhandeara; 1ª Câmara de Direito Público-Relator: José Raul Gavião de Almeida.

Não se atendeu, minimamente, as determinações normativas

adequadas ao abatimento de animais (Decreto Federal n° 30.691/52 e

Decreto Estadual 12.342/78), inclusive as atinentes às inspeções

sanitárias (Lei n° 1283/50, Lei n° 5760/71 e Lei Estadual n° 8208/92).

É notório o risco à saúde humana que decorre do abate sem higiene e

mais relevante ainda, sem qualquer controle da origem e condições

de saúde do animal.Assim, a cessação da atividade é imperativo

conseqüente da necessidade de proteção da saúde dos consumidores

de carne. Essa medida, aliás, tem expresso amparo legal:" Artigo 2°

da Lei 7.889/89- Sem prejuízo da responsabilidade penal cabível, a

infração a legislação referente aos produtos de origem animal

acarretará, isolada ou cumulativamente, as seguintes sanções:IV- A

suspensão de atividades que cause risco ou ameaça de natureza

higiênico-sanitária ou no caso de embaraço a ação fiscalizadora;

V- Interdição, total ou parcial, do estabelecimento, quando a infração

consistir na adulteração ou falsificação habitual do produto ou se

verificar, mediante inspeção técnica realizada pela autoridade

competente, a inexistência de condições higiênico-sanitárias

adequadas. "

" Artigo 84 da Lei 8.078/90 - Na ação que tenha por objeto o

cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a

tutela específica da obrigação ou determinará providências que

assegurem o resultado prático equivalente ao adimplemento.

§5°- Para a tutela específica ou par a obtenção do resultado prático

equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais

como busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento

de obra, impedimento de atividade nociva, além de requisição de

força policial."

" Artigo 1l da Lei 7.347/85 - Na ação que tenha por objeto o

cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o

cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da

atividade nociva, sob pena de execução especifica, ou cominação de

multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente

de requerimento do autor."

Ante o exposto, o voto é no sentido de negar-se provimento ao

reexame necessário.”

A sanção administrativa de cassação de licença do estabelecimento

ou de atividade interessa a cada município na medida em que é de interesse

local e respeita as características de organização e convivência social de dada

localidade. Nesse prisma, o alvará de funcionamento concedido pela

municipalidade poderá ser revogado após o devido processo administrativo que

apure violação às normas do CDC ou outra qualquer destinada à proteção do

consumidor. Esta sanção é tipicamente de caráter repressivo, embora

possamos argumentar que previne danos potenciais aos consumidores e a

comunidade.

A intervenção administrativa é típica sanção de caráter preventivo,

pois objetivando a adequação e continuidade de fornecimento dos produtos e

serviços, intervém as agências reguladoras, nas concessionárias ou

permissionárias dos serviços. Esta sanção está prevista também na Lei

8.987/95 (Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de

serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras

providências):

Art. 32

“O poder concedente poderá intervir na concessão, com o fim de

assegurar a adequação na prestação do serviço, bem como o fiel

cumprimento das normas contratuais, regulamentares e legais

pertinentes.

Parágrafo único. A intervenção far-se-á por decreto do poder

concedente, que conterá a designação do interventor, o prazo da

intervenção e os objetivos e limites da medida.”

Art. 33

“Declarada a intervenção, o poder concedente deverá, no prazo de

trinta dias, instaurar procedimento administrativo para comprovar as

causas determinantes da medida e apurar responsabilidades,

assegurado o direito de ampla defesa.

§ 1º Se ficar comprovado que a intervenção não observou os

pressupostos legais e regulamentares será declarada sua nulidade,

devendo o serviço ser imediatamente devolvido à concessionária,

sem prejuízo de seu direito à indenização.

§ 2º O procedimento administrativo a que se refere o caput deste

artigo deverá ser concluído no prazo de até cento e oitenta dias, sob

pena de considerar-se inválida a intervenção.”

Sempre será aplicada, conforme § 2º do art. 59 do CDC, quando as

circunstâncias de fato desaconselharem as outras sanções previstas no caput

do art. 59 do CDC, o que remete a uma análise fática caso a caso, sendo a

intervenção administrativa não exatamente uma sanção, mas uma prevenção

às outras possibilidades de aplicação de pena (cassação, interdição e

suspensão temporária de atividade)

Combinando o Dec. 2181/97 em seu art. 18, § 3º com o CDC

encontramos uma limitação ao poder de polícia administrativo dos órgãos de

defesa do consumidor. Cláudia Lima Marques discorre sobre o assunto, “in

verbis”:

“Em que pese serem dotados de poder de polícia administrativo, os

órgãos de defesa do consumidor têm autonomia para aplicação

apenas das sanções de apreensão de produto ( inc. II), inutilização de

produto (inciso III) e imposição de contrapropaganda (inc. XII). As

demais sanções, segundo o art. 18, § 3º, do Dec. 2.181/1997, dos incs.

III a XI, “sujeitam-se a posterior confirmação pelo órgão normativo

ou regulador da atividade, nos limites de sua competência.

Em certa medida, embora seja claro que a regulamentação da Lei

teve por objetivo preservar as atribuições dos órgãos diretamente

envolvidos com a regulação da atividade e que possuem em tese uma

perspectiva sistêmica do setor econômico objeto de regulação, tal

regulamentação acabou por retirar grande parte da efetividade dos

órgãos de defesa do consumidor.”

Data vênia a autora em comento deixou de mencionar a

possibilidade de aplicação da sanção de multa prevista no inc. I do art. 56 do

CDC e 18 do Dec. 2.181/97, a qual não está incluída no § 3º do art. 18 do

referido Decreto 2.181/97. Por sua vez, constata-se também a possibilidade de

cumulatividade, prevista no art. 22, parágrafo único do Decreto 2.181/97, que

contém na sua parte final os dizeres “sem prejuízo da competência de outros

órgãos administrativos” o que deixa claro a possibilidade de aplicação dessa

penalidade sem a necessidade de aprovação dos órgãos reguladores de

atividade própria.

Assim, verificamos que, nas atividades reguladas, fiscalizadas e

controladas pelas autarquias (Agências Reguladoras) só estas podem impor as

sanções previstas nos incisos III a XI do art. 56 do CDC e 18 do Decreto

2181/97 (abarcando sanções mencionadas no art. 58 e 59 do CDC), visto que

estas agem em nome do poder concedente e só este, como titular do serviço

público prestado tem competência para realizar essas autuações, limitando em

muito os órgãos de defesa do consumidor face ao Direito Regulatório.

Diz o CDC, no entanto, que as sanções referidas no art. 59 só se

aplicam na hipótese de reincidência – que é fenômeno objetivamente

verificável, constando de nova prática de “conduta infrativa” (quando de maior

gravidade) – o que nos conduz à discrição da autoridade administrativa,

balizada agora pelo disposto nos arts. 17º, II, e 26º (infrações mais graves), do

mencionado Decreto de 1997, bem como as circunstâncias fáticas.

Só se viabiliza o reconhecimento da reincidência (e não ela mesma,

conforme decorre da letra da lei e do regulamento) pela autoridade

administrativa, se, já tiver ocorrido o trânsito em julgado da sentença

administrativa (supostamente mantenedora da sanção), conforme o previsto no

art. 27 do Decreto de 1997.

A reincidência não ocorre se decorrido 5 anos da sentença

irrecorrível (âmbito administrativo) houver outra prática infrativa (art. 27,

parágrafo único do decreto 2.181/97).

Também não ocorre reincidência se, mesmo havendo decisão

administrativa irrecorrível no âmbito administrativo, houver ação judicial

recorrível, ou seja, se ainda a lide estiver sendo discutida.

Os parâmetros estabelecidos para caracterizar reincidência

observaram os direitos fundamentais individuais e coletivos insculpidos no Art.

5º da CF 1988: Presunção da não culpabilidade e do devido processo legal.

Observaram também a questão relativa à reabilitação pelo decurso do tempo,

ou seja utilizou-se do princípio que ninguém pode ser considerado transgressor

eternamente, descaracterizando a reincidência.

Se no artigo 58 do CDC já era necessária a instauração de processo

administrativo, seja anterior ou posterior no caso de medidas cautelares, no art.

59 do CDC não será diferente e novamente será utilizado o decreto 2.181/97

(art. 33 e seguintes).

A aplicação das sanções previstas neste artigo não prescinde da

instauração de procedimento administrativo, justamente porque são medidas

extremas e constritivas da livre iniciativa.

É o que observamos das decisões47 abaixo:

“Interdição do estabelecimento - Necessidade de confirmação pelo

órgão regulador

MANDADO DE SEGURANÇA - ADMINISTRATIVO - INDÚSTRIA

ALIMENTÍCIA - RECLAMAÇÃO FORMULADA POR CLIENTE

(MUNICÍPIO) ACERCA DE ALIMENTOS IMPRÓPRIOS PARA O

CONSUMO - OBSTINAÇÃO À MERENDA ESCOLAR -

47 Lima Marques, Claudia; V. Benjamim, Antonio Herman; Miragem, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor: arts. 1 a 74: aspectos materiais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003, p. 780-81.

FISCALIZAÇÃO DO PROCON E VIGILÂNCIA SANITÁRIA -

LAVRATURA DE AUTO DE INFRAÇÃO - PROCON/PR -

IMPOSIÇÃO DE MULTA E INSCRIÇÃO NO CADASTRO DO ROL

DAS EMPRESAS COM RECLAMAÇÕES NÃO ATENDIDAS -

INTERDIÇÃO DA EMPRESA REVOGADA, DE OFÍCIO, PELA

VIGILÂNCIA SANITÁRIA - COMPROVAÇÃO DE QUE

OCORRERAM DEVIDO AO IRREGULAR ARMAZENAMENTO

PROCEDIDO PELO COMPRADOR-DECADÊNCIA OPERADA -

ILEGALIDADECARACTE-RIZADA - ORDEM PARCIALMENTE

CONCEDIDA, AO EFEITO DE CONFIRMAR A LIMINAR

DEFERIDA (TJPR - l.° Gr.Câm.Cív. - MS 074565300 - rei. Dês.

Nério Spessato Ferreira - j. 15.04.1999).”

“Interdição de estabelecimento - Vigilância sanitária - Notificação

prévia - Ampla defesa

ADMINISTRATIVO - VIGILÂNCIA SANITÁRIA - INTERDIÇÃO -

ART. 24 DA LEI 6.437/77 - AUTO DE INFRAÇÃO POSTERIOR -

PRÉVIA NOTIFICAÇÃO - AMPLA DEFESA - VÍCIO FORMAL -

NULIDADE - APELAÇÃO E REMESSA DESPROVIDAS. O art. 24

da Lei 6.437/77 é taxativo ao dispor acerca da simultaneidade da

expedição do Termo de Infração e seu respectivo Auto, formalidade

que, uma vez inobservada, atenta contra o devido processo legal. Em

face do caráter urgente da medida de interdição, pelas conseqüências

que podem advir da persistência de uma situação irregular, a falta de

prévia notificação da empresa não enseja a nulidade do ato, se lhe é

dada ciência dos motivos determinantes da restrição que lhe foi

imposta e oportunizada a defesa (TRF-4.a R. - 3." T. - ApMS

97.04.66126-6/SC - rei. Dês. Vivian Josette Pantaleão Caminha -j.

31.08.2000 - DJ 27.09.2000, p. 213).”

“Interdição administrativa - Necessidade de processo administrativo

prévio

REMESSA EX OFFIC1O - MANDADO DE SEGURANÇA - PROCON

-INTERDIÇÃO DE ESTABELECIMENTO. Sem que se instaure,

antes, o pertinente procedimento administrativo, a interdição de

estabelecimento configura medida arbitrária (TJDF- 5."Câm.Cív.-MS

/ REO 67594 -rei. Dês. Júlio de Oliveira -j. 06.02.1995 -DJU

02.08.1995, p. 10401).”

4.5 – ARTIGO 60 DO CDC E DECRETO 2.181/97

Após as sanções pecuniárias, as sanções por vício e por defeito em

reincidência resta-nos abordar a contrapropaganda prevista no art. 60 do CDC:

Art. 60

“A imposição de contrapropaganda será cominada quando o

fornecedor incorrer na prática de publicidade enganosa ou abusiva,

nos termos do art. 36 e seus parágrafos, sempre às expensas do

infrator.

§ 1º A contrapropaganda será divulgada pelo responsável da mesma

forma, freqüência e dimensão e, preferencialmente no mesmo

veículo, local, espaço e horário, de forma capaz de desfazer o

malefício da publicidade enganosa ou abusiva.”

Artigos 36, 37 e 38 do CDC:

Art. 36

“A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor,

fácil e imediatamente, a identifique como tal.

Parágrafo único. O fornecedor, na publicidade de seus produtos ou

serviços, manterá, em seu poder, para informação dos legítimos

interessados, os dados fáticos, técnicos e científicos que dão

sustentação à mensagem.”

Art. 37

“É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

§ 1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou

comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa,

ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir

em erro o consumidor a respeito da natureza, características,

qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer

outros dados sobre produtos e serviços.

§ 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de

qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a

superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência

da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de

induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa

à sua saúde ou segurança.

§ 3° Para os efeitos deste código, a publicidade é enganosa por

omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto

ou serviço.

§ 4° (Vetado).”

Art. 38

“O ônus da prova da veracidade e correção da informação ou

comunicação publicitária cabe a quem as patrocina.”

O Decreto 2181/97 não trata da contrapropaganda, mas comina

multa:

Art. 19

“Toda pessoa física ou jurídica que fizer ou promover

publicidade enganosa ou abusiva ficará sujeita à pena de

multa, cumulada com aquelas previstas no artigo anterior,

sem prejuízo da competência de outros órgãos

administrativos.

Parágrafo Único - Incide também nas penas deste artigo o

fornecedor que:

a) deixar de organizar ou negar aos legitimas interessados

os dados físicos, técnicos e científicos que dão sustentação

à mensagem publicitária;

b) veicular publicidade de forma que o consumidor não

possa fácil e imediatamente, identificá-la como tal.”

A moderna sociedade de consumo é caracterizada e marcada pela

publicidade, que exerce poderosa e incontestável influência sobre a vida das

pessoas e da coletividade, influindo em seus comportamentos, seus hábitos,

suas idéias e seus valores, atingindo homens, mulheres e crianças

indistintamente. A mensagem publicitária sempre tem finalidade de venda

(aumentar, manter, conquistar mercado etc), seja ela imediata ou longínqua.

Porém antes de atingir seu fim, seu objetivo pode ter o condão de angariar

simpatia por um produto ou serviço, ou ainda de formar ou orientar a opinião do

consumidor acerca de uma empresa.

Nesse contexto sócio-econômico e cultural, o indivíduo ou a

coletividade é considerado em função de suas possibilidades, de suas

potencialidades de consumir produtos e serviços.

Alguns vislumbram um aspecto negativo no sistema publicitário

capitalista, ao passo que outros apontam o seu caráter de utilidade no quadro

social consumeirista, porque as necessidades humanas podem ser mais bem

atendidas com um sistema de informação adequado sobre os bens e serviços

colocados à disposição do consumidor.

O fato é que a publicidade exerce significativa influência sobre os

componentes psicológico e emocional dos seres humanos, e tudo que

interesse ao homem conclama o manto normativo do direito.

A publicidade como atividade juridicamente relevante é mencionada

pelo CDC em 3 momentos:

1 – Quando suficientemente precisa integra, a oferta contratual (Art.

30 do CDC), o futuro contrato (Arts. 18 e 20 do CDC), vinculando-o como na

proposta (Arts. 30 e 35 do CDC);

2 – Quando for, a publicidade, abusiva ou enganosa é sancionada

(Art. 37 do CDC);

3 – Nos demais casos, como prática comercial deve ser correta nas

informações que presta (Arts. 36, parágrafo único e 38 do CDC); deve ser

identificável (Art. 36, caput do CDC); e deve também ser leal, ter boa-fé (Art. 6º,

IV do CDC).

No CDC a prática comercial (aplica o art. 39, inciso IV) chamada

publicidade é verdadeira atividade social e ato jurídico relevante destinada a

criar vínculos obrigacionais entre fornecedores e consumidores na sociedade

brasileira. É ferramenta tanto do consumidor quanto do fornecedor e por isso

deve expressar a realidade daquilo que se deseja veicular / ofertar / informar.

A publicidade abusiva ou enganosa sofre, num primeiro momento,

controle administrativo do órgão auto-regulamentador, o CONAR – Conselho

Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária - mas também dos órgãos

públicos que garantem a defesa do consumidor, por força do estabelecido nos

arts. 55 a 60 do CDC, e 9º e seguintes do regulamento, Decreto n. 2.181, de

20/3/1997.

O Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária – CBDP48 -

preleciona em seus artigos 1º e 20º:

Art.1º

“Todo anúncio deve ser respeitador e conformar-se às leis do país;

deve, ainda, ser honesto e verdadeiro.”

Art. 20

“Nenhum anúncio deve favorecer ou estimular qualquer espécie de

ofensa ou discriminação racial, social, política, religiosa ou de

nacionalidade.”48 O Código Brasileiro de Auto-regulamentação Publicitária pode ser encontrado no Site http://www.conar.org.br/, acessado em 18/09/2004.

Portanto, via de regra, uma das primeiras formas de controle contra

publicidade abusiva ou enganosa será exercida pelo CONAR. O CBDP apesar

de ser aplicado pelo CONAR em muitos casos não atende as necessidades de

regulação e nem regulamentação da publicidade, seja porque quem aplica é

um órgão corporativo ou, seja porque muitos de seus artigos estejam em total

desacordo e confronto com o Código de Defesa de Consumidor (art. 24 do

CBDP, por exemplo, que permite explorar o medo se houver motivo relevante

ou plausível) ou ainda porque se refere, o CBDP, a regulamentação de normas

éticas. Não obstante o Conar possui decisões sumuladas49, as quais ainda são

veiculadas embora algumas estejam em total desacordo com a legislação

vigente ou não possuem eficácia devido justamente às legislações vigentes.

A imposição da contrapropaganda será cominada quando o

fornecedor incorrer na prática de publicidade abusiva ou enganosa, correndo

sempre às expensas do infrator as custas para tanto. A contrapropaganda será

divulgada da mesma forma, freqüência e dimensão e, preferencialmente, no

mesmo veículo, local, espaço e horário, de forma capaz a desfazer o malefício

da publicidade abusiva.

Para o Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária,

publicidade é "toda atividade destinada a estimular o consumo de bens e

serviços, bem como promover instituições, conceitos e idéias".

Mas, o próprio CDC elenca, no artigo 37 §§ 1º e 2º, o que se pode

entender por publicidade abusiva e enganosa, contudo, na prática, diante da

complexidade dos casos, nem sempre é de fácil constatação as situações

objetivas trazidas pela lei. Como saber se determinada publicidade incita

violência ou não. Alguns casos são de fácil constatação, mas outros não serão.

A contrapropaganda, que deveria chamar contrapublicidade, pois o

CDC não trata da propaganda e sim da publicidade, terá caráter minimizador

do efeito nocivo da publicidade abusiva ou enganosa (o que nem sempre vai

ocorrer), pois caráter efetivamente reparatório jamais terá.

49 Anexo 6 - Súmulas do Conar

Trata-se de obrigação de fazer compensatória de desagravo.

Claudia Lima Marques nos ensina a respeito, “in verbis”:

“A medida de contrapropaganda é sanção específica às hipóteses de

publicidade ilícita, seja pela infração ao dever de informar na

publicidade comercial, característica da publicidade enganosa, ou em

face d publicidade abusiva. A melhor doutrina (Benjamin, Comentários...,

Forense, 6. Ed. p. 282; Marques, Contratos..., 4. Ed., RT, p. 627;

Pasqualotto, Os efeitos obrigacionais. l. ed., RT, 1997) indica a publicidade

enganosa como aquela que divulgue informação falsa ou omita informação

essencial ao consumidor. Publicidade abusiva, conceito d. difícil precisão

(Benjamin, Comentários, p. 297), é aquela que, além das hipóteses do art.

37, § 2.°, do CDC, desrespeite os valores do sistema jurídico a que

pertence.

Claramente percebemos tanto dos ensinamentos acima quanto da

letra da lei que o rol disposto pelo artigo 37 §§ 1º e 2º do CDC são

exemplificativos e não exaustivos, podendo ser aplicada à sanção de

contrapropaganda nas situações em que há desrespeito às regras do CDC ou

a qualquer outra legislação, desde que constatadas as infrações ao sistema

jurídico aqui examinado.

Antonio Janyr Dall'agnol50, no mesmo sentido nos explica, “in

verbis” (grifos nossos):

“A pena de contrapropaganda é, compreensivelmente, específica às

hipóteses de conduta infringente de regras que disciplinam a

publicidade no CDC e legislação do consumidor em geral.

50 O Desembargador Antonio Janyr Dall´Agnol é coordenador do Código de Defesa do Consumidor Eletrônico, da Carta Maior - Informações Jurídicas, e conta também com a contribuição e comentários de Celso Antônio Pacheco Fiorillo, Marcelo Gomes Sodré, Luis Antonio de Souza e Sérgio Porto.Texto retirado do Site http://cartamaior.uol.com.br/cartamaior.asp?coluna=cdc, acessado em Maio de 2004.

Objetiva ela “desfazer o malefício da publicidade enganosa ou

abusiva”, nos termos do § 1º (e, afinal, em razão dos vetos, o único do

artigo em exame).

Esse desfazimento há de se operar, tanto quanto possível, do mesmo

modo como veiculada a propaganda censurada. Compreenda-se,

divulgação pela mesma forma e com a mesma freqüência (=

periodicidade) e dimensão (tempo, espaço); e, mais, dando-se

primazia ao mesmo veículo de divulgação (jornal, revista, rádio ou

televisão).

No caput, o verbo utilizado é equivocado, porquanto “cominar”,

conforme de sabença, é apenas ameaçar com sanção, e não aplicá-la

propriamente. O que se quis dizer, e assim deve ser interpretado, é

que a imposição dar-se-á, será concretizada, aplicada.

Também aqui se há de resguardar o devido processo legal, o que

implica regular instauração do processo administrativo, conforme

previsto pelo art. 33 e segs. do Decreto n. 2.181, de 20.3.97.

O aparente silêncio do legislador, que, como vimos, repetidas vezes

se refere à necessidade de procedimento e de ampla defesa, deve-se

ao veto aposto ao § 2º, que dizia: “A contrapropaganda será aplicada

pelos órgãos públicos competentes da proteção ao consumidor,

mediante procedimento administrativo, assegurada ampla defesa,

cabendo recurso para o Ministro de Estado da respectiva área de

atuação administrativa, quando a mensagem publicitária for de âmbito

nacional”.

As razões do veto fixavam-se na inadmissibilidade, “na ordem

federativa, (de) atribuir a Ministro de Estado competência para

apreciar em grau de recurso a legitimidade de atos de autoridade

estadual ou municipal”.

Dificilmente alguém interpretaria deste modo, pensamos, senão no

sentido de que, no ponto, estaria o legislador a referir-se a atos de

autoridades federais.

Sem muita razão de ser, também, o veto ao § 3º - calcado na

possibilidade de paralisação da atividade empresarial – que estava

assim redigido: “Enquanto não promover a contrapropaganda, o

fornecedor, além de multa diária e outras sanções, ficará impedido de

efetuar, por qualquer meio, publicidade de seus produtos e serviços.”

O Caput do art. 60 do CDC embora, como podemos observar,

impropriamente utilize a palavra cominar tem na realidade grande

aplicabilidade prática, sendo eficaz ao que se presta.

Impende ressaltarmos que se deve estudar o tema juntamente com

o Decreto 2181/97, que dispõe sobre a organização do Sistema Nacional de

Defesa do Consumidor - SNDC, estabelece as normas gerais de aplicação das

sanções administrativas previstas na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990,

bem como seu procedimento administrativo.

Qualquer órgão oficial de defesa do consumidor (Procon’s, DPDC,

etc) pode aplicar a pena de contrapropaganda, não estando esta sanção

restrita (sujeita a confirmação ou aplicação propriamente dita) aos órgãos de

Regulação da Atividade Econômica (ANATEL, ANEEL, ANVISA, ANS, ANP,

ANTT, ANTAQ, ANA etc).

Parece-nos de bom alvitre que a contrapropaganda ou a simples

vedação da propaganda na forma de sanção administrativa deve ser precedida

do devido processo legal judicial ou administrativo que assegure ampla defesa

e contraditório, sendo possível nos termos do artigo 56 parágrafo único ser

aplicada por medida cautelar, guardadas as devidas proporções; é que a

contrapropaganda ou a simples vedação de publicidade depende de apuração

e é sanção limitadora da livre iniciativa, além de determinar uma ação, um fazer

que terá custos.

Nesse sentido:

“CONTRAPROPAGANDA – NECESSIDADE DE

PROCEDIMENTO PRÉVIO – PRESERVAÇÃO DO

CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA

Ementa: Sem a instauração de prévio processo administrativo,

não pode o PROCON impor vedação à propaganda utilizada

por empresa exploradora do chamado “poupa ganha”, porque,

assim fazendo, estaria afrontando a norma constitucional que

assegura a observância do contraditório e da ampla defesa (CF,

art.5º, LV), princípios estes inobservados no caso, o que impõe

a concessão da segurança postulada pela firma impetrante.

Remessa oficial improvida (TJGO – REO 6754-7/195 – rel. Des.

Charife Oscar Abrão – j. 08.03.2001).”51

4.6 – LEGISLAÇÃO APLICÁVEL PROCESSO ADMINISTRATIVO -

CONSIDERAÇÕES

Não poderíamos deixar de tecer considerações a respeito da

legislação adjetiva que determina os procedimentos a serem observados para

apuração das práticas infrativas, bem como possibilitam aos supostos

infratores exercitar a ampla defesa e o contraditório. Não bastasse a

complexidade da matéria, sua especificidade, bem como a complexidade

peculiar dos casos concretos, nossa legislação adjetiva – processual – não é

clara, muito menos simples de ser aplicada.

Primeiramente há de se considerar a existência de várias

legislações: 1) A Federal consistente no Decreto 2.181/97 e a Lei 9.784/99; 2)

As Estaduais, sendo que em São Paulo é a Lei 10.177/98.

Temos inúmeras possibilidades de conflitos nas mais diversas

situações possíveis; podemos citar algumas decorrentes da aplicação das

sanções administrativas e por conseqüência seu trâmite administrativo quando

União, Estados e Municípios autuam (os três ou a combinação de dois deles),

os quais foram intitulados de conflitos verticais. Há, então os conflitos

horizontais, entendidos estes quando vários órgãos “pertencentes” ao mesmo

ente federativo atuam.

Naturalmente não trataremos de todos os casos possíveis, visto que

não há uma regra fixa ou invariável para solucionar todos os conflitos, que

deverão ser verificados in loco. Portanto, nos limitaremos a traçar alguns

51 Lima Marques, Claudia; V. Benjamim, Antonio Herman; Miragem, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor: arts. 1 a 74: aspectos materiais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003, p. 785

parâmetros a serem utilizados que permitam escolher ou determinar a

legislação adjetiva a ser utilizada.

Vejamos, brevemente do que tratam cada uma (grifos nossos):

DECRETO 2.181 DE 20 DE MARÇO DE 1997 - Dispõe sobre a organização do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor - SNDC, estabelece as normas gerais de aplicação das sanções administrativas previstas na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, revoga o Decreto nº 861, 9 julho de 1993, e dá outras providências:...

Art. 33

As práticas infrativas às normas de proteção e defesa do consumidor

serão apuradas em processo administrativo, que terá inicio

mediante:

I - ato, por escrito, da autoridade competente;

II - lavratura de auto de infração;

III - reclamação.

LEI 10.177, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1998 - Regula o processo

administrativo no âmbito da Administração Pública Estadual.

Art 1º

Esta lei regula os atos e procedimentos administrativos da

Administração Pública centralizada e descentralizada do Estado de

São Paulo, que não tenham disciplina legal específica.

Parágrafo único - Considera-se integrante da Administração

descentralizada estadual toda pessoa jurídica controlada ou

mantida, direta ou indiretamente, pelo Poder Público estadual, seja

qual for seu regime jurídico.

Art 2º

As normas desta lei aplicam - se subsidiariamente aos atos e

procedimentos administrativos com disciplina legal específica.

Art 3º

Os prazos fixados em normas legais específicas prevalecem sobre

os desta lei.

LEI 9.784 , DE 29 DE JANEIRO DE 1999. - Regula o processo

administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.

Art. 1º

Esta Lei estabelece normas básicas sobre o processo administrativo

no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em

especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor

cumprimento dos fins da Administração.

Art. 5º

O processo administrativo pode iniciar-se de ofício ou a pedido de

interessado.

Art. 6º

O requerimento inicial do interessado, salvo casos em que for

admitida solicitação oral, deve ser formulado por escrito e conter os

seguintes dados:

I - órgão ou autoridade administrativa a que se dirige;

II - identificação do interessado ou de quem o represente;

III - domicílio do requerente ou local para recebimento de

comunicações;

IV - formulação do pedido, com exposição dos fatos e de seus

fundamentos;

V - data e assinatura do requerente ou de seu representante.

Art. 69

Os processos administrativos específicos continuarão a reger - se por

lei própria, aplicando - se - lhes apenas subsidiariamente os preceitos

desta Lei.

Todas as sanções administrativas, para serem impostas

legitimamente, devem observar um processo administrativo, determinado por

uma legislação adjetiva (no caso temos três), onde a garantia constitucional da

ampla defesa e do contraditório seja observado. No entanto como efetivar essa

garantia havendo legislações diferentes com aplicabilidade em âmbitos

diferenciados? Qual aplicar?

Da breve análise das leis acima citadas nos colocamos em dúvida e

vislumbramos um conflito que, embora, aparente, não é de fácil solução se

considerados os detalhes e peculiaridades caso a caso. São muitas as facetas

que podem assumir os acontecimentos. Desde várias autuações por órgãos

diferentes ou não em diferentes esferas ou não (Federal, Estadual e Municipal)

em diferentes Estados e Municípios ou não.

Coloca-se, assim, uma questão de fundo constitucional. Quem na

esfera da administração pública tem competência para dispor sobre a matéria

processual administrativa? A CF 1988 dispõe, no artigo 22, inciso I, ser

competência privativa da União legislar sobre direito processual. Ainda atribui

competência concorrente à União, aos Estados e ao Distrito Federal para

legislar sobre procedimentos em matéria processual (art. 24, inciso XI da CF

1988); e no âmbito da legislação concorrente, como já visto, a União tem

competência limitada a estabelecer normas gerais (art. 24, §1º da CF 1988).

Observemos que a CF 1988 não distingue entre processo judicial e

administrativo e não esqueçamos que estamos tratando de Relação de

Consumo – CDC e Decreto 2.181/97.

A Lei nº. 9.784, de 29 de janeiro de 1999, diz regular o processo

administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, e, em seu artigo 1º.

"estabelecer normas básicas sobre o processo administrativo". Entende-se,

portanto, que suas normas não poderão conflitar com eventuais legislações

estaduais e municipais de processo administrativo, suspendendo essas quando

lhe contrariem, pelo que determina o §4º., do artigo 24, da Constituição

Federal.

Contudo, o art. 69 da Lei 9.784/99 dispõe ao contrário. A limitação

imposta ao alcance dessas normas processuais administrativas gerais, que se

faz nesse artigo em nada inova, pois ao preconizar que "processos

administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-

lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei", significa recordar o

preceito geral de interpretação das normas de direito, contido no artigo 2º.,

§2º., da LICC – Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei nº. 4.657, de 4

de setembro de 1942): "A lei nova, que estabeleça disposição gerais ou

especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior."

Assim, temos: CDC em Vigor desde 1991, Decreto 2.181/97 desde

1997, Lei Estadual 10.177 de Dezembro / 98, que entrou em vigor 120 dias

depois de sua publicação, ou seja, no final de Abril de 1999, e Lei Federal

9.784 de Jan / 99, que entrou em vigor imediatamente, ou seja, em janeiro de

1999.

Muitas são as soluções possíveis, mas apenas uma pode ser mais

adequada e juridicamente acertada.

Na situação específica de aplicação das sanções administrativas

previstas no CDC e no Decreto 2.181/97, o processo administrativo a ser

observado é o contido no Decreto 2.181/97 e subsidiariamente aplica-se, no

que não conflitar a Lei Federal 9.784/99 no âmbito federal e a Lei estadual

10.177/98 no que não conflitar no âmbito estadual.

Em se tratando de infração à norma de proteção ao consumidor não

se trata aqui de aplicar uma dada lei a cada esfera de administração, ou seja, a

lei federal (CDC e decreto) na esfera federal e a lei estadual na esfera

estadual; e mesmo assim ainda haveríamos de decidir, na esfera federal, qual

lei aplicar, o Decreto 2.181/97 ou a lei 9.784/99. Existem vários tipos de

processos administrativos e o que se refere às sanções administrativas do

CDC e do Decreto é um desses tipos.

Claramente, temos que tanto o CDC quanto o Decreto são normas

específicas (pois tratam de relação de consumo) de caráter geral, pois traçam

linhas gerais (dentro da especificidade das relações de consumo) e entraram

em vigor antes da lei federal e da estadual, bem como são normas de

aplicabilidade nacional. Assim, sempre que se apure em processo

administrativo as infrações às normas consumeiristas (normas de caráter

nacional), aplicar-se-á o Decreto 2.181/97, sendo que os outros regramentos

se aplicam subsidiariamente nas respectivas esferas de administração.

O próprio artigo 5º do Decreto 2.181/97 preceitua que qualquer

entidade ou órgão da Administração Pública, Federal, Estadual e

Municipal, destinado à defesa dos interesses e direitos do

consumidor, tem, no âmbito de suas respectivas competências,

atribuição para apurar e punir infrações a este Decreto e à legislação

das relações de consumo.

Não há que se falar em lei federal (CDC e Decreto) limitada ao

âmbito federal, até porque a lei 9.784/99 já cumpre sua função nessa esfera; e

do mesmo modo a Lei 10.177/98 também cumpre sua função na esfera

estadual em São Paulo.

O cerne da questão diz respeito ao processo administrativo

instaurado ser, derivar ou estar relacionado, mesmo que de forma indireta ou

longínqua ou ainda potencialmente. uma relação de consumo, ou seja, sempre

que as sanções administrativas previstas no art. 56 do CDC e no art. 18 do

Decreto 2.181/97 forem impostas deverá ser observado o disposto no Decreto

no que tange ao processo administrativo.

Ora, a lei 8.884/1994 também prevê nos seus artigos 30 e seguintes

a possibilidade de instauração de processo administrativo e prevê o prazo de

15 dias para apresentação de defesa; trata-se, então, de processo

administrativo que se refere a uma área, qual seja, a da concorrência, e,

portanto, não se aplicam outras legislações, a não ser subsidiariamente e no

que não conflitar, conforme o disposto no art. 69 da lei 9.784/99. Coincidência

ou não, sorte ou não, ela, lei 8.884/94 também entrou em vigor antes das leis

9.784/99 e 10.177/98.

Tanto a lei federal quanto a estadual são muito claras dispondo que

são aplicadas subsidiariamente a processos específicos (Art. 69 – Lei 9.784/99)

e a atos e / ou procedimentos administrativos com disciplina legal específica

(Art. 2º da Lei Estadual 10.177/98). A LICC corrobora e sempre antecipou tal

posicionamento. Não obstante a isso os Procon’s, principalmente o da cidade

de São Paulo vem aplicando o procedimento previsto na legislação estadual de

São Paulo, o que, “data vênia”, não se coaduna com a melhor alternativa de

solução desse conflito aparente. Ademais para as sanções e / ou autuações

realizadas na esfera federal a lei estadual, sem sombra de dúvida, não pode

ser aplicada.

As três legislações cumprem seus papéis nas suas respectivas

esferas, ora conjuntamente, ora isoladamente, de acordo com o caso prático

analisado. No caso de relação de consumo sempre se aplicará o Decreto

2.181/97 e subsidiariamente as outras legislações no que não conflitarem com

o Decreto.

Desse modo, podemos, ilustrar a aplicabilidade dos regramentos em

questão da seguinte forma:

Figura 2: Relação entre as legislações que podem ser utilizadas no processo administrativo

que apura as sanções administrativas do CDC e do Decreto 2.181/97.

Temos assim, várias possibilidades de aplicação das legislações em

questão:

1 – Aplica-se apenas a Lei 9.784/99;

2 – Aplica-se apenas a Lei 10.177/98;

3 – Aplica-se apenas o Decreto 2.181/97;

4 – Aplicam-se as 3 legislações conjuntamente;

5 – Aplica-se o Decreto e a Lei 10.177/98, no âmbito estadual;

6 – Aplica-se o Decreto e a lei 9.784/99 no âmbito Federal.

Nos casos de infrações às normas consumeiristas só poderemos

aplicar as combinações dos itens 4 a 6. No entanto o Procon de São Paulo vem

aplicando a Lei Estadual 10.177/98, embora, conjuntamente com o Decreto

privilegia a primeira.

Justamente pelo decreto traçar normas gerais é que deveria ser

observado primeiro e subsidiariamente a Lei Estadual no que não conflitar.

Decreto 2.181/97regulamentaCDC

Lei Estadual10.177/98-SP

Lei Federal9.784/99

Sabemos contudo que o ordenamento jurídico é um todo e assim

considerado deve ser harmonizado conjugando a aplicação das legislações

pertinentes a cada caso, respeitando as devidas competências.

A decisão52 abaixo mostra exatamente essa harmonização (grifos

nossos), “in verbis”:

“Recall- Imposição de obrigação de fazer - Veiculação de

publicidade - Multa cautelar na hipótese de descumprimento

l. O Procedimento Administrativo 08012.000863/2002-20, em trâmite

neste Departamento, trata de comunicado da empresa Pharmacia

Brasil Ltda., em 08.02.2002, de fls. 02/06 dos autos, informando a

detecção de problema em dois lotes do medicamento Provera®

(acetato de medroxiprogesterona). O referido produto, segundo

informação da própria fornecedora, "é um hormônio derivado da

progesterona natural (produzida pelos ovários) indicado para as

seguintes situações: sangramento uterino anormal devido a

desequilíbrio hormonal, na amenorréia secundária e na terapia de

reposição hormonal na menopausa, como adjunto a terapia de

reposição estrogênica". 2. O problema foi inicialmente detectado no

lote V5490, fabricado em fevereiro de 2001, com prazo de validade

até janeiro de 2003, no qual se verificou que algumas embalagens do

produto Provera® 2,5 mg continham, de fato, o produto Provera® 10

mg. Após investigação, concluiu-se pela possibilidade do problema

ter ocorrido também no lote V5491, pois o material de embalagem

deste lote procedia do mesmo fornecedor. O total de unidades

colocadas no mercado era de 41.624 do lote V5490 e 40.896 do lote

V5491. 3. A fornecedora informou, ainda, que "a dose recomendada

de Provera® varia de 2,5mg a 10 mg ao dia, dependendo da

indicação terapêutica e da resposta clínica individual de cada

paciente. Por isso, mesmo que a paciente tenha tomado comprimidos

de 10 mg ao invés de 2,5 mg, as reações adversas que podem surgir 52 Lima Marques, Claudia; V. Benjamim, Antonio Herman; Miragem, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor: arts. 1 a 74: aspectos materiais. São Paulo: Ed. RT, 2003, p. 767-69.

são toleráveis e estão descritas na bula do produto". 4. Ainda no

comunicado da empresa, esta informa que foram registradas

ocorrências de 04 (quatro) unidades com as embalagens trocadas, e

que havia iniciado "os procedimentos de chamamento do produto

junto às autoridades competentes conforme preconizado pela Portaria

789 de 24 de agosto de 2001". Anexo, a fornecedora encaminhou seu

Plano de Comunicação (Chamamento) - Recall do medicamento

Provera (fls. 05/06), no qual previa a comunicação aos consumidores

por meio de anúncio a ser publicado nos principais jornais do país. 5.

O DPDC, através do Ofício 777, de 21.02.2002, de fls. 09, solicitou à

Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA parecer técnico

a respeito dos riscos em se consumir l0 mg ao invés de 2,5 mg do

medicamento Provera, visto que a fornecedora havia afirmado que as

reações adversas que poderiam surgir eram conhecidas, toleráveis e

estavam escritas na bula do produto. Além disso, encaminhou à

fornecedora a notificação de n. 062, de fls. 10, determinando que a

mesma cumprisse, no prazo de 10 (dez) dias, as determinações

constantes da Portaria 789, de 24 de agosto de 2001, especificamente

em relação aos incs. III, IV, V e VIII do § l.°do art. 2.°, devendo

também apresentar o "Plano de Mídia", de que trata o art. 3.° da

mesma Portaria. 6. Em 19.03.2002, a fornecedora juntou aos autos as

informações de fls. 13/17, a respeito da campanha de chamamento,

informando que todos os distribuidores que haviam recebido o

medicamento foram comunicados e que haviam devolvido todas as

unidades que possuíam dos lotes V5490 e V5491. Além disso, informa

também que a veiculação do chamamento iniciar-se-ia em 19 de

março de 2002, por meio de mensagem nos principais jornais do país.

7. A ANVISA, pelo o Ofício 1291 /2002 – GINVE / GGIMP, de fls.

19/20 informou que "as reações adversas ao medicamento são

conhecidas como reações do tipo A. São, farmacologicamente

possíveis de se prever e que dependem da dose administrada. Dessa

forma, pacientes que porventura tenham administrado uma dose

superior àquela recomendada pelo médico estariam sujeitos ao

aparecimento dessas reações". Em relação a essas reações, o parecer

da ANVISA classifica-as em duas categorias: "/ - Reações adversas

que necessitam de atenção médica: Mais freqüentes: amenorréias,

sangramento uterino médio a grave entre períodos menstruais,

hiperglicemia (boca seca. perda de apetite, sede anormal, vontade de

urinar freqüentemente ), sangramento tipo 'mancha' entre dois ciclos

menstruais. Menos freqüentes: galactorréia, depressão mental, rash

cutâneo. 2 - Reações adversas que necessitam de atenção médica

somente se forem persistentes: Mais freqüentes: dor abdominal ou

cólica, inchaço da face, tornozelos ou pés, dores de cabeça,

alterações de humor, irritação, cansaço, fraqueza não usual, ganho

de peso. Menos freqüentes: acne, dor ou aumento de sensibilidade nos

seios, insônia, diminuição da libido, melasmas, náuseas, entre

outros". 8. O parecer ainda ressalta que "as reações adversas ao

medicamento apresentam alta incidência e morbidade e baixa

mortalidade". 9. A Coordenação Geral de Supervisão e Controle,

deste Departamento, emitiu a nota n. 40 / DPDC / SDE / MJ,

concluindo que, "embora o fornecedor não admita, conforme as

considerações da ANVISA, a ingestão do medicamento em doses

maiores que as indicadas pelo médico tem implicações importantes

para a saúde dos consumidores; ainda conforme a ANVISA, a

incidência e a morbidade decorrentes das reações causadas pelo uso

inadequado do medicamento são elevadas; e existe a possibilidade,

embora baixa, de que as reações ao uso inadequado do medicamento

Provera® leve à morte." Além disso, diante da não realização da

campanha publicitária conforme o art. 10, §§ l." e 2.°, da Lei

8.078/90, pois os anúncios foram veiculados apenas por jornais, em

desacordo com a lei, a nota sugere a instauração de processo

administrativo. 10. A Coordenação Geral de Assuntos Jurídicos,

também deste Departamento, emitiu nota ratificando a sugestão de

instauração de processo administrativo. Propôs, como medida

cautelar, a realização de nova campanha publicitária pela

representada, no prazo de 10 (dez) dias, com base no art. 6.° da Port.

789/01 e no art. 45 da Lei 9.784/99.

Sugeriu ainda, como forma de garantir o cumprimento da medida, a

imposição de multa para o caso de não atendimento à determinação,

conforme os parâmetros fixados pelo art. 9.°, V, da Lei 9.294/96. 11.

É o relatório.

12. O § 2.° do art. 10 da Lei 8.078/90 determina que os anúncios

publicitários, pêlos quais os consumidores devem ser informados a

respeito do defeito do produto ou serviço, serão veiculados pela

imprensa, rádio e televisão. 13. Pelo que consta nos autos, ficou

caracterizada a infração a este dispositivo legal, pois a comunicação

da periculosidade do produto foi realizada por anúncio publicitário

veiculado apenas pela mídia impressa. Ademais, a representada não

juntou aos autos nenhuma comprovação de haver veiculado,

efetivamente, alguma mensagem pelos jornais. 14. De acordo com o

parecer da ANVISA, o consumo de uma dosagem maior do produto

Provera pode, apesar da baixa incidência, levar o paciente à morte.

15. O art. 6.°, I, da Lei 8.078/90 define como um dos direitos básicos

do consumidor "a proteção da vida, da saúde e segurança contra os

riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e

serviços considerados perigosos ou nocivos". 16. Diante dos fatos e

das determinações legais, acolho a sugestão da nota emitida pela

Coordenação Geral de Supervisão e Controle, e determino, com base

no art. 5.° da Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999, e no art. 33,1, do

Dec. 2.181/97, a instauração de processo administrativo, em face da

empresa Pharmacia Brasil Ltda., por entender ter havido infração ao

art. 10, § 2.°. 17. Em razão dos riscos à saúde e à vida aos quais os

consumidores que utilizam o produto Provera estão expostos, e

atendendo ao dispositivo do art. 6.°, I, da Lei 8.078, de 11 de

setembro de 1990, acolho as sugestões da Coordenação Geral de

Assuntos Jurídicos e determino, com base no art. 6.° da Port. 789, de

24 de agosto de 2001, e no art. 45 da Lei 9.784, de 29 de janeiro de

1999, que a empresa Pharmacia Brasil Ltda. promova uma nova

campanha publicitária, no prazo de 10 (dez) dias, de acordo com o

art. 10, § 2.°, da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, seguindo as

determinações do art. 2.° da Port. 789, de 24 de agosto de 2001, com

o objetivo de alertar os consumidores sobre a periculosidade das

unidades do medicamento Provera constantes dos lotes V5490 e

V5491, apresentando, no prazo de 5 (cinco) dias, o plano de mídia e

teor da mensagem a ser veiculada pêlos órgãos de imprensa escrita,

radiodifusora e televisiva, devendo informar, de forma clara, os riscos

que o produto defeituoso pode proporcionar a quem consumi-lo,

conforme o art. 3.°, § 2.°, da Port. 789, de 24 de agosto de 2001.

Evitando-se eufemismos que possam resultar em desestímulo ao

consumidor em atender à campanha de recall. 18. Fica a empresa

representada ciente de que, em caso do não cumprimento da

determinação contida no item anterior, no prazo estabelecido, será

aplicada multa, com base nos arts. 56, parágrafo único, e 57,

parágrafo único, da Lei 8.078/90 e no art. 68 da Lei 9.784/99, no

valor de R$ 1.410,00 (hum mil quatrocentos e dez reais) por dia,

conforme os parâmetros fixados pelo art. 9.°, inc. V, da Lei 9.294, de

15 de julho de 1996. 19. Notifique-se a representada para, se quiser,

apresentar defesa no prazo de l0 (dez) dias, de acordo com o disposto

no art. 44 do Dec. 2.181/97. Expeça-se ofício ao Ministério Público,

para que tome ciência do presente feito.

Publique-se.”

Como se nota da decisão acima colacionada utilizou-se para o caso

em questão várias legislações, sendo duas processuais das quais tratamos:

Lei Federal 9.784/1997, Lei Federal 8.078/1990 – CDC -, Lei Federal

9.294/1996 (Dispõe sobre as restrições ao uso e à propaganda de produtos

fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas,

nos termos do § 4° do art. 220 da Constituição Federal),e Decreto 2.181/97 e

Portaria 789, de 24 de agosto de 2001.

No processo administrativo federal, ao qual a decisão acima se

refere, a lei 10.177/98 não foi utilizada. Da mesma forma se fosse um processo

administrativo estadual (São Paulo no caso) a legislação federal seria utilizada

subsidiariamente.

Não nos parece que a CF de 1988 em seu artigo 22 inciso I ao

dispor que cabe à União, privativamente legislar sobre direito processual o fez

abrangendo também o processo administrativo. Sejamos corajosos e

enfrentemos o problema. Em 1988 nossa Carta Magna já estaria antecipando

um processo de mudança social que só começou a ser implementado após

1994? Claro que não. Essa norma, constante do artigo 22 inciso I está, até

pudemos constatar, referindo-se a processo civil judicial e não a processo

administrativo.

Além do mais estamos diante do nascimento de um ramo do direito,

inexplorado, que é o Direito Regulatório. As primeiras legislações que trataram

do assunto surgiram a partir de 1997, bem como as concessões e permissões;

as agências reguladoras passaram a existir de 1995 em diante. Portanto, um

modo de produção da vida social novo reclama um novo direito e não ao

contrário, ou seja, adaptarmos a legislação à realidade.

Fato é que, estamos diante de uma lacuna da CF de 1988 (que

quando promulgada não poderia prever o futuro e não o fez) e, portanto a Lei

estadual é perfeitamente válida e aplicável. Ademais não me parece crível que

cada um dos 27 Estados brasileiros, com características próprias e peculiares

seja engessado por uma lei federal como alguns pretendem. A lei 9.784/99 não

consegue nem de longe suprir as necessidades de cada estado membro,

fazendo-se necessário uma lei estadual que condiga com a realidade de cada

um.

Outro ponto a ser considerado é a autonomia que os Estados

possuem para gerir-se no âmbito dos três poderes e fora dele. Além disso, as

duas leis, federal e estadual têm em seus dispositivos conotação geral.

Estamos num processo de descentralização e especificação de

atividades no que se refere à oferta de produtos e serviços públicos e de

relevância social. Se a lei 9.784/99 tivesse esse caráter geral como alguns

pretendem estaria remando contra a correnteza, contra a política econômica

praticada nos últimos 13 anos.

Assim, não vislumbramos qualquer ofensa à CF 1988 quanto ao

caráter geral (dentro da sua especificidade – Relação de Consumo) do Decreto

que disciplina o processo administrativo consumeirista, nem tampouco quanto

ao caráter concorrente que os Estados possuem para legislar em matéria

processual administrativa no âmbito de suas respectivas competências.

Aristóteles53 já nos ensinava que devemos contentar-nos em indicar

a verdade de forma aproximada e sumária, bem como não ficar insistido em

encontrar precisão em tudo, mas buscar apenas a precisão que o assunto

comporta e até o ponto apropriado, e assim procedemos.

4.6.1 – A RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA – NOVO PARADIGMA

Infelizmente ainda se questiona sobre a viabilidade, aplicabilidade e

necessidade da responsabilidade civil objetiva. Não obstante ao CDC já instituí-

la como “regra” ser seguida na reparação do dano, não obstante o Código Civil

novo de 2002 também prestigiá-la, nossa sociedade e principalmente os

operadores do direito (alguns) não compreendem o motivo de sua necessidade

no atual estágio de produção da vida social que vivemos.

Por isso, se ao leitor ainda restar o menor resquício de dúvida sobre

a necessidade de se aplicar esse novo paradigma na responsabilização pelos

danos, em todas as esferas das relações jurídicas, conclamamos, então, a

refletir sobre nossa exposição do capítulo 2 e também sobre o montante das

ações em curso em nosso poder judiciário e na esfera administrativa, as quais

tem como pano de fundo um dano não resolvido, não reparado, justamente

pela dificuldade que o autor possui em provar a culpabilidade (sentido genérico

– dolo ou culpa) do agente que causou o dano.

Não é nosso objetivo discorrer aprofundadamente sobre o tema

responsabilidade civil, entretanto a dúvida a respeito sobre a aplicação da

responsabilidade objetiva nos processos administrativos força-nos a abordar o

tema, traçar em linhas gerais algumas conceituações e dirimir essa pendência.

53 Aristóteles. Ética à Nicômaco – texto integral. Trad. Pietro Nassetti. Ed. Martin Claret, 2004, p. 18 e 28.

É grande a dificuldade enfrentada pela doutrina para conceituar

responsabilidade civil. Muitas são as conceituações de responsabilidade civil

que se baseiam na culpa (elemento da responsabilidade civil subjetiva,

baseada na ilicitude). A professora Maria Helena Diniz54 elenca algumas

conceituações trazidas por vários autores:

Pirson e Villé - a obrigação imposta pelas normas às pessoas no sentido de responder pelas conseqüências prejudiciais de suas ações;

Sourdat - dever de reparar dano decorrente de fato de que se é autor direto ou indireto;

Savatier - a obrigação de alguém reparar dano causado a outrem por fato seu, ou pelo fato das pessoas ou coisas que dele dependam;

Josserand - a vê sob um aspecto mais amplo, e não como mera questão de culpabilidade, mas sim de repartição de prejuízos causados, equilíbrio de direitos e interesses (risco criado, e culpa).

Serpa Lopes - é a obrigação de reparar um dano, seja por decorrer de uma culpa ou de uma outra circunstância legal que a justifique, como a culpa presumida, ou por uma circunstância meramente objetiva;

Para a Professora Maria Helena Diniz, responsabilidade civil é a

aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou

patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de

pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda

(responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal

(responsabilidade objetiva).

Acrescentamos a essa conceituação outras possibilidades de dano

como o estético e a imagem já que estes dois diferem de dano moral e

patrimonial, sendo que o dano à imagem é previsto na CF 1988 em seu art. 5º,

inciso V e portanto não é uma construção puramente civil, mas constitucional.

São pressupostos da responsabilidade civil a Ação, Dano e Nexo de

Causalidade.

54 Diniz, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. São Paulo: Ed. Saraiva, v. 7, 2004, p. 39-40;

Assim podemos entender por Ação o ato humano, comissivo o

omissivo, lícito ou ilícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio

agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano

a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.

Por Dano podemos entender a lesão (diminuição ou destruição) que,

devido a um certo evento, sofre uma pessoa, contra sua vontade, em qualquer

bem ou interesse jurídico, patrimonial, moral, estético ou à imagem, podendo

ser direito ou indireto, emergente ou cessante.

O Nexo de Causalidade diz respeito à vinculação, à relação entre a

Ação e o Dano causado

A responsabilidade civil tem como base atos ilícitos e apuração de

culpa.

A responsabilidade civil objetiva que é a contemplada pelo CDC e

por outras legislações (Código Civil 2002, CF 1988, legislações ambientais etc)

é fundada no Risco da Atividade do fornecedor. Assim, todo o fornecedor que

atua no mercado de consumo o faz voluntariamente assumindo o risco de

ganhar ou perder com sua atividade (Livre Iniciativa e Livre Concorrência). Se

ganha, se tem lucro, o mérito é só dele e seus ganhos não são divididos com

os consumidores. Se perde, se tem prejuízo também não pode impor que os

consumidores arquem com ele.

Tanto a livre iniciativa quanto a livre concorrência são irradiadas pela

Dignidade da Vida Humana, base de todo nosso ordenamento jurídico e

explicita no CDC, em seu art. 4º, que, reconhece a vulnerabilidade (está à

mercê do mercado) do consumidor perante o fornecedor (no diz respeito a

tudo), Além disso, a hipossuficiência técnica e econômica acabam por colocar

o consumidor em desvantagem em relação conhecimento técnico sobre as

características do produto ou serviço, as tecnologias empregadas e sua forma

de produção e oferta.

O consumidor não pode deixar de utilizar produtos e / ou serviços e

que devem ser adequados e seguros o suficiente para respeitar a vida e não

causar riscos ou danos, principalmente riscos e danos à saúde e segurança do

consumidor, a não ser aqueles que se espera das regras ordinárias de

experiências e vida cotidiana (Art. 8º do CDC).

A massificação da produção, acondicionamento e oferta de produtos

e serviços são, atualmente, características da sociedade capitalista neoliberal.

Essa escolha feita pelo mercado fornecedor tem uma grande implicação:

Nenhum controle de qualidade conhecido garante 100% de segurança e

funcionamento dos produtos e serviços produzidos e ofertados. O grande

volume de produção, aliado à rapidez dessa produção (produção em série) não

comporta controle de qualidade estrito, ou seja, produto a produto, serviço a

serviço; o controle de qualidade é realizado por amostragem e sendo assim,

impossível de garantir que não haja produtos e / ou serviços inadequados,

impróprios, defeituosos etc.

Desse modo, sob a ótica do que acima foi exposto, o consumidor

não tem escolha se não utilizar produtos e serviços, e como tal é dependente,

na totalidade, das condições impostas pelos fornecedores que já insere no

cálculo do custo dos produtos e serviços fornecidos um valor a título de risco

por danos que possam vir a ser causados aos consumidores (seja pela perda

do produto que a empresa tem de arcar, ou seja pelos danos que esse produto

causou ou causará ao consumidor), pois sabe que um ou outro produto ou

serviço acarretará dano a alguém.

Sob todas essas condições, fatos e presunções é que a

responsabilidade objetiva surge equilibrando a relação entre fornecedor e

consumidor, estabelecendo novo paradigma.

A questão pertinente ao nosso estudo em relação ao processo

administrativo diz respeito, então, a saber se essa responsabilidade objetiva é

ou deve ser aplicada na apuração de prática infrativa às normas de defesa do

consumidor.

Não vislumbramos qualquer óbice à aplicabilidade da

responsabilidade objetiva na apuração de prática infrativa às normas de

consumo. Aliás, temos que se deve aplicá-la não só por decorrer da

sistemática do CDC como também porque, atualmente, não é mais a

responsabilidade subjetiva que impera em nosso sistema. Esta, por sua vez

não faz frente às necessidades e não possui a eficácia desejada ao atual

sistema capitalista.

Ademais, como a responsabilidade objetiva é a regra do CDC, passa

a responsabilidade subjetiva ser exceção no sistema e só poderá ser aplicada

quando expressamente prevista, como, por exemplo, no art. 14 § 4º do CDC

(responsabilidade dos profissionais liberais).

O sistema capitalista atual não comporta mais a responsabilidade

subjetiva (sistema de apuração de responsabilidade individual e não coletiva).

As relações jurídicas extrapolaram o individual x individual; o indivíduo não atua

mais isoladamente. O crescente desequilíbrio de forças, propiciando o

surgimento de grandes e poderosas corporações (atingindo grande parcela de

consumidores nos mais diversos nichos de mercado) que irradiaram suas

tecnologias às médias, pequenas e micro-empresas, acentuando ainda mais o

desequilíbrio, gerou o predomínio dos fortes sobre os fracos, surgindo daí a

urgência de um controle mais efetivo, uma responsabilização eficaz que

produza os resultados práticos desejados e necessários.

Nesse sentido, em relação ao direito e sua eficácia citamos Von

Ihering55 em sua obra “A Luta pelo Direito” (grifos nossos):

“...sou obrigado a examinar um pouco mais de perto a relação do

direito no sentido objetivo com o direito no sentido subjetivo.

Em que consiste esta relação? Creio reproduzir fielmente a idéia

corrente dizendo: em que o primeiro forma a condição do segundo;

não existe direito concreto senão onde existirem condições pelas

quais a regra jurídica abstrata consolida a existência desse direito.

Eis aqui tudo o que a teoria dominante encontra para nos dizer.

Mas essa teoria despreza completamente um lado da questão;

preocupa-se exclusivamente com a dependência do direito concreto

em face do direito abstrato; perde de vista que uma semelhante

55 Von Ihering, Rudolf. A Luta pelo Direito. Tradução: João Vasconcelos. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2003, p. 39-40.

relação de dependência existe igualmente no sentido perfeitamente

oposto.

O direito concreto não recebe somente a vida e a força do direito

abstrato mas devolve-lhas por sua vez.

A essência do direito é a realização prática.

Uma regra do direito que jamais foi realizada ou que deixou de o ser,

não merece mais este nome, transformou-se numa rodagem inerte

que não faz mais trabalho algum no mecanismo do direito e que se

pode retirar sem que isso resulte a menor transformação.”

Assim, a responsabilidade subjetiva, como regramento, não tem

mais eficácia, podendo ser retirada do ordenamento (deixar de ser uma regra

jurídica ou ser aplicada excepcionalmente) sem maiores conseqüências.

Os fornecedores de produtos e serviços passaram a atingir não só

um ou vários consumidores, mas a coletividade inteira. Os negócios se

expandiram, atingindo áreas, regiões e pessoas antes nunca imaginados

(nacional e internacionalmente). Isso de deve, em parte, à globalização, à

tecnologia e à rapidez com que as mudanças são implementadas.

Na sociedade de massa, onde o consumo e a oferta são

massificados (não individualizado) apurar culpa é não responsabilizar e

transferir ao consumidor o risco da atividade que este não escolheu

desenvolver (nem suas formas, nem seus lucros, nem seus prejuízos).

Por outro lado, continua o fornecedor sendo o senhor do seu produto

ou serviço, continua ditando as regras de produção, custo, oferta, qualidade,

quantidade, preço, etc, o que impele seja ele responsabilizado objetivamente

(não apure culpa), até porque essa responsabilização decorre da lei (sentido

latu) que estabelece regras mínimas a serem observadas para que o produto

ou serviço não ofereça qualquer tipo de risco ao consumidor a não ser aquele

esperado, tolerado e inerente às peculiaridades e utilização a que se destina

(agentes químicos, combustíveis, energia elétrica etc).

As sanções administrativas objetivam proteger o consumidor difusa

e coletivamente, controlar e harmonizar o mercado de relações de consumo, de

modo que seria incoerente proteger o consumidor individual aplicando-se a

responsabilidade objetiva e proteger a coletividade através da responsabilidade

subjetiva. Se com a responsabilidade objetiva, com fiscalização e com o

controle é difícil e problemático proteger o consumidor e a coletividade,

imaginemos como seria sem esses instrumentos.

CCAPÍTULOAPÍTULO 5 5

CONCLUSÃO

Abordamos neste trabalho alguns aspectos polêmicos e pouco

explorados por nossa doutrina jurídica a respeito do tema relativo às Sanções

Administrativas no Código de Defesa do Consumidor.

Para o leitor atento, pode, nossa posição, parecer inusitada, mas

reflete a realidade de nossa sociedade. O que estamos dizendo é que o regime

capitalista (liberalismo e neoliberalismo) enquanto forma agressiva56 de

produção da vida social, perniciosamente permite a vulneração da pessoa

humana face ao desenvolvimento e lucro. Ora, a dignidade da pessoa humana

como bem intangível do ser humano mesmo sendo um dos fundamentos de

nossa sociedade (Art 1º, inciso III CF 1988) sofre as conseqüências danosas

da atividade econômica que indeniza, que paga e continua a desenvolver sua

atividade.

Assim, recentemente, surgem as Agências Reguladoras, como

instrumentos balanceadores da descentralização da ação estatal - com a

delegação dos serviços públicos à iniciativa privada, em busca de maior

eficiência e qualidade - e da indispensável preservação do interesse público,

vale dizer dos direitos do cidadão-consumidor

Parece-nos, entretanto, que as Agências Reguladoras têm uma

melhor identificação não com o interesse público em sentido estrito, mas com o

interesse difuso como um todo (Público, Particular e Difuso), na medida que,

como nova forma de regular a economia, ou desregular como alguns preferem,

buscam, em tese, a harmonia do mercado de consumo voltado à satisfação

das necessidades do ser humano de maneira digna e saudável realizando o

objetivo constitucional da dignidade da pessoa humana (Art. 3º da CF 1988),

protegendo a sadia qualidade de vida perquerida pelo Art. 225 da CF 1988.

Mas não só as agências reguladoras têm essa função, como

também a possuem todo e qualquer órgão e / ou entidade privada que faz parte

56 Anexo 7 - Uma Fábula para Adultos

do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor – SNDC – previsto no Art. 105

do CDC.

O tema de que tratamos é esparso e requer toda atenção. Observa-

se da introdução tratar-se de considerações atuais e que dia a dia galgam

espaço no cotidiano de cada indivíduo. Para que se realize de forma eficiente e

clara a fiscalização, o controle do fornecimento de produtos e serviços, o

Estado (sentido geral) lança mão de pessoas jurídicas com autonomia

reguladora, as autarquias, cada vez mais presentes em nossa sociedade.

O aparato de fornecimento de produtos e serviços é complexo e não

se desenvolve linearmente, de modo que falar de uma estrutura administrativa

definida e clara, nas esferas da União, Estado, Municípios e Distrito Federal, é

praticamente impossível. Para que o Estado, através da administração indireta,

nas suas respectivas esferas, aplique as normas consumeiristas deve-se

observar e conjugar o conteúdo da CF 1988 no que tange às competências dos

entes públicos (União, Estado e Municípios, Distrito Federal), do CDC do

decreto 2.181/97, da lei 8.884/94 além de outras.

Conjugando-se CDC e decreto 2.181/97 nota-se que ambos ao

instituírem o SNDC, composto dos órgãos nas três esferas de governo e

entidades privadas, traçam regras gerais de fiscalização e aplicação de

sanções administrativas. Dadas as peculiaridades de cada atividade econômica

desenvolvida pelas empresas, sejam elas concessionárias, instituições

financeiras, cooperativas etc, regras (portarias, resoluções) específicas são

criadas no intuito de regular cada atividade; contudo, é impossível que tais

diplomas fossem específicos quanto à aplicabilidade das sanções

administrativas. Cada caso será um caso. Além do mais está em perfeita

consonância com a política Neoliberal implementada desde os anos 90 em

nosso país que prega a setorização econômica.

Nesse prisma, os ensinamentos de Eros Roberto Grau, já citados,

são atuais. Numa mesma sociedade encontramos várias formas de produção

social (uma é característica, seja conjugada ou não) e cada forma exige um

direito próprio, específico, atuante e eficaz somente naquela forma de

produção.

136

O CDC e Decreto 2.181/97 fornecem linhas gerais, cabendo, então,

às entidades autárquicas, nos limites de suas competências, funções e

objetivos, todos definidos nas leis que as criaram, através de portarias e

resoluções, criar normas que regulamentem cada atividade em específico, bem

como viabilizar a aplicabilidade das sanções administrativas previstas no CDC

e Decreto (O Procon de São Paulo possui exemplo dessa viabilização –

Portaria nº 06/2000)57.

Não seria possível, diante da complexidade e variedade das

atividades industriais e comerciais, que o CDC e o Decreto 2.181/97 fossem

minuciosos a ponto de prever cada situação de aplicação de penalidade. Desse

modo cada atividade, cada grupo de atividade econômica reclama por um

direito próprio criado pelas entidades autárquicas responsáveis pela sua

fiscalização e controle.

O CDC e o Decreto 2.181/97, no que diz respeito à previsão de

aplicabilidade das sanções administrativas decorrentes da ocorrência de

práticas infrativas atentatórias às relações de consumo, está em perfeita

consonância com o fundamento e objetivo maior de nossa Constituição:

preservar, velar e proteger a dignidade da pessoa humana (Art. 1º, inciso III,

Art. 3º e incisos, Art. 5º, 6º, 170 e 225).

Temos também que o CDC traz sua própria classificação das

sanções administrativas (Arts. 57 a 60), e o faz em decorrência de sua própria

sistemática adotada pelos artigos 4º, 6º, 12, 14, 18 e 20. O art. 57 do CDC

poderá ser aplicado em qualquer circunstância, observado o caso concreto e

guardadas as devidas proporções e considerado o artigo 22 do decreto

2.181/97. O Art. 58 que trata de sanções por vício (a exceção da revogação de

concessão ou permissão de uso) se aplica em casos de infrações menos

graves consideradas aquelas que não causem dano ao consumidor individual

ou coletivamente considerado, levando em conta os artigos, 4º, 6º, 9º, 10, 18,

20, 39, 51. O art. 59 se aplica em caso de reincidência quando houver risco de

dano ou dano que não atinja a saúde e / ou à segurança do consumidor,

considerando os artigos 4º, 6º, 8º, 9º, 10, 12, 14; e se aplica também mesmo

57 Anexo 02 - Portaria Normativa Procon nº 06 de 14/06/2000.

137

que não haja reincidência em casos de risco ou dano à saúde e / ou segurança

do consumidor. O art. 60 se aplica quando houver publicidade enganosa ou

abusiva considerados os artigos 4º, 6º, 9º, 30, 36.

Quanto à legislação adjetiva a ser aplicada, no que tange ao

processo administrativo destinado a apurar prática infrativa às normas

consumeiristas, não nos resta dúvida que o Decreto 2.181/97 deve ser sempre

aplicado, podendo ser utilizado outros diplomas (como comumente são) desde

que não conflitem com o Decreto. Concluímos dessa maneira em decorrência

da especificidade da matéria que o Decreto 2.181/97 trata, ou seja, é destinado

especificamente à apuração de infrações à legislação de consumo. Ademais,

no Estado de São Paulo, é norma mais antiga (entrou em vigor em 1997 e

portanto antes da Lei Estadual 10.177/98 de São Paulo e da Lei Federal

9.784/99), além de ter aplicabilidade em todo território nacional.

Não obstante às nossas conclusões é necessário que nos situemos

em relação à realidade social brasileira. Com uma população extremamente

carente de recursos (até para garantir a sobrevivência), com uma população

com altas taxas de analfabetismo (mesmo quem é alfabetizado não entende

em qual conjuntura está inserido e nem conhece os direitos que pode

exercitar), com uma cultura individualista e não coletiva, uma grande parcela da

população não faz a menor idéia do que seja o CDC e / ou seus princípios; o

que dizer sobre a finalidade das sanções admistrativas.

Assim é que se evidencia a importância do Sistema Nacional de

Defesa do Consumidor, incluídos aqui todos os órgãos oficiais, em todas as

esferas administrativas, e os órgãos privados. Numa população totalmente

deficitária em relação ao exercício da cidadania, preocupada em sobreviver,

em melhorar suas condições de vida (grande parte sub-humana), em se

alimentar, em morar etc, faz-se necessário uma política destinada ao controle

preventivo e repressivo daquilo que é ofertado e posto à disposição dos

consumidores.

A relação jurídica de direito privado aqui destacada, antes

abandonada à iniciativa dos próprios particulares, vence o obstáculo da

subjetividade e passa a ser realizada objetivamente impondo uma conduta

138

ética em conformidade ao princípio maior que é a vida digna. Essa realização

jurídica, a qual necessita de fiscalização, controle e correção das distorções, é

efetivada através dos órgãos que integram o Sistema Nacional de Defesa do

Consumidor, tornando-se um dever não só das autoridades públicas, mas

também da sociedade como um todo.

Esperamos assim, ter contribuído de alguma forma para elucidar as

questões polêmicas relacionadas com a aplicabilidade das sanções

administrativas postas no início de nosso trabalho.

CCAPÍTULOAPÍTULO 6 6

ANEXOS

139

Anexo 1

Por sete votos a quatro, o Supremo Tribunal Federal considerou constitucional a Cobrança de Inativos e Pensionistas instituída no artigo 4º da Emenda Constitucional (EC) 41/03.

Votaram pela cobrança os ministros Cezar Peluso, Eros Grau, Gilmar Mendes, Carlos Velloso, Joaquim Barbosa, Sepúlveda Pertence e Nelson Jobim. Já a ministra-relatora Ellen Gracie e os ministros Carlos Ayres Britto, Marco Aurélio e Celso de Mello votaram contra a cobrança.

Os ministros que decidiram pela constitucionalidade da cobrança seguiram o voto do ministro Cezar Peluso, que fez ressalva quanto à instituição de alíquotas diferentes (incisos I e II do parágrafo único do artigo 4º da EC 41/03) para a contribuição de servidores dos Estados, Municípios e Distrito Federal (50%) e de servidores União (60%). Para ele, o tratamento diferenciado é inconstitucional por ferir o princípio da igualdade.

O resultado prático da decisão do Supremo é que, para todos os inativos e pensionistas, sejam eles federais ou estaduais, a contribuição previdenciária deve incidir somente sobre a parcela dos proventos e pensões que exceder o teto estabelecido no artigo 5º da EC 41/03. O dispositivo fixa em R$ 2.400 o teto para incidência da contribuição, devendo esse valor ser atualizado pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (R$ 2.508, atualmente).

Princípio da solidariedade

Ao votar pela constitucionalidade da contribuição, Peluso argumentou que o sistema previdenciário vigente no País não é regido por normas de Direito privado, mas sim pelo Direito público.

`O regime previdenciário público tem por escopo garantir condições de subsistência, independência e dignidade pessoais ao servidor idoso, mediante o pagamento de proventos de aposentadoria durante a velhice, e, conforme o artigo 195 da Constituição, deve ser custeado por toda da sociedade, de forma direta e indireta, o que bem poderia chamar-se de princípio estrutural da solidariedade´, afirmou o ministro.

Ele disse, ainda, que `no rol dos direitos subjetivos inerentes à situação de servidor inativo não consta o de imunidade tributária absoluta dos proventos correlatos.

Porém, considerou inconstitucional a diferença de alíquotas contributivas estabelecidas no nos incisos I e II do parágrafo único do artigo 4º da emenda.

140

Acompanharam Peluso os ministros Eros Grau, Gilmar Mendes, Carlos Velloso, Joaquim Barbosa, Sepúlveda Pertence e Nelson Jobim.Contra a contribuição

Na sessão de hoje, o ministro Marco Aurélio acompanhou o voto da relatora, ministra Ellen Gracie, proferido em maio deste ano, quando o julgamento foi suspenso devido ao pedido de vista do ministro Cezar Peluso.

Em seu voto, Marco Aurélio sustentou que a EC 41/03 afrontou o parágrafo 4º do artigo 60 da Constituição Federal, segundo o qual não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais, `porque cobra-se a seriedade dos representantes do povo´.

Ele salientou, ao finalizar, que o Estado tudo pode, desde que observe de forma irrestrita a Constituição Federal. `E a esta altura, considerados servidores que estão aposentados há 15 anos ou mais, introduzir quanto a eles, a título de contribuição, um ônus, diminuindo-se os proventos, é algo que conflita frontalmente com a Constituição Federal e implica até mesmo o maltrato a dignidade da pessoa humana´, afirmou.

Ao votar com a relatora, o ministro Celso de Mello abordou o princípio da proibição do retrocesso que, em termos de direitos fundamentais de caráter social, impede que sejam desconstituídas conquistas já alcançadas pelo cidadão. Segundo ele, a cláusula proíbe o retrocesso em matéria social, exceto quando há a implementação de políticas compensatórias pelas instâncias governamentais.

Além de Marco Aurélio e Celso de Mello, também votou com Ellen Gracie o ministro Carlos Ayres Britto.

Na proclamação do resultado do julgamento, o presidente do STF, Nelson Jobim, esclareceu que a Ação Direta de Inconstitucionalidade sobre a taxação dos inativos foi considerada improcedente no que se refere ao caput do artigo 4º da Emenda Constitucional 41/03, e procedente com relação aos incisos I e II do parágrafo único do artigo 4º da Emenda, sendo, portanto, inconstitucionais as expressões `50% do` e `60% do`, constantes nos incisos.

Anexo 2

PORTARIA NORMATIVA PROCON N.º 06, de 14/06/2000 - republicada no D.O.E. de 1º/07/2000

141

Dispõe sobre os critérios de fixação dos valores das penas de multa nas infrações ao Código de Defesa do Consumidor.

Considerando a necessidade de se tornar público e dar transparência aos critérios de conveniência e oportunidade adotados para a fixação, no âmbito da Fundação PROCON, dos valores das multas nas infrações ao Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11.09.90), considerando os princípios constitucionais e legais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, interesse público, motivação e eficiência a que estão adstritos todos os atos administrativos, assim como as circunstâncias da gravidade da infração, vantagem auferida, condição econômica do fornecedor, a interação desses elementos no estabelecimento dos valores mínimo e máximo para a pena, estabelecimento da pena base e as agravantes e atenuantes na fixação da pena em concreto;

O Diretor Executivo da Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor - PROCON, tendo em vista a competência prevista no art. 55 do referido código e do art. 14, VI, da Lei Estadual nº 9.192, de 23.11.95, resolve expedir a seguinte PORTARIA:

Art. 1º - A fixação dos valores das multas nas infrações ao Código de Defesa do Consumidor (art. 57 da Lei nº 8.078, de 11.09.90), dentro dos limites legais de 200 a 3.000.000 UFIRs, será feito de acordo com a gravidade da infração, vantagem auferida e condição econômica do fornecedor na forma prevista pela presente portaria.

Art. 2º As infrações serão classificadas de acordo com sua natureza e potencial ofensivo em quatro grupos (I, II, III e IV) pelo critério constante do Anexo I.

Parágrafo único. Consideram-se infrações de maior gravidade, para efeito do disposto no art. 59 da Lei 8.078/90, aquelas relacionadas nos grupos III e IV do Anexo I da Portaria Normativa Procon 6, de 14/06/2.000

* Artigo com redação determinada pela Portaria Normativa Procon n.º 14/03.

Art. 3º Com relação à vantagem auferida, serão consideradas quatro situações:a) vantagem não apurada;b) vantagem de caráter difuso;c) vantagem de caráter individual ou coletivo;d) vantagem de caráter individual ou coletivo de valor significativo ao consumidor.

Art. 4º A condição econômica do infrator será aferida por meio de sua receita mensal média.

§ 1º A receita mensal média do infrator, estimada pela Fundação PROCON-SP, poderá ser impugnada no prazo de defesa, mediante a apresentação de documento de valor fiscal ou balanço, acompanhado de prova de sua publicação oficial.

* §1º com redação determinada pela Portaria Normativa Procon n.º 18/04.

142

§ 2º A receita considerada será referente a do estabelecimento onde ocorrer a infração, salvo nos casos de infrações que atinjam outros estabelecimentos do mesmo titular, caso em que suas receitas também deverão ser computadas.

* §3º revogado pela Portaria Normativa Procon n.º 18/2004.

Art. 5º A dosimetria da pena de multa será feita em duas etapas: a fixação da pena-base dentre os seus limites mínimo e máximo previstos para a situação e, após, adição ou subtração dos montantes referentes às circunstâncias agravantes e atenuantes.

§ 1º A pena aplicada, após a consideração das circunstâncias atenuantes e agravantes, não poderá ultrapassar os limites mínimo e máximo previstos para cada situação.

§ 2º A base de cálculo para o cômputo das circunstâncias agravantes e atenuantes será sempre a pena-base fixada.

Art. 6º Em função da natureza da infração, vantagem auferida e condição econômica do infrator, os limites mínimo e máximo para a pena serão calculados em UFIR para cada situação por meio das fórmulas abaixo:

Pmáx = 3 PmínondePmáx = pena máxima em UFIR;Pmín = pena mínima em UFIR;fn = fator de natureza da infração;fv = fator de vantagem auferida; er = receita mensal média em UFIR.

§ 1º O valor do fator de natureza da infração (fn) será em função do grupo em que estiver classificada a infração:

fn Grupo

200 I

400 II

600 III

800 IV

§ 2º O valor do fator de vantagem auferida (fv) será:

fv Vantagem Auferida

20.000.000 vantagem não apurada

12.000.000 vantagem difusa

7.200.000vantagem individual ou coletiva

4.320.000 vantagem individual ou

143

coletiva de valor significativo

 

§ 3º A multa será reduzida em:

I- três quintos, se o pagamento ocorrer em 30 dias da notificação pessoal ou da juntada do AR, do auto de infração;

II- metade, se o pagamento ocorrer antes da decisão final do Diretor-Executivo;

III- um terço, se o pagamento ocorrer antes da inscrição na Dívida Ativa do Estado;

§ 4º Na hipótese do inciso I, do parágrafo anterior, a aplicação da multa não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de seis meses;

* §4º com redação determinada pela Portaria Normativa Procon n.º 18/04.

§ 5º Na hipótese do inciso I, do parágrafo 3º, o infrator reconhecendo a consistência do auto de infração, poderá impugnar o valor da multa aplicada tão somente em relação ao critério referente à sua condição econômica. Havendo decisão, a multa deverá ser recolhida em trinta dias.

§ 6º Em nenhuma das hipóteses anteriores, a pena poderá ser inferior ao estabelecido no Código de Defesa do Consumidor.

§ 7º O pagamento das multas poderá ser parcelado nos termos da Portaria Normativa Procon nº 4, de 29/07/1999.

*§§ 3º ao 7º acrescentados pela Portaria Normativa Procon n.º 16/04.

Art. 7º A pena-base será fixada, dentro dos limites estabelecidos para a situação, de acordo com as circunstâncias em que a infração for praticada, levando-se em conta, dentre outros, o grau de culpabilidade, a intensidade do dolo, os antecedentes, a conduta, os motivos, as conseqüências e a extensão da infração.

Parágrafo único. Salvo no caso de fixação no limite mínimo, deverá ser justificada a quantidade da pena-base arbitrada.

Art. 8º As circunstâncias agravantes e atenuantes estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor e no Decreto Federal nº 2.181, de 20.03.97, implicam no aumento da pena de 1/3 ao dobro ou na diminuição da pena de 1/3 à metade.

Art. 9º No concurso de práticas infrativas, a pena de multa será aplicada para cada uma das infrações, podendo, a critério do órgão, desde que não agrave a situação do autuado, ser aplicada a multa correspondente à infração de maior gravidade com acréscimo de 1/3.

Art. 10. No caso de concurso de agentes, a cada um deles será aplicada pena graduada de conformidade com sua situação pessoal.

144

Art. 11. Os cálculos serão feitos em UFIR com desprezo das frações inferiores à unidade.

Art. 12. Esta portaria entra em vigor na data de sua publicação.

Anexo I

Classificação das Infrações ao Código de Defesa do Consumidor

I) Infrações enquadradas no grupo I:

1. ofertar produtos ou serviços sem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, condições de pagamento, juros, encargos, garantia e origem entre outros dados relevantes (art. 31);

2. ofertar produtos ou serviços sem assegurar informações claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre preço (art. 31);

3. deixar de fornecer prévia e adequadamente ao consumidor, nas vendas a prazo, informações obrigatórias sobre as condições do crédito ou financiamento (art. 52);

4. omitir, nas ofertas ou vendas eletrônicas, por telefone ou reembolso postal, o nome e endereço do fabricante ou do importador na embalagem, publicidade e em todos os impressos utilizados na transação comercial (art. 33);

5. promover publicidade de produto ou serviço de forma que o consumidor não a identifique como tal de forma fácil e imediata (art. 36);

6. prática infrativa não enquadrada em outro grupo.

II) Infrações enquadradas no grupo II:

1. deixar de sanar os vícios do produto ou serviço, de qualidade ou quantidade, que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuem o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária (arts. 18, 19 e 20);

2. deixar de cumprir a oferta, publicitária ou não, suficientemente precisa, ou obrigação estipulada em contrato (art. 30 e 48);

3. redigir instrumento de contrato que regulam relações de consumo de modo a dificultar a compreensão do seu sentido e alcance (art. 46);

4. impedir, dificultar ou negar a desistência contratual e devolução dos valores recebidos, no prazo legal arrependimento, quando a contratação ocorrer fora do estabelecimento comercial (art. 49);

5. deixar de entregar, quando concedida garantia contratual, termo de garantia ou equivalente em forma padronizada, esclarecendo, de maneira adequada, em que consiste a mesma garantia, bem como a forma, o prazo e o lugar em

145

que pode ser exercitada e os ônus a cargo do consumidor (art. 50, parágrafo único);

6. deixar de fornecer manual de instrução, de instalação e uso de produto em linguagem didática e com ilustrações (art. 50, parágrafo único);

7. deixar de redigir contrato de adesão em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar a sua compreensão pelo consumidor (art. 54, § 3º);

8. deixar de redigir com destaque cláusulas contratuais que impliquem na limitação de direito do consumidor, impedindo sua imediata e fácil compreensão (art. 54, § 4º).

* Incisos I e II com redação determinada pela Portaria Normativa Procon n.º 14/03.

III) Infrações enquadradas no grupo III:

1. deixar de reparar os danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos ou serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos (art. 12);

2. colocar no mercado de consumo produtos ou serviços em desacordo com as normas de regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – CONMETRO (arts. 18, § 6º, II, e 39, VIII);

3. colocar no mercado de consumo de produtos ou serviços inadequados ao fim que se destinam ou lhe diminuam o valor (arts. 18, § 6º, III, e 20);

4. colocar no mercado de consumo produtos ou serviços em desacordo com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, da rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza (art. 19);

5. deixar de empregar componentes de reposição originais, adequados e novos, ou que mantenham as especificações técnicas do fabricante, salvo se existir autorização em contrário do consumidor (art. 21);

6. deixar as concessionárias ou permissionárias de fornecer serviços públicos adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos (art. 22);

7. deixar de assegurar a oferta de componentes e peças de reposição enquanto não cessar a fabricação ou importação do produto (art. 32);

8. impedir ou dificultar o acesso gratuito do consumidor às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes (art. 43);

146

9. manter cadastro de consumidores sem serem objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, ou contendo informações negativas referentes a período superior a cinco anos (art. 43, § 1º);

10. inserir ou manter registros, em desacordo com a legislação, nos cadastros ou banco de dados de consumidores (art. 43 e ss e 39, caput);

11. inserir ou causar a inserção de informações negativas não verdadeiras ou imprecisas em cadastro de consumidores (art. 43, § 1º);

12. deixar de comunicar por escrito ao consumidor a abertura de cadastro, ficham registro e dados pessoais de consumo, quando não solicitada por ele (art. 43, § 2º);

13. deixar de retificar, quando exigidos pelo consumidor, os dados e cadastros nos casos de inexatidão ou comunicar a alteração aos eventuais destinatários no prazo legal (art. 43, § 3º);

14. fornecer quaisquer informações que possam impedir ou dificultar acesso ao crédito junto aos fornecedores após consumada a prescrição relativa à cobrança dos débitos do consumidor (art. 43, § 5º);

15. deixar o fornecedor, na publicidade de seus produtos ou serviços; manter em seu poder para informação dos legítimos interessados, os dados fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem (art. 36, parágrafo único); ou deixar de prestar essas informações ao órgão de defesa do consumidor quando notificado para tanto (art. 55, § 4º);

16. promover publicidade enganosa ou abusiva (art. 37);

17. realizar prática abusiva (art. 39);

18. deixar de entregar orçamento prévio discriminando o valor da mão-de-obra, dos materiais e equipamentos a serem empregados, as condições de pagamento, bem como as datas de início e término dos serviços (art. 40);

19. deixar de restituir quantia recebida em excesso nos casos de produtos ou serviços sujeitos a regime de controle ou tabelamento de preços (art. 40, § 3º) 20. submeter, na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente a ridículo ou qualquer tipo de constrangimento ou ameaça (art. 42);

21. deixar de restituir ao consumidor quantia indevidamente cobrada pelo valor igual ao dobro do excesso (art. 42, parágrafo único);

22. inserir no instrumento de contrato cláusula abusiva (art. 51);

23. exigir multa de mora superior ao limite legal (art. 52, § 1º);

24. deixar de assegurar ao consumidor a liqüidação antecipada do débito, total ou parcialmente, mediante redução proporcional dos juros (art. 52, § 2º);

25. inserir no instrumento de contrato cláusula que estabeleça a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado (art. 53);

147

26. deixar de prestar informações sobre questões de interesse do consumidor descumprindo notificação do órgão de defesa do consumidor (art. 55. § 4º).

IV) Infrações enquadradas no grupo IV:

1. exposição à venda de produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, ou perigosos (art. 18, § 6º, II);

2. colocar ou ser responsável pela colocação no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança (art. 10);

3. deixar de informar, de maneira ostensiva e adequada, a respeito da nocividade ou periculosidade de produtos e serviços potencialmente nocivos ou perigosos à saúde ou segurança, ou deixar de adotar outras medidas cabíveis em cada caso concreto (art. 9º);

4. deixar de comunicar à autoridade competente a nocividade ou periculosidade do produto ou serviço, quando do lançamento dos mesmos no mercado de consumo, ou quando da verificação posterior da existência de risco (art. 10, § 1º);

5. deixar de comunicar aos consumidores, por meio de anúncios publicitários veiculados na imprensa, rádio e televisão, a nocividade ou periculosidade do produto ou serviço, quando do lançamento dos mesmos no mercado de consumo, ou quando da verificação posterior da existência de risco (art. 10, § 1º e 2º);

6. ofertar produtos ou serviços sem assegurar informação correta, clara, precisa, ostensiva e em língua portuguesa sobre seus respectivos prazos de validade e sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores (art. 31);

7. expor à venda produtos com validade vencida (art. 18, § 6º, I);

8. ofertar produtos ou serviços sem assegurar informação correta sobre seus respectivos preços.

* Itens 6 a 8 acrescentados pela Portaria Normativa Procon n.º 14/03.

Anexo 3

PORTARIA Nº 789, DE 24 DE AGOSTO DE 2001MINISTÉRIO DA JUSTIÇAGABINETE DO MINISTRO

Publicada em 27/08/2001

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Regula a comunicação, no âmbito do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - DPDC, relativa à periculosidade de produtos e serviços já introduzidos no mercado de consumo, prevista no art. 10, § 1º da Lei 8078/90.

O Ministro de Estado da Justiça, no uso de suas atribuições e;

Considerando a necessidade de regulamentação, no âmbito do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - DPDC, do procedimento de chamamento dos consumidores, previsto no artigo 10, § 1º da Lei nº 8.078/90, conhecido como "recall", que possibilite o acompanhamento pelos órgãos do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor - SNDC e pela sociedade, deste procedimento;

Considerando o disposto no art. 55 e parágrafos da Lei nº 8.078/90;

Considerando a competência do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - DPDC, da Secretaria de Direito Econômico - SDE, do Ministério da Justiça - MJ, atribuída pelo artigo 106, inciso I da Lei 8078/90;

Considerando a organização do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, resolve:

Art. 1º Regulamentar, no âmbito do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - DPDC, a comunicação determinada pelo art. 10, § 1º da Lei 8078, de 11 de setembro de 1990, por parte dos fornecedores às autoridades competentes e aos consumidores, referente à periculosidade ou nocividade de produto ou serviço já introduzido no mercado de consumo.

Art. 2º O fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade ou nocividade que apresentem, deverá imediatamente comunicar o fato, por escrito, ao Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - DPDC, da Secretaria de Direito Econômico - SDE, do Ministério da Justiça, aos PROCONs, bem como a todas as demais autoridades competentes.

§ 1º A comunicação deverá conter, além de outras informações que se fizerem necessárias, as seguintes:

I - identificação do fornecedor do produto ou serviço objeto do chamamento, informando:

a) Razão Social;

b) Nome Fantasia;

c) Ramo de Atividade;

d) CNPJ/CPF;

e) Inscrição Estadual;

f) Endereço, telefone e endereço eletrônico se houver;

II - descrição pormenorizada do defeito detectado, acompanhado das informações técnicas que esclareçam os fatos;

149

III - descrição dos riscos que o produto ou serviço apresenta, especificando todas as suas implicações.

IV - quantidade de produtos e serviços sujeitos ao defeito e o universo de consumidores que deverá ser atingido pelo chamamento.

V - como estão distribuídos os produtos e serviços objeto do chamamento, colocados no mercado, pelos Estados da Federação;

VI - a data e o modo pelo qual a periculosidade do produto ou serviço foi detectada pelo fornecedor;

VII - quais foram as medidas adotadas para resolver o defeito e sanar o risco;

VIII - descrição pormenorizada do modo de realização da campanha publicitária de informação aos consumidores (Plano de Chamamento), de que trata o artigo 3º desta Portaria, sobre a periculosidade do produto ou serviço, informando:

a) data de início e de fim da campanha (duração);

b) meios de comunicação utilizados e freqüência de veiculação;

c) as mensagens veiculadas.

d) os locais disponibilizados para reparação ou troca do produto ou serviço

§ 2º Caso o fornecedor tenha conhecimento da ocorrência de acidentes decorrentes do defeito do produto ou serviço que originou o chamamento aos consumidores, com danos materiais ou à integridade física, deverá informar ainda:

a) o local e a data destes acidentes;

b) nome, endereço, telefone, endereço eletrônico e demais meios de localização das vítimas de que disponha;

c) descrição dos danos materiais e físicos ocorridos nos acidentes;

d) existência de processos judiciais, decorrentes do acidente, especificando as ações interpostas, o nome dos autores e dos réus, as Comarcas e Varas em que tramitam e os números de cada um dos processos;

e) as providências adotadas em relação aos danos materiais e físicos sofridos pelas vítimas.

§ 3º O DPDC poderá, a qualquer tempo, expedir notificação solicitando informações adicionais ou complementares referentes à comunicação de periculosidade ou nocividade de produto ou serviço e ao Plano de Chamamento, apresentados.

Art. 3º O fornecedor deverá, além da comunicação de que trata o artigo 2º, informar imediatamente aos consumidores, sobre a periculosidade ou nocividade do produto ou serviço por ele colocado no mercado, mediante campanha publicitária que deverá ser feita em todos os locais onde haja consumidores deste produto ou serviço.

150

§ 1º A campanha publicitária será veiculada na imprensa, rádio e televisão, às expensas do fornecedor do produto ou serviço, e dimensionada de forma suficiente a que atinja o universo de consumidores adquirentes dos produtos ou serviços objeto do chamamento.

§ 2º Os anúncios publicitários deverão informar sobre o defeito que o produto ou serviço apresenta, bem como sobre os riscos decorrentes e suas implicações, as medidas preventivas e corretivas que o consumidor deve tomar e todas as demais informações que visem a resguardar a segurança dos consumidores do produto ou serviço, observado inclusive o disposto no Artigo 17 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.

§ 3º Para informar aos consumidores sobre a periculosidade ou nocividade do produto ou serviço, além dos anúncios publicitários, poderá o fornecedor utilizar-se de outros instrumentos que entender aplicáveis ao caso, como correspondência, anúncios via internet, avisos por telefone, dentre outros.

Art. 4º O fornecedor deverá apresentar ao DPDC, aos PROCONs e às demais autoridades competentes, relatórios de acompanhamento da campanha de chamamento aos consumidores, com periodicidade mínima de 60 (sessenta) dias, informando, pelo menos, o universo de consumidores atendidos (quantidade de produtos ou serviços efetivamente reparados ou trocados) até aquele momento e sua distribuição pelos Estados da Federação.

§ 1º O DPDC poderá solicitar a apresentação dos relatórios de acompanhamento em periodicidade inferior à estipulada no caput deste artigo.

§ 2º O DPDC poderá, a qualquer tempo, expedir notificação solicitando informações adicionais referentes à campanha de chamamento aos consumidores.

Art. 5º Ao término da campanha, deverá o fornecedor apresentar relatório final ao DPDC onde conste, além de outras informações que se fizerem necessárias, as seguintes:

a) a quantidade de consumidores, tanto em valores numéricos quanto em percentual relativamente ao total, que foram efetivamente atingidos pelo chamamento, em termos globais e por Estados;

b) a justificativa para o percentual de consumidores eventualmente não atendidos (produtos ou serviços não reparados ou trocados);

c) identificação da forma pela qual os consumidores tomaram conhecimento do chamamento.

Art. 6º O DPDC poderá determinar, exclusiva ou cumulativamente, a prorrogação ou ampliação da campanha, às expensas do fornecedor, caso entenda que os resultados não foram satisfatórios.

Art. 7º O fornecedor não se desobriga da reparação ou substituição do produto ou serviço mesmo findo o prazo da campanha de chamamento.

Art. 8º O não cumprimento às determinações desta portaria sujeitará o fornecedor às sanções previstas na Lei nº 8078/90 e no Decreto nº 2.181/97.

151

Art. 9º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

JOSÉ GREGORI

Anexo 4

Brinquedos Fiscalizados- São Paulo, 28/09/04

Mais de 13 mil foram apreendidos pelo Ipem-SP;

Entre capital e interior, 183 estabelecimentos comerciais foram visitados;

Ação garante segurança das crianças.58

58 Retirado do site http://www.ipem.sp.gov.br/, acessado em 18/10/2004.

152

O dia das crianças está chegando e para o comércio a época é de vendas.

Porém, alguns cuidados são necessários para garantir que o presente da

meninada não se torne uma dor de cabeça. E por isso, nos dois últimos meses

(agosto e setembro) o Instituto de Pesos e Medidas do Estado de São Paulo,

Ipem-SP, órgão vinculado à Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania,

intensificou as verificações e fiscalizações no setor de brinquedos. Resultado:

186.264 brinquedos foram fiscalizados. Destes, 13.507 apreendidos, em um

total de183 estabelecimentos comerciais visitados, na capital, em Botucatu,

Campinas, Garça, Taubaté e Sorocaba.

Brinquedos são produtos de certificação compulsória desde 1992, ou seja, para

serem comercializados necessitam do símbolo de identificação da certificação,

o selo do Inmetro, marca que garante ao cidadão a certeza de que esse

produto passou por uma série de testes. São ensaios em laboratórios para

assegurar a conformidade e qualidade do material utilizado na fabricação das

peças. As embalagens podem possuir ainda o selo de um Organismo

Certificador. Entidades credenciadas pelo Inmetro e aptas à certificação. O

Instituto da Qualidade do Brinquedo (IQB) e o Instituto Falcão Bauer (IFB) são

dois exemplos de Organismo Certificador credenciados.

Além do selo, os consumidores devem ficar atentos a outros detalhes na hora

da compra:

Observe a faixa etária para a qual o brinquedo é destinado; A idade

recomendável deve estar descrita na caixa do produto.

Leia atentamente as instruções de uso e recomendações existentes nas

embalagens. E muito importante: essas informações devem estar em língua

portuguesa;

Sempre retire o brinquedo da embalagem antes de entregá-lo para a criança. E

tenha muito cuidado com os sacos plásticos, pois podem, por um descuido,

provocar asfixia;

Lembre, montar e desmontar brinquedos é tarefa para adultos pelo menos até

você ter a devida certeza que as crianças vão saber brincar corretamente com

os brinquedos;

Outro importante cuidado é com as maquiagens, parte de muitos brinquedos,

principalmente, os voltados às meninas. Maquiagem de brinquedo não deve

ser utilizada nas crianças;

O local da compra é outro fator determinante. Lojas estabelecidas no comércio

garantem mais segurança, pois em geral, trabalham com produtos acreditados

153

e com nota fiscal, uma forma que o cidadão tem para exercer seus direitos em

caso de perdas e danos.

Proteção à integridade física e à saúde das crianças são os objetivos de todo o

trabalho desenvolvido em análises e fiscalização no setor de brinquedo.

No Brasil, os fabricantes vêm seguindo as exigências de fabricação

determinadas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas, ABNT, que

estipulam a forma de fabricação dos brinquedos.

Atualmente, a maioria dos produtos irregulares são importados, principalmente

da China. Muitos deles também entram no país contrabandeados pelo

Paraguai. Por terem preços mais baixos são mercadorias facilmente

encontradas em camelôs. O Ipem-SP fiscaliza os brinquedos expostos à venda

e retira de comercialização aqueles que não apresentam a marca do Inmetro e

do Organismo Certificador.

Em caso de dúvidas, sugestões, reclamações é possível entrar em contato com

a ouvidoria do Instituto de Pesos e Medidas, um canal aberto à sociedade. O

telefone é: 0800-13.05.22. A ligação é gratuita e pode ser feita das 8h00 às

17h00, de qualquer município do Estado. O site: www.ipem.sp.gov.br é outro

meio de entrar em contato com o trabalho desenvolvido pelo Instituto de Pesos

e Medidas.

Resumo da Fiscalização de Brinquedos

Locais da fiscalização:

Capital (nos bairros Penha, Ponte Rasa, Bom Retiro e Pari)

Interior: Botucatu, Campinas, Garça, Taubaté e Sorocaba

Estabelecimentos Comerciais Visitados: 183

Nº de Brinquedos Fiscalizados: 186.264

Nº de Apreensões: 13.507

Anexo 5

Produtos de Certificação Compulsória. A maioria fiscalizado pelos Ipem´s

Atualizado até Agosto de 200459

Produtos de Certificação Compulsória

Barras e Fios de Aço Fusível Tipo Rolha CartuchoBebedouro de Água-Elétrico Interruptores59

? Retirado do Site http://www.inmetro.gov.br/qualidade/prodCompulsorios.asp, acessado em 18/09/2004.

154

Cabo de Potência até 1 KVA Mamadeira

Cabos e Cordões Flexíveis Mangueira de PVC para GLP

Capacetes para condutores e passageiros de motocicletas e similares

Ônibus Urbano – Carroçarias

Cilindro de aço sem costura para gás metano veicular

Plugues e Tomadas

Cilindro de liga leve para gás metano veicular

Pneus Novos de Automóveis, Caminhões e Ônibus

Componentes para instalação do sistema para GNV

Pneus Novos de Motocicletas, Motoneta e Ciclomotor

Condutores Isolados com PVC, para 450/750V, sem cobertura para instalações fixas (ABNT NM 247-3 e ABNT NM 247-4)

Pneus reformados para automóveis, camionetas, caminhonetes e seus rebocados

Disjuntor Preservativo Masculino

Dispositivo de Fixação de Conteiner - Fabricação

Reator eletrônico alimentado em corrente alternada para lâmpada fluorescente tubular

Eixo Veicular Auxiliar – FabricaçãoReator para lâmpada fluorescente tubular

Embalagens para o Transporte Terrestre de Fósforos de Segurança

Recipiente de Aço para GLP – (Botijão de gás)

Embalagem Plástica para Álcool Regulador de Pressão para GLPEquipamento Elétrico para Atmosfera Explosiva

Segurança do Brinquedo

Equipamentos EletromédicosTanque de armazenamento subterrâneo de combustíveis em posto revendedor

Estabilizador de Tensão monofásico p/ tensão até 220 V e potência máxima até 3 KVA

Tubulação não- metálica subterrânea para combustíveis automotivos

Extintor de Incêndio - FabricaçãoVeículo (Rodoviário) Porta Conteiner – Fabricação e Adaptação

Filtro Tipo Prensa para óleo dieselVidros de Segurança dos Veículos Rodoviários

Fósforo

Anexo 6

Súmulas de Jurisprudência do CONAR60

Denomina-se súmula a decisão, aprovada pelo Plenário do Conselho de Ética, que ratifica jurisprudência pacífica do Conar e que caracteriza objetivamente uma infração aos dispositivos do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária.

60 Retirado do Site http://www.conar.org.br/ , acessado em 18/09/2004.

155

As súmulas são numeradas em ordem seqüencial e contêm os Artigos pertinentes do Código. A súmula poderá dispensar, à sua simples invocação pelo relator do feito, o seu parecer, bem como fundamentar a concessão de uma medida liminar de sustação da veiculação do Anúncio.

Até a presente data, dezembro de 2002, existem sete decisões sumuladas:

Súmula nº 1, de 15 de agosto de 1988"O ANÚNCIO DE PRODUTO FARMACÊUTICO POPULAR SUJEITO À LEGISLAÇÃO SANITÁRIA E NÃO REGISTRADO PERANTE O ÓRGÃO COMPETENTE DO MINISTÉRIO DA SAÚDE PODERÁ TER A SUA VEICULAÇÃO IMEDIATAMENTE SUSTADA."

Fundamento: Artigos 1º e 50, letra "c", do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária e seu Anexo "I", item 1.

Súmula nº 2, de 15 de agosto de 1988"PRODUTO FARMACÊUTICO CONSIDERADO ÉTICO PELA AUTORIDADE SANITÁRIA (aquele cuja comercialização se faça somente mediante prescrição médica) NÃO PODERÁ SER ANUNCIADO EM VEÍCULO DE COMUNICAÇÃO DE MASSA E SUA DIVULGAÇÃO PODERÁ SER IMEDIATAMENTE SUSTADA."

Fundamento: Artigos 1º e 50, letra "c", do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária.

Súmula nº 3, de 15 de agosto de 1988"O ANÚNCIO DE PRODUTO OU SERVIÇO SUJEITO A REGISTRO OU LICENCIAMENTO DE AUTORIDADE PÚBLICA FEDERAL, ESTADUAL OU MUNICIPAL TERÁ SUA VEICULAÇÃO SUSTADA LOGO QUE FOR APURADA A INSATISFAÇÃO DESSAS EXIGÊNCIAS LEGAIS."

Fundamento: Artigos 1º e 50, letra "c", do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária.

Súmula nº 4, de 07 junho de 1990"ANÚNCIO DE ARMAS DE FOGO NÃO DEVERÁ SER EMOCIONAL; NÃO DEVERÁ SUGERIR QUE O REGISTRO DO PRODUTO SEJA UMA FORMALIDADE SUPERADA FACILMENTE COM OS SERVIÇOS OFERECIDOS PELO ANUNCIANTE; NÃO FARÁ PROMOÇÕES, NÃO APREGOARÁ FACILIDADE DE PAGAMENTO, REDUÇÃO DE PREÇOS, ETC.; ALÉM DISSO NÃO SERÁ VEICULADA EM PUBLICAÇÃO DIRIGIDA A CRIANÇAS OU JOVENS E NEM NA TELEVISÃO, NO PERÍODO QUE ANTECEDER ÀS 23 HS ATÉ AS 6 HS. DEVERÁ, POR OUTRO LADO, EVIDENCIAR QUE A UTILIZAÇÃO DO PRODUTO EXIGE TREINAMENTO E EQUILÍBRIO EMOCIONAL E ACONSELHARÁ A SUA GUARDA EM LUGAR SEGURO E FORA DO ALCANCE DE TERCEIROS."

Fundamento: Artigos 1º, 3º, 6º e 50, letra "c", do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária e seu Anexo "S", itens de 1, 2, 3, 4 e 5.

156

Súmula nº 5, de 11 de fevereiro de 1993"NENHUM ANÚNCIO, A NÃO SER OS DA PRÓPRIA INSTITUIÇÃO, PODERÁ SE UTILIZAR DO SÍMBOLO OFICIAL E OU DO NOME DO CONAR, NEM MESMO PARA ENALTECER ATOS OU DECISÕES DO CONSELHO."

Fundamento: Artigos 1º, 5º, 43 e 50, letra "c", do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária.

Súmula nº 6, de 17 de junho de 1993"A NÃO INDICAÇÃO DE DIREÇÃO MÉDICA, OU MÉDICO RESPONSÁVEL, COM O NOME DO PROFISSIONAL E RESPECTIVO REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA AUTORIZA O DEFERIMENTO DA MEDIDA LIMINAR DE SUSTAÇÃO DA VEICULAÇÃO DA PUBLICIDADE DE TRATAMENTO OU OUTROS SERVIÇOS MÉDICOS, INDEPENDENTEMENTE DOS ASPECTOS QUE AINDA POSSAM OU DEVAM SER ANALISADOS, POSTERIORMENTE, PELO CONSELHO DE ÉTICA."

Fundamento: Artigos 1º e 50, letra "c", do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária e seu Anexo "G", itens 3 e 4, letras "a" e "b".

Súmula nº 7, de 5 de dezembro de 2002O ANÚNCIO QUE DIVULGAR VENDA DE PRODUTO MEDIANTE PAGAMENTO EM PARCELAS DEVERÁ REVELAR OBRIGATORIAMENTE: 1) O PREÇO À VISTA; 2) NÚMERO E O VALOR DAS PRESTAÇÕES; 3) AS TAXAS DE JUROS INCIDENTES; 4) OS DEMAIS ENCARGOS A SEREM, EVENTUALMENTE, SUPORTADOS PELO CONSUMIDOR; E 5) O PREÇO TOTAL A PRAZO.”

Fundamento: artigos 1º, 27, e § 3º, 50 letra “c”, do CBARP e seu ANEXO “F”

Anexo 7

Uma Fábula para Adultos61

A. Joaquim, o dono do restaurante da esquina, resolveu vender, além dos seus

produtos normais, pequenos pacotes de amendoins, para aumentar seus

lucros.61 Leone, George Sebastião Guerra. Custos – Planejamento, Implantação e Controle. São Paulo: Ed. Atlas, 3ª ed., 2000, p. 407-09.

157

Seu contador, o Sr. Apropriador de Custos, que vem mensalmente encerrar os

livros do restaurante, avisa ao nosso Joaquim que este tem uma "bomba em

suas mãos".

Contador: Joaquim, você me disse que quer vender estes amendoins porque

grande número de pessoas deseja comprá-los; será que você já pensou no

custo?

Joaquim: É lógico que não vai me custar nada. É lucro líquido. É verdade que

eu tive de pagar Cr$ 3.750,00 pela prateleira, mas os amendoins custam Cr$

9,00 o pacote e eu os venderei por Cr$ 15,00. Espero vender 50 pacotes por

semana para começar. Em 12 semanas e meia cobrirei o custo da prateleira.

Depois disso, terei um lucro líquido de Cr$ 6,00 por pacote. Quanto mais

vender, maior o lucro.

Contador: Este seu ponto de vista é antiquado e completamente irreal. Hoje

em dia, os métodos aperfeiçoados de contabilidade permitem que façamos um

estudo mais aprofundado, que demonstra a complexidade do problema.

Joaquim: O quê?

Contador: Quero dizer que devemos integrar toda a operação "venda de

amendoins" dentro da sua empresa e apropriar aos pacotes de amendoins a

sua parcela correia do total das despesas gastas. Devemos apropriar aos

pacotes uma parte proporcional das despesas do restaurante com aluguel, luz,

aquecimento, depreciação, salários dos garçons, do cozinheiro etc.

Joaquim: Do cozinheiro? O que é que ele tem a ver com os amendoins? Ele

nem sabe que eu os vendo.

Contador: Olhe, Joaquim, o cozinheiro trabalha na cozinha, a cozinha prepara

a comida, a comida traz os fregueses que serão os compradores dos

amendoins. Por isso é que você deve apropriar ao custo das vendas dos

amendoins tanto uma parte do salário do cozinheiro quanto uma parte do seu

próprio salário. Veja este quadro demonstrativo; ele contém uma análise de

custos cuidadosamente calculada e indica que o lucro operacional deve ser

igual a Cr$ 191.700 por ano, para cobrir as despesas gerais.

Joaquim: Os amendoins? Cr$ 190 mil cruzeiros por ano de

despesas gerais? Essa não...

Contador: Na verdade, o total dessas despesas é um pouco

superior a isto. Todas as semanas você tem despesas com limpeza e lavagem

158

das janelas e do chão, com a reposição dos sabonetes consumidos no

Lavatório e com cervejinhas para o guarda. O total então sobe a Cr$ 196.950

por ano.

Joaquim: (Pensativo) — O vendedor de amendoins me disse que eu

conseguiria bons lucros — era só colocar os pacotes perto da caixa

registradora e pronto — Cr$ 6,00 de lucro por pacote vendido.

Contador: (Torcendo o nariz) — Ele não é um contador. Você sabe quanto lhe

custa a porção de espaço sobre o balcão, ao lado da caixa registradora?

Joaquim: Não custa nada — não cabe nem um freguês extra — é um espaço

morto, inútil.

Contador: O ponto de vista moderno sobre custos não nos permite pensar em

espaços inúteis. O seu balcão ocupa 6 m2 e as vendas anuais totalizam Cr$

2.250.000 por ano. Logo, o espaço ocupado pela prateleira de amendoins lhe

custará Cr$ 37.500 por ano. Desde que você retire aquela área de uso geral,

deve debitar o seu custo ao ocupante real do espaço.

Joaquim: Você quer dizer que eu devo acrescentar Cr$ 37.500 por ano a mais

como despesa com a venda de amendoins?

Contador: Justamente. Isto elevará os custos gerais da operação a um total

geral de Cr$ 234.450 por ano. Ora, se você quer vender 50 pacotes de

amendoins por semana, estes custos representarão Cr$ 90,00 por pacote.

Joaquim: O quê?

Contador: Evidentemente, devemos acrescentar a isto o preço de compra de

Cr$ 9,00 por pacote, o que nos dará o total de Cr$ 99,00. Ora, se você

pretende vender cada pacote por Cr$ 15,00, obterá como resultado uma

perda líquida por pacote de Cr$ 84,00.

Joaquim: Existe aqui alguma coisa esquisita.

Contador: Veja os números. Eles provam que a venda de amendoins é

deficitária.

Joaquim: (Com um sorriso inteligente) — E se eu vender muitos pacotes — mil

pacotes por semana, em vez de somente 50?

Contador: (Com um ar tolerante) — Joaquim, você não entendeu o problema.

Se o volume de vendas aumentar, o mesmo acontecerá com os seus custos

operacionais — maior número de pacotes, maior o tempo gasto, maior

depreciação, mais tudo. O princípio básico da Contabilidade de Custos é

159

invariável: "Quanto maiores as operações, maiores os custos gerais a serem

apropriados." Não, o aumento do volume de vendas não o ajuda em nada.

Joaquim: OK, já que você sabe tanto, o que devo fazer?

Contador: (Condescendente) — Bem, você poderia reduzir seus custos

operacionais.

Joaquim: Como?

Contador: Mude-se para um imóvel de aluguel mais baixo. Diminua os

salários, mande lavar as janelas somente de 15 em 15 dias; não coloque mais

sabonetes nos lavatórios, diminua o custo por metro quadrado do seu balcão.

Por exemplo, se você conseguir reduzir suas despesas em 50%, a porção das

despesas gerais apropriadas à venda dos pacotes de amendoins passará de

Cr$ 234.500 para Cr$ 117.250 por ano, reduzindo o custo a Cr$ 54,00 por

pacote.

Joaquim: (Não muito satisfeito) – Será isso interessante?

Contador: É lógico que sim. Contudo, ainda assim você perderia Cr$ 39,00 por

pacote, se o seu preço de venda for somente de Cr$ 15,00 por pacote.

Portanto, você deverá aumentar o preço de venda. Se desejar um lucro de Cr$

6,00 por pacote, o seu preço de venda deverá ser igual a Cr$ 60,00.

Joaquim: (Desolado) — Você quer dizer que, depois de reduzir minhas

despesas de 50% ainda tenho que cobrar Cr$ 60,00? E quem vai comprá-lo, a

este preço?

Contador: Isto é uma consideração secundária. O que interessa é que Cr$

60,00 é um preço de venda baseado em uma avaliação real e justa dos seus

custos operacionais já reduzidos.

Joaquim: (Satisfeito) — Olhe. Eu tenho uma idéia melhor. Por que não jogar

fora os amendoins?

Contador: Será que você pode suportar tal perda?

Joaquim: Certamente. Só possuo 50 pacotes — ou seja, Cr$ 450,00, e mais

uma prateleira no valor de Cr$ 3.750,00; jogo tudo fora e pronto, acabou-se

esta porcaria de negócio de amendoins.

Contador: (Balançando a cabeça) — Joaquim, isto não é tão simples assim.

Você está no negócio de amendoins. Se você jogar fora esses amendoins você

estará adicionando Cr$ 234.450,00 de despesas gerais anualmente ao total

160

das suas despesas operacionais. Joaquim, seja realista, esta perda você não

pode suportar.

Joaquim: (Desesperado) — É incrível. Na semana passada eu estava

ganhando dinheiro. Hoje eu estou atrapalhado — só porque pensei que

amendoins sobre o balcão...só porque eu pensei em 50 pacotes de

amendoins por semana.

Contador: (Com um olhar sério) — O objetivo dos estudos modernos de custo

Joaquim é eliminar essas falsas ilusões.

161

CCAPÍTULOAPÍTULO 7 7

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