Emotion Machine

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    The emotion machine, Marvin Minsky (resenha)

    Maria Isabel Timm (CESUP UFRGS)

    [email protected]

    Resumo:Este trabalho apresenta um resumo do livro The Emotion Machine, deMarvin Minsky, que contempla um modelo de funcionamento da mente humana,

    analisado pelo autor com apoio em contribuies multidisciplinares, que vo da

    filosofia inteligncia artificial (rea de atuao do autor), entre outras das reas que

    compem as Cincias Cognitivas (lgica, lingstica, psicologia e antropologia). Arelevncia para a tecnologias educacionais reside na possibilidade de nortear

    estratgias pedaggicas de apoio cognio.

    Palavras-chave: cincias cognitivas, mentes e mquinas, modelo mental

    Abstract:This paper summarizes Marvin Minskys book The Emotion Machine, whichpresents a human mind model, analyzed through a multidisciplinary approach, like

    philosophy and artificial intelligence (authors origin area), and other Cognitive

    Sciences domains (logical, linguistic, psychology and anthropology). Relevance to

    educational technologies is the possible use of this model to develop pedagogical

    strategies to support cognition.

    1 Para cada estado mental, recursos habilitados e desabilitados

    Poucas obras prometem e cumprem objetivo to amplo - a descrio minuciosa,

    clara e eficiente de um modelo complexo para funcionamento da mente humana -quanto The Emotion Machine, do possvel decano da pesquisa e desenvolvimento dainteligncia artificial, Marvin Minsky (Minsky, 2006), professor de Artes e Cincias deMdia e professor de Engenharia Eltrica e Cincias da Computao do MassachussetsInstitute of Technology (MIT). A multidisciplinaridade da obra, j evidente na simplesleitura dos ttulos que compem a atividade profissional do autor, antecipa seu dilogocorajoso com conhecimentos, reflexes, argumentos e contra-argumentos da filosofia,da psicologia, da sociologia e outras reas do conhecimento, os quais desafiam, porvrios ngulos, a descrio do modelo proposto por Minsky, colocando em cheque atodo momento a lgica e a viabilidade de suas explicaes. Quem ganha o leitoratento, que a cada captulo v-se frente de um menu farto de trilhas de raciocnios,para percorrer caminhos de ida e volta em direo a suas prprias crenas, confrontadas

    com camadas e camadas de informaes, interpretaes e hipteses sobre a evoluo, aorganizao e a funcionalidade da mente humana, no labor permanente de processar omundo externo e interno, para enfrentar e resolver problemas da realidade.

    Minsky inicia seu livro falando de uma emoo arrebatadora, o apaixonamento,que afeta indiscriminadamente seres humanos de diferentes idades, gneros, classessociais e culturais. Pretende, com o exemplo, explicar o que chama de um especfico

    Modo para Pensar. Esta expresso, apresentada com iniciais maisculas1,possivelmente, para no ser interpretada como um simples modo ou maneira de pensar,sintetiza um estado corporal-mental onde h alguns recursos mentais acionados e

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    outros desabilitados. No apaixonamento, estariam habilitados os sensores para todas aspossveis virtudes ou belezas do ser amado (reais ou irreais) e, evidentemente,desabilitados os recursos capazes de identificar a realidade desse ser, seus defeitos edeficincias, a tal ponto que os relatos dos apaixonados (representaes mentais

    tornadas informao oral) descrevem a situao amorosa como Inacreditvel!Indescritvel! Inimaginvel! (todas estas expresses,lembra Minsky, indiretamenteinformam uma situao no exatamente real).

    O ser humano procura definir emoes, diz Minsky, ao invs de descrever o queocorre com o corpo e a mente, durante os estados emocionais. Se optasse por esta ltimaopo descrever os estados emocionais a descrio corresponderia ao acionamentode pequenos e mltiplos processos e estruturas funcionais (computacionais) da mente o que ele chama de recursos -, que sempre partem da percepo (de uma situao oufenmeno externo ou interno) e seguem fluxos variveisem direo a uma ao final(objetivo ou meta fsica ou mental), passando pela consulta e escolhaentre informaesguardadas em acervos internos (memrias), estruturadas em tipos de conhecimentos

    variados

    2

    , estratgias de soluo de problemas diversas

    3

    e/ou mltiplas formas deaprendizagem4. O fluxo estrutura um emaranhado de processos que se realimentam

    entre sie que, como estratgia geral de operao mental, so fracionados em mltiplossub-processos, para que o processamento (a soluo, ou a escolha) relativo a cada

    parte viabilize a tomada de deciso de conjunto sobre o problema final.

    Ao descrever as emoes, tratando-as como conjuntos especficos de recursosacionados ou desabilitados, Minsky contextualiza seu modelo de operao bsica do queexplicaria o funcionamento das situaes flexveis de todos os tipos de aprendizados,das trocas de humor (normais ou patolgicas), ou das tomadas de conscincia doindivduo sobre si mesmo ou sobre o mundo, bem como a natureza criativa dainteligncia humana e vrios outros itens caractersticos do funcionamento da mente.

    Trata-se da habilidade do ser humano em alternar naturalmente (com ou semconscincia) entre um estado e outro5, ou seja, recrutar recursos mentais, de formaisolada ou em conjunto com outros recursos, medida de sua necessidade,desabilitando-os de forma parcial ou integral - instantaneamente, se for necessrio.

    2 Mecanismo para alternar estados

    Explicado o cenrio do modelo (mltiplos recursos acionveis/desacionveisviabilizando a gerao de estados mentais, emocionais e comportamentais) e a operao(alternncia entre eles), falta entender, no modelo bsico de Minsky, como isso feito.

    E a entra a maquinaria. Minsky apresenta um modelo bsico de processamentobaseado em regras do tipo se...faa (mquinas if-do), sobre um conjunto formado porum Mdulo Crtico, que reconhece o tipo de problema e aciona o respectivo Modo paraPensar, o qual far parte de um acervo de possibilidades disponveis em um MduloSeletor. Esse acervo construdo desde a infncia do crebro infantil, em direo ao doadulto, que contm, segundo o autor, pelo menos seis nveis de procedimentos mentaispossveis e muitas vezes imbricados (os nveis podem se confundir, no nvel das micro-decises): 1) reaes instintivas; 2) reaes aprendidas; 3) pensamento deliberativo; 4)pensamento reflexivo; 5) pensamento auto-reflexivo; 6) emoes auto-conscientes.Essas seis camadas possuem uma mesma natureza computacional, que opera com base

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    no mesmo tipo de Sistema Crtico-Seletor, cada uma das quais dedicada a tiposespecficos de problemas e respectivas estratgias de enfrentamento.

    Como se percebe de imediato nesse modelo de diferentes camadas deprocessamento de informaes, h um processo ascendente que parte de um territrio deproblemas relativos a comportamentos instintivos em direo a um conjunto deprocedimentos mentais que fundamentam valores, censuras (em relao aoscomportamentos sociais) e ideais. Os quatro ltimos estgios, ligados tica e aosvalores, so completamente aprendidos. Os primeiros do conta de caractersticas inatasda mente humana. Os procedimentos intermedirios (pensamento deliberativo epensamento reflexivo) so o territrio operacional, onde esto os mtodos para resolverproblemas, conflitos e objetivos da vida prtica, contendo muito do senso comumcotidiano. Na figura 1, uma representao do mecanismo bsico de reconhecimento desituao e acionamento de estado mental. Na figura 2, uma representao visualcomentada do modelo de seis nveis de Minsky, que d conta dos procedimentosmentais possveis.

    Figura 1 Sistema bsico de operao de alternncia entre estados mentais propostopor Minsky

    Figura 2 Modelo de seis nveis de atividade mental, proposto por Minsky

    identificando os mesmos nveis, em termos de procedimentos possveis

    A alternncia de estados, identificada com humores, disposies, ou formasespecficas de comportamento, um processo constante e permanente, ao longo da vidacotidiana dos indivduos, podendo, entretanto, manifestar-se de forma patolgica, naforma de fobias, compulses, etc., que, apesar de no serem o foco do autor, aparecemcomo descries e ajudam a compreender as manifestaes concretas de sua existnciano comportamento humano. O Sistema CrticoSeletor, que viabiliza a de troca de umestado a outro, assume vrias caractersticas para reconhecer problemas, como porexemplo um Corretor, o qual avisa ao indivduo que est fazendo algo que deve ser

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    interrompido (algo comopare agora porque sua mo est se aproximando do fogo!); ouum Supressor, que impede a ao perigosa (no movimente sua mo!); ou um Censor,que antecipa e impede a ao (nem pense nisso!). O sistema tambm baliza os nveis deurgncia para recrutamento dos recursos necessrios. o caso da dor exemplo do

    prprio Minsky que aciona um objetivo imediato, do tipo livre-se desta dor!, para seimpor a qualquer outro objetivo que esteja disputando recursos mentais do indivduo,gerando inclusive um nvel de frustrao pela perda de outras opes, que passa a fazerparte talvez de um outro estado de nvel mais intenso, o estado de sofrimento, no qualuma cascata de fatos psicolgicos aciona recursos de todas as reas do crebro.

    3 Iluso de conscincia e de presente

    Minsky aborda a questo da conscincia tratando de descartar, primeiramente,possveis sentidos misteriosos para o fenmeno. Insiste em que a busca de descriescomplexas, porm precisas como no caso das emoes ajuda a observar ecompreender o conjunto de processos envolvidos nisso que chamou uma grandesuitcase word

    6, conscincia, dentro da qual pensadores de vrias culturas e pocas

    depositaram suas prprias definies, muitas vezes com intenes de sntese global designificados, no por acaso, sempre incompletos. Considerando essas mltiplastentativas de definio como um exemplo da metfora das mltiplas rvores, cuja visoisolada impede a compreenso da floresta, Minsky prope desempacotaresse conceito,discretizando seus mltiplos componentes. No desempacotamento, Minsky comeadefinindo o territrio da intencionalidade das aes e pensamentos conscientes. Oprocessamento consciente de busca de alguma soluo s vai ocorrer intencionalmente, mesmo que seja feito de forma automtica quando os processosinconscientes de soluo no funcionam. Esse processo inicia no mbito de processos

    mentais de alto nvel, os quais: usam modelos que o indivduo faz de si mesmo (soauto-reflexivos, permitindo ao indivduo avaliar suas condies para enfrentar oproblema); tendem a ser mais seriais e menos paralelos (o fluxo de pensamentoconsciente, ou sua percepo, serial); tendem a usar descries simblicas (modelosmentais que relacionam relaes espaciais, numricas e semnticas entre os fenmenos,independente de valor cultural); fazem uso da maioria das memrias recentes (anlisedos registros sobre a situao)7.

    Ento, supondo-se um problema cujas solues imediatas no funcionaram (umobjetivo), a maquinaria mental daria incio a um procedimento consciente (no sentido deintencional). Nesse caso, o Sistema Crtico-Seletor inclui um detector de problemasespecial, que reage quando o sistema usual no obtm o resultado esperado e aciona

    outros processos de alto nvel8

    , para examinar (tomar conscincia) do problema. Estesseriam recursos mnimos para a estruturao de um sistema reflexivo9, que nos humanos viabilizado pela capacidade dos indivduos de representar mentalmente seus prpriose mltiplos estados mentais, descritos com seus conhecimentos e aptides, habilidades

    etc., tanto quanto relacionar estes auto-modelos com representaes mentais depossveis estados de outros seres ou fenmenos, ao redor de si (eu e a minha

    capacidade para resolver este ou aquele problema).

    Sendo a conscincia, portanto, um processo intencional de representao ereconhecimento de modelos mentais internos e externos, seguidos do escrutnio

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    minucioso de ambos (modelos interno e externo), na busca de equacionamento paraobteno de objetivos (soluo de problema), Minsky descreve sensao deconscincia, como iluso de imanncia:a percepo interna do acompanhamento, pelamente humana, desse suposto fluxo ininterrupto, que seria na verdade uma repetio

    multiplicada dos processos de representao mental-reconhecimento-escolha. A ilusode imanncia seria produto da forma como os recursos mentais esto organizados. Navida cotidiana, a maioria das questes que os humanos fazem para dar conta das aesprticas, conhecidas, chegam s camadas de alto nvel de processamento mental antesmesmo que o indivduo tenha tempo de se perguntar sobre elas. A memria humanaexplica entrega a informao correta antes de receber o processo completo da

    pergunta. Isso explica a iluso de continuidade (imanncia) e significa que o chamadomomento presenteno seno umprocesso permanente de varredura sobre a memriarecente, com checagem sobre a informao acerca do que mudou e do que permaneceu.Esse procedimento carrega a iluso de que a informao instantnea e ilude apercepo sobre o processo de atualizao de auto-modelos que o indivduo faz de simesmo. O que ocorre a ao de um robusto sistema de reconhecimento do universo

    interno e externo, com atualizao em tempo real da representao mental de ambos.Todos esses processamentos, por mais instantneos que sejam, estaro sempre com umpequeno delay10, algumas fraes de segundo atrs (no tempo) da chamada realidade.Portanto, o que os humanoschamamrealidade no senorepresentao mentalsobreo processo de percepo, reconhecimento e interpretao de si mesmo e de suainterao com o mundo externo. E o presenteno seno a iluso com que a mentehumana representa internamente a torrente de informaes que so processadas emtempo real, transformando-a em pedaos de relevncia, que vo estruturar a memria.

    4 Aprender, antecipar, deliberar

    Se o sistema bsico de reconhecimento e acionamento de recursos (se ...faa)consegue dar conta de um bom nmero de problemas, no o far para todas as situaes.Na maioria das vezes, diz Minsky, ser necessrio antecipar o resultado, para poderavaliar previamente a adequao da resposta. Esta mais uma camada defuncionalidades mentais, que permite agregar o se (situao) com o faa (ao) eresultar em um ento (resultado antecipado). A repetio desse pequeno mdulo leva aum cenrio de mltiplos planos para enfrentar o futuro, e, no limite, caracteriza umprocesso autctone bsico de aprendizado, que o ser humano primitivo com certezadeve ter sido obrigado a vivenciar, para prever comportamento de animais, ou aconseqncia da ingesto de determinado alimento.

    Esta seria ainda, segundo lembra Minsky, a forma bsica como os animaisaprendem comportamentos, atravs de regras se-faa-ento (if-do-then), com osrespectivos reforos (prmios/punio como reforos) relacionados ao que se desejaensinar/treinar. Certamente uma estratgia que no d conta da aprendizagem dequestes complexas, mas sua habilitao nunca abandona o processo humano denecessidades de aprendizagem e continuamente d conta de processos ou tipos deaprendizagem que ocorrem na segunda camada do modelo de mente humana em seisnveis (figura 2, acima), que a camada das reaes aprendidas.

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    Minsky segue estruturando o modelo das camadas de processamento deinformao que se sucedem, para enfrentar necessidades mais complexas, como suportea tomadas de deciso, ou deliberaes. Nem sempre o caminho da deliberao unvoco. Muitas vezes deliberaes implicam em escolhas11entre uma ou outra situao

    futura. O raciocnio descreve escolha entre situaes prticas de vida e se aplica tambmpara toda e qualquer ao deliberada, como construir um arco a partir da escolha entreum conjunto de peas de madeira (exemplo usado no livro pelo autor). Ser necessrioantecipar mentalmente, ou fisicamente, quais sero as peas escolhidas e sua posio, naconstruo final e escolher o que seria o melhor procedimento, aes que implicamclculos mentais relativos a espao e otimizao do tempo. Certamente no h umatomada de conscincia desses clculos, diz Minsky12. como se algum sentasse frente de um terminal e jogasse um jogo virtual, manipulando suas interfaces de cones,cliques e setas, sem saber o que acontece por trs desse jogo, para que tudo funcione.

    5 Imaginar: informao prvia e conhecimento de senso comum

    Em toda a base do modelo de Minsky, uma produtiva combinao de mltiplosprocessos, em diversos nveis e sub-nveis de processamento, viabiliza o sistema if-do,que por sua vez viabiliza o reconhecimento e a interpretao de cenas visualizadas peloshumanos. Todas as interpretaes sero mediadas pelas informaes internas do prpriosistema, que realimenta cada pequeno passo com informaes do contexto(da situaopresenciada, com processamento em tempo real) e informaes da memria(do prprioindivduo). Por exemplo: o conjunto de processos que vai resultar na chamada visohumana seria uma combinao e adaptao dos sistemas bsicos, constitudo de umaseqncia de mini-choques de reconhecimento de cada parte, que inclui um possvelsensor de imagem exercitando msculos especficos para comear o processo de

    visualizao identificando pontos separados; um buscador de caractersticas agrupariaesses pontos em texturas e bordas; um buscador de regies agruparia as bordas etexturas em regies e formas; um buscadorde objetos as reuniria em possveis objetos;um analisador de cenas identificaria as coisas familiares; e um descritor de cenasdescreveria suas relaes espaciais. Tudo isso mediado pelas sugestes de interpretaode cada etapa, que predispem ao reconhecimento e, se necessrio, complementam aspartes que faltam, para obter uma informao familiar, compreensvel.

    O crebro humano, ento, descrevea cena identificada, a partir de suposies designificados, ou de lembranas sobre objetos familiares, imaginando de acordo comsua informao prvia - aquilo que no est presente ou no fez parte da cena anterior.Uma mquina de predies seria capaz de imaginar uma ao futura, com base na

    escolha em um acervo de representaes anteriores dessa situao (o que, alis, muitosgames j fazem). O que faltaria a essa mquina seria exatamente o senso comum, quenorteia a validao de uma ou outra cena imaginada, e contextualiza os limites daimaginao e da antecipao13. No caso da mente humana, ao intercambiar umainformao, de qualquer tipo, o indivduo estar fornecendo ou recebendo um fantsticoacervo de conhecimento de senso comum, inter-relacionado com a situao em si e com

    cada parte da cena ou da fala. Isso no inclui apenas conhecimentos naturalistas, oufsicos, mas inclusive emocionais, como por exemplo a auto-confiana da pessoa queatender o telefone; ou estratgicos (ser que alcano daqui o aparelho telefnico queest no alto?), entre outros. So mltiplos tipos de conhecimento que se emaranham no

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    conjunto da circunstncia, implicando, cada um, sua prpria carga de inmeros e inter-relacionados passos do tipo se-faa-ento: preciso ter as habilidades motoras; estarapto para fazer e/ou revisar planos de ao; antecipar peso, forma ou textura, ajustandoa musculatura para fazer frente necessidade; prover sistemas cognitivos que no esto

    sequer descritos para associar fragmentos de conhecimento de mltiplas rea, lidandocom nveis diferenciados de incerteza; auto-conscincia de suas prprias habilidades,entre tantos outros conhecimentos envolvidos. E, sobretudo, o treinamento dacapacidade de representao mental, produzir e agilmente localizar memria sobretodos esses conhecimentos, que esto, segundo Minsky, na base do processo deaprendizagem.

    O modelo de mente proposto por Minsky descreve, portanto, um motor do tipoif-do-thenpara a troca de estados, ou de fluxos de pensamentos, e busca novas soluesquando encontra obstculos. aos obstculos (transformados emobjetivos/desejos/metas) que esse motor responde, com uma nuvem de recursos, ououtra, segundo o que for indicado pelo sistema Critico-Seletor (identifica um obstculo

    e seleciona quais sero os recursos recrutados ou desabilitados). Em uma formulaosimples, possivelmente estruturadora das principais estratgias de aprendizado, osistema teria o seguinte fluxo de aes: seo problema parecer familiar, useraciocniopor analogia (solues que j funcionaram anteriormente, em situaes similares); separecer no familiar, alterea forma como voc o est descrevendo (implica alteraesna representao mental do problema); separecer muito difcil, dividao problema emmltiplas partes (implica o estabelecimento de sub-objetivos, mais fceis de serematingidos, por etapas); seainda assim parecer muito difcil, substitua-o por um problemamais simples (implica a tentativa de simplificao, atravs de modelos de representaocom menos variveis); senenhuma das anteriores funcionar,peaajuda.

    Evidentemente, cada uma das etapas descritas exige seu prprio plantel deCrticos-Seletores, para registrar decises, avaliar erros em escolhas anteriores e, em

    cada parte, perpassar os seis nveis da mente, cada um com suas respectivascaractersticas inatas e/ou aprendidas, com repertrios de informaes e memriasrelativas a novamente - todos os modelos mentais que o prprio indivduo mantm eatualiza sobre si mesmo e todos os modelos mentais sobre as hipteses que estruturousobre a situao em pauta, incluindo-se as informaes de conhecimento de sensocomum e o contexto cultural. Agreguem-se ainda a esse j exaustivo acervo mental asestratgias de indexao e busca de informaes guardadas na memria (vrias entradassemnticas, mediadas pelos estados emocionais de sua aquisio). Agreguem-setambm as estratgias pessoais de cada indivduo de auto-motivao para garantir seucontrole, na medida do possvel, sobre a competio entre recursos mentais.14Agreguem-se as crenas intuitivas da prpria percepo humana (como a de umhomnculo que controla todo o sistema), ou da cultura onde se situa o indivduo.

    Agreguem-se as diferenas pessoais que tornam praticamente invivel definir umpadro de auto-controle, no que toca alternncia entre estados. E finalmenteagreguem-se caractersticas geradas pela circunstncia evolutiva da cognio, que emalgum momento cristalizou padres falsamente antagnicos15, e a est a mquinahumana de emoes, descrita por Marvin Minsky. Seu estudo viabiliza a possibilidadede identificao de necessidades relacionadas tanto ao ensino, quanto aprendizagem,no sentido de que descreve funcionalidades e nveis de processamento mltiplos,diversificados e capazes de dar conta das diferenas entre pblicos e indivduos. Apontapara o dilogo intenso e complexo entre informtica e educao, em termos de aplicaoe de temas para pesquisa.

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    Notas de texto

    1No ingls: Way to Think

    2Conhecimentos podem ser episdicos(relativos a fatos vivenciados),procedimentais(relativos a processos, formas de fazer)ou declarativos (narrativas vivenciadas), e sub-divises desses tipos. Tambm podem serexpertise positiva (deu certo o que eu fiz);

    Expertise negativa (no deu certo, evitar);habilidade de debug (alternativas de soluo,hipteses); habilidades adaptativas (novo, improvisar).

    3Tratando-se de estratgias bsicas de soluo de problemas, o ser humano pode operardividindo este problema em partes menores, procurar em sua memria quais foram assolues usadas em problemas semelhantes, operar por tentativa e erro ou simplesmenteimprovisar. Qualquer uma dessas opes implica o recrutamento de um conjunto derecursos em diversos nveis mentais e operacionais e ser possvel alternar entre eles,acionando um estado mental diferenciado, ou, na terminologia do livro, um novo Modopara Pensar. Esta alternncia , em si, uma habilidade inata, mas que amadurece, com aaprendizagem e por isso as crianas vo aprendendo, com o tempo, a acionar ousuprimir recursos (estados mentais), adquirindo maior habilidade para combin-los,quase que infinitamente.

    4Aprendizagem pode ocorrer, nos humanos, por ao de imprimersiniciais (pais/tutorescom acesso primeira infncia que descrevem e valorizam o ambiente inicial dacriana); por analogia (busca em casos, scripts de situaes ou solues semelhantes);por tentativa e erro; por repetio/evitao (expertise positiva/negativa); por importaode estratgia de raciocnio de outras reas do conhecimento ou outras camadas damente; por extenso de caractersticas de partes a outras partes de uma mesma estrutura(analogias paralelas, ou panalogias, termo cunhado pelo autor); por knowledge-lines(K-lines), que so espcies de fotografias de um determinado estado mental quandoresolveu um problema, que servem para validar a relevncia dos mecanismos crticoseseletoresusados na situao; entre outros processos mentais que interferem no fluxo doprocesso de percepo do problema reconhecimento do problema acionamento desoluo.

    5 Trata-se de uma habilidade parcialmente inata, que aprendida e treinadaintensamente, ao longo da vida inteira dos humanos.

    6 Suitcase word: palavra container, em traduo livre, significando uma palavra ouexpresso que abrange mltiplas possibilidades de definio, nem sempre excludentes e,possivelmente, como se ver, complementares. Outros exemplos de suitcase wordseriam tambm inteligncia ou subjetividade.

    7O leitor pode bem imaginar a si mesmo parando para pensar intencionalmente emalgo que o desafia. Provavelmente uma parte do seu pensamento estar voltado aexaminar sua prpria capacidade de enfrentar a questo. Em seguida, estar examinandoo problema de forma sinttica, estabelecendo possveis relaes entre os fatos oufenmenos que o compem e avaliando os registros recentes sobre a situao, pormltiplos lados e formas de abordagem.

    8 Os processos de alto nvel a que se refere o texto so relacionados s quatrocaractersticas citadas acima: auto-representaes do indivduo, seriais, com descries

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    simblicas das relaes entre as variveis do problema e com acesso a memriasrecentes sobre o fato.

    9 Um sistema reflexivo supe processamento consciente, ou seja, pressupe aelaborao de representaes internas ao sistema (modelos mentais) acerca das prpriascondies do autor do pensamento consciente para enfrentar o problema. Este um dosproblemas cruciais da IA, a respeito do qual Minsky reflete no livro. Em todo o caso,para o autor, est claro que o crebro humano no evoluiu para servir como uminstrumento de auto-observao, mas sim para resolver problemas prticos, comoalimentao, defesa e reproduo.

    10Delay: atraso entre input e output

    11Escolhas podem ser feitas, por exemplo, atravs da comparao entre pesos (valores)entre as variveis presentes em uma ou outra soluo, o que implica em clculo deprobabilidades de melhor escolha, geralmente feito de forma no consciente peloshumanos, mas importante em termos de modelagem das tomadas de deciso, emmquinas.

    12Tomadas de deciso retomam a questo bsica de luta ou fuga, dentro de suacomplexidade e, no limite, se apresentam ao ser humano a cada momento da vida, emquestes que podem ser bsicas como escolher ir a p ou de nibus ao trabalho, ou maisintrincadas, como decidir se vale a pena ou no comprar um carro novo. Osinstrumentos dessa capacidade so estratgias mentais de apoio tomada de deciso,como as rvores de deciso; ou estratgias de otimizao dos tempos de anlise entreopes (estruturas de memria, sub-objetivos, anlise de problemas semelhantes, entreoutros).

    13O senso comum uma espcie de calcanhar de Aquiles da IA, porque, como lembraMinsky, uma pessoa que atende ao telefone precisa reconhecer o som do toque, levantaro fone, responder s perguntas que forem feitas, compreender o cdigo e a semntica dafala, dominar o contexto das formalidades envolvidas nos cumprimentos sociais, entreoutros tantos requisitos que parecem bvios, mas que, se precisarem ser programadosem mquina, imporo uma esforo inimaginvel de programao, incluindo-se a o fatobsico de reconhecer um aparelho telefnico, se ele mudar de posio na pea, ou for decor diferente.

    14Exemplo de disputa entre recursos mentais:por que esse livro e no dormir? SegundoMinsky, nem sempre as estratgias para solucionar estas disputas por recursos sonobres, porque a primitiva mente humana prefere pequenos enganos que prometemganhos imediatos (vou ler o livro para parecer esperta em relao aos colegas,exemplo adaptado do livro de Minsky), do que nobres ideais, que exigem esforo eganhos relativos.

    15A respeito de falsos opositores: em todas as culturas, tende-se a opor palavras ouconceitos, como triste em contraposio aalegre; pobre em contraposio arico;pensamento em contraposio asentimento. Minsky chama ateno para o fato de quepossivelmente no exista a palavra tricotomia, em nenhuma lngua, mas h dicotomia,na maioria delas, o que aponta para este padro de cognio intuitivo.

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    Referncia

    MINSKY, Marvin. The Emotion Machine. New York, London, Toronto e Sydney:Simon & Schuster, 2006.