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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SULINSTITUTO DE LETRAS
Jos Peixoto Coelho de Souza
Cano brasileira:
Proposta de material didtico para um curso de Portugus como Lngua Adicional
Porto Alegre
2009
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A riqueza musical que existe sobre as terras brasileiras , sem dvida,uma das mais abundantes e motivadoras matrias-primas culturais doplaneta.
Jlio Medaglia
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AGRADECIMENTOS
minha me, Marta, de quem herdei o amor s lnguas e ao meu pai, Joo Fernando, de quemherdei o amor msica.
Aos meus irmos, Gabriela, Fernando, Marilia e Nil, pelo exemplo, pela coragem e pelosmomentos de carinho.
Professora Dra. Margarete Schlatter, pela orientao, pelo exemplo de profissionalismo semprealiado ao bom humor e pela oportunidade de desconstruir e apontar novos rumos para reconstruiro meu conceito de ensinar lnguas.
Ao Maestro Pablo Trindade e ao Expresso 25, por me ensinarem a viver a msica a cadamomento e pelo prazer de fazer msica juntos e compartilh-la.
A todos os colegas do PPE, em especial ao Andr Fuzer, Natalia Lafuente e SimoneMendona, pelo companheirismo, pelo constante aprendizado e pelos momentos de descontrao.
Professora Dra. Ingrid Finger e ao Professor Dr. Johannes Doll, pelo exemplo deprofissionalismo aliado sensibilidade no trato com os alunos.
s Professoras Rejane Sommer e Jane Machado, por acreditarem no meu potencial e me darem achance de comear a lecionar aos 19 anos.
A todos os meus amigos, em especial ao Marco Tomazzoni, pelos anos de amizade e dedescobertas.
Aos meus alunos, pela oportunidade de aprender ensinando.
And last but definitelynot least, Laura, pelo amor, pelo apoio e pelo companheirismo em tantosmomentos juntos.
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RESUMO
Este trabalho tem como objetivo refletir sobre o uso da cano como recurso pedaggico atravsda proposta de estruturao do programa de um curso de Portugus como Lngua Adicional(PLA) com base na cano brasileira. Apesar de a cano ser utilizada como instrumento didticoh bastante tempo, a maioria das tarefas envolvendo o seu uso costuma limitar-se aopreenchimento de lacunas, ignorando tanto a interface musical da cano, quanto o contextocultural no qual ela se insere. O trabalho tambm aborda o conceito de cano enquanto gnerodiscursivo, a sua relao com a cultura do pas onde foi produzida e o seu uso no ensino delnguas adicionais, propondo diferentes objetivos de ensino que o professor pode delinear aoutiliz-la. Por fim, apresentamos o curso de Cano Brasileira, desenvolvido especialmente para
o Programa de Portugus para Estrangeiros da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,descrevendo os seus objetivos, os critrios utilizados para a estruturao do curso e analisandodois exemplos de unidades elaboradas.
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SUMRIO
1. INTRODUO ............................................................................................................ 8
2. A CANO NO ENSINO DE LNGUAS ................................................................. 10
2.1 O conceito de cano ....................................................................................... 10
2.2 A relao entre cano e cultura ...................................................................... 12
2.3 A cano e o ensino de lnguas ........................................................................ 13
3. MATERIAIS DIDTICOS COM BASE NA CANO ......................................... 17
3.1 Objetivos de ensino .......................................................................................... 17
3.2 Elaborao de material didtico ....................................................................... 20
4. O CURSO DE CANO BRASILEIRA .................................................................. 22
4.1 Objetivos do curso .......................................................................................... 22
4.2 Critrios para a estruturao do curso ............................................................. 25
4.2.1 Seleo dos gneros musicais ........................................................... 25
4.2.2 Seleo dos temas e das canes ...................................................... 27
4.2.3 Estrutura do material didtico ........................................................... 28
4.2.3.1 Pra comear ........................................................................ 28
4.2.3.2 Conhecendo a cano ......................................................... 28
4.2.3.3 Compreendendo a letra ....................................................... 29
4.2.3.4 Ouvindo msica ................................................................. 30
4.2.3.5 Produo escrita .................................................................. 31
4.2.3.6 Conhecendo mais ................................................................ 31
4.3 Anlise do material .......................................................................................... 32
4.3.1 (Re)Conhecendo gneros musicais brasileiros .................................. 32
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4.3.2 Msica Nordestina .......................................................................... 36
5. CONSIDERAES FINAIS .................................................................................... 41
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ........................................................................ 42
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1. INTRODUO
Este trabalho tem como objetivo refletir sobre o uso da cano como instrumento didtico
no ensino de Portugus como Lngua Adicional1 (doravante PLA), atravs de uma proposta de
material didtico para um curso de cano brasileira para falantes de outras lnguas. O meu
interesse pela cano relaciona-se, inicialmente, minha experincia como professor de ingls
em um curso livre por dez anos e, mais recentemente, ao meu trabalho como professor-bolsista
no Programa de Portugus para Estrangeiros (PPE) da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, onde atuo desde 2008/1. O material que ser analisado neste trabalho foi elaborado no
primeiro semestre deste ano para compor uma nova disciplina no PPE chamada Cano
Brasileira, com o objetivo de apresentar aos alunos diferentes gneros musicais do Brasil e de
promover o debate acerca de temas relacionados a esses gneros. O curso foi trabalhado,
inicialmente, com uma turma em 2009/1, e neste semestre com duas turmas2.
Uma outra motivao pessoal para esta pesquisa o fato de eu participar, desde 2004, do
Expresso 25, grupo musical de Msica Popular Brasileira (MPB) de Porto Alegre, com o qual
tive a oportunidade de fazer vrias apresentaes aqui e em outras cidades do Brasil, e tambmem pases como Uruguai, Alemanha e Portugal. Nessas turns, especialmente Alemanha, pude
perceber o poder de expresso da msica brasileira, pois mesmo sem compreender as letras, o
pblico deixava-se emocionar pelos arranjos, melodias e harmonias.
Apesar da grande variedade de pesquisas j existentes na rea de PLA, ainda h poucos
estudos sobre a cano, gnero importante e representativo da cultura brasileira. Uma possvel
razo para a falta de estudos sobre a cano como recurso pedaggico que, no contexto
acadmico brasileiro, a cano considerada um gnero menor, especialmente em relao literatura, pelo fato de ser de origem popular e de estar mais prxima da lngua oral, em geral
desprestigiada em relao variante escrita nesse contexto. (BARBOSA, 2001) Nesse sentido,
1 Utilizo a expresso lngua adicional em vez de lngua estrangeira com base nos referenciais curriculares daSEC/RS (2009). O uso da palavra estrangeiraexpressa distanciamento, algo que no nosso, enquanto adicionalserelaciona a acrescentar, agregar a outras lnguas que j falamos. Este trabalho trata de um curso planejado paraalunos que esto temporariamente no Brasil, interagindo, portanto, em vrios contextos cotidianos em lngua
portuguesa.2Em 2009/1 o curso foi ministrado por mim e, em 2009/2, uma turma estava sob minha responsabilidade e outra soba responsabilidade do colega Andr Fuzer. Agradeo a Andr Fuzer pela colaborao na elaborao de algumas
unidades.
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esta monografia tambm pretende discutir o status do uso da cano brasileira no ensino de
lngua e cultura ao propor um curso de PLA tendo a cano e gneros musicais brasileiros comoelementos centrais. Assim, a questo sobre a qual este estudo pretende debruar-se : como
estruturar um curso de cano brasileira para falantes de outras lnguas? Para respond-la,
abordo as seguintes perguntas:
1. Que critrios devem ser levados em conta para a seleo dos gneros musicais?2. Como selecionar os temas e canes a serem abordados no curso?3. Como explorar a cano mais aprofundadamente?
O trabalho divide-se em cinco captulos: introduo, a cano no ensino de lnguas,
materiais didticos com base na cano, o curso de cano brasileira e consideraes finais. No
segundo captulo, abordo o conceito de cano, a sua relao com cultura e o seu uso no ensino-
aprendizagem de lnguas adicionais. No terceiro captulo, trato do material didtico com base na
cano, seus objetivos de ensino e sua elaborao. No captulo seguinte, apresentado o curso de
Cano Brasileira criado para o PPE, seus objetivos, os critrios usados para estruturar o curso e
dois exemplos de unidades desenvolvidas. No ltimo captulo, reflito sobre as implicaes deste
trabalho para o uso da cano no ensino de lnguas adicionais e aponto algumas questes que
poderiam ser foco de novas pesquisas na rea.
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2. A CANO NO ENSINO DE LNGUAS
A cano tem sido utilizada como instrumento pedaggico nas aulas de lnguas adicionais
h muitos anos. Porm, apesar de o primeiro estudo sobre o uso da cano no ensino de lnguas
ter sido publicado em 1949, quando Gravenall escreveu seu artigo Music in Language-Teaching
(MURPHEY, 1990 apud GOBBI, 2001), ainda hoje no h uma definio mais aprofundada da
cano enquanto gnero do discurso3. Acredito que um elemento que dificulta essa conceituao
o fato de haver uma impreciso terminolgica por parte de alguns pesquisadores em relao
distino entre cano e msica. Se entendemos cano como um gnero formado por duas
interfaces, uma verbal e outra musical (NAPOLITANO, 2005), ento o termo msicarefere-se
segunda, tornando o seu uso no ensino de lnguas no to relevante.
Porm, em estudos recentes na rea, como Gobbi (2001), Pereira (2006) e Fernandes
(2006), os autores fazem uso do termo msica referindo-se tambm letra, fato que est presente
no prprio ttulo de seus trabalhos. Ademais, Fernandes (2006) utiliza-se dos termos cano,
msica, texto musicado e poesia musicada indiferentemente. Por outro lado, estudiosos como
Gada (2005), Anjos (2006) e Zachariadis (2008) fazem uso do termo cano e marcam a
distino entre cano e msica a fim de reafirmar a cano enquanto gnero discursivo queenvolve msica e letra.
2.1 O conceito de cano
Com base na questo terminolgica acima discutida, utilizo o termo cano referindo-me
a este como um
gnero hbrido, de carter intersemitico, pois resultado da conjugao entre a suamaterialidade verbal e a materialidade musical (rtmica e meldica); e que essasdimenses so inseparveis, sob pena de transform-lo em outro gnero (...)(COSTA, 2003, p. 18, grifo do autor)
Embora o conceito de Costa (2003) seja bastante completo, gostara de adicionar a ideia
que a materialidade musical da cano tambm composta pela sua harmonia, elemento to
3Conforme Bakhtin (2003) Todos os diversos campos da atividade humana esto ligados ao uso da linguagem.()O emprego da lngua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos) concretos e nicos, proferidos pelosintegrantes desse ou daquele campo da atividade humana.() Cada enunciado particular individual, mas cadacampo de utilizao da lngua elabora seus tipos relativamente estveis de enunciados, os quais denominamosgnero do discurso. (grifos do autor) (BAKHTIN, 2003, p. 261-262).
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fundamental na caracterizao de uma msica quanto a sua melodia e ritmo. O autor Bohumil
Med, na sua obra Teoria da Msica(1996), define melodia como o conjunto de sons dispostosem ordem sucessiva, harmonia como conjunto de sons dispostos em ordem simultnea e
ritmo como ordem e proporo em que esto dispostos os sons que constituem a melodia e a
harmonia (MED, 1996, p.11 grifos do autor). Esses trs componentes e a letra so, assim,
constituintes do gnero cano e devem ser, portanto, todos eles levados em conta se queremos
us-lo no ensino.
O carter hbrido da cano pode apresentar-se nas diferentes formas em que os aspectos
verbais e musicais relacionam-se, como, por exemplo, entre a letra e o gnero 4 musical, e/ou
entre a letra e a melodia. Sobre essa ltima relao, Ulha (2006) afirma que na cano popular
brasileira
a melodia e letra interferem estreitamente uma sobre a outra. Existem elementos naletra, especialmente sua qualidade narrativa ou lrica, que conduzem a diferentes tiposde melodias: existem particularidades na melodia, especialmente seu contornomeldico e tipos de intervalos empregados que marcam o carter da cano.(ULHA, 2006, p. 1)
Portanto, importante ressaltar que, ao analisar uma cano, o sentido da letra deve seratribudo levando-se em conta a sua relao com a interpretao da msica em si, pois conforme
Arnaldo Antunes (2000, apud NAPOLITANO, 2005), devido a diversas mudanas ocorridas na
cano, como a introduo da fala e do grito e das novas relaes formadas pela melodia e
harmonia, o contexto sonoro tornou-se cada vez mais importante para a compreenso do seu
sentido. Portanto, os professores devem levar em conta essa relao ao utilizar a cano no ensino
de lnguas. Isso quer dizer que ater-se somente materialidade verbal de uma cano no levar
em conta os elementos constituintes do prprio gnero e, portanto, limitar o trabalho a uma
compreenso superficial.
4O termo gnerorefere-se aqui s diferentes categorias da rea musical (samba, rock, jazz, etc), sendo, portanto,
diferente do conceito de gneroapresentado anteriormente, no qual a cano se inclui.
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2.2 A relao entre cano e cultura
Segundo Trouche (2004), a relao entre a lngua e a cultura5de uma sociedade to forte
que ela se manifesta nas formas de ver e dizer do seu povo. Ao estudarmos uma lngua, no
somente estamos entrando em contato com o seu lxico e suas regras gramaticais, mas tambm
com os vrios aspectos culturais do povo que a fala. Sobre essa relao entre lngua e cultura,
Barbosa (2009) afirma que h uma necessidade urgente de uma associao entre aspectos
lingusticos e culturais, uma vez que ambos no podem ser vistos como objetos imutveis e
cristalizados.
Assim, se entendemos que o ensino de uma lngua envolve tratar de aspectos culturais,
necessrio que se reflita sobre como ajudar os alunos a construir essa compreenso atravs da
qual possam melhor entender a sua prpria cultura. Schlatter (2000) refere-se a essa questo
quando aborda o papel da cultura no ensino de lnguas.
A construo de um novo parmetro cultural deve iniciar atravs da compreenso doseu prprio e a explorao do novo parmetro deve ser feita atravs de materiaisautnticos que, como bem sabemos, esto repletos de valores culturais.(SCHLATTER, 2000, p. 523)
Nesse sentido, acredito que a cano seja um exemplo de material autntico6que, devido
sua carga cultural inerente, permite ensinar a lngua e a cultura de forma contextualizada,
expondo o aluno variedade cultural do pas onde foi produzida, atravs de diferentes temas e
variantes lingusticas presentes na sua materialidade verbal e de elementos constitutivos da sua
materialidade musical. Alm disso, se, como afirma Barbosa (2000), no contexto especfico da
cultura brasileira, a cano produzida no pas considerada uma expresso cultural muito
diversificada, representando os sonhos, as emoes e as contestaes do nosso povo, ela pode
propiciar pontes para entendimentos sobre formas de agir e posicionar-se valorizadas (ou
5Neste trabalho, entendo cultura como conhecimentos, crenas, arte, moral, leis, costumes adquiridos comomembro de uma sociedade, isto , sistemas aprendidos e compartilhados de padres para perceber, para crer, paraagir e para avaliar as aes dos outros (GOODENOUGH, 1981, p. 62ff, apud GARCEZ, 2000, p. 495). Assim,acredito que a cultura seja scio-culturalmente construda nas prticas discursivas, nas formas de ser, dizer e agir(DOURADO e POSHAR, 2007).
6Nesta monografia adoto o conceito de material autntico de Little e Singleton (1988, p. 21, apud BRESSAN, 2002,p. 48), que afirmam que texto autntico aquele que foi criado para preencher um propsito social na comunidade
lingustica em que foi produzido.
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rejeitadas) na sociedade onde circulam, como tambm promover a reflexo do aluno estrangeiro
sobre seus prprios valores em relao aos temas retratados na cano.
2.3 A cano e o ensino de lnguas
A cano tem sido um tradicional recurso pedaggico, sendo que o primeiro livro
didtico7 a utiliz-la como base foi publicado em 1954 (GOBBI, 2001). Segundo Murphey
(1992), uma das razes para a importncia do seu uso que muitas pessoas possuem grande
facilidade para memorizar as letras das canes, um fenmeno chamado pelo autor de song stuck
in my head, referindo-se a lembrar canes completas em uma outra lngua, muitas vezes tendo
quase nenhum conhecimento dessa lngua. Segundo o autor, esse fato parece reforar a ideia de
que as canes atuam na memria de curta e longa durao (MURPHEY, 1992, p. 7).
No Brasil, estudos como os de Lima (2004), Anjos (2006) e Oliveira (2007) discutem os
benefcios do uso de canes no ensino de lnguas adicionais. Os autores lembram que,
primeiramente, a cano proporciona uma atmosfera agradvel de aprendizado, gerando
expectativa, motivao e estmulo, alm de possuir (...) uma carga cultural de importncia e peso
inestimveis8(MERCEDES, 2001, p. 74, apud OLIVEIRA, 2007, p. 7). Essa questo bastanterelevante, pois, para muitos alunos, a cano est associada a momentos de prazer no seu dia-a-
dia. Alm disso, no podemos esquecer que h uma grande identificao por parte deles,
especialmente dos adolescentes, com determinadas canes e gneros musicais, Por isso, o
professor deve ter em vista a faixa etria dos seus alunos e os seus interesses na hora de escolher
qual cano trabalhar para que essa expectativa se concretize. claro que o gosto pessoal do
professor tambm deve ser levado em conta, porm tendo em mente quem so as pessoas que vo
ouvir a cano.Alm disso, a sua riqueza cultural est no fato de veicular valores estticos, ideolgicos,
morais, religiosos, lingusticos, pois possui as marcas do tempo e do lugar da sua criao.
(LIMA, 2004, p. 178). Por essas razes, Anjos (2006) afirma que esse gnero deve adquirir
um merecido e vlido destaque no ensino/aprendizagem de lngua estrangeira nosetor cultural. preciso no esquecer que a cano est inserida em momentos scio-histrico-econmico polticos significativos do pas, e assim sendo possibilita
7One hundred songs and poemsde Blumenthal e Stern (1954).8(...) una carga cultural de inestimable importancia y peso.
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reflexes de maior interesse e relevncia sobre as caractersticas culturais do pas cujalngua est sendo objeto de estudo. (ANJOS, 2006, p.62)
Um problema comumente encontrado nas tarefas com base na cano que elas
costumam enfocar somente os seus aspectos lingusticos, ignorando a sua relao com os
aspectos musicais. Segundo Ferreira (2002), isso seria como falar de um corpo esquecendo-se da
alma, e vice-versa (FERREIRA, 2002, p. 39). Ademais, como j vimos, a compreenso dos
sentidos da letra deve levar em conta a materialidade musical.
Sendo o objeto deste trabalho o uso da cano no ensino de PLA, acredito que o foco
principal deva, sim, estar no estudo da letra da cano, porm, nunca ignorando os seus aspectos
musicais. Vindo ao encontro dessa ideia, Napolitano (2005, p. 97) prope que a cano seja
analisada com base tanto nos seus parmetros verbais quanto nos musicais, e que devemos nos
lembrar de pens-los conjunta e complementarmente, mesmo que para fins didticos acabemos
separando-os. Dessa maneira, as relaes entre ambos os parmetros, isto , entre o contedo da
letra e o gnero musical e entre a letra e a melodia, so essenciais atribuio de sentidos
cano. Como exemplo, podemos citar a cano Cotidiano9, cuja melodia reitera o contedo
repetitivo da letra na descrio do dia-a-dia dos personagens, fato que pode ser evidenciado nas
trs primeiras e na quinta estrofe, nas quais a melodia apresentada sem variao:
Todo dia ela fazTudo sempre igual
Me sacodes seis horas da manh
Me sorri um sorriso pontualE me beija com a boca
De hortel...
Todo dia ela diz
Que pr'eu me cuidarE essas coisas que diz
Toda mulherDiz que est me esperando
Pr'o jantarE me beija com a boca
De caf...
Todo dia eu s pensoEm poder parar
9Composta por Chico Buarque em 1971.
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Meio-dia eu s pensoEm dizer no
Depois penso na vidaPr levar
E me calo com a bocaDe feijo...
Seis da tardeComo era de se esperar
Ela pegaE me espera no porto
Diz que est muito loucaPr beijar
E me beija com a bocaDe paixo...
Toda noite ela dizPr'eu no me afastar
Meia-noite ela jura eterno amorE me aperta pr'eu quase sufocar
E me morde com a boca de pavor...
Em muitos casos, para uma melhor compreenso dos sentidos da cano, faz-se tambm
necessria uma explicitao do contexto scio-histrico-cultural em que ela foi produzida, pois
como compreender uma cano sem o seu contexto cultural, se os significados so
construdos a partir de aspectos culturais (LIMA, 2004, p. 177 e 179)? Assim, como no
relacionar o tema da seca e dos retirantes nordestinos retratados na canoAsa Branca10com o
baio, seu gnero musical, se a letra dessa cano, ao expor a situao do personagem principal
ao despedir-se da sua amada para ir embora do serto devido seca, narra o drama de muitos
moradores dessa regio nos anos quarenta, poca em que a cano foi composta?
Quando oiei a terra ardendoQual fogueira de So Joo
Eu preguntei a Deus do cu, aiPor que tamanha judiao
Que braseiro, que fornaiaNem um p de prantao
Por farta d'gua perdi meu gadoMorreu de sede meu alazo
10Composta por Luis Gonzaga e Humberto Teixeira em 1947.
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Int mesmo a asa branca
Bateu asas do sertoIntonce eu disse adeus RosinhaGuarda contigo meu corao
Hoje longe muitas lguaNuma triste solido
Espero a chuva cair de novoPra mim vortar pro meu serto
Quando o verde dos teus ioSe espaiar na prantao
Eu te asseguro no chore no, viuQue eu vortarei, viu
Meu corao
Por fim, vale lembrar que alguns gneros musicais esto diretamente relacionados
dana, como, por exemplo, a msica produzida no nordeste do pas (o baio, o forr, o xote, o
ax e o frevo), a msica gauchesca e, tambm, o funk carioca. Portanto, para enriquecer o
trabalho com esses gneros, pode ser interessante apresentar aos alunos vdeos retratando as
danas e os locais onde elas normalmente ocorrem.
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3. MATERIAIS DIDTICOS COM BASE NA CANO
Entendendo que a cano pode promover, mediante uma explorao didtica adequada,
contextos de uso da lngua significativos no ensino de PLA e que, para us-la, deve-se tratar, de
maneira adequada, de seus componentes verbais e no-verbais, neste captulo passo a refletir
sobre os objetivos de ensino que esse recurso pedaggico nos permite delinear e que questes
devemos ter em vista ao elaborar materiais didticos com base na cano.
3.1 Objetivos de ensino
A cano oferece ao professor de lnguas adicionais uma grande variedade de opes para
o desenvolvimento de objetivos de ensino. Isso se deve ao fato de podermos trabalh-la tanto
como um texto oral quanto escrito - preferencialmente das duas maneiras - o que permite termos
como meta inicial a sua compreenso oral e escrita. Todavia, importante ressaltar que alm de
atividades de compreenso, a cano pode servir de base para produo oral, a partir de
discusses sobre questes de vocabulrio ou de compreenso da letra, e para produo escrita, a
partir de posicionamentos em relao ao seu tema. Alm disso, por ser um material autntico, acano apresenta diferentes variantes regionais e scio-culturais, o que permite aos alunos entrar
em contato com expresses idiomticas, grias e diferentes pronncias.
Ao analisar estudos realizados no pas sobre o uso da cano no ensino de lnguas
adicionais (GOBBI, 2001; ANJOS, 2006; FERNANDES, 2006; PEREIRA, 2006;
ZACHARIADIS, 2008), constatei que os autores propem diferentes objetivos ao explorar esse
recurso didtico, desde o desenvolvimento fonolgico dos estudantes at o seu uso para a prtica
das quatro habilidades, passando pelo ensino de vocabulrio, de aspectos gramaticais e decultura. Esse fato refora a versatilidade que a cano oferece ao professor na hora de delinear os
objetivos do seu uso em aula.
Na sua dissertao de mestrado, Gobbi (2001) faz uma reviso bibliogrfica dos estudos
realizados sobre o uso da cano no ensino de lnguas, descrevendo possveis objetivos referentes
ao seu uso para a prtica das quatro habilidades, geralmente de forma integrada. No mbito da
compreenso oral, por exemplo, a autora aponta que atividades com base na cano podem ter
por fim a distino de fonemas, o reconhecimento de formas reduzidas de palavras e o
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desenvolvimento de estratgias de compreenso oral, como, por exemplo, a inferncia do
significado de palavras no contexto. J Hancock (1998, apud GOBBI, 2001) sugere tantoatividades visando a compreenso do significado geral da cano, como selecionar figuras que
melhor associam-se letra e fazer anotaes sobre os personagens e palavras-chave, quanto de
identificao de elementos especficos, tais como localizar palavras que esto escritas, mas no
esto presentes na letra original, ordenar os versos que esto fora de ordem, e, finalmente,
encontrar as diferenas ou ordenar figuras retratando a letra da cano.
Porm, apesar das diversas possibilidades para a prtica da compreenso oral que este
recurso pedaggico oferece, acredito que a cano seja tradicionalmente mal aproveitada.
Quantas vezes, como estudantes de lnguas, tivemos professores que traziam canes para a sala
de aula com o nico propsito de preencher lacunas, sem nem mesmo discutir o seu tema?
Entretanto, ouvir a cano somente com esse objetivo reduz a cano a um instrumento de
avaliao em uma perspectiva muito restrita de compreenso oral, focada apenas na identificao
de algumas palavras do texto.
Gostaria de ressaltar que considero o preenchimento de lacunas na prtica da
compreenso oral uma tarefa possvel na utilizao da cano, mas no deve ser a nica, e,
quando utilizada, deve ser baseada em objetivos de ensino claros. Por exemplo, o professor devesaber por que razo e com que objetivo retira palavras da letra, se para praticar rimas, sentidos
possveis do texto, alguma classe gramatical especfica ou a percepo de alguns sons
especficos, tendo sempre em vista o grau de compreensibilidade da palavra ao ouvir a cano.
Quanto leitura, essa habilidade pode ser trabalhada, por exemplo, antes de ouvir a
cano, atravs de tarefas como palavras cruzadas e o encaixe de palavras na letra. As duas
estratgias envolvem a retirada de palavras da letra, sendo que, na primeira, so fornecidas dicas
para a identificao dessas palavras e, na segunda, as palavras so apresentadas aos alunos e elesdevem encaix-las levando em conta a sua adequao dentro do contexto. Tambm podem ser
propostas tarefas de leitura aps a audio da cano, como responder perguntas especficas ou
gerais sobre a letra, ou, ainda, de maneira integrada com a produo oral e/ou escrita, atravs de
discusses, comentrios, etc.
Penso que tarefas anteriores escuta so interessantes, pois permitem aos alunos atribuir
sentido letra antesde ouvir a cano, facilitando a posterior prtica da compreenso oral para
conferir se as palavras usadas esto adequadas. Em relao a perguntas sobre a letra, sugiro
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questes como a identificao de interlocuo e de referentes, a inferncia do significado de
grias e/ou expresses idiomticas e o reconhecimento de caractersticas da linguagem utilizada,como grau de informalidade ou formalidade e o uso de recursos poticos.
No que se refere produo oral, Gobbi (2001) sugere que atividades que abordem o
enredo, os personagens retratados e os temas culturais e sociais presentes nas letras possam servir
como assunto para discusses entre os alunos, comparando-os com a realidade do seu pas.
Concordo com a autora e lembro que, alm disso, os alunos podem desenvolver essa habilidade
ao discutir as respostas das tarefas de leitura com um colega, e atravs de questes para ativar o
seu conhecimento prvio sobre o tema da cano, e de perguntas sobre a relao entre as
interfaces verbal e musical da cano, como a melodia e a letra ou a letra e o gnero musical.
Com relao produo escrita, a autora prope desde exerccios mais tradicionais, como
responder questes especficas ou interpretativas sobre a letra, at a criao de uma nova cano
ou de uma nova estrofe. Kanel (1996, apud GOBBI, 2001) sugere a escrita de resumos ou artigos
sobre a cano, o gnero musical ou o intrprete. A autora tambm prope tarefas de transposio
de gneros textuais, como a elaborao de histrias em quadrinhos, dilogos ou contos baseados
na letra da cano.
Considero que uma produo escrita seja uma boa forma de encerrar uma tarefa com basena cano, permitindo, muitas vezes, uma sistematizao dos assuntos tratados. Para isso,
proponho a escrita de textos relacionados ao tema da cano ou ao gnero musical. Acredito,
tambm, que exerccios de transposio da cano para outro gnero textual, como mencionados
acima, podem ser muito ricos, permitindo ao aluno perceber as modificaes necessrias para a
adequao dos recursos lingusticos (e outros) ao novo gnero.
Por fim, gostaria de lembrar que uma das maiores riquezas da cano est, como disse
anteriormente, na sua forte relao com a cultura do pas em que foi produzida. Anjos (2006)aponta que o grande mrito de trabalhar com canes no ensino de lnguas que elas possibilitam
a aprendizagem lingustica e intercultural. Segundo a autora,
esse enfoque nos permite passar no s pelo conhecimento do outro, mas tambmpela nossa prpria identidade cultural, analisando e revendo opinies e conceitos,desenvolvendo um pensamento crtico em relao ao mundo que nos cerca. (ANJOS,2006, p.105)
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3.2 Elaborao de material didtico
A elaborao de material didtico envolve muitas consideraes, sendo que uma das
primeiras a concepo de linguagem subjacente ao material a ser produzido. Neste trabalho,
com base em Clark (2000), a linguagem vista como um meio para realizar aes no mundo; ns
a usamos nas nossas prticas sociais do dia-a-dia para fazer coisas. Partindo desse conceito, o
objetivo das tarefas elaboradas no pode limitar-se a apresentar novos recursos lingusticos, mas
deve, sim, proporcionar aos alunos situaes significativas de uso da lngua-alvo. Nesse sentido,
concordo com Bortolini (2006) quando afirma que, sob essa perspectiva, o objetivo de ensino
deve ser priorizar
a reflexo sobre temas relevantes para os alunos (objetivos educacionais) que serodesenvolvidos atravs do foco nas habilidades (compreenso e produo oral eescrita), em gneros discursivos e em funes comunicativas (BORTOLINI, 2006, p.27).
Outra questo importante a definio de critrios a serem tomados como base para a
elaborao do material. Sobre esse assunto, Schlatter (2009)11 prope que, inicialmente, o
professor deve selecionar um tema norteador que seja relevante para os alunos. Partindo do tema,
a prxima etapa consiste em pensar quais gneros do discurso so geralmente implicados por esse
tema, para ento selecionar textos orais e escritos relacionados e que permitam o uso da lngua
dentro desse campo temtico. Aps a escolha dos textos, o professor deve definir as habilidades
que sero o foco da tarefa, a fim de elaborar tarefas que convidem os alunos a fazer uso da
lngua-alvo. A autora ressalta que se deve, tambm, ter em vista uma sequncia de tarefas, como
tarefas preparatrias, tarefas de compreenso, tarefas de resposta ao texto e, finalmente, tarefas de
resposta ao texto dos alunos.Segundo Bressan (2002), duas outras decises a serem tomadas previamente elaborao
da tarefa dizem respeito a estabelecer o nvel de proficincia exigido para a sua resoluo e o seu
objetivo. Em relao primeira, a autora aponta para o fato de que esse passo deve ocorrer
durante o prprio processo de seleo dos textos e antes do objetivo da tarefa ser definido. Em
outras palavras, o nvel de proficincia no definido pelo texto em si, mas, sim, pelo prprio
11Apresento aqui um resumo de alguns dos critrios sugeridos pela autora. Para uma viso mais aprofundada do
assunto, recomendo a leitura do artigo.
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professor ao elaborar a tarefa, tendo em vista os objetivos de ensino que esse texto permite
delinear. Quanto segunda deciso, a autora afirma que todas as tarefas devem apresentar umobjetivo especfico, e que o mesmo deve, preferencialmente, estar associado funo ou o
propsito social do texto em questo.
Por fim, Bressan (2002) ressalta a importncia das tarefas preparatrias, lembrando que
quanto menor for o nvel de proficincia dos alunos, mais tarefas preparatrias, que tenham como
objetivo ativar conhecimento prvio ou ensinar conhecimentos-chave para a compreenso, sero
necessrias.
Neste captulo, apresentei diferentes objetivos de ensino que o material didtico com base
na cano oferece ao professor de lnguas adicionais, incluindo o seu uso para a prtica das
quatro habilidades e o ensino de elementos lingusticos e culturais. Abordei tambm critrios que
fundamentam a elaborao do material didtico apresentado neste trabalho. No captulo a seguir,
passo a apresentar o curso de Cano Brasileira, seus objetivos, os critrios para a sua
estruturao e dois exemplos de unidades desenvolvidas.
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4. O CURSO DE CANO BRASILEIRA
No primeiro semestre de 2008, Rmulo Torres e Gabriela Bulla, professores-bolsistas do
Programa de Portugus para Estrangeiros (PPE), decidiram oferecer um curso de Msica
Brasileira para os alunos dos nveis intermedirio e avanado. Embora o mesmo nome tenha sido
utilizado para se referir s duas disciplinas, as suas propostas e materiais didticos eram
diferentes, pois partiam de elementos estruturantes distintos: enquanto o curso intermedirio
baseava-se em gneros musicais, o avanado organizava-se a partir de temas relacionados com a
realidade e a cultura brasileira retratadas nas letras das canes.
No incio de 2009, devido ao meu interesse sobre o tema, resolvi reestruturar o curso a
fim de oferec-lo no primeiro semestre letivo. Dessa maneira, a primeira deciso que deveria
tomar era qual dos critrios de organizao utilizar como base para a elaborao do programa do
curso. Por acreditar que os alunos do PPE esto em constante contato com diversos gneros
musicais brasileiros atravs da TV, do rdio e da Internet, mas que, muitas vezes, no tm os
recursos para identific-los, escolhi tomar os gneros como fator estruturante do curso. Alm
disso, decidi elaborar a disciplina para o nvel intermedirio, j que alunos nesse nvel possuem
proficincia em lngua portuguesa para uma compreenso aprofundada do contedo verbal dacano, e porque esse nvel possui um maior nmero de alunos inscritos no PPE (abrangendo as
turmas de Intermedirio I e II).
4.1 Objetivos do curso
O programa de Cano Brasileira por mim elaborado compreende nove unidades
planejadas para serem trabalhadas em quinze aulas de duas horas cada, totalizando 30 horas.Alm de oito unidades referentes a oito gneros musicais, h tambm uma unidade introdutria
para ser trabalhada na primeira aula, cujo objetivo expor aos alunos os gneros que sero
abordados no decorrer do curso.
Exceto as unidades sobre bossa nova e funk, que incluem tarefas extras de compreenso
oral e/ou escrita e, assim, devem ser trabalhadas em duas aulas cada, as outras seis unidades
foram concebidas para serem desenvolvidas em, aproximadamente, uma aula e meia cada. Todas
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as unidades foram elaboradas com o intuito de permitir a prtica das quatro habilidades
(compreenso oral, leitura, produo oral e escrita), muitas vezes de maneira integrada.O curso de Cano Brasileira tem como objetivos:
Apresentar uma amostra da variedade dos gneros musicais brasileiros; Apresentar um encadeamento cronolgico da maioria dos gneros musicais estudados; Praticar e desenvolver compreenso oral, leitura, produo oral e escrita sobre msica
brasileira e tpicos relacionados;
Desenvolver estratgias de compreenso oral, Relacionar a msica brasileira com aspectos da cultura do pas; Refletir sobre temas e/ou questes presentes nas letras trabalhadas; Familiarizar o aluno com termos musicais (como melodia, harmonia e ritmo) e com
vocabulrio referente a instrumentos musicais;
Desenvolver a percepo musical do aluno, atravs do reconhecimento auditivo deelementos musicais como a instrumentao, o andamento e a interpretao vocal,
Promover a reflexo sobre os propsitos da cano levando-se em conta a relao entre amaterialidade verbal e musical da cano.
A fim de oferecer uma viso mais abrangente da estrutura do curso, apresento na tabela a
seguir um esquema com um resumo de cada uma das unidades, incluindo os gneros musicais, na
sequncia em que so trabalhados, a cano estudada em cada unidade, o tema abordado, o seu
intrprete e os objetivos especficos.
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Como podemos observar na Tabela 1, os oito gneros musicais abordados no curso so
respectivamente: samba, bossa nova, msica gacha, msica nordestina, rock, MPB, tropiclia efunk carioca. Com isso, acredito oferecer uma boa viso da variedade dos gneros musicais
brasileiros. Ademais, os objetivos especficos das diferentes tarefas incluem discutir, reconhecer,
apresentar, refletir sobre, relacionar, identificar e debater elementos referentes ao contedo da
letra da cano, ao gnero musical e a questes lingusticas e culturais mobilizadas pelas canes.
As razes para a escolha dos gneros musicais e os critrios usados para a elaborao do
material didtico e estruturao o curso sero tratados na seo seguinte.
4.2 Critrios para a estruturao do curso
Nesta seo, trato especificamente da questo aqui focalizada: como estruturar um curso
de cano brasileira para falantes de outras lnguas? Para isso, abordo as seguintes perguntas: que
critrios devem ser levados em conta para a seleo dos gneros musicais? Que gneros e temas
devem ser abordados no curso? Como trabalhar com a cano? Passo, a seguir, a discutir cada um
desses aspectos.
4.2.1 Seleo dos gneros musicais
Para estruturar o curso de Cano Brasileira, a primeira etapa realizada foi a seleo dos
gneros musicais a serem includos no curso, a qual se baseou em critrios subjetivos e de
relevncia do gnero no contexto musical do pas. O primeiro refere-se apreciao pessoal dos
gneros, sendo que tive como objetivo expor os alunos a uma variedade de ritmos e instrumentos
para dar uma viso mais abrangente da riqueza da msica brasileira. J o segundo diz respeito aograu de representatividade do gnero no mbito da msica brasileira, apoiado na anlise de Luiz
Tatit (2008), no seu livro O Sculo da Cano.
No seu livro, Tatit (2008) traa um panorama do gnero cano popular brasileira no
sculo XX, abordando a sua origem e os principais movimentos que marcaram essa manifestao
artstico-cultural no pas. Nesse contexto, o autor v o samba como representante-mor da cano
brasileira e afirma que o tropicalismo e a bossa nova so os movimentos musicais de maior
importncia no processo de desenvolvimento da cano, pois, nas palavras do autor, o gesto de
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recolhimento e depurao da bossa nova e o gesto de expanso e assimilao do tropicalismo
tornaram-se seiva que realimenta a linguagem da cano popular (...) (TATIT, 2008, p. 149 e86).
importante ressaltar que o tropicalismo no considerado um gnero musical, mas, sim,
um movimento artstico-cultural. Entretanto, o fato de incluir instrumentos eltricos, como a
guitarra e o rgo, permite ao ouvinte reconhecer caractersticas musicais nicas em comparao
com a msica produzida no pas no final dos anos 1960.
Quanto escolha dos outros gneros, inclu MPB pelo fato de muitos artistas
representantes desse estilo, como Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, terem
reconhecimento internacional, e por consider-lo um dos gneros mais ricos produzidos no pas,
devido a sua grande variedade e riqueza musical. Alm disso, acredito que, se quisermos
apresentar aos alunos uma perspectiva cronolgica dos gneros musicais, faz-se necessrio
abordar a MPB produzida na dcada de 1960, perodo entre a bossa nova e o tropicalismo.
Com relao escolha dos gneros regionais (msica gacha e nordestina), a relevncia
do primeiro deve-se ao fato de os alunos morarem no Rio Grande do Sul e de terem contato
direto com manifestaes culturais do Estado. E no intuito de contrastar esse gnero local com o
de outras regies brasileiras, decidi incluir a msica produzida no nordeste do pas pela suagrande riqueza cultural e musical.
Por fim, o gnero rock foi selecionado devido sua popularidade no Brasil e no mundo e
por ser de origem internacional, fato que est intimamente ligado ao tema central proposto na
unidade. J o funk carioca foi recentemente includo no curso, por ter sido o gnero escolhido
para o desenvolvimento de uma unidade-exemplo pelo nosso grupo de projeto sobre cano
brasileira do Seminrio de Formao de Professores de Portugus para Estrangeiros.
Cabe salientar que as unidades foram organizadas na sequncia apresentada na Tabela 1de forma que haja um encadeamento cronolgico entre eles (exceto os de msica gacha e
nordestina), com base na histria da msica brasileira apresentada pelo musiclogo Ricardo
Cravo Albin (2004), na sua obra O Livro de Ouro da MPB.
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4.2.2 Seleo dos temas e das canes
Definidos os gneros musicais a serem trabalhados na disciplina, o estgio seguinte
envolveu a escolha dos temas e das canes, realizada com base em dois critrios:
representatividade e temtica. O primeiro refere-se ao fato de a cano apresentar aspectos
musicais representativos do gnero a que pertence, isto , ritmo e instrumentos musicais tpicos
do gnero em questo. O segundo critrio diz respeito ao fato de a letra tratar de um assunto
relevante para os alunos e que permita instigar discusses.
Tendo esses dois critrios em vista, busquei canes cuja temtica fosse, dentro do
possvel, relacionada ao prprio gnero musical. Por exemplo, a cano Gerao Coca-cola12,
trabalhada na unidade sobre rock (gnero musical de origem americana), aborda a questo da
juventude no Brasil e a influncia dos Estados Unidos. J a unidade sobre msica gacha enfoca
as expectativas dos alunos em relao vida no Brasil e as diferenas que encontraram ao chegar
a Porto Alegre, cidade retratada na canoRamilonga13.
No caso das unidades sobre msica nordestina e funk carioca, a escolha dos temas se deu
no pela temtica da cano em si, mas por questes relacionadas ao prprio gnero, como os
problemas do preconceito musical contra o funk carioca e do preconceito lingustico referente svariantes do serto nordestino. Semelhantemente, a seleo do tema da unidade sobre bossa nova
considerou uma caracterstica bastante comum nas letras desse gnero: o uso de recursos de
linguagem potica, como rima, aliterao e metforas. Assim, selecionei canes que explicitam
essas questes nas suas letras.
Por fim, com relao s unidades sobre MPB e tropicalismo, o processo foi justamente o
contrrio: a escolha da cano determinou a temtica do mdulo. As canes escolhidas, Que
Nem a Gente14
e Crebro Eletrnico15, abordam temas (esteretipos e a relao do homem com a
mquina) que chamaram a minha ateno por tratarem de questes relevantes com as quais os
alunos poderiam se identificar. Mesmo assim, o critrio de representatividade musical tambm
foi levado em conta na deciso final, j que as duas canes apresentam caractersticas musicais
prprias dos gneros que representam.
12Composta por Renato Russo em 1985.13Composta por Vitor Ramil em 1997.14Composta por Celso Vifora em 2008.15Composta por Gilberto Gil em 1969.
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4.2.3 Estrutura do material didtico
Nesta seo, apresento uma proposta de como explorar a cano de maneira mais
aprofundada. Para isso, apresento a estrutura do material didtico produzido para o curso. Exceto
a unidade (Re)Conhecendo gneros musicais brasileiros, criada para a primeira aula, as outras
oito unidades apresentam uma estrutura padro, sendo divididas, respectivamente, em seis etapas:
Pra comear, Conhecendo a cano, Compreendendo a letra, Ouvindo msica, Produo escrita e
Conhecendo mais. Alm dessas etapas, as unidades sobre bossa nova e funk carioca possuem
tarefas de compreenso escrita e oral, com textos e vdeos relacionados a esses gneros. Isso se
deve ao fato de que o tema da produo final das duas unidades relaciona-se diretamente com o
gnero musical abordado.
As seis etapas bsicas e seus objetivos so descritos nas prximas subsees.
4.2.3.1 Pra comear
Nesta etapa so propostas perguntas introduzindo o tema a ser abordado e
contextualizando o contedo da letra a ser trabalhada, sendo que, em algumas unidades, tambm apresentado vocabulrio referente ao assunto. Desse modo, o objetivo principal desta etapa
ativar o conhecimento prvio dos alunos, preparando-os para uma melhor compreenso da
cano. Muitas vezes os alunos so convidados a deduzir o contedo da letra com base nessas
perguntas e no ttulo da cano, como na unidade sobre samba, na qual os alunos so
apresentados a uma lista de comidas e bebidas, das mais comuns s mais sofisticadas, para
discutir questes relacionadas s diferenas entre elas e relacionar o assunto cano (Caviar16) a
ser trabalhada.
4.2.3.2 Conhecendo a cano
Nesta etapa, os alunos escutam a cano, entrando em contato com a letra e msica. Em
trs unidades a letra apresentada na ntegra, e nas outras cinco os alunos so solicitados a ouvir
para completar lacunas. Entretanto, muitas vezes os alunos so solicitados a preench-las antes
16Composta por Zeca Pagodinho em 2002.
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de ouvir a cano, como uma maneira de atribuir sentido letra anteriormente sua compreenso
oral. Para isso, so propostos diferentes procedimentos, como dicas com a definio das palavras,ou uma lista de palavras previamente apresentada. Assim, ao escutar a cano, os alunos podem,
primeiramente, conferir se as palavras que eles utilizaram foram as mesmas usadas pelo
compositor, para depois focarem-se no reconhecimento de palavras especficas. Por exemplo, na
unidade de MPB, cuja letra da cano retrata esteretipos referentes a diversos tipos de pessoas,
os alunos preenchem, inicialmente, as lacunas da direita com base nos seus prprios esteretipos,
para aps ouvir a cano, conferir cada palavra, e, ento, completar as lacunas da esquerda. A
seguir, podemos ver um trecho da primeira estrofe da cano como apresentada na unidade.
Que Nem a GenteLetra e Msica: Celso Vifora
Favelado no tudo ____________ / ____________Milionrio no tudo ____________ / ____________Maltrapilho no tudo ____________ / ____________
Elegante no , necessariamente,Tudo ____________ / ____________
4.2.3.3 Compreendendo a letra
Aps terem um primeiro contato com a cano, as perguntas propostas nesta etapa tm o
intuito de desenvolver a compreenso da letra por parte dos alunos. Para isso, as tarefas convidam
os alunos a inferir o significado de palavras e/ou expresses idiomticas atravs do contexto, a
identificar a ideia principal da letra como um todo e/ou de versos especficos, e a reconhecer
interlocutores e referentes. Na unidade sobre tropicalismo, por exemplo, os alunos respondem as
seguintes perguntas:
1. A que/quem o compositor se refere quando diz eu? E quando diz crebro eletrnico?
2. Como voc entende as expresses em itlico retiradas da letra:a) Porque sou vivo, vivo pra cachorrob) a morte nosso impulso primitivoc) com seus botes de ferro e seus olhos de vidrod) Eu c com meus botes de carne e osso
3. Qual a viso do compositor sobre a tecnologia? Como voc sabe?
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4. Na opinio do compositor, existe alguma contradio entre o ser humano e a tecnologia?
5. Voc concorda essa opinio? Por qu?
6. Esta cano foi escrita em 1969. Voc acha que o tema continua atual? Por qu?
Alm disso, como pde ser visto acima, esta etapa tem como objetivo a produo oral dos
alunos sobre o tema e questes especficas presentes na letra da cano, estimulando-os a
relacionar as ideias com o seu conhecimento de mundo e seu ponto de vista, e convidando-os a
dar suas opinies, sobre as quais podero escrever mais adiante na tarefa de produo escrita.
4.2.3.4 Ouvindo msica
Esta etapa tem o intuito de expor os alunos a mais exemplos de canes pertencentes ao
gnero trabalhado, a fim de demonstrar a variedade existente dentro do prprio gnero, e,
tambm, de desenvolver a sua percepo musical atravs do reconhecimento de elementos como
os instrumentos utilizados e o andamento da cano. Por andamento, referimo-nos velocidade
(lenta, mdia ou rpida) da msica. Por fim, embora seja uma questo bastante subjetiva, um
outro elemento tratado nesta etapa o clima da msica, isto , a sensao que eles tm ao ouvi-la. Podemos ver esses critrios na tarefa a seguir, trabalhada na unidade sobre msica gacha,
cujo objetivo discutir as caractersticas que diferenciam msica gacha de msica gauchesca.
1. Agora voc vai escutar quatro canes representando quatro tipos de msicas gauchescas.Acompanhe as letras, preste ateno na msica e preencha a tabela abaixo com as suasimpresses. Depois compare as suas impresses com as dos colegas.
Msica Intrumentos
( 1 / 2 ou 3 / 4 ou+)
Tempo
(rpido / mdio/ lento)
Clima
(feliz / triste /...)
Algo que
chamou a suaateno1. GaudncioSete Luas(Milonga)2. Batendo gua(Chamam)3. Lembranas(Valsa)4. Queixo Duro(Vaneira)
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2. Voc acha que h semelhanas entre essas canes e Ramilonga? E diferenas? Quais?
Esses e outros critrios de anlise da cano so, inicialmente, apresentados na primeira
aula atravs da unidade (Re)Conhecendo Gneros Musicais Brasileiros, que ser apresentada na
prxima seo, com o intuito de instrumentalizar os alunos para que sejam capazes de,
gradualmente, distinguir os gneros com os quais entraro em contato.
4.2.3.5 Produo escrita
Nesta etapa, que sugiro ser realizada em casa, os alunos so solicitados a escrever um
texto relacionado aos assuntos tratados na unidade. Entendo que uma produo escrita seja uma
boa maneira de sistematizar as discusses realizadas no decorrer da unidade, pois permite aos
alunos colocarem em prtica o que foi debatido e o que aprenderam.
Para escrever o texto, os alunos so informados sobre o gnero a ser escrito (interlocutor,
propsito e do formato do texto). O gnero artigo de opinio foi escolhido para ser trabalhado em
seis das oito unidades porque envolve fazer uso de outras fontes de informaes alm das que
esto na unidade, dessa forma convidando o aluno a buscar mais dados, mas, ao mesmo tempo, a
dar o seu ponto de vista pessoal sobre o tema abordado, utilizando-se de um registro de
linguagem adequado ao gnero. Um exemplo de tarefa que explicita essas razes pode ser
encontrado na unidade sobre rock, na qual os alunos so convidados a escrever um artigo para
uma revista para jovens sobre a gerao coca-cola do seu pas, refletindo sobre as semelhanas
e diferenas existentes em relao do Brasil.
O outro gnero textual selecionado foi carta de opinio, que considerei relevante para as
unidades sobre msica nordestina e funk carioca, pois envolvem assuntos mais controversos,como preconceitos lingustico e musical. Atravs de uma carta de opinio para um jornal e uma
revista, respectivamente, espera-se que os alunos possam posicionar-se e expressarem suas
opinies sobre os temas propostos.
4.2.3.6 Conhecendo mais
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Com base nos exemplos de materiais didticos propostos nos Referenciais Curriculares da
SEC/RS (2009), decidi incluir esta ltima etapa, a qual tem como objetivo fornecer recursos paraque o prprio aluno possa ampliar o seu conhecimento sobre o intrprete e o gnero musical
trabalhados. Para isso, alguns sites so indicados, como os que sero apresentados na unidade
sobre msica nordestina, nos quais os alunos podem ler mais sobre o gnero e o artista ou banda
trabalhados na unidade. Tambm so recomendados outros nomes representativos do gnero e
outras canes famosas, a fim de que eles possam ampliar seu repertrio. Esta etapa permite que
o aluno possa ter uma viso ainda mais abrangente do que foi estudado e conhecer outras
referncias da msica brasileira.
4.3 Anlise das tarefas
Nesta seo, apresento duas unidades completas elaboradas para o curso de Cano
Brasileira, sendo que a primeira foi idealizada para a aula de apresentao da disciplina, e a
segunda compe a quinta unidade do curso, que segue a estrutura apresentada anteriormente.
Essa escolha deve-se ao fato de que a primeira possui uma estrutura diferente e por apresentaralguns conceitos (como andamento e instrumentao) que sero abordados em todas as unidades
seguintes do curso. J a unidade sobre msica nordestina foi selecionada por trabalhar com uma
cano cuja letra apresenta representa uma variante desprestigiada da lngua portuguesa, fato que,
normalmente, levaria alguns professores a desconsiderar o seu uso, por apresentar formas
consideradas erradas da lngua na perspectiva da gramtica tradicional. Dessa maneira, espero
demonstrar que isso no deve ser considerado um impedimento, mas, sim, uma forma de
apresentar aos alunos a riqueza do portugus falado no Brasil.
4.3.1 (Re)Conhecendo gneros musicais brasileiros
Alm de introduzir alguns conceitos a fim de facilitar a identificao das caractersticas
dos gneros musicais, a unidade (Re)Conhecendo Gneros Musicais Brasileiros tem o intuito de
expor os alunos a trechos de oito canes que considero musicalmente representativas dos
gneros que sero abordados no decorrer do curso. Por musicalmente representativas, refiro-me a
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canes que sejam facilmente associadas ao seu gnero musical, permitindo o seu
reconhecimento por parte dos alunos.Na primeira tarefa, os alunos apresentam-se e conversam sobre questes relacionadas
msica e ao seu gosto musical. Espera-se que, durante a conversa, surjam diferentes nomes de
artistas brasileiros e de gneros musicais, informaes que o professor deve enfatizar na hora em
que eles apresentam o seu colega para a turma.
Na tarefa seguinte, o professor apresenta as duas colunas com os nomes das canes a
serem escutadas e dos gneros musicais, sendo que, provavelmente, alguns deles j tero sido
mencionados no atividade anterior. Aps, o professor toca trechos (aproximadamente 1 minuto e
30 segundos) de cada cano, com um pequeno intervalo para que os alunos relacionem as
colunas, e, em seguida, comparem as suas escolhas antes de ouvir novamente e antes de corrigir a
tarefa.
A fim de auxiliar a diferenciao dos gneros, so introduzidos os cinco critrios para
anlise das canes presentes na tabela, como o nmero de instrumentos, o andamento, o clima, a
interpretao vocal e o propsito da cano. O professor explica cada um desses conceitos,
preferencialmente dando exemplos para facilitar a percepo musical dos alunos. Os oito trechos
so tocados novamente a fim de que os alunos preencham a tabela com as suas impresses paradepois compar-las com um colega.
Com o objetivo de iniciar o curso, espera-se que esta unidade no s familiarize o aluno
com alguns termos musicais e com vocabulrio referente a instrumentos musicais, mas, tambm,
desenvolva a sua percepo musical, atravs do reconhecimento auditivo de elementos musicais
como o andamento, a interpretao vocal e a instrumentao.
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Programa de Portugus para Estrangeiros / UFRGS
Cano BrasileiraUnidade elaborada por Jos Peixoto Coelho de Souza
(Re)Conhecendo gneros musicais brasileiros
1. Em duplas, apresente-se para o seu colega e converse sobre as perguntas abaixo. Lembre-se deanotar as informaes que voc considerar importantes para depois apresent-las para a turma.
a) Voc gosta de msica? Por qu?b) Que gneros musicais voc mais escuta?c) Que experincia voc tem com a msica? Voc toca algum instrumento? Voc canta?
d) Voc conhece algum tipo de msica brasileira? Qual?e) Voc conhece algum cantor ou grupo de msica brasileira? Qual?f) Na sua opinio, o que a msica traz para a vida das pessoas?
2. Voc vai escutar trechos de oito canes de diferentes gneros da msica brasileira. Relacioneo nome da cano com o gnero que ela representa.
a) Cano 1 Cara Estranho ( ) Tropiclia
b) Cano 2 Chega de saudade ( ) Msica Nordestina
c) Cano 3 O Amanh ( ) Funk Carioca
d) Cano 4 Tapinha no di ( ) Bossa novae) Cano 5 Batendo gua ( ) Rock
g) Cano 6 Eu s quero um xod ( ) Samba
h) Cano 7 Roda Viva ( ) Msica Gauchesca
i) Cano 8 Alegria, Alegria ( ) MPB
3. Compare as suas escolhas com as do seu colega e veja se ele concorda com voc. Caso no,justifique com base na sua opinio e no que voc conhece da msica brasileira.
4. Agora oua os trechos novamente. Preste ateno na voz do cantor, nos instrumentos e noclima da msica. Preencha a tabela descrevendo as caractersticas que voc percebeu.
Cano Instrumentos Andamento Clima Vocal Propsito
( 1 / 2 ou 3 / 4 ou +) (rpido / mdio / lento) (feliz / triste / ...) (suave/ com vibrato
/...)
(danar / relaxar /
...)
1
2
3
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7
8
5. Compare o que voc escreveu com as anotaes do seu colega. Tente explicar a sua percepoe d a sua opinio sobre as canes que voc escutou.
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4.3.2 Msica Nordestina
A unidade sobre msica nordestina a quarta unidade do curso, logo aps a de msica
gacha, e tem como tema principal a questo do preconceito lingustico. Considero que esse seja
um assunto de grande relevncia no ensino de PLA, visto que h uma ampla diversidade de
variantes com as quais os estudantes podem ter acesso. Alm disso, o debate acerca de variante(s)
de prestgio e variante(s) desprestigiada(s) se faz presente em todas as sociedades. Essa questo
motivou a prpria escolha da cano a ser estudada (Asa Branca), pois, para muitos professores
de portugus, ela vista como um exemplo de portugus errado.
Tendo em vista esse tema, as trs primeiras perguntas da primeira etapa contextualizam a
regio nordeste e o serto nordestino, locais retratados na letra da cano, ativando o
conhecimento prvio dos alunos sobre a regio e fazendo uma comparao com o Rio Grande do
Sul, estado onde os estudantes residem. J as ltimas perguntas introduzem os temas da variao
e do preconceito lingstico, relacionando-os com o seu prprio pas.
Depois da primeira etapa, os alunos so apresentados a doze palavras extradas da letra da
cano, sendo que elas esto grafadas conforme a pronncia de uma das variantes existentes no
serto nordestino como uma forma de ilustrar a diferena do portugus falado nessa regio.Ento, os alunos so solicitados a refletir sobre qual seria a forma equivalente de cada palavra na
variante que eles esto aprendendo em Porto Alegre, para depois comparar suas ideias com um
colega. O uso do termoforma equivalenteno enunciado da tarefa pretende salientar ao aluno que
as duas formas so igualmente vlidas dentro das comunidades de fala onde so usadas.
Na tarefa 3 da segunda etapa, os alunos escutam a cano, duas ou trs vezes, com o
objetivo de preencher as lacunas da esquerda com as palavras apresentadas na tarefa anterior.
Decidi trabalhar com lacunas para desenvolver a compreenso oral dos alunos atravs doreconhecimento das palavras j trabalhadas. Por fim, os alunos devem preencher as lacunas da
direita com as palavras equivalentes na variedade conhecida por eles (de Porto Alegre) refletindo
sobre as diferenas que o seu uso traria para a letra e sobre a variante lingustica usada na verso
original.
Na etapa Compreendendo a letra, a primeira tarefa prope a inferncia do sentido de
quatro palavras mais comuns no linguajar nordestino atravs do seu contexto. No se espera que
os alunos infiram o significado exato, mas, sim, que sejam capazes de identificar o seu sentido
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aproximado. Aps, eles devem conversar sobre a ideia principal de cada um dos cinco versos, a
fim de aprofundar a compreenso do tema da cano para responder a questo seguinte, que tratados problemas da seca e dos retirantes no serto nordestino. Em posse dessas informaes, os
alunos so convidados a relacionar essas questes com a realidade do seu pas, comparando-a
com a situao brasileira. Para terminar esta etapa, aborda-se a relao entre a realidade dos
moradores do serto nordestino retratada na letra e o baio, exemplo de gnero musical tpico do
nordeste do pas, com o intuito de explicitar a ligao entre a msica brasileira e aspectos da vida
no pas.
Na etapa seguinte, so apresentadas mais quatro canes representativas de quatro ritmos
da msica nordestina: forr, ax, frevo e xote, com o intuito de compar-los e identificar as
semelhanas e diferenas entre eles. Os alunos ouvem cada cano acompanhando a letra (que
entregue junto com a tarefa) e, depois, preenchem a tabela com as informaes solicitadas, para
depois compararem as suas impresses com as dos colegas.
A produo final consiste em escrever uma carta de opinio para um jornal de Porto
Alegre, posicionando-se em relao a uma questo referente discusso sobre preconceito
lingustico realizada no decorrer da tarefa e dando exemplos da sua prpria lngua ou da cano
trabalhada, fazendo com que o aluno coloque em prtica o que foi desenvolvido nesta unidade,reflita e posicione-se quanto s diferenas existentes entre a variante considerada correta pela
gramtica tradicional e as que diferem dela.
Por fim, a ltima etapa recomenda alguns sites onde os alunos podem buscar mais
informaes sobre a regio nordeste, Luis Gonzaga, o baio e outros gneros musicais do
nordeste. Tambm so sugeridos os nomes de seis artistas conhecidos e canes famosas desses
gneros.
Neste captulo apresentei o programa do curso de Cano Brasileira, abordando os seusobjetivos, os critrios para a seleo dos gneros musicais, temas e canes trabalhados, a
estrutura do material didtico elaborado para o curso e a anlise de duas unidades do curso. Na
seo seguinte, fao algumas consideraes finais, refletindo sobre as implicaes deste trabalho
para os estudos sobre a cano no ensino de lnguas adicionais e apontando algumas questes que
poderiam ser foco de novas pesquisas na rea.
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Programa de Portugus para Estrangeiros / UFRGSCano Brasileira
Unidade elaborada por Andr Fuzer e Jos Peixoto Coelho de Souza
I Pra Comear
Converse com o seu colega sobre as seguintes perguntas:
a) Voc j ouviu falar na regio nordeste do Brasil? O que voc ouviu falar de l?b) Que diferenas voc imagina que existem entre os estados da regio nordeste e o RS?c) Voc j ouviu falar no serto nordestino? O que voc ouviu falar de l?d) No seu pas, h diferena de sotaque e de vocabulrio entre as diferentes regies?e) Essas diferenas podem caracterizar diferentes classes sociais e/ou escolaridade?
f) Na sua opinio, existe alguma forma de preconceito relacionada a essas diferenas?
II Conhecendo a Cano
1) As palavras abaixo foram extradas de uma cano, chamada Asa Branca, que retrata a vida noserto nordestino e esto grafadas conforme a pronncia de moradores da regio. Leia as palavrasabaixo e pense em qual seria a forma equivalente usada na regio de Porto Alegre. Escreva essaforma ao lado de cada palavra.
a) farta __________________ g) num __________________b) vortarei __________________ h) intonce __________________
c) prantao __________________ i) espai __________________d) fornaia __________________ j) io __________________e) int __________________ k) vort __________________f) oiei __________________ l) preguntei __________________
2) H alguma palavra que voc no conseguiu compreender? Compare suas anotaes com as deseu colega.
3) Agora oua a cano e complete as lacunas da esquerda com as palavras acima.
Asa Branca
Letra e Msica: Luis Gonzaga e Humberto Teixeira
Quando _____________ / ____________ a terra ardendoQual fogueira de So Joo
Eu ____________ / ____________ a Deus do cu, aiPor que tamanha judiao?
Que braseiro, que ___________ / ____________Nem um p de _____________ / ____________
Por ____________ / ____________ d'gua perdi meu gado
Morreu de sede meu alazo
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____________ / ____________ mesmo a asa branca
Bateu asas do serto____________ / ____________ eu disse adeus Rosinha
Guarda contigo meu corao
Hoje longe muitas lguaNuma triste solido
Espero a chuva cair de novoPra mim ____________ / ____________ pro meu serto
Quando o verde dos teus _____________ / ____________Se _________ / ____________ na ____________ / ____________
Eu te asseguro __________ / ____________ chore no, viuQue eu __________ / ____________, viu, meu corao
4) Compare as respostas com as de seu colega. Vocs preencheram com as mesmas palavras?
5) Leia a letra novamente prestando ateno no contexto em que essas palavras aparecem. Osignificado que voc tinha imaginado na tarefa 1 o mesmo?
6) Complete as lacunas da direita com as palavras usadas na tarefa 1 e leia a letra com essaspalavras. Que diferenas o uso dessas palavras trazem para a letra? Por qu?.
III Compreendendo a Letra
1) Com base no contexto da cano, escreva os significados das seguintes palavras e expresses:
a) Judiao ___________ c) Asa Branca ___________b) Alazo ___________ d) Lgua ___________
2) Em duplas, converse sobre qual a ideia principal do:
a) primeiro verso; d) quarto verso;b) segundo verso; e) quinto verso.
c) terceiro verso;
3) Esta cano aborda dois fatos muito comuns no serto nordestino. Quais so esses fatos?
4) Eles existem no seu pas tambm? Se sim, como so l? Se no, por que voc acha que noexistem?
5) Quais as semelhanas e diferenas do seu pas e do Brasil com relao a esses fatos?
6) Esta cano um baio. Qual a relao entre o tema da cano e o gnero musical?
7) O narrador desta cano fala certo ou errado? Por qu?
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5. CONSIDERAES FINAIS
Neste trabalho refleti sobre o uso da cano no ensino de lnguas adicionais, mais
especificamente no ensino de PLA, atravs da estruturao de um programa para um curso com
base na cano para falantes de outras lnguas. Para isso, demonstrei a relao entre lngua,
cultura e cano e os diferentes objetivos de ensino que o uso desse instrumento pedaggico
permite ao professor desenvolver para as suas aulas sob uma perspectiva do uso da linguagem.
Para responder a questo focalizada neste trabalho, apresentei o curso de Cano
Brasileira do Programa de Portugus da UFRGS, abordando a seleo dos gneros musicais, dos
temas e das canes, e propondo uma maneira de explorar as canes de forma mais
aprofundada. O curso trabalha oito gneros musicais brasileiros de forma cronolgica, abordando
temas e/ou questes presentes nas letras das canes trabalhadas, em uma tentativa de relacionar
a cano brasileira com aspectos da cultura do pas, j que, segundo Barbosa (2000), a cano
produzida no Brasil representa as emoes e as aspiraes do povo. Alm disso, o curso enfoca
as interfaces verbal e musical da cano, tratando-a como um gnero hbrido (COSTA, 2003),
cuja compreenso envolve lidarmos com a relao entre essas interfaces, como entre a letra e a
melodia, por exemplo.Uma questo importante abordada apenas superficialmente neste trabalho a definio da
cano enquanto gnero do discurso. Uma pesquisa mais aprofundada sobre esse tema daria um
maior embasamento cientfico para esse gnero, esclarecendo a impreciso terminolgica ainda
existente entre os termos canoe msica.
Apesar de o curso de Cano Brasileira ter sido planejado para o nvel intermedirio, a
cano enquanto recurso pedaggico pode tambm ser utilizada com alunos de nvel bsico,
expondo-os a temas relacionados cultura brasileira e linguagem autntica, lembrando, porm,que a seleo da cano e que as tarefas propostas devem ser adequadas a esse nvel de
proficincia. (BRESSAN, 2002).
Por fim, espero que a reflexo realizada neste trabalho possa contribuir para um melhor
aproveitamento da cano no ensino de lnguas adicionais, atravs do reconhecimento das suas
peculiaridades e dos variados objetivos de ensino que ela nos oferece, tendo sempre em vista a
importncia de lidarmos tanto com a sua materialidade verbal quanto no-verbal.
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