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E

Maio-Junho, 2008 ULTIMATO 3

abertura

Os que querem ser perdoados, restaurados, salvos do pecado e da morte, têm de se aproximar de Deus de

bolso vazio, sem defesa, sem desculpa, sem explicação

Entre a carteira recheada e o bolso vazio, a segunda opção é muito melhor que a primeira. O pão-durismo e o consumismo têm muito a ver com a carteira recheada. A viúva de bolso vazio depositou no gazofilácio “duas pequenas moedas de cobre, de muito pouco valor”. Ela deu tudo o que possuía para viver. Mas os de carteira recheada lançaram no mesmo gazofilácio o que lhes sobrava (Mc 12.41-44).

A pior marca da carteira recheada é o estado de espírito acentuadamente complicado e perigoso que ela fomenta: a auto-suficiência. A carteira recheada pode ser um bom passaporte nesta vida e neste mundo, mas não abre porta alguma em direção a Deus, tanto nesta como na outra vida. Só se chega a Deus de bolsos vazios. O homem e a mulher de carteiras recheadas dificilmente bateriam em seu peito para clamar: “Ó Deus, tem pena de mim, pois sou pecador!” (Lc 18.13, NTLH).

Setecentos anos antes de Cristo, a voz de Deus já falava aos desprovidos: “Venham, todos vocês que estão com sede, venham às águas; e vocês que não possuem dinheiro algum, venham, comprem e comam! Venham, comprem vinho e leite sem dinheiro e sem custo” (Is 55.1). De fato, as boas novas da salvação são para...

Os sem-água, os sem-dinheiro, os sem-leite e os sem-pão.

Os sem-perdão de pecados, os sem-reconciliação com Deus e os sem-paz de espírito.

Os sem-vez, os sem-valor, os sem-obras, os sem-razão, os sem-merecimento, os sem-crédito e os sem-saldo.

Os que querem ser perdoados, restaurados, salvos do pecado e da morte, têm de se aproximar de Deus de bolso vazio, sem defesa, sem desculpa, sem explicação, sem pretensão, sem esmola, sem história de sucesso.

A base da salvação repousa unicamente na graça de Deus: “Vocês são salvos pela graça mediante a fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus”. Não é por meio de alguma obra “para que ninguém se glorie” (Ef 2.8-9). Pois “as nossas boas ações, que pensamos ser um lindo manto de justiça, não passam de trapos imundos” (Is 64.6, BV).

Martinho Lutero só teve consciência do perdão de seus pecados depois de se apresentar de bolsos vazios diante de Deus.

O reformador declarava que não temos nenhum recurso próprio, nenhuma possibilidade de livramento em nós mesmos porque “não só as nossas injustiças são imundas, mas também as nossas justiças” (Martinho Lutero, Obras Selecionadas, v. 1, p. 357). Ele

chamava graça àquela grande abóbada debaixo da qual colocava toda a imundícia que os escribas fariseus escondiam dentro dos sepulcros caiados ou que deixavam dentro do copo. Ele transferia todos os

seus pecados, a sua miséria moral, o seu sentimento de

culpa, as suas imundas “justiças”, o seu

desespero, o seu pavor do inferno e a ele mesmo por inteiro para debaixo daquela enorme

calota que é a graça de Deus (Conversas com Lutero, p. 138).

Enquanto os de carteira recheadas não se humilharem, tornando-se iguais aos de bolso vazio, não haverá salvação para eles. Daí o apelo do profeta: “Venham, todos vocês que estão com sede (...) e vocês que não possuem dinheiro algum, venham comprem e

comam!” (Is 55.1).

De bolso vazio!

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ATENDIMENTO AO LEITOR Telefones: (31) 3891-3149 0300 313 1660 Fax: (31) 3891-1557E-mail: [email protected] Postal 4336570-000 · Viçosa, MG

Editora Ultimato

Man

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ULTIMATO Maio-Junho, 2008 4

carta ao leitor

Fundada em 1968

ISSN 14153-3165Revista Ultimato

Ano XLI · NÀ 312Maio-Junho 2008

Direção e redaçã[email protected]

Elben M. Lenz César (Jornalista responsável)MTb 13.162 MG

AdministraçãoKlênia Fassoni, Daniela Cabral, Lenira Andrade

VendasLucia Viana, Lucinéa de Campos,

Romilda Oliveira, Tatiana Alves e Vanilda Costa

Editorial e ProduçãoMarcos Bontempo, Bernadete Ribeiro,

Djanira Momesso César, Fernanda Brandão Lobato e Roberta Dias

Finanças / CirculaçãoEmmanuel Bastos, Aline Melo, Aparecida Peixoto, Edson Ramos, Emílio Gonçalves, Luís Carlos Gonçalves, Rodrigo Duarte e

Solange dos Santos

EstagiáriosAlaila Ribeiro, Bruno Tardin, Daniel Figueiredo, Fabiano Ramos, Hadassa Alves, Ivny Monteiro,

Larissa Caldeira, Luci Maria da Silva, Macel Guimarães, Marcela Pimentel e Priscila Rodrigues

Arte - OliverartelucasImpressão - Plural

Tiragem - 35.000 exemplares

Łrgão de imprensa evangélico destinado à evangelização e edificação, sem cor

denominacional, Ultimato relaciona Escritura com Escritura e acontecimentos com Escritura. Pretende associar a teoria com a prática, a fé com as obras, a evangelização com a ação

social, a oração com a ação, a conversão com a santidade de vida, o suor de hoje com a glória por vir. Circula nos meses ímpares.

Publicado pela Editora Ultimato Ltda., membro da Associação de Editores Cristãos (AsEC)

Os artigos não assinados são de autoria da redação. Reprodução permitida. Obrigatório

mencionar a fonte.

Assinatura Individual - R$ 55,00Assinatura Coletiva - desconto de 50% sobreo preço da assinatura individual para cadaassinante (mínimo de 10)Assinatura Exterior - R$ 97,00Edições Anteriores - [email protected]úncios [email protected]

No dia 12 de abril de 2008 saí de Viçosa, MG, às 5h30 da manhã em direção a Conceição de Macabu, RJ, onde deveria pregar na comemoração dos 100 anos de David Alves, uma ex-ovelha de cinqüenta anos atrás. Foi difícil conseguir permissão de minha esposa e filhas para ir de carro. Eu queria ver o verde das árvores, o azul do céu, o amarelo-avermelhado do nascer e do pôr-do-sol enquanto dirigisse o carro.

No início da viagem, a neblina mal me deixava enxergar o asfalto. Antes de começar a ver o verde, o azul e o amarelo, vi a coisa mais feia deste mundo: a morte. Logo depois de uma curva, lá estava em pedaços um caminhão que batera violentamente em um barranco, cheio de botijões de gás. O acidente, ocorrido poucos minutos antes, fora tão violento que não era possível localizar a cabine do caminhão. Vi também outra coisa muito feia: o dono de um dos automóveis que lá estavam colocou em seu carro dois ou três botijões de gás...

Doze horas depois de ver o verde, o azul, o amarelo e a morte, já em Conceição de Macabu, eu vi a vida! Encontrei-me com David Alves, nascido em 11 de abril de 1908. Ele nunca tivera câncer nem doenças cardíacas, nunca fora atingido por uma bala perdida, nunca sofrera um acidente fatal, nunca fora vítima de latrocínio. O ancião tem sete filhos, 51 netos, 79 bisnetos e cinco tetranetos.

São ao todo 142 descendentes diretos, sem contar os cônjuges.

Por coincidência, eu havia lido na Bíblia, no dia anterior, o texto de Jeremias que separa os velhos dos bem velhos (6.11). Velho seria eu (78) e bem velho, o centenário David Alves. Diante daquela multidão de parentes e amigos dele, li duas passagens das Escrituras Sagradas. Na primeira, o salmista descreve o início da vida, quando o espermatozóide fecunda o óvulo e aquela “substância ainda informe” (o embrião) vai sendo entretecida, de “modo especial e admirável”, até completar-se e poder dispensar o ventre materno (Sl 139.13- 18). Na segunda, o apóstolo Paulo afirma categoricamente que “se for destruída [pela morte] a temporária habitação terrena em que vivemos [o corpo], temos da parte de Deus um edifício, uma casa eterna nos céus, não construída por mãos humanas” (2Co 5.1). A vida futura será, para os que estão vivos hoje, uma experiência absolutamente nova, ligeiramente parecida com a do parto.

A vida não é “o caminho entre o nascimento e a morte”, como diz o Dicionário de Psicologia Dorsch. À luz do cristianismo, a vida é maravilhosa e infinitamente mais que o mísero período de tempo espremido entre as dores do parto e as dores do sepultamento! Aleluia!

E. César

A morte e a vida

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Incapazes de latirU

ULTIMATO Maio-Junho, 2008 6

PastoraisPastorais 56

A missão de latir não pertence apenas aos

pastores. Ela se estende a todos aqueles que têm alguma posição

relevante na sociedade e são, portanto, co-responsáveis pela

segurança de todos

Uma vez treinados, os cães servem para a guarda da casa e de outros bens de seus donos. São capazes de proteger lojas e fábricas à noite. Ao latir e rosnar, amedrontam ladrões e acordam quem está dormindo, em caso de fogo. Se esses cães perderem a capacidade de latir, já não servem para cães de guarda.

Por serem responsáveis pela segurança religiosa do povo de Deus, alguns homens e mulheres são vocacionados, preparados e empossados como atalaias, guardas, líderes, pastores, sentinelas ou vigias dos fiéis. Com muita freqüência, esses “cães de guarda” dão mau testemunho, cometem escândalo, tornam-se mercenários e abandonam o rebanho, principalmente na longa história de Israel. Há muitas queixas contra eles no Antigo Testamento.

Todas muito severas. Uma delas encontra-se em Isaías 56.10: “As sentinelas de Israel estão cegas e não têm conhecimento; todas elas são como cães mudos, incapazes de latir. Deitam-se e sonham; só querem dormir”.

Isaías 56.9-12 mostra que esses pastores são incapazes de

enxergar o perigo (“não têm conhecimento”), de latir (“são como cães mudos”), de permanecer

acordados (“só querem dormir”), de controlar a

gula (“são cães devoradores insaciáveis”), de se submeterem

ao Senhor (“todos seguem seu próprio caminho”), de abrir mão dos seus interesses pessoais (“cada um procura vantagem própria”) e incapazes de frear sua decadência (“bebamos nossa dose de bebida

fermentada, que amanhã será como hoje, e até muito melhor”).

O que mais impressiona é a denúncia de que são “incapazes de latir”. Tornaram-se cães emudecidos que não sabem, não podem e já não conseguem latir ou ladrar. Então, para que servem? Quando o ladrão se aproxima, quando o lobo ataca o rebanho, eles não ladram. O rebanho fica, dessa forma, perigosamente desprotegido.

A missão de latir não pertence apenas aos pastores. Ela se estende a todos aqueles que têm alguma posição relevante na sociedade e são, portanto, co-responsáveis pela segurança de todos. Entre eles estão os pensadores, os sociólogos, os comunicadores, os professores, os governantes, os legisladores, os psicólogos, os estatísticos, os militares, os juízes etc. Se todos forem incapazes de latir, o caos ético se instalará de forma alarmante, globalizada e irreversível.

O pai e a mãe de crianças e adolescentes têm a obrigação de “latir” em benefício de seus filhos, livrando-os de desperdiçar a saúde e a vida nos caminhos desastrosos da incredulidade, da secularização, do crime, do álcool e das drogas e da promiscuidade sexual. A qualquer perigo, a qualquer desvio e a qualquer ameaça, o pai e a mãe, em uníssono, precisam emitir aqueles “latidos” que assustam tanto o assaltante como a vítima.

Talvez fosse bom verificar ao nosso redor: os “cães de guarda” que nos rodeiam tornaram-se incapazes de latir? Nós mesmos nos tornamos cães mudos, incapazes de latir?Ro

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Seções

Capa

Maio-Junho, 2008 ULTIMATO 7

“Busquem o Senhor enquanto é possível achá-lo”IS 55.6

ABREVIAÇÕES:BH - Bíblia Hebraica; BJ - A Bíblia de Jerusalém; BV - A Bíblia Viva; CNBB - Tradução da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil; EP - Edição Pastoral; EPC - Edição Pastoral - Catequética; NTLH - Nova Tradução na Linguagem de Hoje; TEB - Tradução Ecumênica da Bíblia. As referências bíblicas não seguidas de indicação foram retiradas da Edição Revista e Atualizada, da Sociedade Bíblica do Brasil, ou da Nova Versão Internacional, da Sociedade Bíblica Internacional.

Refl exãoRobinson CavalcantiA mui piedosa esquerda cristã 38Ricardo GondimDesde 1968 40

Redescobrindo a Palavra de DeusComo será que está a Maria? Será que ela carrega o vírus da aids no seu corpo?, Valdir Steuernagel 42

HistóriaA integridade do evangelho: uma avaliação do neopentecostalismo, Alderi Souza de Matos 44

EntrevistaRaimundo César Barreto JúniorO sucesso da não-violência 47

O caminho do coraçãoTudo em comum, Ricardo Barbosa de Sousa 52

Da linha de frenteOrgulho e preconceito, Bráulia Ribeiro 54

Arte e culturaCaetano e Cristo, Mark Carpenter 58

Ponto fi nalSalvação que embeleza, Rubem Amorese 66

Doenças não catalogadas pela medicina que podem e devem ser tratadas 26

O caminho confuso e perigoso da terapia de vidas passadasCarlos Caldas 28

Você precisa ser curado... 30

Feridas físicas e morais da sola dos pés ao alto da cabeça 32

Abertura 3Carta ao leitor 4Pastorais 6Cartas 8Quadro de avisos 13Mais do que notícias 14Números 20Nomes 22Frases 23Reportagem 24Em Jesus você pode confi ar 31Novos acordes 53 Deixem que elas mesmas falem 56Meio ambiente e fé cristã 57Ação mais que social 60Vamos ler! 62Prateleira 63Agenda 64

EspecialA dança do “quero” e “não quero” 36

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Leia em www.ultimato.com.br• Minha vida tem feito diferença? (seção “Altos papos”), por Jeverton Magrão Ledo

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ULTIMATO Maio-Junho, 2008 8

Viv GriggAo relacionar a refl exão Mui bíblica missão integral (março/abril

2008, p. 38), de Robinson Cavalcanti, com as respostas de Viv

Grigg na entrevista O inverso da cultura (p. 48), dá para perceber

que formular a teologia da missão integral é uma coisa, mas vivê-la é algo completamente diferente! A nossa teologia calvinista é

bíblica e excelente; o que nos falta é vivenciá-la no cotidiano.

REV. DEWEL LOMÔNACO BRAGAItajubá, MG

Que coisa! Leio na entrevista com Viv Grigg que as igrejas O

Brasil para Cristo, Assembléia de Deus, Deus é Amor, entre

tantas outras igrejas pentecostais (sempre desprezadas e

ridicularizadas pelas co-irmãs clássicas da Reforma), têm feito

a tal missão integral desde 1910! Agora é que vocês prestaram

atenção nesse fato! Benza a Deus! Nem tudo está perdido!

PAULO CÉSAR SAMPAIOFortaleza, CE

Acabo de ler a entrevista com Viv Grigg. Coincidência ou

não, terminei de ler há pouco o livro A Crucifi cação de Felipe Strong, de Charles Sheldon, o mesmo autor de Em seus Passos o que Jesus Faria? É impressionante como os

temas são próximos. Aguardo ansioso o relançamento de

Servos entre Os Pobres, de Grigg.

GUSTAVO BRANDÃOCuritiba, PR

Deus é fielTenho o privilégio de acompanhar Ultimato desde a sua

concepção e nascimento. Guardo todos os números. Leio

da primeira à ultima página, de “Pastorais” ao “Ponto

fi nal”. Quanta coisa eu mesma gostaria de ter escrito, e

as vejo tão bem colocadas nas palavras dos articulistas.

É o caso do artigo Deus é fi el... e eu? (março/abril

2008, p. 15). Parece que estava revendo as perguntas

que sempre faço ao ver este adesivo em tantos carros.

Precisamos rever nossa conduta. Estamos sendo fi éis

nos dízimos, nas ofertas, nos cargos que ocupamos na

igreja, no casamento realizado na presença do Senhor,

na educação de nossos fi lhos para o Senhor? Nestes

quarenta anos, Ultimato tem nos ajudado muito a sermos

fi éis ao Deus que é fi el.

MÁRCIA BROCHADO SEVERINO DA SILVARio de Janeiro, RJ

O Jesus dos EvangelhosGostei de ler Ultimato não quer fazer o papelão de deixar Jesus de lado (março/abril 2008, p. 37). O testemunho da

revista é mesmo cristocêntrico. Nestes dias relativistas,

pluralistas, hedonistas e subjetivistas é muito importante

ler e ouvir coisas que vão contra a correnteza e apontam

para Cristo, o Salvador do mundo. Há aqueles que falam

de Jesus, mas negam as doutrinas básicas da encarnação,

morte, ressurreição e ascensão. Ou simplesmente

usam o nome de Jesus como amuleto, desconhecendo a

profundidade de seu sacrifício.

ALEX ESTEVES DA ROCHA SOUSASete Lagoas, MG

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Maio-Junho, 2008 ULTIMATO 9

Verdades contundentesAprecio a linha de Ultimato, ora anunciando, ora

denunciando. Gosto mais da denúncia. Sou fã dos audazes,

daqueles que sem medo revelam as falhas, como o profeta

Elias diante do rei Acabe (1Rs 8.15) e João Batista diante

do rei Herodes (Lc 3.19). Os dois possuíam o espírito de

ousadia, aquele espírito que nos livrará da ira divina. Tenho

muita admiração pelas refl exões, em especial as de Ricardo

Gondim, pela sinceridade como encara os fatos, por sua

linguagem clara e objetiva e por sua destreza em revelar

verdades contundentes. Parabéns editores e colaboradores!

MARIA CARMINA SAMPAIO TORRES Belém, PA

HomossexualidadeA edição de janeiro/fevereiro de Ultimato abordou a questão da

homossexualidade. O assunto é candente e muito complexo.

Como psicólogo, tenho atendido diversas pessoas, de ambos

os sexos, com tendências homossexuais. Parece que a natureza

e a vida pregam peças em algumas pessoas. Num corpo

biologicamente masculino colocam sentimentos femininos;

e num corpo biologicamente feminino colocam sentimentos

masculinos, criando um tremendo confl ito. É preciso esclarecer

que este é um dos tipos de homossexualidade bastante

freqüentes. A homossexualidade traz muitos questionamentos,

porque, via de regra, o sentimento homossexual, aliás, como

todo sentimento, não depende da vontade da pessoa. O primeiro

questionamento é teológico: por que Jesus, em momento algum,

refere-se, ao menos indiretamente, à homossexualidade? Em

nenhum dos quatro evangelistas a questão é abordada. Não

acredito que entre os judeus não houvesse homossexuais.

O segundo questionamento é uma pergunta que me faço

freqüentemente: tem a igreja o direito de exigir que o

homossexual leve uma vida celibatária? Não tenho respostas

para os meus questionamentos e talvez por isso mesmo eles me

causem certa inquietação. Mas agradeço constantemente a Deus

por não ser homossexual e por meus fi lhos também não o serem,

porque é um sofrimento muito grande.

CÂNDIDO A. LORENZATOPorto Alegre, RS

— Jesus não menciona a homossexualidade, mas cobra uma

conduta sexual mais alta do que qualquer outro escritor bíblico:

“Qualquer que olhar para uma mulher para desejá-la, já cometeu

adultério com ela” (Mt 5.27). Se para evitar esse olhar fi xo

e calculado por uma mulher alheia poderia ser necessário

arrancar e lançar fora o olho direito (linguagem fi gurada usada

por Jesus), o que pensar de uma relação sexual contrária à

natureza (a prática homossexual)? Se Jesus não se referiu, ao

menos indiretamente, à homossexualidade, seu mais notável

convertido e seguidor é quem mais explicitamente trata do

assunto. Paulo diz que as mulheres “trocam suas relações

sexuais por outras, contrárias à natureza” e que, “da mesma

forma, os homens também abandonaram as relações naturais

com as mulheres e se infl amaram de paixão uns pelos outros.

Começaram a cometer atos indecentes, homens com homens, e

receberam em si mesmos o castigo merecido pela sua perversão”

(Rm 1.26- 27). (Veja É para abandonar a homofobia, mas não a condenação da prática homossexual, p. 20)

A morte da morteEste ano começou para mim de uma forma muito difícil, pois

perdi meu querido irmão e sobrinhos num grave acidente.

Quando estávamos todos abatidos, muitos irmãos entraram

em contato conosco e se compadeceram da nossa dor. No

meio de tantas bênçãos, ganhei também uma assinatura de

Ultimato. Além disso ainda recebi todas as edições de 2007.

Qual não foi a minha surpresa, uma delas falava da morte

da morte, e outra, de Jó. Obrigada por trazerem textos tão

edifi cantes para a igreja dos nossos dias e por nos tratarem

com tanto amor e carinho nesses momentos difíceis.

MEIREANA DUTRA DE ASSIS SILVASão Paulo, SP

Que vida boba!De fato, se não existisse a promessa de Jesus de um novo

céu e uma nova terra, a vida não teria o menor sentido.

Infelizmente muitos só descobrem isso no leito da morte,

quando há tempo, é claro.

ANTONIO PORTOItapetininga, SP

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ULTIMATO Maio-Junho, 2008 10

Missão integralA missão da igreja está, muitas vezes, soterrada pela iniqüidade do homem, mas tenho plena fé que Cristo cuida de sua noiva por meio de palavras de conhecimento e sabedoria de pessoas como o bispo Robinson Cavalcanti. Ele consegue refl etir de forma profunda a grande missão que Jesus nos deixou: o “Ide”. Por vezes, a igreja tem perdido o foco deste itinerário, mas certamente a palavra ministrada não voltará vazia. É tempo de pensarmos sobre as peculiaridades da vida de Jesus Cristo, e o quanto ele mudou a história. Para vivermos conforme essa missão, precisamos examinar com mais fi delidade o texto bíblico e resgatar o nosso papel transformador da sociedade. Essa missão não é fácil, mas nós temos o Espírito Santo que nos capacita. Certamente, estamos sendo chamados por Cristo para vivermos de forma prudente neste tempo sombrio para a cristandade.

CLEVERTON BARROS DE LIMA Campinas, SP

A realidade do cristianismo brasileiroGostaria de parabenizá-los pela revista Ultimato. Comecei a

lê-la quando eu ainda estava na faculdade, e muitas vezes

me pego lendo e relendo edições antigas. Cada edição é

como um sopro de vida nova para mim, por isso aguardo

ansiosamente a chegada da publicação! Gosto do fato de

que os artigos não são utópicos, revelam a espiritualidade

cotidiana de cada um de nós: as dúvidas, os medos, as

alegrias, a realidade do cristianismo no Brasil. Muito

obrigada. Oro para que Deus continue a inspirar a equipe e

os colunistas!

STEPHANIE PARKERPorto Alegre, RS

Evangélicos e católicosUm evangélico, por mais errado que seja, ainda é mais

certo do que qualquer católico, pois não se prosta diante de

uma imagem de escultura para prestar-lhe culto, adorá-la

ou mesmo venerá-la como eles (os católicos) se defendem.

ODAIR ORLANDIUmuarama, PR

MariaEstamos estudando em nossa igreja sobre Maria, mãe de

Jesus. Lembro-me de ter lido na revista Ultimato (maio/

junho 1993) os artigos Maria demais e Maria de menos.

Poderia receber uma cópia desses textos por e-mail?

ÁUREA CACHONI M. FERRAZOLIOurinhos, SP

Mulheres nunca maisQuero me manifestar contra a carta Mulheres nunca mais,

de Wesley Chrisley, de Sorocaba, SP. O comentário foi muito

infeliz e ele próprio deve ser tremendamente infeliz por

não valorizar o trabalho maravilhoso que as mulheres estão

fazendo para o Senhor. Se ele visitasse a minha igreja, veria

mulheres resgatando vidas para Cristo, pregando nas praças,

nas empresas, nas cadeias, nas igrejas, e mudaria de idéia.

As mulheres estavam presentes no dia de Pentecostes e

o derramamento do Espírito foi também sobre elas, como

havia sido profetizado pelo profeta Joel: “Sobre os meus

servos e as minhas servas derramarei o meu Espírito”

(At 2.18). Wesley precisa conhecer mais as histórias de

avivamento, como o caso de Sarah Osborn, que fez parte de

um avivamento em Newport, nos anos de 1766-1767. Outra

grande ministra foi Hannah Smith, autora do livro O Segredo de uma Vida Feliz. Com o afastamento do seu marido do

ministério por motivo de adultério, ela continuou a pregar,

ensinar e escrever. Paulo faz referências elogiosas a várias

mulheres: Febe, Priscila, Maria, Júnia, entre outras.

PR. ELSON MEDEIROSAssembléia de Deus de Laranjeiras - Serra, ES

84 anos de vida e 59 de sacerdócioAgradeço comovidamente as saudações e augúrios ao ensejo

de meu natalício. É sempre muito gratifi cante sentir que outros

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Maio-Junho, 2008 ULTIMATO 11

FALE CONOSCO

Cartas à Redação

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Cartas à Redação, Ultimato, Caixa postal 43,

36570-000, Viçosa, MG

Inclua seu nome completo, endereço, e-mail e

número de telefone. As cartas poderão ser editadas e

usadas em mídia impressa e eletrônica.

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Edições Anteriores [email protected]

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irmãos se rejubilam com o inestimável dom da vida com que o

Senhor nos brinda. Já me pesam nos ombros 84 anos de vida e 59

de sacerdócio. Valho-me deste feliz ensejo para felicitar todos

aqueles que colaboram para as edições de Ultimato, periódico

que leio com prazer e muito proveito. É de gente que mergulha e

não perpassa pela superfície. Parabéns, e que o Senhor continue

iluminando sem cessar as mentes que propagam sua santa

Palavra. Rezem por mim, que rezo por vocês.

MONSENHOR VALDEMIRO CARAMCampinas, SP

HanseníaseO Brasil ocupa hoje o segundo lugar em número de portadores

de hanseníase. Vivemos um estado de epidemia não divulgado

pelo governo. Assim, há pouca informação sobre a doença,

mesmo no meio médico, o que retarda o tratamento e gera

seqüelas irrecuperáveis, principalmente quando o portador não

apresenta lesões cutâneas. Como portadora dessa enfermidade,

e também padecendo intensamente com as reações colaterais

da poliquimioterapia, posso afi rmar que a necessidade maior é

trazer a público a realidade do país e oferecer mais informações

à classe médica. Simpatia em nada nos ajuda!

PATRÍCIA NEMEPalmas, TO

Ultimato na EBFDesde o início de 2008 nossa classe de escola bíblica

dominical para jovens tem estudado os assuntos de destaque

da revista Ultimato. Os resultados são satisfatórios e

fantásticos. A linguagem simples e objetiva da revista ajuda a

compreensão dos alunos. Agradeço a Deus por vocês.

SORAYA AGUIAR MENEZESIpatinga, MG

Juntos até entãoDesde meus tempos de estudante no Instituto José Manuel

da Conceição, em Jandira, SP, e do Seminário Presbiteriano

de Campinas, Ultimato tem sido uma bênção para mim e

para meus irmãos na fé. Até aqui estamos juntos! Que a

revista continue sendo o que é!

REV. ELY BARBOSASalto de Pirapora, SP

Blog UltimatoNão sou muito afeito a ler blogs; raros são os que leio, mas

ao ver que Ultimato lançou o seu, não pude resistir e entrei, li

e gostei muito. Ultimato, embora quarentona, está cada vez

mais moderna, antenada e se torna a cada dia um excelente

veículo de transmissão das verdades bíblicas, quebrando

preconceitos e paradigmas, sendo inclusive tema de matéria

em revista católica. Continuem no caminho.

SÉRGIO PRATES LIMARio de Janeiro, RJ

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do que

Rebanhos instáveis tanto na seara protestante como na seara católica

O problema de trânsito de uma igreja para outra não é um

fenômeno exclusivamente protestante. Nas grandes cidades, diz Dom Moacyr Grechi, bispo de Porto Velho, RO, “cresce também o número de fiéis que escolhe a igreja ou a paróquia não pela vizinhança ou território, mas segundo seu gosto e suas afinidades espirituais”. No caso dos evangélicos, o trânsito pode ser de uma igreja para

Segundo cálculos do Instituto de Pesquisas Econômicas

Aplicadas, o governo Luiz Inácio Lula da Silva gastou, em 2006, com todos os seus programas sociais, cerca de 21 bilhões de reais. O jornalista Clóvis Rossi compara esse montante com os lucros somados de quatro entidades financeiras em 2007 (Itaú, Bradesco, Unibanco e Santander), no valor de 21,777 bilhões de reais. Rossi aponta o problema da desigualdade social: enquanto a primeira soma é distribuída entre 11 milhões de famílias alcançadas pelo programa

outra da mesma denominação ou de uma denominação para outra. Nas últimas décadas, é maior o número dos que saem das denominações históricas para as denominações pentecostais do que o contrário. No rebanho católico também há a figura do padre, cuja performance, segundo a mesma fonte, “é julgada pelas emoções que suscita ou pela sedução que exerce”.

O país dos migrantes é o 5º mais populoso

Segundo o Fundo das Nações Unidas para a População

(UNFPA), “se todos os migrantes regularmente registrados residissem no mesmo país, representariam o quinto país do mundo em número de habitantes”, logo depois da China (1,3 bilhão), Índia (1,1 bilhão), Estados Unidos (297 milhões) e Indonésia (222 milhões). O Brasil viria em seguida (180 milhões). Setenta por cento de todos os migrantes vivem em dois países da América do Norte (Estados Unidos e Canadá) e em cinco países da Europa (Rússia, Alemanha, França, Reino Unido e Espanha).

O paredão entre ricos e pobres continua de pé

Bolsa-Família, a segunda é distribuída entre quatro “famílias” financeiras.

O pesquisador Gabriel Ulysses, do mesmo instituto do Ministério do Planejamento, esclarece: “Apenas 10% da população continua se apropriando de 80% da renda nacional” (Folha de São Paulo, 17/07/07, A2).

Cresce o número dos que nunca ouviram falar das boas notícias

A igreja não está dando conta. Não está suportando a concorrência.

Segundo o Vaticano II, há quarenta anos, 66% da humanidade “nada ou muito pouco ouviu do anúncio das boas notícias”. Hoje, este número, o dos que quase não ouviram falar do evangelho, aumentou para 80%. A consciência missionária precisa, como nunca, ser acesa. O maior desafio da Grande Comissão (a ordem explícita dada por Jesus no momento de sua ascensão) é alcançar com o evangelho cada época da história, cada canto da terra, cada âmbito da sociedade e cada pessoa dos ajuntamentos humanos.

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do que

Filhos e genros de Shimpo e Tamao (da esquerda para a direita): Arthur e Aki, Luiza e Socei, Alice e Yoshio, Rosa e

Soie, Emília e Zentem, Paulo e Teruko e Olga e Setiro

Os jovens imigrantes japoneses Tamao Hashimoto, nascida na Província de Fukuoka,

e Shimpo Kuniyoshi, nascido na Província de Okinawa, ambos descendentes de famílias nobres, conheceram-se por acaso no centro de São Paulo em 1919, quando tinham 20 anos. Casaram-se no ano seguinte. Quando deixou a família no Japão e veio para o Brasil por decisão própria, Tamao era uma adolescente de 14 anos. O navio que trouxe essa leva de imigrantes gastou 60 dias para chegar ao porto de Santos. Shimpo era um rapaz de 18 anos quando aportou no Brasil algum tempo depois daquela que seria sua esposa.

À altura do casamento, os dois jovens já haviam fugido das lavouras de café do interior do Estado de São Paulo por não agüentarem o trabalho braçal e por receberem chibatadas dos capatazes quando o serviço não rendia. Passaram a trabalhar como empregados domésticos na capital.

O jovem casal teve oitos filhos. Exceto o primeiro, que morreu de meningite aguda aos seis meses de idade, todos os outros estão vivos: Luiza Kaio (85), Rosa Kaio (84), Arthur Kuniyoshi (82), Paulo Kuniyoshi (80), Emília Sakiyama (77), Alice Sakiyama (75) e Olga Hayashi (66). Destes, dois já comemoraram bodas de diamante: Luiza e Socei Kaio (outubro de 2005) e Rosa Soie Kaio (março de 2006); e três, bodas de ouro: Arthur e Aki Kuniyoshi (julho de 2000), Emília e Newton

Sakiyama (dezembro de 2000) e Alice e Yoshio Sakiyama (setembro de 2003). A soma da idade dos sete filhos de Tamao e Shimpo e de seus sete cônjuges é igual a 1.096 anos (a idade média dos 14 idosos é de 78 anos).

O primeiro contato da família Kuniyoshi com o evangelho foi através do testemunho de um dos empregados do sítio que compraram perto de Cambará, no Paraná. O rapaz era “muito educado, reverente e muito bom de serviço”. Mais tarde, a filha mais velha do casal foi estudar corte e costura em Cambará e se hospedou com uma imigrante japonesa evangélica, que lhe falou de um certo Jesus, filho de Deus, que veio salvar o mundo do pecado. Outra família japonesa também era crente e procurava evangelizar os conterrâneos da região. Não tardou para que um dos filhos dessa família, que morava em São Paulo, trouxesse a Cambará pastores japoneses da Igreja Metodista Livre. O resultado é que não demorou muito para que Luíza e Rosa se convertessem ao evangelho e também se enamorassem dos irmãos Socei e Soie, da família Kaio, aquela que havia pregado o evangelho para as moças. Luíza casou-se com Socei cinco meses antes do lançamento das bombas

atômicas em Hiroshima e Nagasaki, que matou cerca de 214 mil japoneses em agosto de 1945. Rosa casou-se com Soie onze meses após essa tragédia.

Com o tempo, toda a família se converteu. O testemunho de Paulo Kuniyoshi, o quarto filho, é impressionante. Apesar de freqüentar a igreja e estudar a Bíblia com regularidade, ele demorou algum tempo para ter uma experiência pessoal de aceitação de Jesus como seu Senhor e Salvador. Isso aconteceu em Bauru, SP, em 1977, quando ele tinha 49 anos e já era engenheiro e advogado. Naturalmente o evangelho colaborou para que os descendentes de Tamao e Shimpo tivessem casamentos estáveis e se mantivessem unidos (todos os anos os sete casais tiram férias no mesmo lugar e no mesmo período).

O formidável encontro de Tamao e Shimpo em 1919 já rendeu noventa pessoas: sete filhos, 25 netos, 56 bisnetos e 2 tataranetos! Incluindo os cônjuges, o número total sobe para 130 pessoas.

A propósito do centenário da imigração japonesa (1908-2008)Cinco dos sete filhos dos imigrantes japoneses do início do século 20 já fizeram bodas de ouro

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Maio-Junho, 2008 ULTIMATO 17

Os cristãos de fé e conduta não deveriam se abalar com a zombaria e oposição dos

cabeças-pensantes, cheios da sabedoria deste mundo e de arrogância, pois estes também erram e são obrigados a voltar atrás, a desdizer o que haviam dito, a “desprovar” o que haviam provado.

No artigo Samba do cientista louco, o jornalista Ruy Castro, da Folha de São Paulo, demonstrou que na área de nutrição o que os cientistas dizem hoje contraria por completo o que diziam ontem. O leite, que hoje é considerado um veneno para quem tem úlcera, antes era tomado para aliviá-la; a manteiga é mais saudável do que a margarina, mas antes era a vilã para vários órgãos, inclusive o coração; ovo faz bem ao coração (antes era o pior inimigo do colesterol e do coração); café, que estimula o sistema nervoso central, o coração, os vasos sangüíneos e os rins, era uma bebida proibida por conter cafeína; açúcar é uma beleza, mas antes ele deveria ser substituído pelos adoçantes.

Tanto a Rússia quanto a China estão revendo a política de diminuição da taxa de natalidade. Para reverter a situação criada anteriormente pelo próprio governo, uma das províncias da Rússia adotou uma providência inusitada: o governador Sergei Morozov pediu aos empregadores que dessem folga a seus funcionários no dia 12 de setembro de 2007, para que eles

tivessem tempo livre para fazer sexo, de tal modo que, em caso de concepção, a criança nascesse nove meses depois, em 12 de junho de 2008, Dia Nacional da Rússia. As mulheres que derem à luz nesse dia poderão ganhar, entre outros prêmios, uma casa nova (FSP, 13/09/07, A14).

A política do filho único, em vigor na China desde o final dos anos 70, que teria evitado 400 milhões de nascimentos, está sendo reconsiderada para desacelerar o envelhecimento rápido da população. A vice-ministra de Planejamento Familiar teria dito que a China corre o risco de “ficar velha antes de ficar rica”. No momento, entre 30% e 40% dos chineses estão autorizados a ter dois ou mais filhos (FSP, 29/02/08, A14).

Há menos de dois meses, o escritor Carlos Heitor Cony comentou que a própria ciência percorre um caminho muitas vezes errado: “De 50 em 50 anos, até em ciências exatas, como a física, as verdades são modificadas”.

Os cristãos precisam suportar com firmeza a zombaria dos não-crentes sem se apoquentar nem diminuir a alegria e a certeza de serem filhos de Deus e co-herdeiros com Cristo (Rm 8.17). O zombador, como escreve John Stott, “é alguém que nega a seriedade do pecado, da culpa e do juízo, e que não dá muita importância à necessidade da reconciliação e do perdão” (A Bíblia Toda, o Ano Todo, p. 90).

A manteiga é mais saudável do que a margarina

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ULTIMATO Maio-Junho, 2008 18

do que

A situação do cristianismo europeu não é nada confortável nem no

meio católico nem no meio protestante. Na Itália, onde 97% da população se considera católica, apenas 30% dos fiéis vão à igreja. Na França, denominada “filha primogênita da igreja”, há cidades com maior presença de mulçumanos que de católicos. Sessenta por cento da população de Marselha, a segunda maior cidade da França, professa o islamismo. Enquanto o número de sacerdotes diocesanos e religiosos cresce na América Latina, África e Ásia, decresce na América do Norte, na Oceania e principalmente na Europa (18,4% a menos). O número de católicos aumenta na Ásia e na África, mas diminui de maneira sensível na Europa. Quarenta por cento dos britânicos, tradicionalmente protestantes, declaram não acreditar em Deus (no Brasil a porcentagem desses era de 1% na década de 70 e hoje chega a 7,3%).

Em artigo publicado no jornal americano Chicago Sun Times, Adele M. Stan, autora de Debating

Sexual Correctness (Retidão sexual em debate), diz que o papa Bento XVI “nunca olhou no espelho para encontrar a verdadeira razão do declínio do catolicismo na Europa”. O papa responsabiliza o modernismo, o relativismo e o multiculturalismo. Porém, Stan afirma que “a rejeição da Europa ao catolicismo tem menos a ver com a perda de espiritualidade do que com o autoritarismo de uma instituição que muitos consideram, na melhor das hipóteses, moralmente inapta; na pior, moralmente falida”.

Para a autora do artigo, os campos imersos em sangue da Primeira Guerra Mundial provariam serem campo fértil para o existencialismo e para seu primo, o niilismo. A Igreja Católica Romana tem sua parcela de culpa: ela se aliou ao anti-semitismo na França, ao ditador Francisco Franco na Espanha e ao movimento revolucionário na Croácia.

Consultado a respeito dos comentários de Adele Stan, o historiador protestante Alderi Souza de Matos diz

que é difícil avaliar a correção desse diagnóstico. “O crescente secularismo da Europa pode ser explicado em parte por certas situações internas da Igreja Católica, mas há outros fatores envolvidos”. Alderi explica que “desde o iluminismo, no século 18, essa tendência secularizante tem crescido tanto em nações católicas como em protestantes”, e acrescenta: “O problema de muitas pessoas é a desilusão com a religião em geral, não só com o catolicismo”. A religião tem sido identificada com obscurantismo, moralismo, hipocrisia, manipulação. Quanto ao crescimento do islamismo na Europa, o historiador explica que é principalmente em virtude da imigração.

Uma boa definição de secularismo foi dada recentemente pelo cardeal Paulo Poupard, presidente do Pontífice Conselho para a Cultura: “Secularismo não é uma negação explícita da presença de Deus, mas sim uma mentalidade vazia em que Deus está total ou parcialmente ausente da vida e da consciência dos homens”.

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Maio-Junho, 2008 ULTIMATO 19

O que o alemão João Debeneck Cochlaeus e o polonês Ryszard Mozgol têm em

comum? Ambos são católicos. Mas o que mais os aproxima são as bobagens que escreveram sobre Martinho Lutero. Cochlaeus escreveu sobre o reformador em 1549 e Mozgol, 458 anos depois, no 490º aniversário da Reforma, em outubro de 2007.

Cochlaeus foi cônego da Catedral de Mainz (1526) e, depois, da Catedral

de Breslau, ambas na Alemanha. Já na velhice, aos 70 anos, escreveu a primeira biografia de Lutero, morto três anos antes (1546), intitulada Commentaria de Actis et Scriptis Martini Luther (Comentários acerca dos Atos e dos Escritos de Martinho Lutero). Mozgol, por sua vez, faz parte do Instituto da Memória Nacional da Polônia, uma instituição encarregada dos relatórios da polícia secreta do país na era pós-comunista.

Na biografia de Lutero o alemão Cochlaeus escreveu que a criança nascida no dia 10 de novembro de 1483 não havia sido gerada pelo marido de Margaret Lutero nem por qualquer outro homem. O Diabo em pessoa havia possuído a pobre mulher que, de vez em quando, se envolvia em bruxarias. Assim, o reformador seria filho ilegítimo de Satanás e, como

Para o polonês Ryszard Mozgol, Para o polonês Ryszard Mozgol, Lutero ainda é filho do DiaboLutero ainda é filho do Diabo

A cultura secular, aquela não influenciada pelo cristianismo nem a ele sujeita, não educa

o cidadão a negar-se a si mesmo. O cristianismo, ao contrário, educa o crente a não satisfazer certas inclinações, porque elas contrariam o padrão de vida inserido no Decálogo ou no Sermão do Monte. Além do desconforto da consciência, além do

temor do Senhor, a oposição do

Espírito a

tal, precipitara um número imenso de almas na ruína e trouxera à Alemanha e à cristandade a desgraça e a miséria (Conversas com Lutero, p. 267).

Nos cartazes que o polonês Mozgol expôs em toda a cidade de Lublin, na Polônia Oriental, em outubro do ano passado, havia a figura do Diabo cochichando ao ouvido do reformador protestante, mostrando-o como herege e blasfemo.

Entre as vozes que condenaram esse movimento — fundado em 1989 por um grupo radical, com o propósito de estabelecer um Estado católico na Polônia —, está a de Mariusz Maikowski, pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia em Lublin, leste da Polônia: “É chocante e inacreditável que retratos como o de Martinho Lutero como anticristo ainda apareçam em pleno século 21”.

qualquer obra da carne leva o fiel a abrir mão da vontade má. A tentação em muitos casos acaba passando de largo.

Mas a própria permissividade que hoje domina a sociedade não é absoluta. Tolera-se que o homem seja infiel à sua mulher e vice-versa, só porque a preferência sexual dele e dela é por outra mulher e por outro homem, respectivamente. Os homossexuais, por sua vez, devem ser deixados em paz, pois sentem atração sexual apenas por pessoas do mesmo sexo.

No entanto, talvez questionando os limites dessa permissividade, o

escritor Ferreira Gullar faz perguntas muito sérias: “Se o sujeito nasceu pedófilo, por que sua preferência sexual é considerada crime? Por que punir alguém que apenas obedece a impulsos inatos que lhe são impostos pela natureza?” (Folha de São Paulo, 24/02/2008, p. E10).

Deve-se revogar a lei que proíbe a pedofilia? Deve-se retirar a pedofilia da relação dos crimes hediondos? Deve-se deixar o pedófilo à vontade? Deve-se deixar de “latir” em favor das crianças? (Veja Incapazes de latir, p. 6.) Por enquanto essas providências são inaceitáveis!

A pedofilia vai vingar?

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do que

números400litros de água é o consumo diário de uma

pessoa em bairros nobres da capital de São

Paulo. A média no Brasil é de 150 litros,

e a ONU diz que os seres humanos não

precisam de mais de 100 litros por dia

800veículos novos entram em circulação

por dia na cidade de São Paulo. Deve

haver 10 milhões de veículos na Grande

São Paulo

2.600horas é quanto uma empresa brasileira

gasta, em média, a cada ano, para atender

às exigências governamentais (quase um

terço do ano)

72horas são sufi cientes para uma pessoa ler

toda a Bíblia. Se ela fi zer isso não de uma

só vez, mas por apenas 15 minutos diários,

terminará em menos de dez meses

450.000.000.000de dólares é quanto a indústria global de

bebidas alcoólicas movimenta a cada ano.

Um pouco mais que os 330 bilhões de dólares

gerados por drogas ilegais, como cocaína,

heroína e ecstasy

3mentiras são pregadas a cada dez minutos

de conversa, segundo pesquisa recente do

psicólogo Robert Fellman, da Universidade de

Massachusetts, nos Estados Unidos

ULTIMATO Maio-Junho, 2008 20

É para abandonar a homofobia, mas não a condenação à prática homossexual

A revista Novas de Alegria, das Assembléias de Deus de Portugal, abordou a questão

da homossexualidade em duas edições. Na primeira (janeiro de 2008), o pastor Alexandre Samuel Lopes, de Lisboa, escreveu que os homens e as mulheres com tendências homossexuais devem ser acolhidos com respeito, compaixão e delicadeza, sem qualquer atitude de injusta discriminação. Além de ser cristão, esse comportamento possibilita uma mudança, pois “a igreja é a base da recuperação, é primeira e última oportunidade”. A aceitação do homossexual, acrescenta o pastor, “é o início da sua transformação para uma vida dentro dos padrões de Deus”.

Na segunda edição (março de 2008), o pastor Samuel Pinheiro, diretor da revista, transcreveu o comunicado assinado pela Federação das Entidades Evangélicas da Espanha, pela Aliança Evangélica Espanhola e pelo Conselho Evangélico da Galiza: “Declaramos o nosso respeito por qualquer pessoa que, em uso da sua liberdade de

expressão, defenda as suas práticas e crenças homossexuais, como também o pensamento em relação à educação dos filhos, por radicalmente opostos que sejam aos mantidos por este manifesto. Igualmente reprovamos qualquer manifestação homofóbica procedente do coletivo ou de uma pessoa. Mas com mesma firmeza, e da mesma maneira, reclamamos os mesmos direitos e respeito para com a Igreja Cristã Evangélica, no respeito às práticas, crenças e defesas de uma conduta heterossexual e o direito de expressar livremente a nossa concepção da educação heterossexual dos nossos filhos”.

Mais adiante, o documento esclarece: “Por isso reafirmamos o direito a: 1) Proclamar, compartilhar e pregar toda a mensagem e o ensino do

evangelho; 2) Fazê-lo livremente, sem impedimento e nos termos que a Bíblia define; 3) Declarar como pecado diante de Deus toda conduta e procedimento das pessoas que transgridem tanto os princípios morais como éticos e legais; 4) Proclamar que o evangelho inclui uma mensagem de esperança de restauração em Cristo em todas as áreas da vida; 5) Poder exercer este direito, com todo respeito, diante de todo aquele que livremente pretende escutar-nos, sem por ele sermos tratados como retrógrados ou etiquetados com insultos tão fáceis e rentáveis como ‘seitas perigosas’ ou ‘homófobos’”.

A aceitação da homossexualidade é tão simples e tão natural que, pelo menos no meio evangélico espanhol, já há um esforço organizado para encorajar os pais a dar continuidade

à educação que valorize e dê visibilidade à heterossexualidade,

não só no ensino mas também na formação de um ambiente familiar

favorável.

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Maio-Junho, 2008 ULTIMATO 21

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ULTIMATO Maio-Junho, 2008 22

Já ultrapassa a cifra de 1 milhão de exemplares o livreto de bolso de 20 páginas escrito por Fausto Rocha, 69, professor de comunicação cristã do Seminário Teológico Nazareno e de jornalismo na Faculdade Nazarena do Brasil, ambos na cidade de Campinas, SP. A Voz do Povo Não é a Voz de Deus mostra que o ensino da Bíblia é contrário aos conceitos a respeito de Deus e da salvação que estão arraigados no inconsciente coletivo. O folheto é resultado do sermão que Fausto pregou há dez anos em Poá, na

grande São Paulo, por ocasião do jubileu de ouro da fundação do município, a convite do conselho de pastores daquela cidade, famosa por sua exposição anual de orquídeas. O advogado e jornalista Fausto Rocha nasceu em lar evangélico e foi batizado na adolescência na Primeira Igreja Batista de São Paulo. Por 40 anos atuou como produtor e apresentador de programas de televisão, entre eles Diálogos da Capital, nas redes nacionais Cultura, Excelsior, Tupi e SBT. Além de ter exercido o

O sermão que gerou 1 milhão de livretos

O primeiro hinário evangélico brasileiro chama-se Salmos e Hinos e foi publicado há quase 150 anos no Rio de Janeiro, graças ao trabalho de

Sarah e Robert Kalley e do médico João Gomes da Rocha, filho adotivo do casal.

O mais recente hinário não se denomina hinário, mas “corinário” (por causa do costume de chamar de “corinho” os cânticos mais novos, aqueles que não fazem parte dos

CD’s. Todo o seu tempo livre é gasto ouvindo e recordando os louvores que fizeram e fazem parte de seus momentos de adoração, alguns dos quais não são mais cantados pelos cristãos do novo século.

Valdivino Reis de Melo, 45, é formado em gestão de serviços executivos e atua há dezoito anos como diretor executivo na área sindical patronal de asseio e conservação e de segurança privada nos Estados de Goiás e Tocantins. Nascido em Caldas Novas, GO, e convertido aos 18 anos, Valdivino logo foi eleito presbítero da Terceira Igreja Presbiteriana Renovada de Goiânia, onde reside. A mais recente edição do corinário Vem Cantar foi publicada pela Casa do Livro, em Goiânia, em 2005 ([email protected]).

hinários tradicionais). Além de ser o mais recente, o corinário Vem Cantar é o que tem o maior número de hinos — a coleção toda conta com 1.234 títulos, quase o dobro dos cânticos de Salmos e Hinos (608), Cantor Cristão (579) e Harpa Cristã (640). Inclui melodias antigas e mais recentes. Por coincidência, o primeiro cântico fala sobre a alegria que está no coração de quem conhece a Jesus, e o último é um convite para voltar para Jesus aquele cujo coração está sem alegria.

O autor dessa façanha não é ministro de louvor, não é músico nem toca instrumento musical algum. É um apaixonado por música sacra. Seu acervo musical é fabuloso: tem mais de 40 mil cânticos catalogados, distribuídos em mais de 2 mil vinis, mais de 2 mil cassetes e mais de mil

O homem do corinário de 1.234 cânticos

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mandato de deputado estadual (duas vezes) e de deputado federal (duas vezes), Fausto Rocha foi assessor de comunicação de dois prefeitos de São Paulo (Miguel Colassuono e Paulo Egydio Martins). É também autor de Como Falar de Jesus no Evangelismo, Rádio, TV e Escola Dominical.

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Frases

Maio-Junho, 2008 ULTIMATO 23

Sou emigrante de um país que ainda não vi,

mas para o qual quero ir. Sou forasteira numa sociedade que cada vez me empurra mais contra a parede e me intimida a ser o contrário daquilo que Deus deseja que eu seja. É um desafio constante ser cristão autêntico no meio de um mundo cada vez mais anticristão.

Ana Ramalho, da Assembléia de Deus em Caldas da Rainha,

Portugal

Minha vida está se esvaindo. Não sei se

vou chorando ou sorrindo. Sorrindo, pondo fim a uma agonia que não agüento mais. Chorando por deixar para trás pessoas que amo demais.

Leide Moreira, 59, vítima de esclerose

lateral amiotrófi ca, desde 2004, a mesma doença de

Stephen Hawkins

Os ricos, poderosos e famosos também morrem

de drogas. Some a eles uma legião de drogados anônimos e desassistidos e começará a ter uma idéia do tamanho do problema.

Ruy Castro, jornalista

A leitura da Bíblia ajuda muito na recuperação

de pessoas que enfrentam problemas de saúde física, psicológica e espiritual, porque ela traz esperança ao desesperado, orientação ao perdido e conforto ao entristecido.

Erní Walter Seibert, editor de A Bíblia no Brasil

Sinto que meus filhos levam uma vida em suspenso

na expectativa da minha libertação, e o seu sofrimento diário, o de todo o mundo, faz com que a morte me pareça uma opção amena.Ingrid Betancourt, política franco-colombiana mantida

há seis anos na selva colombiana como refém pelas

FARC

Jesus nunca teve um programa de televisão. Nunca escreveu

livros. Nunca fundou uma megaigreja. Muito do seu trabalho foi pessoal. E, mesmo assim, ele mudou o mundo.

Loren Seibold, pastor adventista em Ohio,

Estados Unidos

O uso de animais na ciência é

absolutamente necessário. Ciência é questão de soberania nacional. Não se trata de procedimento obsoleto. Nossa segurança estaria mais comprometida caso não pudéssemos antes testar esses medicamentos em animais de laboratórios. Analgésicos, antiinflamatórios, vacinas, antibióticos, hormônios em suas versões mais modernas, dependeram tanto da experimentação animal como nós dependemos do ar para respirar e viver.

Luiz Eugênio Araújo de Moraes Mello,

professor de fi siologia e presidente

da Federação de Sociedades

de Biologia Experimental

Ultimamente está-se minimizando a questão

do pecado. Quer-se uma religião na qual as pessoas não sejam chamadas ao arrependimento, mas se sintam bem, assim como são. Por essa razão, o culto torna-se tão variado ou alternativo, e visa simplesmente atingir o sentimento. E cada um tem o direito de ter sua opinião própria.

Horst R. Kuchenbecker, pastor emérito da Igreja Evangélica Luterana do

Brasil

Quando somos assediados por uma

quantidade de anúncios em favor de uma vida distanciada do evangelho, a voz do sino se antepõe ao que nos separa de Deus. Trata-se, portanto, do válido instrumento da evangelização, também em nossos dias.

Dom Eugênio de Araújo Sales,

arcebispo emérito do Rio de Janeiro, referindo-se aos

sinos das igrejas cristãs

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Eram 25 moças e rapazes, todos universitários. Eles saíram de Viçosa, MG, e viajaram 2.030

quilômetros, até chegar à cidade de Coronel José Dias, um dos municípios mais carentes do Brasil, na região sudeste do Piauí, onde fica o Parque Nacional da Serra da Capivara. Nos dez dias passados nos povoados de São Pedro e Santa Luzia, os jovens distribuíram entre os habitantes (42% deles, analfabetos) brinquedos, kits com pastas, escovas de dente e sabonetes, utensílios domésticos, roupas e calçados.

Se a notícia se limitasse ao parágrafo anterior, os leitores mais críticos se indignariam com tamanho assistencialismo, tão comum em muitas obras sociais. Porém, a caravana universitária fez muito mais do que isso. Além de distribuir livros didáticos, revistas e livros de conteúdo cristão, folhetos evangélicos, Novos Testamentos e Bíblias, o grupo de estudantes, o médico e a técnica em enfermagem que os acompanharam desenvolveram um amplo trabalho, dentro da estratégia chamada missão integral. Eles fizeram atendimentos médicos, pequenas cirurgias, palestras nas escolas públicas sobre variados assuntos (saúde bucal, aleitamento materno, o meio ambiente, e até sobre relacionamento familiar), cortes de cabelo, medições de pressão arterial e ofereceram diversas oficinas (como construir caixas d’água com ferro e cimento, como fazer irrigação por gotejamento, como pintar casas com

tinta de argila, como reciclar

papéis, como produzir mel de abelha e como fazer artesanato).

Se a notícia terminasse aqui, os leitores mais apaixonados pelo anúncio das boas novas da salvação ficariam decepcionados. Porém, por meio da música, do teatro, de fantoches, de palestras, de projeção de filmes e de visitação, os jovens evangélicos da Universidade Federal de Viçosa falaram de Jesus. Para melhor integração com a comunidade local, fizeram várias visitas aos lares e não menos que 334 pessoas assistiram às duas projeções do filme Jesus que fizeram.

Tudo isso foi feito durante a viagem do Projeto Água Viva (PROAV) ao município de Coronel José Dias. Esta não foi a primeira nem será a última viagem do projeto. Fundado em 2002, o PROAV já realizou seis viagens missionárias ao Nordeste, duas ao Sergipe e quatro ao Piauí, totalizando quinze municípios e comunidades alcançados. Antes da viagem cada equipe recebe um treinamento que dura em média quatro meses. Os participantes são alunos de diferentes cursos da Universidade Federal de Viçosa e membros de diferentes denominações evangélicas. Diversos voluntários contribuem para o preparo das equipes. Já foram treinados 150 universitários. O trabalho não é feito de maneira isolada, mas de comum acordo com alguma denominação que já opera na região a ser alcançada ou nas proximidades dela. Nas duas primeiras viagens, o PROAV trabalhou em parceria com os presbiterianos, e nas demais, com a Missão Suíça, que tem doze missionários nos estados do Maranhão, Piauí e Pará. A missão, por sua vez, tem parceria com a Associação

Sopa, sabã

reportagem

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das Igrejas Cristãs Evangélicas do Brasil (AICEB). Algumas igrejas têm sido plantadas como resultado desse ministério. Pinturas de templos e casas pastorais, projetos arquitetônicos de templos e pelo menos o início da construção deles, são outros feitos desse esforço missionário. No povoado de Curralinho, SE, o PROAV chegou a elaborar o projeto e a construção de uma praça pública, graças a uma ajuda substanciosa do Projeto Sertão.

O PROAV foi organizado pelo casal Elíbia e João Tinoco, ex-alunos do Centro Evangélico de Missões (CEM), em Viçosa, MG. Tinoco, 57, é professor de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Federal de Viçosa. Convertido ao evangelho em 1998, sentiu-se vocacionado para o ministério. Fez o curso de especialização em teologia para graduados no Seminário Presbiteriano de Campinas, foi licenciado pelo Presbitério Zona da Mata Norte, ordenado ao ministério pelo Presbitério

Centenário de Belo Horizonte e nomeado pastor auxiliar da Terceira Igreja Presbiteriana de Belo Horizonte. Por ser maranhense e conhecer muito bem a carência material e espiritual do Nordeste, Tinoco criou o PROAV, tendo em vista a evangelização desta região brasileira. Elíbia Maria vem de uma tradicional família presbiteriana de Pancas, ES, e é uma das primeiras missionárias a se formar no CEM.

(Para mais informações, acesse <www.projetoaguaviva.com.br>)

Nota*Expressão que defi ne o ministério do Exército de Salvação, fundado por William Booth na Inglaterra em 1865, uma das primeiras manifestações da missão integral (os miseráveis dos cortiços de Londres precisavam de comida, saúde e perdão de pecados).

bão e salvação*

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A preocupação com a saúde e com a duração da vida é a maior e a mais insistente de todas as

preocupações do ser humano, desde a vida intra-uterina à parada irreversível das funções cerebrais, o que de fato caracteriza a morte.

Isso explica o exército quase incontável de homens e mulheres de avental branco, cuja profissão é prevenir, diagnosticar e curar uma enorme quantidade de doenças. Além dos médicos, outros milhares e milhares de pessoas participam dessa guerra incessante contra a doença e a morte — enfermeiros, laboratoristas, farmacêuticos e engenheiros (que desenham e constroem aparelhos médicos cada vez mais numerosos e sofisticados). Por causa dessa preocupação, que os animais não têm, somos obrigados a construir inúmeros ambulatórios, centros de saúde, clínicas e hospitais; criamos

Doenças não catalogadas pela medicina que podem e devem ser tratadas

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Não há relato de que Jesus tenha realizado

alguma cura de ordem médica entre os apóstolos, porém

ele curou a segurança demasiada de Pedro, a incredulidade de

Tomé e a violência de Tiago e João

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poderosas e multinacionais indústrias farmacêuticas; abrimos uma farmácia a cada esquina e organizamos diversos planos de saúde. Talvez a metade da população mundial ficasse desempregada se a doença e a morte fossem debeladas de uma vez por todas.

O ministério de Jesus era holístico. Ele se preocupava com a alma e com o corpo, com a saúde e com a salvação, com a ética e com o perdão de pecados, com as ovelhas de dentro e com as de fora do aprisco. Jesus ensinava nas sinagogas judaicas, proclamava as boas novas da salvação e curava “toda sorte de doenças e enfermidades entre o povo” (Mt 4.23; 9.35), não uma vez só nem em um só lugar. Curava as doenças mais simples, como a febre da sogra de Pedro, e as mais graves, como a mulher por doze anos hemorrágica, a mulher por dezoito anos encurvada e o homem por 38 anos paraplégico. Em muitos casos, Jesus curava não porque o doente ou seus familiares e amigos o procuravam, mas porque ele mesmo enxergava o sofrimento alheio e tomava a iniciativa de operar a cura. Em duas ocasiões, Jesus atrasou-se: para curar a filha de Jairo e o irmão de Maria e Marta. Mesmo já tendo passado pela tal morte somatopsíquica, a menina de 12 anos, cujo corpo ainda não estava enrijecido, e Lázaro, cujo corpo já havia sido sepultado, foram trazidos à vida, o que também aconteceu com o filho único da viúva de Naum.

Nesse afã necessário de oferecer resistência às doenças e à morte, temos nos esquecido de que somos portadores de outras doenças que não estão arroladas nos melhores catálogos médicos. São doenças e complicações sem conta, menos palpáveis e mais independentes do corpo, embora provoquem danos à saúde física. Nesse sentido, é bom ler a resposta de Jesus aos que o criticavam por entrar e comer em casa de cobradores de impostos e de outras pessoas de má fama: “São

os doentes que precisam de médico, não aqueles que têm boa saúde. Meu propósito é convidar os pecadores a se arrependerem dos seus pecados, e não gastar meu tempo com aqueles que acham que já são gente muito boa” (Lc 5.31, BV). Nessa passagem, a doença e a cura a que Jesus se refere não são as doenças do corpo e da mente, mas as muitas complicações comportamentais relacionadas, em última análise, ao evento histórico que os teólogos denominam a “queda do homem”.

É preciso acordar para o fato de que o mesmo Deus que pode curar a cegueira, a surdez, as doenças de pele, a hemorragia, as deficiências físicas, e até reimplantar uma orelha decepada (o que aconteceu com Malco), é o mesmo Deus que pode curar a incredulidade, a cegueira espiritual,

a paixão pelo dinheiro, o egoísmo, a sem-vergonhice, a falta de cortesia, a gula, o egocentrismo, a lascívia, a infidelidade conjugal, o secularismo, o consumismo, a arrogância e muitos outros defeitos de caráter que não estão em nenhum compêndio médico. Esses desacertos podem aparecer nos dicionários e em algum livro sobre ética, mas de forma meramente especulatória e acadêmica.

Prometemos cura de distúrbios físicos e não falamos nada sobre a cura de distúrbios de caráter. Oramos muito pela cura de uma doença terminal que vai nos levar para o mundo dos mortos, mas oramos pouco (quando oramos) pela cura de uma doença moral que vai nos levar para o inferno. Fazemos um alarde enorme quando o paralítico volta a andar, o cego volta a ver, o paciente sai do Centro de Tratamento Intensivo e recebe alta hospitalar, mas não é comum comemorarmos a volta da ovelha perdida, a transformação daquelas três mulheres sem nome envolvidas em relacionamentos sexuais equivocados (a mulher samaritana, a mulher adúltera e a mulher pecadora), a mudança daquele homem sovina e desonesto e de baixa estatura (corporal e moral).

Não há relato de que Jesus tenha realizado alguma cura de ordem médica entre os doze apóstolos, porém, o Senhor curou a segurança demasiada de Pedro, a incredulidade de Tomé e a violência de Tiago e João (os “filhos do trovão”).

Precisamos de uma revolução no cenário cristão, que equilibre o desejo da saúde física com o da saúde espiritual. Seria um erro desprezar a preocupação com a saúde e a doença da vida temporal, mas é preciso abrir as Escrituras e reler a advertência de Paulo: “O exercício corporal é bom, porém o exercício espiritual é muito mais importante, e é um revigorante para tudo o que você faz” (1Tm 4.8, BV)!

Jesus se preocupava com a alma e com o corpo, com a saúde e com a salvação, com a ética e com o perdão de pecados, com as ovelhas de dentro e com as de fora do

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A edição número 2.003 da revista Isto É (20/03/2008) trouxe como matéria de capa

um tema, no mínimo, curioso e instigante: “terapia de vidas passadas” (doravante, TVP). Este assunto é de especial interesse no Brasil, apontado por estudiosos do fenômeno religioso como o maior país espírita do mundo. A reportagem apresenta vários relatos de supostas curas de traumas e dores que só aconteceram depois que os pacientes se submeteram ao polêmico tratamento. Tratamento?

Profissionais da área psi (psiquiatras, psicólogos, psicoterapeutas e psicanalistas) em geral discordam veementemente de tal possibilidade. Todavia, alguns psicólogos dizem ser possível uma pessoa ter hoje um problema cuja causa esteja em uma suposta vida anterior. Seguindo esta linha de raciocínio, a cura só será possível se a pessoa descobrir o que aconteceu no seu passado, anterior à sua vida consciente hoje. A Sociedade Brasileira de Terapia de Vidas Passadas realiza congressos sobre a temática. No entanto, há que se destacar que o Conselho Federal de Psicologia, órgão oficial de reconhecimento de atividades na área, não reconhece a técnica. De fato, não há evidência científica segura que comprove a suposta eficiência da chamada TVP.

É compreensível que pessoas em sofrimento apelem para tratamentos alternativos em busca de solução para seus problemas e dilemas. O problema é apelar para algo que poderá complicar ainda mais a situação. É o caso de quem recorre à TVP.

Segundo os testemunhos de supostas curas, as sessões de TVP são emocionalmente muito intensas. A pessoa é total ou parcialmente hipnotizada, de acordo com técnicas especiais de hipnose. Em estado

inconsciente, poderá chorar, rir ou gritar. Invariavelmente, volta à consciência com relatos surpreendentes de uma outra vida supostamente vivida no passado. Mesmo que tais relatos sejam

detalhados, isso não prova de maneira conclusiva que a pessoa tenha vivido aquela outra vida.

Por mais que os defensores da TVP queiram alegar neutralidade religiosa, dizendo que se trata de procedimento meramente científico, não há como separá-lo da crença religiosa espírita. O espiritismo kardecista e algumas das grandes tradições religiosas orientais, como o hinduísmo e setores do budismo, são reencarnacionistas, ou seja, acreditam na idéia de reencarnação. A TVP caminha nessa direção. Este é um caminho

perigoso para quem quer resolver seus problemas, taras ou traumas; em vez de curar, pode complicar ainda mais a situação. Não é difícil entender a razão: imaginemos o senhor X. Se ele é uma pessoa que acredita na tese reencarnacionista, ele não é ele mesmo, mas sim alguém que teria vivido antes. Digamos que o senhor X de hoje já foi na verdade o senhor Y ontem. Hoje X vai ser recompensado ou castigado conforme o bem ou o mal que Y teria praticado em uma vida anterior. Só que Y por sua vez é a reencarnação de alguém que teria vivido em um período ainda mais remoto, digamos, a senhora Z. Mas Z também não é Z... E assim vamos retrocedendo cada vez mais no tempo, ad infinitum. Como X vai se curar de um trauma recorrendo a um tratamento na base da

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A terapia de vidas passadas é um caminho

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TVP, se Y, de quem ele supostamente seria reencarnação, também tinha seus problemas dos quais precisava se tratar? A conclusão é inevitável: a crença na tese da reencarnação tem o potencial de criar confusões mentais que podem gerar graves problemas de natureza psicológica e emocional.

Não é sem razão que Machado de Assis, com o brilhantismo que lhe era tão característico, tenha escrito por cerca de trinta anos (1865–1896) diversas crônicas com críticas pesadas ao espiritismo, que começava a se inserir na sociedade carioca de então. No livro Parapsicologia, Espiritismo e Psicopatologia, o psiquiatra Ronald Scott Bruno defende a idéia de que o espiritismo, por alguns motivos já mencionados, é fator potencialmente gerador de psicopatologias, isto é, transtornos e disfunções

mentais. As ciências psi serão muito mais úteis se ajudarem as pessoas a descobrirem as verdadeiras causas dos seus traumas, fobias e esquisitices, com sobriedade, sem apelar para elementos fantásticos como a TVP. Aqui vale a pena reproduzir um trecho da citada reportagem da revista Isto É:

Na opinião do presidente do Conselho Federal de Psicologia, Humberto Verona, a cura acontece devido à sensação de conforto pelo fato de o paciente se identificar com o terapeuta. “Elas apenas encontraram no psicólogo uma compatibilidade de crenças que facilitou o processo terapêutico”, afirma. A psiquiatra Marli Piva acrescenta: “A pessoa já se sente aliviada só de achar uma explicação para o seu problema”, diz ela.

Para Gildo Angelotti, diretor-executivo do Instituto de Neurociência e Comportamento, de São Paulo, as vivências relatadas pelos pacientes surgem de memórias inativas que registram imagens de filmes, sons, histórias de livros e tudo que é percebido pelo indivíduo ao longo da vida. “É como um sonho. Quando a pessoa está dormindo, os sentidos são pouco requisitados e sobra mais espaço para o resgate destes registros históricos. Mas a

reunião destes elementos vem da mente do próprio indivíduo,

não de outras vidas.” Na opinião dele, a TVP chega a ser arriscada aos pacientes psicóticos ou esquizofrênicos, que podem ter uma reação violenta a partir das revelações ou ficarem obcecados em encontrar nesta vida as pessoas do passado.

Como se vê, não há evidência científica que aponte para a possibilidade de se tratar de uma vida passada. E a teologia cristã, como vê a questão? O cristianismo, herdeiro do judaísmo, rejeita a idéia

de reencarnação. As Escrituras Sagradas não dão base para se pensar assim. Uma antropologia que admite as possibilidades de reencarnação e de tratamento de problemas

supostamente acontecidos em uma vida pregressa é, no mínimo, confusa. Afinal, ninguém é ninguém. Não há idéia de personalidade. Não é possível se falar de identidade.

A antropologia bíblica, em contraste, aponta para outra direção, totalmente diferente: o ser humano, “imagem e semelhança de Deus” (Gn 1.26- 27), é único e, portanto, tem valor inestimável. A Bíblia diz que “aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo, depois disto, o juízo” (Hb 9.27). Há quem veja a mensagem deste versículo como amedrontadora, pois fala de juízo. Mas a força do texto não está em ser assustador. Antes, indica de modo

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Carlos Caldas é professor na Escola Superior de Teologia e Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo.

ULTIMATO Maio-Junho, 2008 30

De sua e sua ansiedadeansiedade, aquela , aquela preocupação demasiada preocupação demasiada com o dia de amanhã, com o dia de amanhã, com a subsistência, com a subsistência,

com a segurança, com o peso, com a com a segurança, com o peso, com a beleza, com as coisas a fazer, com a beleza, com as coisas a fazer, com a mudança de tempo, com as coisas e mudança de tempo, com as coisas e com outros.com outros.

De seu De seu ciúmeciúme doentio, aquela doentio, aquela insegurança que faz você imaginar insegurança que faz você imaginar mil coisas que ainda não estão mil coisas que ainda não estão acontecendo mas que poderão acontecendo mas que poderão acontecer por sua própria culpa.acontecer por sua própria culpa.

De seu De seu desânimo,desânimo, aquela falta aquela falta de coragem crônica para enfrentar de coragem crônica para enfrentar os dias difíceis, as circunstâncias os dias difíceis, as circunstâncias difíceis, os empreendimentos difíceis difíceis, os empreendimentos difíceis e as pessoas difíceis.e as pessoas difíceis.

De seu De seu desespero sexualdesespero sexual, aquela , aquela fome e sede de sexo como se este fome e sede de sexo como se este fosse o único prazer da vida, que fosse o único prazer da vida, que provoca uma corrida vã a qualquer provoca uma corrida vã a qualquer tipo de relacionamento, com tipo de relacionamento, com qualquer pessoa e em qualquer qualquer pessoa e em qualquer tempo e lugar.tempo e lugar.

De seu De seu egocentrismoegocentrismo, aquela , aquela aberração de amar excessivamente aberração de amar excessivamente a si mesmo e de ocupar sozinho o a si mesmo e de ocupar sozinho o lugar que deveria ser repartido com lugar que deveria ser repartido com os outros.os outros.

De seu De seu estilo consumistaestilo consumista, aquele , aquele prazer incontido de comprar o útil prazer incontido de comprar o útil e o inútil, o que não tem e o que e o inútil, o que não tem e o que tem, aquela concepção errônea e tem, aquela concepção errônea e desastrosa de que a felicidade gira desastrosa de que a felicidade gira em torno do ter, e não do ser, aquela em torno do ter, e não do ser, aquela simplicidade frente ao simplicidade frente ao marketingmarketing.

De seu De seu gênio explosivogênio explosivo, aquele , aquele temperamento sempre briguento, temperamento sempre briguento, impetuoso, amargo, quase sempre impetuoso, amargo, quase sempre desprovido de razão, que provoca o desprovido de razão, que provoca o afastamento de parentes, amigos e afastamento de parentes, amigos e conhecidos.conhecidos.

De sua De sua hesitaçãohesitação, aquela atitude , aquela atitude que não leva a nada, não o coloca que não leva a nada, não o coloca em marcha, não movimenta suas em marcha, não movimenta suas mãos nem seus pés e ainda impede mãos nem seus pés e ainda impede que você fale alguma coisa.que você fale alguma coisa.

De sua De sua hipocondriahipocondria, aquela , aquela obsessão com a saúde que promove obsessão com a saúde que promove

uma corrida constante ao médico e uma corrida constante ao médico e à farmácia e que até contribui para à farmácia e que até contribui para você adoecer.você adoecer.

De sua De sua hipocrisiahipocrisia, aquela arte de , aquela arte de enganar os outros, aquele esforço enganar os outros, aquele esforço de esconder a verdadeira identidade de esconder a verdadeira identidade simulando outra que não existe, simulando outra que não existe, aquele pecado de lavar apenas o aquele pecado de lavar apenas o exterior do copo.exterior do copo.

De sua De sua incredulidadeincredulidade, aquela , aquela indisposição para crer na indisposição para crer na proximidade e na provisão de Deus, proximidade e na provisão de Deus, que o afasta dele e o impede de que o afasta dele e o impede de enxergar seu amor, seu poder e sua enxergar seu amor, seu poder e sua glória.glória.

De seu sentimento de De seu sentimento de inferioridadeinferioridade, aquela , aquela impressão forte, ou até impressão forte, ou até mesmo a certeza, de que mesmo a certeza, de que você está sendo superado você está sendo superado

Você precisa ser curado...

maravilhoso o valor da existência humana. Biblicamente, cada pessoa tem direito a uma identidade. A pessoa é quem é, não a reencarnação de alguém que viveu no passado, que por sua vez é a reencarnação de alguém que viveu ainda antes.

A vida apresenta situações difíceis para todos, provenientes da injustiça que os homens cometem contra seus semelhantes (C. S. Lewis, em O Problema do Sofrimento, afirma que 80% do sofrimento do ser humano é provocado pelo próprio ser humano) e de fatores que são conseqüência do pecado — afastamento de Deus. Bem afirmou o sábio do passado, ao observar como as pessoas vivem: “Eis o que tão-somente achei: que Deus fez o homem reto, mas ele se meteu em muitas astúcias” (Ec 7.29). Em vista disso, é importante procurar soluções para as crises, mas por meios de seriedade científica comprovada. Como cristãos, cremos que o progresso da ciência é dom de Deus para a humanidade. É o que a tradição teológica reformada chama de “graça comum” — bênçãos da parte do Deus, que faz com que o sol nasça sobre maus e bons e que a chuva caia sobre justos e injustos (cf. Mt 5.45). Não é este o caso da TVP. Quem se submete a este tipo de tratamento pode, conforme apontado por alguns psicólogos, encontrar, na melhor das hipóteses, alívio temporário e ilusório. Felizmente, há esforços sérios na área da psicologia que conjugam técnicas e conhecimentos cientificamente comprovados com a mensagem bíblica da graça, do amor e da misericórdia de Deus. O Corpo de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos (CPPC) que o diga!

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pelos outros, principalmente pelos outros, principalmente pelas pessoas mais próximas, pelas pessoas mais próximas, provocado por sua auto-avaliação provocado por sua auto-avaliação exageradamente negativa.exageradamente negativa.

De sua De sua intolerânciaintolerância, aquele apego , aquele apego demasiado às suas próprias idéias e demasiado às suas próprias idéias e às suas próprias crenças, associado às suas próprias crenças, associado com certa dose de soberba e despido com certa dose de soberba e despido de qualquer dose de amor.de qualquer dose de amor.

De sua De sua invejainveja, aquele desgosto , aquele desgosto e pesar pelo sucesso ou felicidade e pesar pelo sucesso ou felicidade dos outros, que provoca o desejo dos outros, que provoca o desejo violento de possuir o que o próximo violento de possuir o que o próximo tem, e que rouba sua paz de espírito.tem, e que rouba sua paz de espírito.

De sua De sua mania de mania de perseguiçãoperseguição, ,

aquela certeza aquela certeza infundada de infundada de que alguém que alguém deseja deseja

o seu mal e está trabalhando o seu mal e está trabalhando incansavelmente nesse sentido.incansavelmente nesse sentido.

De seu De seu medomedo, aquele estado de , aquele estado de espírito que aumenta e exagera a espírito que aumenta e exagera a sensação de perigo, sufocando a sensação de perigo, sufocando a vontade e a disposição de fazer algo.vontade e a disposição de fazer algo.

De sua De sua preguiçapreguiça, aquela , aquela continuada aversão ao trabalho, continuada aversão ao trabalho, ou a morosidade com a qual você ou a morosidade com a qual você o realiza, justificando-a com mil o realiza, justificando-a com mil desculpas sem a menor procedência.desculpas sem a menor procedência.

De sua De sua procrastinaçãoprocrastinação, aquela , aquela tendência a adiar indefinidamente tendência a adiar indefinidamente e sem razão justificável o que deve e sem razão justificável o que deve ser feito hoje, com o risco de perder ser feito hoje, com o risco de perder para sempre as oportunidades que para sempre as oportunidades que passam e não voltam.passam e não voltam.

De sua De sua rabugicerabugice, aquele mau , aquele mau humor permanente, que faz mal a humor permanente, que faz mal a você e aos que o cercam.você e aos que o cercam.

De seu sentimento de De seu sentimento de superioridadesuperioridade, aquela impressão , aquela impressão forte ou até mesmo certeza de que forte ou até mesmo certeza de que você é o máximo, provocado por você é o máximo, provocado por uma auto-avaliação exageradamente uma auto-avaliação exageradamente positiva.positiva.

De sua De sua timideztimidez, aquela qualidade , aquela qualidade negativa que mistura o temor, o negativa que mistura o temor, o acanhamento e a fraqueza, e que o acanhamento e a fraqueza, e que o leva a evitar novos encontros e novas leva a evitar novos encontros e novas experiências.experiências.

De seus De seus queixumesqueixumes, aquele hábito , aquele hábito de não enxergar beleza em pessoa de não enxergar beleza em pessoa alguma e em lugar algum, de alguma e em lugar algum, de colecionar somente as coisas ruins colecionar somente as coisas ruins da vida e de reclamar contra elas o da vida e de reclamar contra elas o tempo todo.tempo todo.

De sua De sua tristezatristeza, aquela entrega , aquela entrega sinistra e passiva aos problemas reais, sinistra e passiva aos problemas reais, aos problemas de gravidade exagerada aos problemas de gravidade exagerada e aos problemas inexistentes, uma e aos problemas inexistentes, uma estranha aversão à alegria.estranha aversão à alegria.

Quando os cobradores do imposto para a manutenção do

templo em Jerusalém perguntaram a Pedro se Jesus pagava aquela taxa, o apóstolo respondeu de pronto: “Paga, sim!” De fato, era uma obrigação imposta a qualquer israelita acima de 20 anos (Êx 30.12-14). Porque “todas as coisas foram criadas por ele e para ele” (Cl 1.16) e porque Jesus era “maior do que o templo” (Mt 12.6), o Senhor deixa claro a Pedro que ele não era obrigado a pagar o referido imposto das duas dracmas (valor equivalente ao salário pago ao trabalhador braçal por dois dias de serviço). Todavia, para não escandalizar os cobradores, Jesus desembolsou quatro dracmas para pagar a cota dele e a de Pedro.

Desembolsar significa tirar da bolsa ou do bolso. Logo o verbo não é o mais apropriado. Nem Jesus nem Pedro tinham aquele dinheiro no bolso. Mas os cobradores continuavam em pé ao lado deles aguardando o pagamento do imposto. Então, Jesus ordenou a Pedro que fosse ao mar e jogasse nele o anzol, na certeza de que na boca do primeiro peixe fisgado ele encontraria um estáter, moeda que valia exatamente quatro dracmas (Mt 17.24-27).

Por não ter havido troco, Jesus e Pedro continuaram sem dinheiro no bolso, mas livres do compromisso daquele dia. Isso combina com o ensino de Jesus no Sermão da Montanha: “Não fiquem preocupados com o dia de amanhã” (Mt 6.34).

Em Jesus você pode confiar

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32 ULTIMATO Maio-Junho, 2008

A primeira doença do ser humano não foi física, mas espiritual. Ele desobedeceu e comeu do fruto da árvore

do conhecimento do bem e do mal. Por essa única razão, foi proibido de comer do fruto da árvore da vida, ficando assim, sujeito à enfermidade física e à morte do corpo. A doença espiritual perturba para sempre o seu relacionamento com Deus. Ele fica desconsertado diante do Criador, teme-o e esconde-se dele. A doença espiritual destrói ainda a naturalidade do homem em todos os sentidos e em todas as frentes (Gn 3). A partir daí, todos perdemos tanto a saúde espiritual como a saúde física.

Essa situação doentia do caráter humano vem à tona no livro de Isaías: “E nos tornamos todos como seres impuros, e toda nossa (aparente) integridade parecia como roupas poluídas; e nós nos desvanecemos como folhas transparentes, e nossas iniqüidades nos carregam como o vento” (Is 64.5, BH). O profeta já havia falado sobre esse assunto no início do livro: “Da sola dos pés ao topo da vossa cabeça nada permanece são, cobertos que estais de feridas,

equimoses e chagas putrefatas. Elas não foram tratadas, não receberam ataduras nem foram suavizadas com óleo” (Is 1.6, BH). Se no caso de Jó, “as feridas terríveis da sola dos pés ao alto da cabeça” (Jó 2.7) eram causadas por uma enfermidade física extremamente grave, no que diz respeito aos contemporâneos de Isaías, as chagas putrefatas eram causadas por uma enfermidade moral extremamente grave.

Deus não se compadece apenas dos que são portadores de doenças físicas, mas também daqueles acometidos por doenças morais. O profeta Isaías descreve essa disposição terapêutica de Deus de maneira poética e elegante. Apesar de Alto e Sublime, apesar de habitar um lugar alto e santo, Deus habita também com o arrependido, para elevar o seu espírito e vivificar o seu coração, para dar novas forças aos desanimados e vontade de viver aos que estão tristes e abatidos por causa de seus pecados. Deus mesmo se expressa: “Por causa do pecado e da cobiça do meu povo, eu fiquei irado com eles e os castigarei. Na minha ira, eu me afastei deles, mas mesmo assim eles continuaram teimosos e seguiram

o seu próprio caminho. Tenho visto como eles agem, mas eu os curarei e os guiarei; eu os consolarei. Nos lábios dos que choram, colocarei palavras de louvor. A todos ofereço a paz, paz aos que estão perto e aos que estão longe; eu os curarei” (Is 57.17-19, NTLH).

Para que não haja a menor dúvida, é bom lembrar a história de Davi e Ezequias, reis de Israel. Os dois eram portadores de doenças terminais e ambos clamaram dramaticamente ao Senhor por cura, e ele os curou. Davi ia morrer porque havia pecado contra Deus (2Sm 12.13) e Ezequias ia morrer porque estava com uma úlcera, provavelmente maligna (2Rs 20.7). A doença de um era moral, a do outro, física. Davi queria muito que Deus o lavasse de sua culpa, o purificasse de seu pecado e apagasse todas as suas iniqüidades, o adultério com Bate-Seba e o assassinato de Urias (Sl 51). Ezequias queria muito que Deus não o fizesse passar pelas portas da sepultura no vigor de sua vida (Is 38). A pesada mão de Deus se retirou da cabeça de Davi e suas transgressões foram perdoadas (Sl 32). A sentença de morte foi retirada de Ezequias e o rei teve mais 15 anos de vida.

Feridas físicas e morais da sola dos pés ao alto da cabeça

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Esp lEspecialEspecial

A dança do “quero” e “não quero”

Uma das coisas mais divertidas na seção de Cartas é a dança do

“quero” e “não quero”. Os que não querem receber a revista expressam seu sentimento com ardor. O mesmo acontece com os que querem. Alguns dos que querem pedem para ocupar a “vaga” dos que não querem. Da parte dos que não querem, há cartas muito educadas e outras nem tanto.

Em março enviei correspondência na qual cancelava a assinatura de Ultimato. Continuei a receber a publicação. Venho, pois, renovar o pedido de cancelamento.

Padre Astôr BackesSanta Cruz do Sul, RS, Agosto de 1986

Solicito uma assinatura de Ultimato. Faço-o em nome da comunidade de estudantes de filosofia e teologia de Vacaria que residem e estudam no Instituto de Teologia e Pastoral de Passo Fundo.

Padre Odalberto Domingos CasonattoPasso Fundo, RS, Agosto de 1986

Recuso categoricamente o envio a mim da revista Ultimato, presente de grego, a saber, cavalo de Tróia.

Witold SkwaraRecife, PE, Janeiro de 2004

Sinto muito, mas não quero mais receber Ultimato. A assinatura é muito cara. Fiz uma assinatura do jornal Mundo Jovem, muito mais abrangente, por Cz$ 100,00. Sou

um jovem estudante de psicologia, de religião católica. Também sou muito crítico e, mediante minha análise crítica, optei por um jornal de cultura mais elevada. Quando terminar psicologia, farei teologia e, com fé, serei um sacerdote exemplar. Agora faço uma pergunta: quem é mais preparado: um pastor que estuda só quatro anos para se formar ou um padre que passa 12 anos no seminário para se ordenar? É lógico que é o padre.

Francisco de Assis da Silva*João Pessoa, PB, Outubro de 1987

Favor cancelar a remessa de Ultimato, pois não é lida aqui por ninguém.

Iva TonelliParóquia N. S. Auxiliadora

Juiz de Fora, MG, Julho de 1987

Gosto muito de ler Ultimato. Quero receber a revista, que leio quando encontro números perdidos aqui. Informo que Dom Frederico faleceu e que a Paróquia Santa Teresa não tem padre. Um desses números, se vocês aprovarem, pode ser meu.

Padre FernandoRio Grande, RS, Setembro de 1994

Resolvi não mais assinar Ultimato, pois me causou revolta ver o sr. Paulo Romeiro e companhia limitada usar a revista para falar mal de servos ungidos do Senhor. No meu

entender, Ultimato está pactuando com eles.

Irene Mesquita RodriguesSorocaba, SP, Novembro de 1994

Tenho recebido com freqüência a revista Ultimato. Faço questão de registrar meu interesse em continuar recebendo e dizer o quanto tem me ajudado em meu pastoreio.

Padre Danilo Mamedes Rodrigues, Belo Horizonte,

MG, Setembro de 1995

Agradeço a remessa graciosa de Ultimato e peço que continuem a me enviar a preciosa revista para meu novo endereço. Que meu sucessor, Dom Ricardo, da Diocese de Caetité, BA, não seja esquecido.

Dom Antonio Alberto G. RezendeUberaba, MG, Março de 2003

Nunca pedi esta revista Ultimato. Nunca autorizei meu endereço e nunca a li! Por favor, não percam tempo em me enviá-la. Enviem o dinheiro que estão gastando na postagem da revista para o Fome Zero. Lá, com certeza, farão melhor uso.

Padre Manuel Messias Vilela, Fazenda Rio Grande, PR, Março de 2004

* Francisco de Assis da Silva, 42, foi ordenado padre em janeiro de 1997. Hoje está à frente da Paróquia Nossa Senhora de Fátima, em Cajazeiras, PB.

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Albânia: não há DeusA Albânia acaba de se declarar “o primeiro Estado ateu no mundo”. O país é pouco menor que o estado de Alagoas e tem 2 milhões de habitantes. O movimento ateísta dos seis últimos meses apresenta o seguinte balanço: 2.169 igrejas, mesquitas e conventos foram fechados e em sua maioria transformados em centros culturais para a mocidade.

Estados Unidos: algo pior do que a bomba atômicaO secretário de Estado Dean Rusk declarou que o mundo dispõe de pouco mais que uma geração para vencer a fome e o desemprego e menos de 10 anos para evitar um cataclisma. Segundo Rusk, a explosão demográfica por volta do ano 2000 poderá representar perigo maior do que a bomba atômica.

vestíbulo de uma universidade até um escritório de trabalho”. O celibato será observado em grande escala pelos padres, mas o casamento será permitido, cabendo a cada um fazer a sua opção.

Israel: o vale de ossos secosA crise atual, em face da secularização da vida num mundo dominado pela ciência e pelo materialismo, atingiu também o judaísmo. Por esta razão, reuniram-se, em Jerusalém, mais de 1.500 rabinos da Europa e do Mediterrâneo para estudar a forma de apresentar a fé aos fiéis de hoje. O Congresso reafirmou a necessidade da volta à ortodoxia e o estreitamento dos laços com Israel como dever religioso. Recomendou a imigração para a nova Canaã e a criação de escolas hebraicas nas comunidades judaicas do mundo.

(Fonte: Ultimato, edições de janeiro a maio de 1968)

Notícias de 40 anos atrás

No mundo inteiro a guerra está sendo travada a cada dia, a cada hora, a cada minuto. É uma guerra diferente. Nela não há bombas, nem metralhadoras, nem armas atômicas. As armas são outras. São as letras do alfabeto colocadas em ordem, formando palavras, expressando idéias, procurando conquistar o pensamento dos homens.

Walter Kaschel, diretor da Associação Brasileira de Evangelização

Pronunciamentos de 40 anos atrás

Japão: o vazio que a técnica não encheCerca de 200 mil japoneses tiveram a oportunidade de ouvir as pregações do evangelista americano Billy Graham, 50 anos, durante dez dias em Tóquio. Mais de 15 mil pessoas fizeram sua decisão de aceitar Cristo como Salvador. Na última reunião, Graham declarou: “Temos percebido que há um grande vazio espiritual neste país. Os japoneses estão percebendo que o desenvolvimento da tecnologia não satisfaz os desejos íntimos do coração”.

França: a igreja no ano 2000O teólogo leigo Jean Marie Paupert, acaba de lançar em Paris um livro de conjecturas sobre a igreja no ano 2000. Segundo o autor, a eucaristia “se transformará num memorial comunitário celebrado por pequenos grupos em qualquer lugar, desde o

Faço as minhas orações especialmente pela manhã, mas oro também quando estou num avião, ou enquanto guio o automóvel, ou espero um ônibus. Meu colóquio com Deus é muito simples: não lhe peço muita coisa, suplico-lhe apenas que me ajude a prosseguir em meu trabalho do melhor modo possível. Depois, rogo-lhe que proteja os meus filhos, minha mulher e toda a minha família.

Dr. Christian N. Barnad, o cirurgião que fez o primeiro transplante de coração

Uma das razões por que o ateísmo vem crescendo no mundo inteiro se deve ao fato de os cristãos não viverem como deveriam, dando por conseguinte uma idéia falsa do cristianismo.

Cardeal Franjo Seper, da Iugoslávia, recentemente nomeado

pró-prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé

(Fonte: Ultimato, edições de janeiro a maio de 1968)

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Os cristãos se movem na história pela memória da civilização que emergiria do jardim do Éden, sem

o pecado original, e pela antevisão do que teremos na Nova Jerusalém, quando os efeitos da queda forem erradicados. Já na revelação os crentes não podem deixar de atentar para a mensagem do Antigo Testamento, tendo Israel como povo de Deus: o Ano Sabático e o Ano do Jubileu, a proibição da escravidão, o amparo à viúva, ao órfão e ao estrangeiro, a terra como sendo de Deus, proibida a sua propriedade perpétua, tida como instrumento de produção para o alimento de todos. O pecado não era só individual, mas das nações, famílias e governantes.

O reino de justiça e de paz tem o seu “já” na história e o seu “ainda não” após o juízo final. O primeiro fruto do Espírito Santo é o amor. Não somos salvos por obras, mas para elas, pois sem elas a fé seria morta. A igreja primitiva foi uma comunidade de partilha de bens e mordomia do que Deus nos confia. O critério de julgamento será pelas evidências éticas sociais: “tive fome”, “tive sede”.

Na história da igreja esses valores foram cultivados. Entre os Pais

da Igreja, Basílio, Ambrósio, João Crisóstomo, Gregório de Nazianzo, Gregório de Nissa e Agostinho de Hipona advogaram a justiça social e o bem comum. Em seu texto Naboth e o Pobre, Ambrósio escreveu: “Não é teu o bem que distribuis aos pobres, apenas restituis o que é dele. Porque tu és o único a usurpar o que é dado a todos para o uso de todos”. A Reforma Protestante veio com o nacionalismo europeu, defendendo os interesses de cada povo contra a opressão dos poderes supranacionais: o papado e o sacro-império. A doutrina da vocação em Lutero, ou da dignidade do trabalho em Calvino — e do valor da educação para ambos — tiveram um impacto na civilização, com o capitalismo superando o modo de produção feudal, abrindo caminho para a democracia liberal e sendo criticado por movimentos como os Niveladores (1647-1650), socialistas (parlamento,

cidadania, sufrágio universal, contra os monopólios), e sua dissidência, os Cavadores, comunistas, liderados por Gerrard Winstanley, autor da Lei da Liberdade. No século 17, esses evangélicos, defensores de um pós-capitalismo, acreditavam que, no que concerne aos meios de produção, “a propriedade privada, em si mesma, constituía a principal causa do mal e de todas as formas de abusos e corrupção social”.

O reavivamento inglês, a partir de Wesley, incluindo o abolicionismo e o reformismo social de Wilberforce e da Paróquia Anglicana de Claphan, são marcas de uma visão integral do pecado, do

evangelho e da missão, cujo legado seria dilacerado pelo que David Moberg denominou de “A Grande Reversão” — os evangélicos, reagindo ao “evangelho social”, universalista e de teologia liberal, foram para o outro extremo com um “evangelho individual” descarnado e insensível,

A igreja primitiva foi uma comunidade

de partilha de bens e mordomia do que

Deus nos confia

A mui piedosa esquerda

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Robinson Cavalcanti

Dom Robinson Cavalcanti é bispo anglicano da Diocese do Recife e autor de, entre outros, Cristianismo e Política – teoria bíblica e prática histórica e A Igreja, o País e o Mundo – desafi os a uma fé engajada. <www.dar.org.br>

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ambos antibíblicos. Enquanto isso surgiu uma esquerda cristã na Igreja de Roma, com os padres Lammenais e Lacordaire. A própria instituição, com a encíclica Rerum Novarum, abandonaria os seus vínculos com o absolutismo e assumiria os novos desafios sociais. Entre os protestantes, os movimentos do socialismo religioso e do socialismo cristão foram corajosas propostas. Na Igreja de Roma, pensadores como Jacques Maritain, Emmanuel Mounier e Gabriel Marcel lançaram as bases do pensamento humanista cristão e do solidarismo, com grande influência no Brasil do pós-Segunda Guerra aos anos 60, agora resgatados pelos estudos de Michel Lowi.

Os termos direita e esquerda surgiram na Assembléia Nacional francesa pós-revolucionária (1789) para designar os defensores e os opositores do antigo regime ou do novo regime. Naquele contexto, a então esquerda seria direita hoje. O marxismo estava longe de existir, e a ditadura do (sobre o) proletariado perseguiria o pensamento de esquerda existente antes, em separado, e depois dele, particularmente os religiosos. Harold Laski afirmou: “Democracia

sem socialismo não é democracia; socialismo sem democracia socialismo não é”. Diante do aparente triunfo do pensamento único, Norberto Bobbio afirma que sempre haverá uma esquerda, formada pelos inconformados com as desigualdades não-naturais. A inconformação com os males do presente século, o compromisso com os valores do reino de Deus, a promoção da liberdade responsável, da democracia representativa e participativa, da justiça social e da soberania dos povos diante dos impérios políticos e econômicos, e de um modo de produção não baseado em um darwinismo social — com a sobrevivência dos mais fortes e mais aptos —, mas na solidariedade — com todo o capital nas mãos de todos os trabalhadores, e não do Estado ou de outros seres —, continuam a ser o ideário de milhares de nascidos de novo, piedosos e ortodoxos, no exercício responsável da cidadania, orando “seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu”.

da cristã

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Ricardo Gondim

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Celebro os 40 anos da revista Ultimato. Procuro recordar o ano em que circularam as primeiras

revistas. O mundo fervia: estudantes parisienses entrincheirados desafiavam o sistema educacional francês; tchecos provocavam o imperialismo russo; Martin Luther King e John Kennedy tombavam, assassinados em condições suspeitas; a América Latina amargava ditaduras militares por todo lado; a guerra do Vietnã horrorizava o planeta. O ano de 1968 foi inundado com tantos acontecimentos que ainda hoje as águas não conseguiram baixar.

De lá para cá, o planeta mudou: o bloco soviético ruiu; a Ásia deixou de ser um perigo geopolítico para tornar-se a nova promessa econômica; a Europa criou sua moeda e o dólar perdeu exclusividade; o Oriente Médio ressuscitou teocracias; as grandes religiões — hinduísmo, judaísmo, cristianismo e islamismo — se viram obrigadas a lidar com fundamentalismos.

Em quase meio século, a África padeceu com holocaustos semelhantes ao de Ruanda. Impotente, viu milhões serem dizimados por epidemias

— aids, malária, tuberculose. Sem conseguir acabar com conflitos internos, condenou milhões à miséria — Angola, Darfur, Zimbábue.

Também, desde as primeiras edições de Ultimato, computadores se tornaram utensílios domésticos e máquinas de escrever, relíquias; CD’s e DVD’s são agora siglas conhecidas. A televisão conectou o mundo via satélite. A internet revolucionou o conhecimento; hoje poucos consultam as enciclopédias, preferindo o Google.

Por outro lado, o mundo percebeu que o mito do progresso cobra um preço altíssimo; e a comunidade internacional despertou: o planeta não suporta a dilapidação desenfreada do meio ambiente. Com o derretimento das calotas polares, as conseqüências do efeito estufa substituíram o pavor da guerra atômica.

O mundo religioso mudou desde que o jovem Elben Lenz César escreveu os primeiros textos para a revista Ultimato. Os evangélicos cresceram velozmente e chamaram a atenção de sociólogos e teólogos; o Vaticano mostrou certa preocupação. Os pentecostais se tornaram maioria — embora já nem se diferencie os crentes entre “tradicionais” e “renovados”. Os protestantes mudaram, para o bem e para o mal.

Os problemas éticos foram graves. Desde a Constituinte de 1988, pairaram suspeitas sobre as aventuras políticas dos evangélicos; na política, o amadurecimento foi pífio. Os altos custos para financiar o expansionismo de algumas igrejas acabaram enfraquecendo a reputação dos pastores, e os constantes apelos por dinheiro

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— aids, malária, tuberculose. Semconseguir acabar com conflitos internos, condenou milhões à miséria — Angola, Darfur, Zimbábue.

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Há muito que celebrar. Escritores nacionais tomaram coragem e publicaram o que antes apenas pregavam; poetas musicaram poemas que lhes inspiravam; fez-se

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Ricardo Gondim é pastor da Assembléia de Deus Betesda no Brasil e mora em São Paulo. É autor de, entre outros, Eu Creio, mas Tenho Dúvidas. <www.ricardogondim.com.br>

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em programas de rádio e televisão viraram alvo de piadas.

A espiritualidade revelou sintomas preocupantes. Alastraram-se devoções utilitárias e muitas igrejas passaram a funcionar como centros de auto-ajuda; com os crentes ávidos por “conseguir” uma bênção, correntes de oração se popularizaram. Se antigamente havia testemunho de mudança de vida, passou-se a relatar milagres de prosperidade e de solução de problemas corriqueiros. Sermões antropocêntricos pareciam querer fazer de Deus um servo obediente.

Contudo, há muito que celebrar depois de 40 anos. Escritores nacionais tomaram coragem e publicaram o que antes apenas pregavam; poetas musicaram poemas que lhes inspiravam; até as controvérsias teológicas revelaram a liberdade dos pensadores de se desvencilharem das matrizes denominacionais; fez-se a obra missionária sem recursos estrangeiros; criaram-se ONG’s para defender desde crianças carentes até o meio ambiente.

Devem-se festejar, principalmente, as ações anônimas de milhões de leigos que encarnam a doutrina do sacerdócio universal dos crentes. Eles visitaram

penitenciárias e hospitais, levando esperança para milhões; criaram creches, clínicas para recuperação de toxicômanos e asilos para idosos; evangelizaram e discipularam empresários, atletas e artistas.

Nos conflitos e paradoxos da história, nessa ambivalência humana, nos perigos do mundo, a revista Ultimato se tornou um marco dos princípios do evangelho, sempre provocando reflexão e sempre na defesa da vida. O futuro da humanidade promete ser tenso, ameaçador e bem mais complexo. Que a revista insista em seu ultimato para que os cristãos não se esqueçam da sua vocação: serem “astros e luzeiros em meio a uma geração corrompida e perversa”.

Parabéns. Toda a equipe da revista Ultimato merece uma salva de palmas. Continuem! Vocês se tornaram uma dádiva para que lusófonos sejam enriquecidos com informações, reflexões e crônicas da melhor qualidade.

Soli Deo Gloria.

em programas de rádio e televisão viraram alvo de piadas.

A espiritualidade revelou sintomaspreocupantes. Alastraram-se devoções utilitárias e muitas igrejas passaram a

penitenciárias e hospitais, levando esperança para milhões; criaram creches, clínicas para recuperaçãode toxicômanos e asilos para idosos; evangelizaram e discipularam

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Valdir Steuernagel

edescobrindo a Palavra de DeusR

Como será que está a Maria? Ser áela carrega o vírus da aids no seu c

O cenário parece demasiado difícil para ser verdadeiro, mas o é, na sua crueza e no desenho

de uma realidade de vida que de tão real deveria ser proibida.

O teto da casa havia caído e a “família” se mudou para uma casa emprestada pelo vizinho. Mas tanto a casa caída como a casa em pé pareciam vazias. As pessoas dormiam no chão, em cima de qualquer pano, e roupa para guardar não havia. A cozinha era do lado de fora de casa, onde se fazia um pequeno fogo no chão. Num dia porque o vizinho trazia alguma coisa. Noutro porque se havia catado algumas bananas. E depois de amanhã... quem sabe nem vai se fazer fogo.

A família era formada de quatro irmãos. Maria, então com 6 anos, era a mais nova. Tenho saudades dela e o meu coração chora quando penso nela: seus olhos pediam acolhimento e seu rosto expressava abandono. Ela não tinha quem cuidasse dela nem de suas roupas. Ambos os pais haviam morrido por complicações

causadas pelo vírus da aids e estavam enterrados no fundo do quintal.

Agora os quatro irmãos tinham um ao outro, a casa emprestada, algum outro vizinho que se lembrava deles de vez em quando e a pessoa da Visão Mundial que passava por lá uma vez por semana.

Nem sei o nome do menino

A família já havia tentado de tudo e nada dava jeito. O menino parecia um caso sem solução. Desde pequeno tinha convulsões. Virava os olhos e espumava pela boca, e isso gerava muitos comentários na vizinhança.

Quando isso acontecia, a mãe do menino ficava muito triste. O pai estava sempre à procura de ajuda. O fato já não era familiar, mas comunitário, público. Isso se tornou ainda mais claro quando o pai levou o menino a alguns homens que apareceram na vila e de quem as pessoas estavam dizendo coisas boas

e impressionantes. Porém, colheu apenas decepção e muito barulho, só conseguindo o que ele não precisava: ser caso de análise.

O evangelho de Marcos (9.14-27) fala dessa cena e de como Jesus foi averiguar o que estava acontecendo e se viu diante de um pai desesperado, segurando pela mão um menino cujos olhos pareciam carregar um enorme cansaço. E assim Jesus entra na história dessa família. Pergunta pelo quadro do

menino. Faz um diagnóstico da situação.

Quando, mais tarde, o pai chega em casa segurando o menino pela mão, a mãe olha e

chora. É o choro de uma mãe que tem uma profunda angústia aliviada, um choro com cara de riso. Pelo semblante do marido e pelos olhos do menino ela sabe que algo aconteceu, e o que aconteceu lhe devolveu um menino diferente, um menino liberto, curado, tocado por Jesus.

O sexto Objetivo do Milênio é “combater

a aids, a malária e outras doenças”

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Valdir Steuernagel é pastor luterano e trabalha com a Visão Mundial Internacional e com o Centro de Pastoral e Missão, em Curitiba, PR. É autor de, entre outros, Para Falar das Flores... e Outras Crônicas.

r á que u corpo?

Quando, tarde da noite, os pais ainda sem conseguir dormir começam a conversar, o assunto é um só: esse Jesus que se preocupou com o nosso menino é “coisa de outro mundo”.

Ontem foi o menino, agora é a Maria

O sexto Objetivo do Milênio é “combater a aids, a malária e outras doenças”. Com estes objetivos, a Organização das Nações Unidas está diagnosticando os principais problemas que acometem a vida no e do planeta e convocando todas as nações do mundo a se engajarem no alcance de objetivos cujo cumprimento visa melhorar a vida das pessoas e da comunidade humana. O Brasil está entre os países que se comprometeram a alcançar estes objetivos e, no combate à aids, tem ganhado um enorme destaque positivo. É o primeiro país em desenvolvimento a proporcionar acesso universal e gratuito ao tratamento da aids na rede pública de saúde. Porém, no que diz respeito a “outras doenças”, o Brasil não vai tão bem. Enquanto escrevia este artigo, li a trágica notícia de que “as forças armadas

começam a erguer hospitais para tratar pacientes com dengue no Rio”. A dengue, a malária, a febre amarela, machucam e matam muitas pessoas neste Brasil de contradições sociais.

Comecei este artigo preocupado em mostrar dados, abundantes e assustadores. Porém, abandonei os números e voltei a olhar para a Maria e a caminhar em direção a Jesus. É significativo o número de vezes em que Jesus está cercado de pessoas doentes, fragilizadas e paralisadas pelas dificuldades da vida. Sua presença e sua palavra são sempre de esperança. Esperança de restauração e de encontro com o shalom de Deus, no qual a saúde tem lugar especial. Assim, engajar-se no cumprimento deste objetivo do milênio é caminhar com Jesus e em nome de Jesus pelas casas de teto caído e ir ao encontro de pais desesperados com os conflitos dos seus filhos, para que todos “tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10.10).

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história

Alderi Souza de Matos

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Elas ocupam um enorme espaço na televisão aberta, chegando a milhões de lares brasileiros todos os dias. As

três mais conhecidas e salientes têm nomes parecidos — Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da Graça de Deus e Igreja Mundial do Poder de Deus. Esses nomes apontam para objetivos ousados e ambiciosos. Seus líderes máximos adotam, respectivamente, os títulos de bispo, missionário e apóstolo. Elas são o fenômeno mais recente, intrigante e explosivo do

“protestantismo” tupiniquim. Trata-se das igrejas neopentecostais, denominadas por alguns estudiosos “pentecostalismo autônomo”, em virtude de seus contrastes com os grupos mais antigos desse movimento.

É difícil categorizá-las adequadamente, não só por serem ainda recentes, mas porque, ao lado de alguns traços comuns, também apresentam diferenças significativas entre si. A Igreja Mundial investe fortemente na cura divina. Seu apóstolo garante que ninguém realiza mais

milagres do que ele. Seu estilo é personalista e carismático.

Caminha no meio dos fiéis, deixa que as pessoas recolham o suor do

seu rosto para fins terapêuticos, às vezes é ríspido com os auxiliares. O missionário da

Igreja Internacional é simpático e bonachão; parece um pastor à

moda antiga. É também polivalente: prega, canta, conta piadas, anuncia produtos e serviços. Controla com rédea curta o seu pequeno império. Todavia, nenhuma dessas igrejas vai tão longe na

ruptura de paradigmas quanto a IURD. Dependendo do ângulo de análise, parece protestante ou católica. Seu carro-chefe é a teologia da prosperidade. Defende sem pejo a ética da sociedade de consumo. Seu líder está entrando na lista dos homens mais ricos do país.

Desde o início, o cristianismo tem exibido uma grande variedade de manifestações, algumas bastante inusitadas. Foi o caso do gnosticismo e do marcionismo nos primeiros séculos, das seitas apocalípticas na Idade Média e de alguns grupos resultantes dos reavivamentos nos Estados Unidos do século 19. Porém, nenhum movimento tem sido tão pródigo em termos de quantidade e diversidade de ramificações quanto o pentecostalismo contemporâneo. No atual ambiente pluralista e inclusivista, muitos observadores vêem nessa multiplicidade um sinal de vitalidade, de dinamismo. Todavia, há sinais preocupantes nos ensinos e práticas de certos grupos. Na célebre Confissão de Fé de Westminster (1647), os puritanos ingleses colocaram a questão em termos de diferentes

A integridade do evangelho: uma avaliação do neopentecostalismo

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Em muitas igrejas neopentecostais a Bíblia

se torna um joguete, uma peteca lançada para lá e para cá ao sabor das conveniências. Os textos bíblicos são usados de modo mágico, como se fossem amuletos

ou talismãs, como se tivessem um poder

imanente e intrínseco

graus de pureza das igrejas cristãs — cap. 25.4,5 (igrejas mais puras e menos puras). Uma avaliação simpática e honesta das igrejas neopentecostais aponta para alguns aspectos que precisam ser reconsiderados a fim de que elas se tornem genuínos instrumentos do evangelho de Cristo.

O problema hermenêutico

Uma grave deficiência dessas novas igrejas está na maneira como interpretam a Bíblia. Os reformadores protestantes insistiram no valioso, porém arriscado, princípio do “livre exame das Escrituras”, ou seja, de que todo cristão tem o direito e o dever de ler e estudar por si mesmo a Palavra de Deus. Acontece que muitos viram nisso uma licença para a livre interpretação do texto sagrado, o que nunca esteve na mente dos líderes da Reforma. Eles lutaram contra uma abordagem individualista e tendenciosa da Escritura, insistindo na adoção de princípios equilibrados de interpretação que levavam em conta o sentido literal e gramatical do texto, a intenção original do autor, o contexto histórico das passagens e também a tradição exegética da igreja. Por essas razões, eles rejeitaram o antigo método de interpretação alegórica, isto é, a busca de sentidos múltiplos na Escritura, por entenderam que ela obscurecia e distorcia a mensagem bíblica.

Em muitas igrejas neopentecostais nada disso é levado em consideração. A Bíblia se torna um joguete, uma peteca lançada para lá e para cá ao sabor das conveniências. Tomam-se diferentes declarações, episódios e símbolos bíblicos e, sem esforço algum de interpretação, passa-se diretamente para a aplicação, muitas vezes de uma maneira que nada tem a ver com o propósito original da passagem. O

que é ainda mais grave, os textos bíblicos são usados de modo mágico, como se fossem amuletos ou talismãs, como se tivessem um poder imanente e intrínseco. A Bíblia é encarada prioritariamente como um livro de promessas, de bênçãos, de fórmulas para

a solução de problemas, e não como a revelação especial na qual Deus mostra como as pessoas devem conhecê-lo, relacionar-se com ele e glorificá-lo.

Uma nova linguagem

Na sua releitura da Bíblia, os neopentecostais por vezes criam uma nova terminologia, muito diferente dos conceitos bíblicos tradicionais. Privilegiam-se expressões como “exigir nossos direitos”, “manifestar a fé”, “declarar a bênção”, todos os quais apontam para uma espiritualidade antropocêntrica, ou seja, voltada para as necessidades, desejos e ambições dos seres humanos, e não para a vontade e a glória de Deus. Alguns dos temas bíblicos mais profundos e solenes redescobertos pelos reformadores do século 16 são quase que inteiramente esquecidos. Não mais se fala em pecado, reconciliação, justificação pela fé, santificação, obediência. O evangelho corre o risco de ficar diluído em uma nova modalidade de auto-ajuda psicológica, deixando de ser “o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê”.

O conceito de fé talvez seja aquele que esteja sofrendo as maiores distorções. No discurso de muitas igrejas do pentecostalismo autônomo, a fé se torna uma espécie de poder ou varinha de condão que as pessoas utilizam para obter as bênçãos que desejam. Deus

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Alderi Souza de Matos é doutor em história da igreja pela Universidade de Boston e historiador oficial da Igreja Presbiteriana do Brasil. É autor de A Caminhada Cristã na História e Os Pioneiros Presbiterianos do Brasil.<[email protected]>

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fica essencialmente passivo até que seja acionado pela fé do indivíduo. É verdade que Jesus usou uma linguagem que aparentemente aponta nessa direção (“tudo é possível ao que crê”, “vai, a tua fé te salvou”). Mas o conceito bíblico de fé é muito mais amplo, a ênfase principal estando voltada para um relacionamento especial entre o crente e Deus. Ter fé significa acima de tudo confiar em Deus, depender dele, buscar a sua presença, aceitar como verdadeiras as declarações da sua Palavra. O objeto maior da fé não são coisas, mas uma pessoa — o Deus trino.

Fundamento questionável

A teologia da prosperidade, que serve de base para boa parte da pregação e das práticas neopentecostais, é uma das mais graves distorções do evangelho já vistas na história cristã. Essa abordagem teve início nos Estados Unidos há várias décadas, sob o nome de “health and wealth gospel”, ou seja, evangelho da saúde e da riqueza. No neopentecostalismo, essa se torna a principal chave hermenêutica das Escrituras. Tudo passa a ser visto dessa perspectiva reducionista acerca do relacionamento entre Deus e os seres humanos. O raciocínio é que Cristo, através da sua obra na cruz, veio trazer solução para todos os tipos de problemas humanos. Na prática, acaba se dando maior prioridade às carências materiais e

O grande problema está nas megaigrejas e seus líderes centralizadores, ávidos de fama, poder e dinheiro. Estes precisam arrepender-se e voltar

às prioridades da mensagem cristã

emocionais, em detrimento das morais e espirituais, muito mais importantes.

Tradicionalmente, as maiores bênçãos que o homem podia receber de Deus incluíam o perdão dos pecados, a reconciliação, a paz interior e, num sentido mais amplo, a salvação. Dentro da nova perspectiva teológica, as coisas mais importantes que Deus tem a oferecer são um bom emprego,

estabilidade financeira, uma vida confortável, felicidade no amor e coisas do gênero. É uma nova versão da tese do sociólogo alemão Max Weber, segundo o qual os calvinistas buscavam no sucesso econômico a evidência da sua eleição. Os problemas da teologia da prosperidade são diversos: (a) falta de suporte bíblico — a Escritura aponta na direção oposta, mostrando a armadilha em que caem os que se preocupam com as riquezas; (b) empobrecimento

da relação com Deus, concebida em termos interesseiros e mercantilistas; (c) incentivo a atitudes de individualismo, egocentrismo e falta de solidariedade; (d) tendência para a alienação quanto aos problemas da sociedade.

Conclusão

O neopentecostalismo representa um grande desafio para as igrejas históricas e mesmo para as pentecostais clássicas. Esse movimento tem encontrado novas formas de atrair as massas que não estão sendo alcançadas pelas igrejas mais antigas. Nem todos os grupos padecem dos males apontados atrás. Muitas igrejas neopentecostais são modestas, evangelizam com autenticidade e não se rendem à tentação dos resultados rápidos, dos projetos megalomaníacos e dos métodos incompatíveis com o evangelho. O grande problema está nas megaigrejas e seus líderes centralizadores, ávidos de fama, poder e dinheiro. Estes precisam arrepender-se e voltar às prioridades da mensagem cristã, buscando em primeiro lugar o reino de Deus e a sua justiça, para que então as demais coisas lhes sejam acrescentadas.

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Entrevista: Raimundo César Barreto Júnior

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Aos 41 anos, o salvadorense Raimundo César Barreto Jr. já conseguiu muita coisa na vida. O pulo inicial

aconteceu quando ele tinha 5 anos e entregou sua vida a Jesus, decisão que ele faz questão de renovar todos os dias. O outro pulo importante foi quando abandonou a universidade e um bom emprego na Petrobrás e se matriculou no Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil, em Recife. Depois de ser ordenado pastor batista, aos 26 anos, Raimundo teve o privilégio de fazer doutorado em ética social no Seminário Teológico de Princeton. Casado, dois filhos, hoje ele é pastor da Igreja Batista Esperança, em Salvador, BA, professor do Seminário Batista de Recife e da Universidade Regional da Bahia, e coordenador-geral do Centro de Ética Social Martin Luther King Jr. do Brasil, em Salvador. Por ser uma das maiores autoridades em Martin Luther King Jr., Ultimato fez com ele a seguinte entrevista, a propósito do 40º aniversário do assassinato do mais notável defensor cristão de mudanças sociais por vias não-violentas dos Estados Unidos, agora em abril.

O sucesso da não-violênciaEspecialista em ética social lembra que Martin Luther King Jr. resistia aos sistemas injustos com o firme compromisso de nunca atingir a dignidade humana do oponente

Ultimato — Quem fez mais pelos direitos civis dos norte-americanos: o presidente Abraham Lincoln ou o pastor batista Luther King?Raimundo César — Não gosto de fazer comparações valorativas entre pessoas que viveram em épocas e mundos diferentes. Estamos diante de dois dos mais importantes líderes que os Estados Unidos já tiveram. E arrisco dizer que eles se complementam. A emancipação proclamada por Lincoln, pondo fim à escravidão, não se materializou totalmente, especialmente no sul do país, até que a luta pelos direitos civis, liderada por Martin Luther King Jr., conseguisse banir a segregação e sua afirmação de “iguais, mas separados”, um terrível regime de apartheid racial, comparável ao que a África do Sul conheceu. Vale salientar, porém, que se trata de dois tipos diferentes de liderança. Lincoln foi um político, um presidente, que teve a coragem de liderar a nação num dos períodos mais críticos de sua história. A liberdade de todos era, a seu ver, um fator sine qua non para o avanço do país. Luther King, apesar de ser um líder de um vasto movimento social que lutava pelos direitos civis dos negros norte-americanos, via a si mesmo

antes de tudo como profeta e pastor. Referia-se a si mesmo como um pastor tentando salvar a alma de sua nação. Recusou ofertas para se candidatar a cargos públicos, preferindo o papel que o marcou na história, o de líder moral, ou, no dizer de alguns, de consciência moral da nação. Cornel West diz que ele foi o maior profeta da história dos Estados Unidos e se tornou uma inspiração para muitos outros líderes na luta contra a injustiça ao redor do mundo.

Ultimato — Os historiadores dizem que o ensaio do americano Henry David Thoreau sobre o dever da desobediência civil, a política pacifi sta do indiano Mahatma Gandhi e a teologia existencialista do alemão Paul Tillich exerceram grande infl uência sobre o jovem Luther King. Como o senhor vê essa tríplice infl uência?Raimundo César — Antes de comentar essa tríplice influência, devo lembrar que a mais marcante influência no pensamento do dr. King foi a tradição profética da igreja negra (Black Church) nos Estados Unidos. Não podemos entender Luther King se perdermos isso de vista. Ele é fruto dessa tradição,

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Embora fosse o líder de um vasto movimento social que lutava pelos direitos civis dos negros norte-americanos, Martin Luther King Jr. via a si mesmo, antes de tudo, como profeta e pastor

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na qual se vê totalmente imerso, como neto, filho e genro de pastores batistas negros. A Black Church é tida como a mais importante instituição dos negros norte-americanos, pois foi a primeira instituição fundada por eles, onde estavam fora dos auspícios e da vigilância dos brancos. Por isso, todas as lutas por direitos civis e sociais, especialmente no sul do país, tiveram a igreja como base. Quando Rosa Parks foi presa, causando comoção à população negra de Montgomery, no Alabama, foi numa igreja que os líderes negros da cidade se reuniram e tomaram a decisão de fazer um boicote ao sistema de transporte público, que durou mais de onze meses. Foi nesse contexto que Luther King foi escolhido como porta-voz do movimento, aos 26 anos, tornando-se, assim, o seu líder até o seu assassinato, treze anos depois. Por outro lado, ele foi um estudioso. Fez doutorado numa excelente universidade, entrando em contato com diversas escolas de pensamento. Uma de suas características era a preocupação de pôr os pensamentos que lhe impactavam em suas leituras em diálogo com sua realidade. A capacidade de traduzir conceitos abstratos numa linguagem compreensível pelas pessoas mais simples lhe possibilitou funcionar como um intelectual orgânico, catalisando em torno do movimento pessoas de todas as classes. O pensamento de Henry David Thoreau foi uma importante influência nesse contexto, pois forneceu a King o conceito de desobediência civil, que ele passou a usar como

estratégia das suas lutas. A idéia de que há um imperativo moral que nos obriga à não-cooperação com o mal foi chave para ele. Todos os passos dados por King na liderança do movimento foram fundamentados numa boa dose de reflexão. Ao liderar, por exemplo, boicotes, ele queria deixar claro que estava usando meios justos para alcançar um fim justo. Influenciado por Thoreau e Tomás de Aquino, ele concluiu que temos o dever moral de obedecer a leis justas, mas quando se trata de uma lei injusta, que viola a dignidade humana, somos chamados a resisti-la. Paul Tillich foi outra influência importante sobre King; afinal, ele escreveu sua tese de doutoramento sobre Tillich. A principal influência talvez tenha vindo de um livro em que Tillich relaciona os conceitos de amor, justiça e poder. Tillich enxergava o amor como fundação do poder, não sua negação. Essa concepção da relação entre amor e poder se tornou essencial no pensamento de King. Além do mais, Tillich afirmava a primazia de Deus sobre todas as outras coisas no universo, o que certamente contribuiu para o conceito de “companhia cósmica” desenvolvido por King, quando afirmava que aquele que luta pela justiça nunca está sozinho, tem companhia cósmica. Ele dizia que o arco do universo é longo, mas se inclina na direção da justiça. Essa primazia do divino contribuiu muito para os momentos mais críticos e desesperadores da caminhada. Gandhi também exerceu forte influência sobre King através de

sua estratégia de resistência não violenta, inspirada no conceito de satyagraha, força da verdade ou força da alma, em diálogo com os ensinamentos de Jesus no Sermão do Monte. Para Gandhi, a força física dos opressores deveria ser enfrentada com a força da verdade daqueles que lutam por justiça. King viu nesse método a aplicação prática da doutrina cristã do amor de uma maneira que ele nunca tinha encontrado em nenhum pensador cristão. Foi nesse contexto que ele afirmou: “Jesus me deu a inspiração e Gandhi me deu o método”. King acreditava que por trás de todas as coisas existe uma força benevolente no universo, um Deus justo e amoroso. Sendo assim, a sua luta deveria se dirigir na direção da realização desse propósito amoroso. As armas de sua luta deveriam ser coerentes com este propósito. O amor se transformava em instrumento de transformação social. A resistência não violenta significava o compromisso de nunca atingir a dignidade humana do oponente, de resistir aos sistemas injustos sem, porém, se permitir descer ao ponto de odiar o próximo, mesmo que ele estivesse do outro lado da luta sendo travada. É interessante como Gandhi, não-cristão, teve uma percepção acurada dos ensinamentos de Jesus. King percebeu isso. Perguntado certa vez sobre qual seria o maior inimigo do cristianismo na Índia, Gandhi teria respondido: os cristãos!

Ultimato — O teólogo inglês John Stott ensina que o verdadeiro líder não é individualista

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King via no racismo, na pobreza e no militarismo três faces de um mesmo mal. Não adiantaria lutar contra o racismo apenas, esquecendo a injustiça social

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e, por isso, inspira as pessoas a seguir sua liderança, pois entende que sua função depende da cooperação de todos (A Bíblia Toda, O Ano Todo, p. 131). Luther King se enquadra nessa perspectiva?Raimundo César — Tive a oportunidade de ouvir pessoalmente alguns líderes que trabalharam junto com King, inclusive Andrew Young, um de seus auxiliares mais próximos. É muito claro que King foi um líder que não apenas trabalhou em equipe, mas inspirou seus liderados. Ele tinha a coragem moral de não se omitir diante do perigo. Um de seus biógrafos conta que numa das marchas eles foram informados que haveria um atentado contra a vida dele. Seus companheiros lhe deram a oportunidade de não prosseguir à frente da marcha, mas ele se recusou, seguindo à frente. Sabendo do risco, um de seus auxiliares convidou todos os pastores negros que participavam da marcha que estavam usando terno na mesma tonalidade do de King para se juntarem a ele, formando uma parede de pessoas, que marchavam ao seu lado, de braços dados, colocando-se também em perigo, a fim de confundir um possível atirador. Esse episódio fala muito sobre o tipo de líder que o dr. King era. Por não fugir dos momentos difíceis, tendo, inclusive, sido preso inúmeras vezes, ele ganhava autoridade moral para liderar o movimento, inspirando seus seguidores. Ele também assumiu posições difíceis, mesmo quando isso significava a perda de apoio e admiração, como foi o caso de seu protesto contra a guerra

no Vietnã. Por achá-la moralmente equivocada e por entender que não podia se calar diante de um mal que tinha ligações com o mal do racismo e da pobreza que combatia em casa, ele abriu a boca denunciando o erro dessa guerra, mesmo contra a vontade de seus companheiros. Eles achavam que perderiam o apoio — conseguido a duras penas — do governo e até mesmo de parte da população ao movimento. Em resposta a eles, King afirmou: “Passei toda a minha vida lutando contra a segregação de espaços públicos; como poderia segregar a minha consciência agora?”

Ultimato — Em Para Onde Vamos Daqui: caos ou comunidade?, seu último livro, Luther King esboçou uma agenda com três objetivos: a queda do racismo, a queda da guerra e a queda da pobreza. A humanidade já alcançou esses alvos?Raimundo César — King via no racismo, na pobreza e no militarismo três faces de um mesmo mal. Não adiantaria lutar contra o racismo apenas, esquecendo o problema da pobreza, da injustiça social. E esses dois problemas também estavam ligados ao problema do militarismo, em que seu país exercia um papel extremamente negativo tanto no Vietnã quanto nas alianças que fazia com as elites latino-americanas. King via tanto a justiça quanto a injustiça como sendo indivisíveis. Isso o levava a associar os problemas domésticos aos internacionais. Costumava dizer que “o mal que afeta a um diretamente

afeta a todos indiretamente”, “a injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça em todos os lugares” e “ou nós aprendemos a viver juntos como irmãos e irmãs, ou pereceremos todos juntos, como tolos”. Claro, esses males continuam existindo. A pobreza extrema ainda é a realidade de grande parte da população mundial. Não por coincidência, em âmbito mundial as populações de pele mais escura estão, em sua maioria, na parte inferior da escala social e econômica, e as de pele mais clara, em regra, no topo dessa escala. Ou seja, a pobreza e o racismo continuam de braços dados. Não basta combatermos a pobreza. Precisamos nos dar conta do elemento racista que ela esconde. E o militarismo continua em voga sob a liderança dos Estados Unidos. King criticava o fato de seu país estar matando os vietnamitas morenos do outro lado do mundo. Hoje podemos dizer o mesmo dos afegãos e iraquianos, atuais vítimas do militarismo norte-americano. A visão ético-teológica de King pode nos ajudar no enfrentamento desses males, que ele chamava de irmãos gêmeos, além de outros que ele não percebeu em sua época, como o sexismo e os problemas ambientais. Todos estão interligados.

Ultimato — O legado de Luther King ainda é relevante, quarenta anos depois de sua morte?Raimundo César — A partir do que acabo de dizer, fica claro que o legado de King continua sendo relevante hoje. Em alguns casos, ele teve uma

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percepção adiante do seu tempo. Para mim, ele teve uma visão tão profunda da inter-relação da vida e da comunhão geográfica que o processo de globalização nos leva a experimentar, que parece que ele estava falando em alguns momentos não para a sua própria geração, mas para a nossa. Mais ainda, ele continua sendo uma grande inspiração para líderes e movimentos em várias partes do mundo, o que mostra a sua atualidade. O historiador afro-americano Vicent Harding, falando dessa significância de King para as lutas atuais, escreveu: “King vive... nós o vimos enfrentando os tanques na praça de Tiananmen, dançando sobre o muro trêmulo em Berlim, cantando em Praga, vivo nos olhos de Nelson Mandela... Ele vive dentro de nós, aqui mesmo... onde quer que suas batalhas não concluídas são retomadas por nossas mãos”. James Cone, outro pensador negro americano, diz que o legado de King, que sempre se identificou com os marginalizados, pertence especialmente ao chamado “terceiro mundo”, ao mundo dos pobres e deserdados. Especialmente para estes, seu legado continua sendo inspirador.

Ultimato — Quarenta anos depois do assassinato de Luther King num hotel em Memphis, no Tennessee, no dia 4 de abril de 1968, os Estados Unidos têm um candidato negro à presidência do país. Trata-se de mais uma dívida da democracia com a pessoa e a obra de Luther King?Raimundo César — Não é a primeira vez que os Estados Unidos têm um

candidato negro à presidência. Há registros de que o próprio King teria sido convidado a concorrer como uma alternativa a Johnson e Nixon, em 1968, mas recusou. Jesse Jackson e Arl Sharpton, ambos ligados ao movimento pelos direitos civis, foram candidatos, mas sem chances reais de ganhar. Barack Obama talvez seja o primeiro candidato negro com chances reais de ganhar uma corrida presidencial nos Estados Unidos. Apesar de ele não ter raízes no movimento liderado por King, como os outros dois, ele resgata muito mais os ideais pelos quais King lutou que qualquer outro líder desde a sua morte. Sua capacidade de energizar o público como um dos melhores oradores na política norte-americana contemporânea, sua origem inter-racial e seu apelo ao resgate do sonho perdido (depois de oito anos de uma presidência que dividiu o país no meio, instaurando o medo como norma e isolando a nação do resto do mundo) o aproximam muito de King. O fato de ter pai africano, de já ter vivido fora dos Estados Unidos, de ter inclinação para mediar e unir, mais do que dividir, também coloca Obama dentro do legado de King, com sua visão de conexão entre os problemas internos e as questões internacionais. Mas ainda resta ver se o país está pronto para eleger um negro com essas características como presidente.

Ultimato — Em outubro de 1962, Luther King, negro e protestante, com 33 anos, e John Kennedy, branco e católico, com 45, se encontraram na Casa Branca para uma

conferência sobre direitos civis. No ano seguinte, Kennedy foi assassinado e, menos de seis anos depois, o mesmo aconteceu com Luther King. O democrata Barack Obama também corre o risco de ser assassinado, como se diz à boca pequena?Raimundo César — Eu gostaria de crer que desde os anos 60 as coisas mudaram e que não haveria espaço para esse tipo de conspiração hoje nos Estados Unidos. No entanto, o fundamentalismo e os extremismos estão mais vivos do que nunca. Normalmente, os loucos e fanáticos produzidos por esses movimentos se sentem ameaçados por líderes mais inovadores, de mentalidade menos beligerante e mais conciliadora, como John Kennedy e Martin Luther King. O próprio Gandhi também foi assassinado assim. Nos anos 60, muitos foram os líderes negros assassinados nos Estados Unidos. Quando Kennedy morreu, King teria dito à sua esposa que sabia que não sairia vivo daquela revolução. Mas nem isso o deteve. Ele trabalhou intensamente por mais seis anos, deixando marcas profundas na vida de sua nação, como o Civil Rights Act, de 1964, lei que garantia o direito de votar dos negros, alcançado graças ao movimento liderado por King. Não dá para dizer o que aconteceria se Obama fosse eleito, mas caso isso ocorra, devemos pedir a Deus que ele possa completar seu mandato e venha a ser um presidente menos arrogante que o atual e mais sensível para com as relações e necessidades da comunidade internacional, especialmente na América Latina.

Apesar de não ter raízes no movimento liderado por King, Barack Obama resgata muito mais os ideais pelos quais King lutou que qualquer outro líder desde a sua morte

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Ultimato — Se estivesse vivo hoje, Luther King se oporia à guerra do Iraque?Raimundo César — Sem dúvida alguma. Além de sua visão não violenta de mundo (King não era doutrinariamente pacifista, mas adotava a não-violência como estilo de vida e estratégia de mudança social), ele jamais aceitaria a falácia da guerra justa vendida pelo governo Bush. Ele se empenharia para mostrar a injustiça desta guerra. Aliás, suas palavras têm constado entre as mais inspiradoras declarações lidas por aqueles que têm se mobilizado contra a guerra. Quando a invasão ao Iraque aconteceu, eu estava nos Estados Unidos e participei de algumas marchas com milhares de pessoas, em Washington, contra a guerra. Muitos dos líderes desse movimento pela paz que conheci, que se tornou o maior movimento desse tipo desde os movimentos contra a guerra no Vietnã, eram pastores, que se colocavam dentro do legado de King. Seus filhos e sua esposa, que já morreu, também participaram de alguns desses protestos, e suas palavras têm permeado o movimento.

Ultimato — Qual é a sua opinião sobre as acusações de que Luther King teria tido casos extraconjugais?Raimundo César — Eu não posso dizer com convicção que estas acusações

sejam verdadeiras, pois as fontes não são isentas. Tais informações vêm, na sua maior parte, de tapes postos pelo FBI nos quartos de hotel onde King se hospedava, nos últimos anos de sua vida. Nesse período, especialmente por causa de sua posição contra a guerra no Vietnã, o governo norte-americano se mostrava profundamente incomodado com suas críticas. Por isso o FBI passou a persegui-lo, tentando encontrar evidências que o desmoralizassem ou inibissem a sua liderança. Independentemente disso, é possível que casos extraconjugais tenham acontecido, sim. Se de fato aconteceram, isso evidenciaria, talvez, uma fraqueza moral em King. No entanto, isso jamais deve ser usado como justificativa para que olvidemos as importantes contribuições que ele nos deixou através de sua vida e de seu compromisso com o evangelho e com a transformação da sociedade. Devemos lembrar que a própria Bíblia não esconde as fraquezas morais de grandes líderes como Abraão e Davi, e nem por isso eles perdem o valor como personagens cujas vidas e palavras nos inspiram a caminhada. Para concluir, uma pergunta que sempre me faço quando penso nesse tema é a seguinte: se o serviço de inteligência mais poderoso do mundo estivesse na nossa cola dia e noite,

por vários anos, o que encontraria na nossa intimidade?

Ultimato — Qual é o propósito do Centro de Ética Social Martin Luther King Jr. do Brasil, com sede em Salvador?Raimundo César — O Martin Luther King Jr. do Brasil é uma organização sem fins lucrativos inspirada no legado de King, que se propõe a acompanhar de forma solidária e profética o povo brasileiro, suas igrejas e organizações populares no desenvolvimento de uma participação social consciente, organizada e crítica que vise construir uma sociedade mais justa e igualitária. A organização realiza e propicia processos educativos de ação-reflexão e de comunicação, bem como de acompanhamento e articulação de atores sociais e de solidariedade em âmbito local, nacional e internacional. Pretende capacitar pessoas, igrejas e outras organizações populares para que possam responder eticamente aos desafios cruciais da realidade contemporânea. Entre as atividades em que o Martin Luther King Jr. do Brasil atua ou apóia estão a pesquisa, a reflexão, o treinamento, a comunicação e a práxis em áreas relacionadas à justiça social, pobreza, racismo, sexismo, meio ambiente, violência urbana, saúde, educação e direitos civis e humanos em geral.

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Ricardo Barbosa de Sousa

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Tudo em comum

No livro dos Atos dos apóstolos há um pequeno trecho que descreve de forma magnífica

a natureza e qualidade de vida da primeira comunidade cristã em Jerusalém (At 2.41-47). A descrição é fascinante, impressiona qualquer um que a lê, até mesmo os mais céticos e descrentes. O que vemos ali é o reino de Deus em ação, a concretização da oração que Cristo ensinou: “Venha o teu reino; faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu...”.

Este relato contrasta com a história de uma outra comunidade (Gn 11.4), que decidiu construir uma torre que alcançasse os céus e fizesse seus nomes célebres e famosos. Falavam a mesma língua e tinham um projeto em comum, mas, em vez de criarem uma comunidade, criaram um altar para sua auto-exaltação. Este

relato da Torre de Babel está presente na vida de todos nós. Na educação, política, trabalho e nos púlpitos de nossas igrejas, todos nós estamos construindo nossas torres, empenhados em tornar nossos nomes célebres. Queremos construir nosso próprio reino.

O Pentecostes tornou possível o reino de Deus entre nós. O povo de Atos 2 começa a viver o seu êxodo, dá os primeiros passos rompendo com o jeito que se vivia no “Egito” para viver o novo jeito ensinado por Cristo, e faz isto de forma natural e sincera, impulsionado pelo chamado de Cristo e pelo poder do Espírito Santo. A promessa do Espírito não foi para que os primeiros cristãos tivessem poder para se autopromoverem, mas para reafirmarem os feitos e o caráter de Cristo. Era um novo tipo de comunidade que nascia de um novo

tipo de pessoa. Muitas vezes queremos uma igreja diferente que nos faça diferentes, mas não

queremos ser pessoas diferentes que constroem uma comunidade diferente.

O relato de Atos nos diz que eles “perseveravam na doutrina dos apóstolos...”, que “diariamente perseveravam unânimes no templo”. Alguns tinham largado tudo e dedicado dois anos e meio de suas vidas para seguirem a Cristo. Eles permaneceram em Jerusalém da ascenção até o Pentecostes aguardando a promessa do Espírito. Era uma comunidade de cristãos disciplinados. A graça não se opõe à disciplina; pelo contrário, é a disciplina espiritual que sinaliza nosso desejo espiritual. A igreja sofre quando tentamos viver sob a direção do Espírito Santo, mas sem disciplina, como também sofre quando tentamos viver com disciplina, mas sem o Espírito Santo.

Era uma comunidade totalmente comprometida em tornar Jesus Cristo conhecido. Tudo nela apontava para Cristo. Suas orações, o partir do pão, o cuidado que tinham para com os outros, sua pregação e seu testemunho, a alegria da comunhão, a renúncia dos bens, enfim, tudo em suas vidas e ações apontava para Cristo.

O Êxodo continua. Estamos a caminho do céu. O testemunho dos dois varões vestidos de branco foi: “Esse Jesus que dentre vós foi assunto ao céu virá do modo como o vistes

Soph

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Ricardo Barbosa de Sousa é pastor da Igreja Presbiteriana

do Planalto e coordenador do Centro Cristão de Estudos,

em Brasília. É autor de Janelas para a Vida e O Caminho do Coração.

Por Carlinhos [email protected]

N o v o s A c o r d e s

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Expresso luz ao vivo – 20 anos (DVD)O Expresso Luz acaba de lançar seu primeiro DVD. É um presente ao público fi el que acompanha sua trajetória nesses 20 anos de estrada. Produzido no Acampamento Boa Esperança, em Goiânia, palco de várias experiências marcantes do grupo, o show gravado ao vivo relembra as canções que marcaram as distintas fases: vai de “Sinta o amor” e “Seara”, registradas em seu primeiro trabalho (1986), às recentes “Cheia de graça” e “Água”. O DVD teve uma produção simples, mas primorosa, sob a direção de imagem de João Inácio e direção de áudio de Olemir Cândido. No menu, traz o making of das gravações e um “bate papo” com integrantes e ex-integrantes do grupo, narrando a história desde a sua fundação. Distribuído por Vencedores Por Cristo: www.vpc.com.br

Vocale, VocaleVocale é um quarteto capixaba formado por Naara Knupp, Hellem Pimentel, Fabrícia Erler e Karol Stahr. É o primeiro CD desse grupo que tem potencial para ser uma das boas revelações do momento. Com vocal apurado e musicalidade harmoniosa, apresenta um estilo eclético com marcas predominantes da cultura musical pop gospel. Destaque para as canções “Razão do meu viver”, “Derrama sobre nós” e a tradicional “Em fervente oração”, numa versão jazzística. A produção

executiva e os arranjos vocais são de Karine Lessa, que compôs sete das dez canções do CD. Os arranjos de muito bom gosto são de Fabiano Araújo. Contatos pelo e-mail <[email protected]> ou pelo tel. 27 3349-9837.

Exodos, ExodosNos anos 70 uma banda cristã provocou muita polêmica no Brasil com seus ritmos barulhentos, roupas extravagantes e cabelos compridos. Chegou a ser citada pela revista Veja no ano de 1976. Era a banda Exodos, formada por três adolescentes batistas. Considerada por pesquisadores como “a primeira banda brasileira de rock evangélico”, atraiu muitos jovens com suas canções que anunciavam uma nova vida em Jesus, numa época em que vigorava a repressão e a censura. Trinta anos depois é lançado um CD com treze músicas compostas entre os anos de 1970 e 1977 e regravadas com instrumentos e equipamentos da época. Entre elas a conhecida “Galhos secos”. Para saber mais sobre o grupo, acesse <http://paginas.terra.com.br/religiao/bandaexodos>. Para adquirir esse CD histórico, ligue para 11 9962-9571.

subir” (At 1.11). O mesmo Jesus que viveu entre nós, morreu pelos nossos pecados e ressuscitou para nossa esperança vai voltar e estabelecer definitivamente seu reino entre nós. Enquanto isto, somos chamados para ser sal da terra, luz do mundo e ovelhas no meio de lobos. Olhamos para o mundo, cultura, família, juventude, infância, guerra, drogas, prostituição, violência, desesperança, solidão, desespero, e percebemos que a humanidade precisa urgentemente de uma nova esperança.

O problema é que, quando olhamos para a comunidade de Jerusalém, reconhecemos, lá no fundo, um sentimento ambíguo. É um modelo de comunidade que admiramos, mas não queremos. Admiramos o amor sacrifical deles, mas não é este o tipo de amor que buscamos. Admiramos sua vida abnegada, mas não estamos dispostos a abrir mão do que temos por amor ao próximo. Achamos extraordinário o fato de que tinham tudo em comum, mas não abrimos mão de nosso individualismo. Confessamos a doutrina dos apóstolos, mas a negamos na prática. No fundo, não queremos uma comunidade assim. Mas ela é possível e o mundo anseia por ela.

A igreja sofre quando tentamos viver sob a

direção do Espírito Santo, mas sem disciplina, como

também sofre quando tentamos viver com

disciplina, mas sem o Espírito Santo

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Bráulia Ribeiro

da linha de frente

Bráulia Ribeiro, missionária em Porto Velho, RO, é autora de Chamado Radical (Ed. Ultimato). <[email protected]>

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Um dos prazeres de pais cristãos é ensinar seus filhos pequenos a cantar musicas cujas mensagens imprimam

em suas mentes conceitos que mais tarde serão necessários em suas vidas. Eu gostava de esgoelar com os meus: “Meu coração era sujo”, “O sabão lava meu rostinho”, e, claro, não podia faltar, “Cuidado, olhinho, o que vê/ o Salvador do céu está olhando pra você...”

Recentemente comecei a me deixar assustar por fantasmas, não sei se fruto dos anos ou das circunstâncias. Na jornada da vida, as críticas, as altas expectativas e os baixos níveis de compromisso me deixaram atada a amarguras, feridas e lepras. Os fantasmas dos irmãos que não perdoei me atormentam, cutucam, me visitam nas noites insones, me tiram a paz e me azedam o suco gástrico, causando dor física. Até agora nunca tinha me prendido a nada assim. Caminhei até aqui numa jornada de perdão constante, quase alienado, que se re-expunha, se re-feria inúmeras vezes, mas continuava presente. Devo dizer que esta vida “delirante” do perdão é mais feliz do que a vida “racional” da amargura.

Como diz Derrida, o perdão que exige troca social (o outro se arrepende, portanto eu posso perdoá-lo) não pode ser chamado de perdão. O perdão de pés no chão, que se precavê, que reforça defesas, que cobra arrependimentos, é um mecanismo social humano, nada mais. O perdão divino e verdadeiro, o único que merece esse título é aquele incondicional, excepcional e extravagante. Perdôo porque sim. Perdôo total e completamente, sem cobranças e sem resquícios. Perdôo

porque as pessoas não mudaram e não merecem ser perdoadas. Aliás, o perdão não tem objeto, basta-se a si mesmo. Enquanto eu não entendi isso, sofri interiormente por alguns meses na mansão assombrada da família Adams.

Dias atrás minha colega Carol veio me visitar. Amiga de muitos anos, risada alta, Carol chegou sem sorrir, fixou em mim seus olhos azuis e disse, tirando da testa a mecha grisalha para que eu visse, sem duvidar, a centelha que eles queriam me passar: “Bráulia, estava orando por você e Deus me disse que ele está te vendo.” Conversamos um pouco mais e ela se foi.

Deus me vê! Saí da sala me sentindo a heroína do romance de Jane Austen, observada à distância por Mr. Darcy, sabendo reconhecida por ele a beleza, adivinhadas as curvas nas muitas pregas do vestido, os lindos seios num decote que revela o colo e nada mais. Ainda consigo seduzi-lo. Sou a noiva, a esperada. Julgava-me a preterida, a escrava; no entanto o Rei me vê como imaculada, a noiva desejável. Ele me vê.

Aquela noiva da “Valsinha”,1 sobre quem um dia escrevi com esperança, fez sentido outra vez. A igreja soterrada de paradoxos sociais, enredada em seus orgulhos e preconceitos, apagada na burca de sua ignorância, se ergue novamente, remexe no armário e reencontra suas vestes de festa.

Os olhos dele não me vigiam para me acusar, me perscrutar ou me envergonhar. Eles não me desnudam impudicos como os olhos dos homens

sentados em um bar fazem com as distraídas que passam. Eles não me consomem em demanda egoísta de prazer pessoal, se é que a metáfora ainda cabe. Eles me vêem inteira, com bondade e respeito, me vêem como o cavalheiro inglês, antevendo-me a minha beleza sublime, para mostrar-se forte.

Mesmo me achando questionadora, comprei, sem perceber, a coerção moral infantil através do conceito do Deus amedrontador. Comprei para mim e vendi a meus filhos a idéia de olhos que vigiam, cobram e julgam. Mas a imagem principal de nosso noivo não é esta. São seus olhos que embelezam a noiva com seu perdão excepcional, esquizofrênico e divino. É ele que a embeleza, não ela a si. A idéia prevalecente na Palavra sobre ele é de embevecimento, carinho, auto-sacrifício, misericórdia e benignidade. A religião o transforma em juiz. Sentir seus olhos sobre mim (Sl 33.18; 34.15; 2Cr 16.9) me revelou novamente seu amor. E à luz deste amor caminho devagar para fora da mansão das sombras das amarguras e desesperanças.

Nota1. Ultimato n° 281, março-abril 2003.

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Orgulho e preconceito

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Gabriele Greggersen

deixem que elas mesmas falem

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Gabriele Greggersen é autora de A Antropologia Filosófica de C. S. Lewis (Editora Mackenzie) e O Senhor dos Anéis: da Fantasia à Ética (Editora Ultimato).

Em março comemoramos o Dia Internacional da Mulher. Mas quais são as vantagens

efetivamente conquistadas? Em A Missão da Mulher, Paul Tournier diz que a presença feminina em vários setores representa a sua humanização. Enquanto os homens tendem ao racionalismo e materialismo, as mulheres são mais intuitivas e sensíveis. Muitos empregadores dão preferência a elas devido a seu comprometimento com o trabalho.

O jornalista britânico G. K. Chesterton já antevia que, em vez de trazer benefícios, a “independência feminina” só acrescentava cargas à mulher, sem amenizar as já tradicionais. As mulheres têm turnos dobrados ou triplicados, ainda mais quando são “chefes” do lar. O vislumbre do ônus faz algumas abdicarem da profissão para cuidar dos filhos.

O que deve fazer a mulher que não pode deixar de trabalhar por motivos financeiros e tem filhos pequenos para cuidar? E as que se realizam na profissão? Abrir mão da maternidade? O controle de natalidade tem sido uma imposição de governos totalitários, como o chinês. Chesterton denunciava o predomínio do interesse econômico sobre o humano e a intervenção do governo nesses temas.

Alguns governos europeus incentivam a permanência da mãe no lar através de programas de apoio financeiro. Preocupam-se

com a diminuição da população nativa e o aumento do contingente de estrangeiros em seus países. Já no Brasil, as iniciativas de auxílio à família (salário-educação, bolsa-scola) costumam ser antros de corrupção.

Na Primeira Carta de Pedro (3.7), o apóstolo ordena que a mulher seja tratada com dignidade, já que homens e mulheres são “herdeiros da mesma graça de vida”. Trata-se do valor atribuído à pessoa humana, como forma de reconhecimento no sentido humano e material. Sem falar no desnível salarial entre homens e mulheres exercendo a mesma função.

Tanto C.S. Lewis quanto Chesterton falam em ortodoxia no sentido da glória advinda do andar no caminho reto, que não pertence nem ao homem, nem à mulher, mas a Cristo (cf. Hb 2.9). Nos tempos bíblicos essa glória era simbolizada pelo uso do véu pelas mulheres, o que nunca significou inferioridade, mas algo que deve ser protegido e preservado como um tesouro. A figura da mulher é usada como metáfora da igreja, a Noiva de Cristo. Ela deve ser amada como Cristo amou a igreja (Ef 5.25, cf. Ef 5.28).

Embora a palavra submissão (1Tm 2.11), que se aplica também aos homens (cf. 2Co 10.6; Hb 12.9), significasse obediência e serviço, ela não deixa de ser uma missão. Em vez de subalternidade, deve-se entendê-la como equivalência. A hierarquia

observável na natureza reflete-se na humanidade, mas ela não altera a igualdade de todos diante de Deus.

Porém, muitas mulheres rejeitam tais cuidados no intuito de “provar” a sua independência. No outro extremo, há aquelas que se submetem ao estereótipo do objeto sexual. Assim, confunde-se a independência feminina — que não significa imitar os homens em tudo — com a conivência com uma sociedade que não respeita a mulher. Cada campo conquistado por elas tem um preço a ser pago. Uma juíza de futebol ou uma policial não tem que pôr em risco suas qualidades femininas. Mesmo em ambientes dominados por homens, a mulher merece ser reconhecida (e não descriminada), antes de tudo, por ser mulher.

O que dizer das missionárias e pastoras que sacrificam as suas vidas pelo reino, muitas vezes abrindo mão de constituir família? Em geral elas recebem menos que os missionários, casados ou não, e são esquecidas pela história. Respondamos à altura de homens e mulheres diante de Deus.

Respondendo à altura

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Marina Silva e Jane Vilas Bôas

Marina Silva é professora de história e senadora eleita

pelo Estado do Acre. Atualmente serve ao país como

ministra de Estado de Meio Ambiente. É membro da Igreja

Assembléia de Deus.

Jane Vilas Bôas é antropóloga e assessora da ministra do

Meio Ambiente. É membro da Igreja Batista Central de

Brasília.

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meio ambiente e fé cristã

“Também a terra não se venderá em perpetuidade, porque a terra é minha.” Lv 25.23

“Minhas são todas as feras do campo. Se tivesse fome não to diria, pois meu é o mundo e a sua plenitude.” Sl 50.11-12

“Não destruirás o seu arvoredo (...); porque dele comerás, pelo que não cortarás para que sirva de tranqueira para si.” Dt 20.19

“No Éden nascia um rio que irrigava o jardim, e depois se divida em quatro.” Gn 1.10

“Então o Senhor Deus formou o homem do pó da terra e soprou em suas narinas o fôlego da vida, e o homem se tornou um ser vivente.” Gn 2.7

Nos versículos acima temos terra, água, ar, plantas, animais e o ser humano. Todos

componentes da criação, cujo domínio Deus entregou ao último. Deus regula o uso desses bens, deixa claro que os atos de criação resultam em coisas que pertencem a ele mesmo. Fomos criados e responsabilizados por lavrar e cuidar do jardim (Gn 2.15). Temos o direito de satisfazer as nossas necessidades e devemos fazê-lo respeitando as necessidades das próximas gerações. Não podemos usar os recursos naturais até o esgotamento, pois não só o mundo, mas também a sua plenitude são propriedades do Criador.

No Brasil, a esperança do Criador em nós se manifesta na forma de muitas riquezas. Somos detentores de cerca de 11% da água doce disponível no mundo e 22% das espécies vivas da terra. Somos ricos também em diversidade social. Temos povos indígenas que falam mais de 220 línguas e comunidades tradicionais como seringueiros, faxinalenses, pescadores, caiçaras, pantaneiros, etc.

Temos ainda o Cerrado, abrigo de 5% da biodiversidade da terra e uma das maiores áreas de captação de água para a América do Sul: abastece as bacias dos rios Amazonas, Tocantins, Paranaíba, São Francisco, Paraná e Paraguai, além do Aqüífero Guarani, maior manancial subterrâneo de água doce transfronteiriço do mundo.

O Pantanal, declarado patrimônio da humanidade pela UNESCO, é a maior área úmida continental do globo. Podemos citar também a mata Atlântica. Sua riqueza biológica a faz destaque mundial e, pela nossa Constituição, é patrimônio nacional.

Para encerrar esta pequena lista, citamos a Amazônia, importante para o equilíbrio do planeta. Ali estão fixadas

mais de uma centena de trilhões de toneladas de carbono. Sua vegetação libera sete trilhões de toneladas de água para a atmosfera a cada ano, responsáveis inclusive pelas chuvas no Sudeste. O bioma abriga um terço da biodiversidade global e 30% das florestas tropicais ainda existentes no mundo.

Diante dessas magnitudes, o que podem fazer os cristãos individualmente ou em suas igrejas?

Primeiramente, reconhecer o mandato cultural do Senhor para cuidarmos da criação. Somos mordomos. Fomos parceiros de Deus, pois Adão foi chamado para nomear todas as coisas criadas (Gn 2.19).

Para bem exercer a mordomia é preciso conhecer o ambiente em que vivemos e desenvolver atitudes que evitem o desperdício ou a saturação por resíduos de nosso consumo.

Essas atitudes podem ser postas em prática com o cuidado de não desperdiçar água e energia elétrica, a escolha de produtos industriais que não poluam as águas, o solo ou o ar nem tenham sido produzidos por trabalho escravo ou em condições indignas ou ilegais.

Além das atitudes no plano pessoal, há também o plano coletivo e a dinâmica das instituições que tratam do tema meio ambiente, que também devem ser objeto de preocupação e atuação de todos como cidadãos.

Enfim, há dezenas de formas de expressar amor ao Senhor e gratidão pela criação. Tudo é uma questão de consciência da mordomia.

Rodo

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Mordomia ambiental

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Mark Carpenter

Mark Carpenter é diretor-presidente da Editora Mundo

Cristão e mestre em letras modernas pela USP.

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Quem pensa que sabe como são os africanos nunca imaginaria que

Mia Couto fosse natural do continente negro. O romancista mais celebrado de Moçambique é branco, enche seus livros do realismo mágico da tradição latino-americana e tem um estilo que lembra Guimarães Rosa. Foi contado entre os melhores escritores africanos do século 20.

Em entrevista recente ao Estadão, perguntaram-lhe se há influência brasileira em sua literatura. Respondeu: “Sim. Ela veio justamente da música de Chico, de Caetano. Muitos músicos moçambicanos tinham tentado cantar em português, mas o português duro, rápido, de Portugal, não tinha musicalidade. Aí ouvimos Chico, Caetano, Gil e descobrimos que o português poderia ser outra coisa. Foi uma descoberta.”

Talvez tenha sido crítico demais ao português dos fadistas e trovadores, mas a descoberta de que a língua da mera comunicação corriqueira poderia ser também a língua da poesia e dos sonhos abriu-lhe um novo mundo. Muitos anos mais tarde, o comitê Nobel também reconheceu que a língua portuguesa possui a

maleabilidade necessária para ser talhada por alguém com o talento de José Saramago. Aqueles que se importam com os idiomas enxergam na nossa gramática, nos nossos vocábulos e na nossa sintaxe as ferramentas para criar e perpetuar aquilo que só existe na língua. O português pode ser usado para emocionar, agregar e inspirar.

Como cristãos, temos o privilégio de servir e adorar a um Deus literário. A linguagem da Bíblia evidencia sua preocupação com a arte de expressar-se. Há nela não apenas a Verdade Revelada, mas as múltiplas verdades reveladas por meio de uma riqueza estonteante de poemas, acrósticos, canções, parábolas, paralelismos, hipérboles, metáforas, figuras de linguagem e artifícios da retórica. Não resta a menor dúvida de que Deus — o Verbo — se relaciona conosco através da Palavra, e que esta palavra tem forma intencional, bela e artística. Leland Ryken afirma que “os escritores da Bíblia e o próprio Jesus Cristo perceberam que é impossível comunicar a verdade de Deus sem usar os recursos da imaginação. A Bíblia faz muito mais que apenas sancionar o uso da arte. Ela demonstra que a arte

é indispensável (“The Imagination as a Means of Grace”, Communiqué, 2003).

Penso, às vezes, que a linguagem usada em muitas igrejas é como o português “duro e rápido” que Mia Couto ouvia quando criança. É utilitária, descritiva e funcional, mas carece do tipo de imagística e musicalidade que despertam a alma. Como pastores e líderes, concentramo-nos no conteúdo de nossas doutrinas em detrimento de sua forma. Esquecemos que a Bíblia não divide a arte em sacra e secular. Nela, a arte possui valor igual tanto em ambientes de louvor quanto do cotidiano (Nm 21.16-18; Is 16.10; 52.8-9).

Como seria se nossos pastores se importassem tanto com a linguagem quanto se importam Chico, Caetano e Gil, assim também como Davi, Salomão e Jesus? Tenho a impressão que, se a poesia de nossas teologias saturasse as nossas palavras, os muitos Mias Coutos das nossas congregações de repente ouviriam algo diferente, algo novo, capaz de agarrar suas imaginações, inspirar-lhes e enviar-lhes correndo de volta à Palavra, fonte de nossa inspiração.

Caetano e Cristo

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Klênia Fassoni

Há pouco mais de um ano o pastor Ronaldo Lidório, em visita à Editora Ultimato, compartilhou com a nossa equipe que ele recebia dezenas de e-mails por mês de jovens interessados em fazer missões, o que o angustiava, pois para ele “a igreja tem sido lenta” na integração dessa poderosa força em sua prática cotidiana e missionária. Recentes pesquisas (Polis, IBASE, UNESCO) fazem eco à constatação deste missionário que já não é tão jovem (41 anos), mas que inciou sua vida missionária aos 26. Elas mostram que é nas organizações religiosas onde acontece de forma mais intensa a participação de jovens.

Sangue novo, novos espaços ocupados

Este sangue novo é fonte de ousadia, de criatividade, de visão e alcance na prática da missão. Alexandre Brasil, até maio de 2008 membro do CONJUVE — Conselho Nacional de Juventude, declara: “Se muitas vezes afirmou-se que os evangélicos chegaram atrasados em relação à participação em questões mais amplas

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da sociedade, no que se refere à participação da juventude nas políticas públicas temos um quadro mais animador”.

Em abril de 2008, mais de 2 mil jovens estiveram reunidos na 1ª Conferência Nacional de Políticas Públicas de Juventude para discutir estratégias e ênfases relacionadas às políticas públicas de juventude, em encontro liderado pelo CONJUVE, que tem representantes de três organizações que atuam com jovens evangélicos: ABUB — Aliança Bíblica Universitária do Brasil; JOCUM — Jovens com Uma Missão e Rede FALE. A abeuense Sarah Nigri comenta sua experiência: “Tenho aprendido a reclamar menos e a pensar mais em soluções para os problemas que enfrentamos, e a enxergar, mesmo naqueles que não são cristãos, o reflexo da imagem do nosso Deus!”

Missão de Base

Eles têm entre 24 e 31 anos. São sete casais comprometidos com o evangelho do reino, congregando em diferentes igrejas locais.

Vamos abrir espaços à igreja jovem

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Leia em www.ultimato.com.br• Relato das conferências de juventude, por Sarah Nigri• Entrando no céu com Watoto, por Jônatas Almeida

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Equipe da Missão Base

Estranhavam que a maior parte dos “chamados” fosse das áreas de saúde, educação ou teologia. Eles são de áreas distintas:

direito, publicidade, jornalismo, design gráfico, tecnologia da informação. Um deles tem formação em serviço social.

Há dois anos organizaram a Missão Base (www.base.org.br), que tem o objetivo de servir às agências missionárias nas áreas de banco de dados, divulgação, identificação e suporte a voluntários, divulgação de oportunidades de envolvimento com missões nas igrejas. Já prestaram serviços para Missão Evangélica aos Pescadores (MEAP), MEVA, Pioneiros e Refúgio. Todo o

trabalho feito para as missões é gratuito!Eles acreditam que estão fazendo

missões. E estão certos! Além do importante serviço que prestam em áreas freqüentemente negligenciadas por agências missionárias, eles são exemplo de resgate das profissões e vocações a serviço do reino.

Entrando no céu com Watoto

Jônatas Almeida, formando em administração/comércio exterior pelo Instituto Mackenzie, está fazendo sua monografia na área de fair trade (comércio justo). Seu desejo é preparar-se para servir a Deus em algum país africano. No final de março ele se emocionou com a apresentação do Coral Watoto, na Igreja Evangélica de Vila Yara. “Watoto” em português significa “crianças”. Além do coral, formado por crianças órfãs (principalmente por causa da aids), o grupo mantém um projeto que ampara crianças em Uganda.

Jônatas declara: “Meus olhos se encheram de lágrimas pela alegria com que cantaram sobre Deus. Até me imaginei entrando no céu, cantando com eles...”. Desde o terceiro ano da faculdade ele tem dedicado quase todas as suas noites de sexta-feira a se aproximar, conversar e ajudar moradores de rua na cidade de São Paulo.

Vamos abrir cada vez mais as portas a este sangue novo!

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Ricardo Quadros Gouvêa é ministro presbiteriano e professor de teologia e de fi losofi a.

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vamos ler!

Ricardo Quadros Gouvêa

Poucos no Brasil conhecem Gilbert Keith Chesterton (1874-1936), escritor cristão inglês. Celebremos, portanto, a publicação em português de sua obra-prima Ortodoxia (Orthodoxy: The Romance

of Faith), de 1908. Um século de atraso não é demais para os padrões brasileiros. Ainda que tardio, o lançamento é oportuno, quando, por um lado, tantos tratados ateus estão chegando às livrarias e, por outro, o fundamentalismo religioso nos enche de horror.

Chesterton caminhou do racionalismo (origem tanto do liberalismo quanto do fundamentalismo teológicos) à compreensão da “ortodoxia”, fazendo o caminho inverso de tantos, da fé em Cristo para a fé na ciência e na razão. Ele não é um irracionalista pleno de misticismo barato. Usa a inteligência, mas seu pensamento é propositadamente assistemático. Seus livros de apologética cristã são todos provocadores e surpreendentes. Ele defende a fé de forma inovadora, empolgante, sem ser maçante, como é comum em apologética. Chesterton não é repetitivo nem professoral. Com ele enxergamos novas formas de apreciar o cristianismo e de entender seu valor singular.

Conhecido entre os amigos como “G.K.”, era uma figura peculiar. Chamado de “o príncipe do paradoxo”, era afável, bem humorado e distraído. Era alto e gordo como poucas vezes se vê. Opunha-se às políticas imperialistas britânicas (The Napoleon of Notting Hill). Escreveu sobre Robert Browning e Charles Dickens, e se tornou famoso como crítico literário. Foi brilhante ao discorrer sobre Tomás de Aquino (Saint Thomas Aquinas: The Dumb Ox) e Francisco de Assis. Escreveu peças de teatro, poemas e os romances de ficção policial que o deixaram famoso (bem como seu detetive-teólogo, o padre Brown). É preciso citar o enigmático suspense O Homem que Foi Quinta-Feira.

Ateu aos 12 anos e agnóstico aos 16, retornou para a Igreja Anglicana após o feliz casamento com Frances

Blogg, em 1901. Após esta sua primeira conversão, o escritor e jornalista Robert Blatchford publicou uma série de textos condenando o cristianismo e o teísmo em geral. Chesterton respondeu com seu primeiro livro de sucesso, Heréticos (Heretics, 1903) que traz a primeira apresentação de sua compreensão peculiar da fé cristã, que seria expressa mais explícita e completamente cinco anos depois no livro Ortodoxia, na verdade, uma coletânea de ensaios

mais ou menos independentes uns dos outros, no estilo fascinante deste literato que, na época da publicação, tinha apenas 34 anos de idade. Aos 48 anos, Chesterton converteu-se ao catolicismo romano (1922). Muitos autores anglicanos influentes, como John Henry Newman e Thomas Howard, fizeram o mesmo. Foi então que escreveu sua obra apologética mais madura, The Everlasting Man (1925), na qual também explica suas razões.

No capítulo “O Maníaco”, Chesterton rejeita o predestinacionismo como uma forma de religiosidade doentia. O que “o príncipe do paradoxo” entende por uma “perigosa ortodoxia” e pela “emocionante aventura da ortodoxia” é algo bem diferente do neognosticismo e neofarisaísmo que encontramos hoje no mundo evangélico brasileiro e norte-americano. A “ortodoxia” de Chesterton é anti-sectária, de

tendências irênicas. Ele é anti-racionalista e, portanto, avesso às teologias sistemáticas fundadas na inferência dedutiva. É humanista em seu combate ao tecnicismo e a todas as formas de desumanização promovidas pelo avanço da civilização tecnológica. A Ortodoxia de Chesterton é, segundo ele mesmo afirma, “uma emocionante aventura” que inclui a adoção da “ética dos elfos” e a militância na “revolução eterna”. A esta altura já deve ter ficado claro para o leitor que ela não vai agradar os guardiões da sã doutrina.

OrtodoxiaG. K. ChestertonMundo Cristão, 2008

Ortodoxo, sem perder a ternura

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Marcos [email protected]

prateleira

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Para ler mais textos da “Prateleira”, acesse www.ultimato.com.br/blog

Sexo, drogas e rock ‘n’ roll — histórias

de um filho pródigo

OS FILHOS pródigos são muitos. Davi, por exemplo, poderia ilustrar o título dessa prateleira. Não sabemos por quanto tempo ele calou os seus dramas, antes de voltar. No entanto, sabemos de cor algumas de suas letras. Mas tenho em mente um outro músico.

A história original, contada por Jesus (Lc 15.11-32), precisa tornar mais agradecidos e generosos aqueles que nunca saíram de casa. Não nos cabe separar o trigo. E, quem sabe, precisamos também aprender a aproveitar a vida, fazer festa. Aliás, comer, beber e alegrar-se deveria ser proibido para os pagãos, porque separado de Deus ninguém pode comer, beber ou alegrar-se (Ec 2.25).

O outro músico do primeiro parágrafo tem uma história não muito diferente da história do filho pródigo e é invariavelmente ligado ao título da prateleira (a não ser, talvez, pelo terceiro substantivo). E, assim como o filho da parábola, ele também “caiu em si”: “Naquele momento, quase que por si mesmas, minhas pernas cederam, e caí de joelhos. Na privacidade do meu quarto, implorei por socorro. Eu não atinava com quem estava falando, sabia apenas que havia chegado ao meu limite, não me restava

mais nada para lutar. [...] Em poucos dias percebi que havia acontecido alguma coisa comigo. [...] Encontrei um lugar a que recorrer, um lugar que sempre soube que estava ali, mas em que nunca realmente quis ou precisei acreditar. Daquele dia até hoje, jamais deixei de orar de manhã, de joelhos, pedindo ajuda, e à noite para expressar gratidão por minha vida e, acima de tudo, por minha sobriedade. Prefiro me ajoelhar porque sinto que preciso ser humilde quando oro e, com meu ego, isso é o máximo que posso fazer”.

Faz exatos 20 anos que Eric Clapton, uma lenda viva da música, fez essa oração — talvez, sua performance mais escondida e mais barulhenta. Não desisto de acreditar que os filhos pródigos estão voltando. E, aí sim, vamos dizer juntos “vai rolar a festa”.

A inveja entre crentes e o sublime entre pagãos

DEUS AMA imparcialmente. Para quem se lembra do dilema descrito no Salmo 73 — a vida nababesca dos maus e o constrangimento dos que se mantêm puros — essa afirmação é, no mínimo, desconfortável. Nas palavras de Paul Stevens, em A Espiritualidade na Prática, “o amor de Deus é sem causa ou previsibilidade humana”.

É verdade também que o sol brilha sobre mocinhos e bandidos e a chuva cai sobre honestos e corruptos

(Mt 5.45). No entanto, não raro ficamos embaraçados com o sucesso dos maus. Temos um desejo quase incontrolável de manipular a graça de Deus e nos irritamos quando uns e outros são alcançados por ela e, sem perceber, nos perguntamos: “Por que não fui eu?”

Outro dia encontrei Deus em um lugar inusitado. Fui ver o guitarrista americano Stanley Jordan e fui surpreendido pela graça. A apresentação aconteceu na Universidade Federal de Viçosa, em meio às montanhas de Minas. Puro êxtase. Não me passou pela cabeça envenená-lo por inveja. Isso, diz a lenda, teria feito Antonio Salieri com Amadeus Mozart. O compositor italiano do século 18 não entendia como Mozart, um devasso, poderia compor algo tão sublime.

Na verdade, lembrei-me de Bezalel, da sua destreza e capacidade artística (Êx 35.31); de Jubal, pai dos que tocam harpa (Gn 4.21), e, agradecido, murmurei algumas frases de adoração. A verdade é bela e, como diria Calvino, “se reconhecermos o Espírito de Deus como única fonte da verdade, nunca desprezaremos a verdade onde quer que apareça”.

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30 de junho a 4 de julhoAcontecerá o 17º Simpósio Reformado Os Puritanos, com o tema “Cristo, o Redentor”, em Maragogi, AL.Telefone: 81 3223-3642E-mail: [email protected]

28 de julho a 1 de agostoO Centro Evangélico de Missões (CEM) oferecerá o Curso de Aconselhamento Pastoral Familiar, em Viçosa, MG. O curso é destinado a profi ssionais das ciências humanas e da saúde, ofi ciais de igrejas, pastores e pastoras.Telefone: 31 3891-3030E-mail: [email protected]: www.cem.org.br

21 a 23 de agostoA Rede Evangélica Nacional realizará o 3º Encontro RENAS, em Curitiba, PR.Telefone: 11 4136-1253E-mail: [email protected]: www.renas.org.br

4 a 7 de setembroO Conselho Nacional de Pastores e Líderes Evangélicos Indígenas realizará o 6º Congresso CONPLEI, em Manaus, AM.Telefone: 65 301-2611E-mail: [email protected]: www.conplei.org

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Rede CLAVES BrasilA Rede CLAVES Brasil realiza ofi cinas de capacitação da metodologia CLAVES, que ajuda crianças na prevenção contra maus-tratos. Para solicitar que as ofi cinas aconteçam em sua organização, igreja ou conselho tutelar,entre em contato com a revista Mãos Dadas ([email protected]). A Rede CLAVES Brasil é formada por oito organizações cristãs com forte compromisso em favor da dignidade das crianças e adolescentes.

OraçãoDe 6 a 8 de junho mobilize sua igreja e organização para o 13º Mutirão Mundial de Oração por Crianças e Adolescentes em Situação de Risco. Acesse o Material de Apoio para Mobilização no site da revista Mãos Dadas <www.maosdadas.org>, ou peça-o por e-mail <[email protected]> ou carta (Caixa Postal 88, Viçosa, MG 36570-000).

20º Seminário Música e Adoração27 a 30 de agosto, em São Paulo, SPConteúdo: Clínica Coral e RegênciaPúblico-alvo: Regentes, coristas, cantores e apreciadores de música sacraCoordenação técnica: Maestro Rev. João W. FaustiniRealização: Sociedade Evangélica da Música Sacra (SOEMUS)Mais informações: 11 4412-1516 / [email protected]

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Rubem Amorese

Rubem Amorese é consultor legislativo no Senado Federal e presbítero na Igreja

Presbiteriana do Planalto, em Brasília. É autor de, entre outros, Louvor, Adoração e Liturgia e Icabode — da mente de Cristo à consciência moderna.

<[email protected]>

Para fazer marketing de si mesmo, Satanás se

apresenta “belo” como um anjo de luz, e seus profetas, “bons” como

ministros da justiça

O mercado vale- se do belo para vender. Honesta ou ardilosamente,

ressalta o aspecto estético de um produto, sabendo que a natureza humana, inconscientemente, o associará à qualidade. Isso vale para a aparência limpa e bem refrigerada de uma lanchonete, para o design sofisticado de uma loja de marca mundial ou mesmo para o terno azul-marinho, de corte impecável, de um executivo que deseja “vender” a imagem de competência. Marketing (espero que o uso do termo em inglês cause esse efeito abonador sobre meus leitores).

De fato, a beleza sempre remete ao bem, à pureza e à perfeição. O fenômeno é universal, e também de difícil explicação.

Curiosamente, o dicionário Houaiss define o belo como “tudo que leva ao aperfeiçoamento espiritual do ser humano; o próprio Deus, enquanto manancial eterno e perfeito de tudo o que é propício ao progresso das criaturas e finalidade desse progresso; sublime”. Sublime? Sim, a extrema beleza. Fecha-se o círculo entre o belo e o bem: aquilo “que apresenta inexcedível perfeição material, moral ou intelectual”.

Veja que “sublime”, nas Escrituras, é um dos títulos de Deus (Is 57.15) e uma descrição de seu Servo (v.13), e que, nesses versos, a sublimidade se associa à santidade de Deus. Aquele que vivifica o “contrito e abatido de espírito”.

É interessante notar que, para fazer marketing de si mesmo, Satanás se apresenta “belo” como um anjo de luz, e seus profetas, “bons” como ministros da justiça (2Co 11.14- 15). Sim, o uso ardiloso desse conhecimento da psique humana vem de longe. Não tendo a beleza própria do bem, imita o sublime para enganar os incautos. Refiro-me aqui,

ambiguamente, tanto a Satanás quanto a produtos e serviços de má qualidade “maquiados”.

No entanto, o verdadeiro não precisa de maquiagem. Nem o santo, o justo, o contrito e abatido de espírito, porque essas formas de beleza provêm de uma fonte legítima, primária e inesgotável: o Sublime.

Uma palavra que unificaria essas belezas morais é salvação. É assim que compreendo a afirmação do Salmo 149.4: “e de salvação adorna os humildes”. Uma salvação progressiva, no sentido da santificação (Fp 2.12), qualidades e características que Deus infunde e molda naqueles que se fazem maleáveis às suas mãos de oleiro.

A beleza proveniente dessa ação salvífica de Deus dispensa maquiagem. Não tem o objetivo de vender. É apenas glória. A glória de Deus em nós. Não fenece com a idade, não perde o brilho nem o viço. Não precisa de plásticas nem de liftings. Uma beleza serena e alegre, que vai dormir com um cântico no coração; o cântico da

consciência lavada. Esse não é um pensamento meu, mas do seguinte verso do salmista: “Exultem de glória os santos, no seu leito cantem de júbilo” (Sl 149.5).

Se é verdade que o coração humano decodifica a beleza como perfeição e vice-versa, também o é que todos são capazes de perceber a beleza da salvação; beleza com a qual Deus adorna o humilde e que aponta de volta para sua glória.

“Na velhice darão ainda frutos, serão cheios de seiva e de verdor” (Sl 92.14). Belos velhinhos.

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Um líder sem uma estratégia é como um soldado que vai para guerra e pula de pára-quedas sem ter planejado o local. Depois de chegar ao solo ele se surpreende. Caiu no meio do campo e o inimigo.

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