Estatuto Do Desarmamento

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  • ACADEMIA DE POLCIA CIVIL DO DISTRITO FEDERAL

    ESTATUTO DO DESARMAMENTO

    SRGIO BAUTZER

    ANDR PORTELA

    Braslia

    2013

  • proibida a reproduo total ou parcial do contedo deste material todos os direitos reservados. 2

    ESTATUTO DO DESARMAMENTO

    Crimes do Estatuto do Desarmamento

    O art.12doEstatutodoDesarmamento(Lein10.826/2003) trata da posse ilegal

    de arma de fogo, acessrios e munies de uso permitido. Se for arma de uso restrito,

    estar congurado o crime do art. 16.

    Posse irregular de arma de fogo de uso permitido

    Dispe o art. 12 da lei em estudo:

    Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessrio ou

    munio, de uso permitido, em desacordo com determinao legal ou

    regulamentar, no interior de sua residncia ou dependncia desta, ou,

    ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsvel

    legal do estabelecimento ou empresa:

    Pena deteno, de 1 (um) a 3 (trs) anos, e multa.

    Diante da pena imposta no preceito secundrio, possvel a concesso de

    ana , pela Autoridade Policial, aps a lavratura do Auto de Priso em Flagrante,

    na hiptese de crime de Posse Irregular de Arma de Fogo de Uso Permitido.

    O objeto jurdico, que o bem protegido pela norma, a incolumidade

    pblica (segurana da coletividade). Inclume signica livre de perigo.

    Objeto material, que a coisa sobre a qual recai a conduta do criminoso, no

    caso, arma de fogo, acessrio ou munio de uso permitido.

    Sujeito ativo: quando se tratar de posse de arma de fogo, acessrio ou

    munio no interior de residncia ou dependncia desta, o crime poder ser praticado

    por qualquer pessoa. De outra parte, o crime ser prprio quando se tratar de pessoa na

    posse de arma de fogo, acessrio ou munio em seu local de trabalho, pois apenas

    titular ou o responsvel legal pelo estabelecimento podem pratic-lo.

    Sujeito passivo (vtima) do crime a coletividade.

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    Elementos do tipo: possuir e manter sob sua guarda; a doutrina

    diferencia as condutas dizendo que possuir estar na posse e manter sob a guarda

    manter sob sua vigilncia.

    Arma de fogo de uso permitido aquela cuja utilizao autorizada a

    pessoas fsicas, bem como a pessoas jurdicas, de acordo com as normas do Comando

    do Exrcito e nas condies previstas na Lei n 10.826, de 2003. Cuida-se de norma

    penal em branco. O Decreto n 3.665/2000 dene quais so as armas de fogo

    permitidas.

    A arma de fogo, acessrio e munio devem estar em perfeitas condies de

    uso. H necessidade de percia para a comprovao da prtica do crime. Ex.: exame de

    ecincia realizado na arma de fogo.

    Elemento normativo do tipo: em desacordo com determinao legal ou

    regulamentar, ou seja, em desacordo com o Estatuto do Desarmamento e com seus

    regulamentos.

    Basicamente, para ter arma em casa (posse de arma), precisa-se de

    autorizao da Polcia Federal, com o aval do Sinarm.

    Para adquirir arma de fogo de uso permitido, o interessado dever, alm de

    declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos:

    a) comprovao de idoneidade, com a apresentao de certides negativas

    de antecedentes criminais fornecidas pela Justia Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e

    de no estar respondendo a inqurito policial ou a processo criminal, que podero ser

    fornecidas por meios eletrnicos;

    b) apresentao de documento comprobatrio de ocupao lcita e de

    residncia certa;

    c) comprovao de capacidade tcnica e de aptido psicolgica para o

    manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento da Lei n

    10.826/2003.

    O Sinarm expedir autorizao de compra de arma de fogo aps atendidos

    os requisitos anteriormente estabelecidos, em nome do requerente e para a arma

    indicada, sendo intransfervel esta autorizao.

    A aquisio de munio somente poder ser feita no calibre correspondente

    arma registrada e na quantidade estabelecida em regulamento.

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    A empresa que comercializar arma de fogo em territrio nacional

    obrigada a comunicar a venda autoridade competente, como tambm a manter

    banco de dados com todas as caracterscas da arma e cpia dos documentos dispostos na

    lei.

    A empresa que comercializa armas de fogo, acessrios e munies responde

    legalmente por essas mercadorias, cando registradas como de sua propriedade

    enquanto no forem vendidas.

    Ser aplicada multa empresa de produo ou comrcio de

    armamentos que realizar publicidade para venda, estimulando o uso

    indiscriminado de armas de fogo, exceto nas publicaes especializadas.

    A comercializao de armas de fogo, acessrios e munies entre pessoas

    fsicas somente ser efetivada mediante autorizao do Sinarm.

    Elemento espacial (modal) do tipo: a pessoa pode apenas ter a arma em

    casa. No local de trabalho, o nico que tem a posse o proprietrio ou responsvel legal

    pelo estabelecimento da pessoa jurdica.

    Acerca do tema, vale a pena conferir julgado da 6 Turma do STJ:

    Apreenso de arma em caminho. Tipicao. O veculo prossionalmente

    no pode ser considerado local de trabalho para tipicar a conduta como

    posse de arma de fogo de uso permitido (art. 12 da Lei n 10.826/2003). No

    caso, um motorista de caminho prossional foi parado durante scalizao

    da Polcia Rodoviria Federal, quando foram encontrados dentro do veculo

    um revlver e munies intactas. Denunciado por porte ilegal de arma de

    fogo de uso permitido (art. 14 do Estatuto do Desarmamento), a conduta foi

    desclassicada para posse irregular de arma de fogo de uso permitido (art.

    12 do mesmo diploma), reconhecendo-se, ainda, a abolitio criminis

    temporria. O entendimento foi reiterado pelo tribunal de origem no

    julgamento da apelao. O Min. Relator registrou que a expresso local de

    trabalho contida no art. 12 indica um lugar determinado, no mvel,

    conhecido, sem alterao de endereo. Dessa forma, a referida expresso no

    pode abranger todo e qualquer espao por onde o caminho transitar, pois tal

    circunstncia est sim no mbito da conduta prevista como porte de arma de

    fogo. Precedente citado: HC n 16.052-MG, DJe

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    9/12/2008. REsp 1.219.901-MG, Rel. Min. Sebastio Reis Jnior,

    julgado em 24/4/2012.

    A autorizao para o proprietrio possuir arma no interior do

    estabelecimento, e no para ele portar. Se seu funcionrio possuir arma no local,

    responder pelo crime previsto no art. 14 ou no art. 16 do Estatuto, dependendo se a

    arma permitida ou proibida.

    Elemento subjetivo do tipo: crime doloso.

    Consumao e Tentativa: a consumao se d quando o agente entra

    ilegalmente na posse da arma.

    Para a maioria da doutrina, crime de mera conduta (no tem resultado

    naturalstico) e permanente.

    No cabe tentativa.

    Entrega das Armas

    Houve um perodo, que se estendeu de 23/12/2003 a 25/10/2005, para

    entrega das armas de fogo. Vrias medidas provisrias prorrogaram o prazo de entrega

    da armas de fogo para a Polcia Federal.

    Durante o prazo de que a populao dispunha para entreg-las Polcia

    Federal, o delito de posse de arma de fogo no foi claramente abolido pela referida

    norma.

    Diante das prorrogaes, surgiram questionamentos se havia ocorrido a

    abolitio criminis ou a anistia. A jurisprudncia, tanto do STJ como do STF, diz que

    houve a chamada abolitio criminis temporria, tambm chamada de descriminalizao

    temporria ou vacatio legis indireta.

    Houve retroatividade para descriminalizar a posse ilegal de arma de fogo na

    vigncia da lei anterior (Lei n 9.437/1997)?

    No STJ prevalece o entendimento de que a abolitio criminis temporria

    retroativa. Seno vejamos o que foi decidido no HC n 100.561/MT Rel. Ministra Maria

    Thereza de Assis Moura, 6 Turma:

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    Penal. Processual penal. Habeas corpus. 1. Crime de posse de armas.

    Crime come do na vigncia da Lei n 9.437/1997. Vaca o Legis.

    Aplicao retroativa. Possibilidade. Extino da punibilidade. 2. Crime de

    receptao. Trancamento da ao penal. Falta de prova da origem ilcita dos

    bens. Alegaes que dependem de aprofundada incurso no conjunto

    probatrio. Matria de mrito. Habeas corpus. Meio incompatvel. 3. Ordem

    concedida em parte.

    1. Esta Corte j rmou entendimento no sentido de que a vaca o legis

    estabelecida pelos arts. 30 e 32 da Lei n 10.826/2003, para a regularizao

    das armas dos seus proprietrios e possuidores, reconhecida hiptese de

    aboli o criminis temporalis e aplica-se retroativamente aos delitos de posse

    de arma praticados sob a vigncia da Lei n 9.437/1997.

    2. O habeas corpus no se presta a uma aprofundada incurso no conjunto

    probatrio, de molde a constatar a inocorrncia do crime antecedente ao de

    receptao. Matria probatria e a ser analisada em sede de apelao, j

    interposta.

    3. Ordem concedida, em parte, apenas para declarar extinta a punibilidade

    do paciente relativamente ao crime previsto no art. 10, 2 da Lei n

    9.437/1997, mantendo, todavia, a imputao pelo crime de receptao.

    Porm no STF, segundo o Informativo n 494, foi decidido:

    A Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia o reconhecimento da

    extino da punibilidade com fundamento na supervenincia de norma penal

    descriminalizante. No caso, o paciente fora condenado pela prtica do crime

    de posse ilegal de arma de fogo de uso restrito (Lei n 9.437/1997, art. 10,

    2), em decorrncia do fato de a polcia, em cumprimento a mandado de

    busca e apreenso, haver encontrado uma pistola em sua residncia. A

    impetrao sustentava que durante a vaca o legis do Estatuto do

    Desarmamento, que revogou a citada Lei n 9.437/1997, fora criada situao

    peculiar relativamente aplicao da norma penal, haja vista que concedido

    prazo (Lei n 10.826/2003, arts. 30 e 32) aos proprietrios e possuidores de

    armas de fogo, de uso permitido ou restrito, para que regularizassem a

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    situao dessas ou efetivassem a sua entrega autoridade competente,

    de modo a caracterizar o instituto da aboli o criminis. Entendeu-se que a

    vacatio legis especial prevista nos arts. 30 e 32 da Lei n 10.826/2003 (Art.

    30. Os possuidores e proprietrios de armas de fogo no registradas devero,

    sob pena de responsabilidade penal, no prazo de 180 dias (cento e oitenta)

    dias aps a publicao desta lei, solicitar o seu registro apresentando nota

    scal de compra ou a comprovao da origem lcita da posse, pelos meios de

    prova em direito admitidos. Art. 32. Os possuidores e proprietrios de armas

    de fogo no registradas podero, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias aps

    a publicao desta lei, entreg-las Polcia Federal, mediante recibo e,

    presumindo-se a boa-f, podero ser indenizados, nos termos do

    regulamento desta lei.), no obstante tenha tornado a pica a posse ilegal de

    arma de fogo havida no curso do prazo que assinalou, no subtraiu a

    ilicitude penal da conduta que j era prevista no art. 10, 2, da Lei n

    9.437/1997 e continuou incriminada, com mais rigor, no art. 16 da Lei n

    10.826/2003. Ausente, assim, estaria o pressuposto fundamental para que

    se vesse como caracterizada a abolitio criminis. Ademais, ressaltou-se que o

    prazo estabelecido nos mencionados dispositivos expressaria o carter

    transitrio da atitipicidade por ele indiretamente criada. No ponto,

    enfatizou-se que se trataria de norma temporria que no teria fora

    retroativa no podendo congurar, pois, abolitio criminis em relao aos

    ilcitos cometidos em data anterior. HC n 90.995/SP, Rel. Min. Menezes

    Direito, 1 Turma, 12/2/2008. (HC n 90.995)

    Com a edio da Lei n 11.706 foi dado um novo prazo para regularizao

    de armas. A lei presume a boa-f e admite o pagamento de indenizao, porm o agente

    deve agir de maneira espontnea. Se no houver entrega de maneira espontnea, por

    vontade livre do agente, a conduta tpica estar congurada. Dispe o art. 30 da lei em

    estudo:

    Art. 30. Os possuidores e proprietrios de arma de fogo de uso permitido

    ainda no registrada devero solicitar seu registro at o dia 31 de dezembro

    de 2008, mediante apresentao de documento de identicao pessoal e

    comprovante de residncia xa, acompanhados de nota scal de compra ou

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    comprovao da origem lcita da posse, pelos meios de prova admi dos

    em direito, ou declarao rmada na qual constem as caractersticas da

    arma e a sua condio de proprietrio, cando este dispensado do pagamento

    de taxas e do cumprimento das demais exigncias constantes dos incisos I a

    III do caput do art. 4 desta Lei. Para ns do cumprimento do disposto no

    caput deste artigo, o proprietrio de arma de fogo poder obter, no

    Departamento de Polcia Federal, ceticado de registro provisrio, expedido

    na forma do 4o do art. 5o desta Lei. (NR)

    Tal norma se estende s munies e acessrios, apesar de no haver meno.

    Os arts. 31 e 32 da lei em comento regem:

    Art. 31. Os possuidores e proprietrios de armas de fogo adquiridas

    regularmente podero, a qualquer tempo, entreg-las Polcia Federal,

    mediante recibo e indenizao, nos termos do regulamento desta Lei.

    Art. 32. Os possuidores e proprietrios de arma de fogo podero entreg-la,

    espontaneamente, mediante recibo, e, presumindo-se de boa-f, sero

    indenizados, na forma do regulamento, cando extinta a punibilidade de

    eventual posse irregular da referida arma.

    Por m, a Lei n 11.922/2009 prorrogou o prazo de entrega das armas de

    fogo de uso permitido at 31 de dezembro de 2009. Dispe o art. 20 da lei mencionada:

    Ficam prorrogados para 31 de dezembro de 2009 os prazos de que tratam o 3 do art.

    5 e o art. 30, ambos da Lei n 10.826, de 22 de dezembro de 2003.

    Em texto extrado da internet, POSSE DE ARMA DE FOGO: , ou no,

    crime? de Noeval de Quadros, o autor nos fornece as seguintes concluses:

    I O STJ rmou entendimento de que a tpica a conduta de possuir arma

    de fogo irregularmente tanto de uso permitido [...] quanto de uso restrito ou

    proibido [...] at 23 de outubro de 2005 [...]

    II A Lei n 11.706/2008 alterou a redao do art. 30 do Estatuto do

    Desarmamento descriminalizando novamente posse de arma de fogo de uso

    permitido at 31 de dezembro de 2008 [...]

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    III A Lei n 11.706 no descriminalizou a conduta de possuir arma de

    fogo de uso proibido ou restrito desde que no passvel de registro e

    de numerao raspada ou suprimida.

    IV A nova lei alterou tambm o art. 32 do Estatuto do Desarmamento,

    criando uma nova causa de extino de punibilidade, que a entrega de

    qualquer tipo de arma de fogo autoridade policial. Para essa entrega a lei

    no previu prazo.

    V A pessoa agrada na posse de arma de fogo de uso permitido, no

    registrada aps 31 de dezembro de 2008, ou na posse de arma de fogo de uso

    proibido ou restrito de numerao raspada ou suprimida, desde 24 de

    outubro de 2005, incidir em crime.

    Vale frisar que o autor Noeval de Quadros elaborou o texto mencionado

    antes da edio da Lei n 11.922/2009.

    Omisso de cautela

    Rege o art. 13 da lei em estudo:

    Art. 13. Deixar de observar as cautelas necessrias para impedir que menor

    de 18 (dezoito) anos ou pessoa portadora de decincia mental se

    apodere de arma de fogo que esteja sob sua posse ou que seja de sua

    propriedade:

    Pena deteno, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.

    Pargrafo nico. Nas mesmas penas incorrem o proprietrio ou diretor

    responsvel de empresa de segurana e transporte de valores que deixarem

    de registrar ocorrncia policial e de comunicar Polcia Federal perda, furto,

    roubo ou outras formas de extravio de arma de fogo, acessrio ou munio

    que estejam sob sua guarda, nas primeiras 24 (vinte quatro ) horas depois

    de ocorrido o fato.

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    Diante da pena aplicada no preceito secundrio, possvel a no

    lavratura do Auto de Priso em Flagrante, na hiptese de crime de Omisso de

    Cautela, previsto no art. 13 da Lei n 10.826/2003, mas sim de termo circunstanciado.

    Anlise do Caput

    No caput, trata-se de crime de dupla objetividade jurdica porque protege

    dois bens jurdicos:

    A Incolumidade pblica (segurana coletiva).

    o objeto jurdico imediato protegido por todos os tipos penais do Estatuto

    do Desarmamento.

    B Menor de 18 anos ou doente mental.

    O objeto mediato a vida ou a integridade fsica do menor de 18 anos ou do

    doente mental. sujeito passivo o deciente MENTAL, e no o fsico. No

    necessria nenhuma relao, por exemplo, de parentesco, entre sujeito ativo e

    sujeito passivo.

    Sujeito ativo: o possuidor ou proprietrio da arma de fogo.

    Objeto material do crime: a arma de fogo permitida ou restrita.

    O crime previsto no caput do art. 13 no tem como objetos materiais os

    acessrios e munies, apenas armas de fogo.

    Elemento subjetivo: crime culposo (deixar de observar as cautelas

    necessrias).

    E se o responsvel dolosamente deixar menor ou doente mental se apoderar

    da arma?

    Depender.

    Se for menor de 18 anos, responder pelo crime previsto no art. 16,

    pargrafo nico, inciso V, do Estatuto do Desarmamento.

    Consumao e tentativa: a consumao se d com o mero apoderamento da

    arma pelo menor ou doente mental.

    A tentativa possvel? NO, pois se trata de crime culposo.

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    Anlise do Pargrafo nico

    O pargrafo nico do art. 13 do Estatuto do Desarmamento prev tipo penal

    autnomo, totalmente distinto do caput e assim disposto:

    Pargrafo nico. Nas mesmas penas incorrem o proprietrio ou diretor

    responsvel de empresa de segurana e transporte de valores que

    deixarem de registrar ocorrncia policial e de comunicar Polcia Federal

    perda, furto, roubo ou outras formas de extravio de arma de fogo, acessrio

    ou munio que estejam sob sua guarda, nas primeiras 24 (vinte quatro)

    horas depois de ocorrido o fato.

    Cuida-se de crime prprio, pois apenas poder ser praticado pelo diretor ou

    proprietrio de empresa de segurana ou de transporte de valores.

    O crime prprio aquele que exige uma especial qualidade do agente, no

    caso, ser diretor ou proprietrio de empresa de segurana ou de transporte de valores.

    O crime consiste em deixar de registrar o boletim de ocorrncia e em deixar

    de comunicar Polcia Federal. O tipo penal exige do sujeito ativo duas comunicaes.

    Aps lavrado o B.O., deve ser levado Polcia Federal.

    E se zer s uma comunicao?

    A maioria da doutrina diz que responder pelo delito, j que o Estatuto (Lei

    n 10.826/2003) exige as duas comunicaes.

    Para a minoria, uma s comunicao no congura crime. Entende ser o

    Estado responsvel pela comunicao entre seus rgos. a corrente da qual nos

    liamos.

    Os objetos materiais do crime so as armas de fogo deuso permitido ou

    de uso restrito, bem como munies ou acessrios.

    O elemento subjetivo do crime em estudo o dolo.

    A consumao se d aps as primeiras 24 horas depois do fato. Cuida-se de

    crime a prazo. Na verdade, depois de conhecido o fato, e no simplesmente ocorrido

    o fato. S possvel fazer a comunicao aps tomar cincia do extravio, perda, roubo

    ou furto. Salutar dizer que o prazo de 24 horas, a partir do momento em que possvel

    fazer a comunicao.

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    No possvel tentativa, j que se trata de um crime omissivo puro e de

    mera conduta.

    Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido

    Arma de fogo o instrumento mecnico capaz de lanar projteis a distncia

    a partir da exploso de plvora. A partir da palavra munio podemos chegar aos

    projteis, plvoras e demais artefatos explosivos com que se carregam as armas de fogo.

    Acessrio o artefato que acoplado ou serve de apoio para a arma de fogo.

    At 1997, o porte de arma era contraveno penal (art. 19 da LCP). Em

    1997, entrou em vigor a Lei das Armas de Fogo (Lei n 9.437/1997), que transformou o

    porte de arma de fogo em crime, cominando a mesma sano posse.

    Em 2003, entrou em vigor o Estatuto do Desarmamento (Lei n

    10.826/2003), mantendo a posse e o porte como crimes.

    A autorizao para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o

    territrio nacional, de competncia da Polcia Federal e somente ser concedida aps

    autorizaodo Sinarm.

    obrigatrio o registro de arma de fogo no rgo competente, sendo

    que as armas de fogo de uso restrito sero registradas no Comando do Exrcito.

    O certicado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o

    territrio nacional, no autoriza o seu proprietrio ao porte e transporte da arma

    registrada.

    A autorizao de porte de arma de fogo perder automaticamente sua

    eccia caso o portador dela seja de do ou abordado em estado de embriaguez ou sob

    efeito de substncias qumicas ou alucingenas.

    O porte de arma, segundo o Estatuto do Desarmamento, pode ser

    concedido queles a quem a ou a corporao autorize a utilizao em razo do

    exerccio de sua atividade. Assim, um delegado de polcia que esteja aposentado

    no tem direito ao porte de armas; o pretendido direito deve ser pleiteado nos

    moldes previstos pela legislao para os particulares em geral.

    proibido o porte de arma de fogo em todo o territrio nacional, salvo para

    os casos previstos em legislao prpria e para: 1) os integrantes das Foras Armadas,

    2) os integrantes de rgos referidos nos incisos do caput do art. 144 da Constituio

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    Federal, 3) os integrantes das guardas municipais das capitais dos Estados e dos

    Municpios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, nas condies

    estabelecidas no regulamento da lei em estudo, 4) os integrantes das guardas municipais

    dos Municpios com mais de 50.000 (cinquenta mil) e menos de 500.000 (quinhentos

    mil) habitantes, quando em servio8, 5) os agentes operacionais da Agncia Brasileira

    de Inteligncia e os agentes do Departamento de Segurana do Gabinete de Segurana

    Ins tucional da Presidncia da Repblica, 6) os integrantes dos rgos policiais referidos

    no art. 51, IV, e no art. 52, XIII, da Constituio Federal) os integrantes do quadro

    efetivo dos agentes e guardas prisionais, os integrantes das escoltas de presos e as

    guardas porturias, 8) empresas de segurana privada e de transporte de valores

    constitudas, nos termos da lei em comento) para os integrantes das entidades de

    desporto legalmente constitudas, cujas atividades esportivas demandem o uso de armas

    de fogo, na forma do regulamento desta Lei, observando-se, no que couber, a legislao

    ambiental. 10) integrantes das Carreiras de Auditoria da Receita Federal do Brasil e de

    Auditoria-Fiscal do Trabalho, cargos de Auditor-Fiscal e Analista Tributrio.

    Assim, permitido o porte de arma de fogo para os integrantes do

    quadro efetivo dos agentes e guardas prisionais e para as guardas porturias,

    desde que comprovada a capacidade tcnica e aptido psicolgica.

    Mesmo que o policiamento ostensivo seja de competncia das polcias

    militares estaduais, permitido aos integrantes das guardas municipais o porte de arma.

    Aos residentes em reas rurais, maiores de 25 (vinte e cinco) anos que

    comprovem depender do emprego de arma de fogo para prover sua subsistncia

    alimentar familiar ser concedido pela Polcia Federal o porte de arma de fogo, na

    categoria caador para subsistncia, de uma arma de uso permitido, de ro simples, com

    1 (um) ou 2 (dois) canos, de alma lisa e de calibre igual ou inferior a 16 (dezesseis),

    desde que o interessado comprove a efetiva necessidade em requerimento ao qual

    devero ser anexados o documento de identicao pessoal, comprovante de residncia

    em rea rural, atestado de bons antecedentes.

    O caador para subsistncia que der outro uso sua arma de fogo,

    independentemente de outras tipicaes penais, responder, conforme o caso, por porte

    ilegal ou por disparo de arma de fogo de uso permitido.

    As armas de fogo u lizadas pelos empregados das empresas de segurana

    privada e de transporte de valores, constitudas na forma da lei, sero de propriedade,

  • proibida a reproduo total ou parcial do contedo deste material todos os direitos reservados. 14

    responsabilidade e guarda das respectivas empresas, somente podendo ser utilizadas

    quando em servio, devendo essas observar as condies de uso e de armazenagem

    estabelecidas pelo rgo competente, sendo o certicado de registro e a autorizao de

    porte expedidos pela Polcia Federal em nome da empresa.

    Anlise do art. 14

    Dispe o art. 14 do Estatuto do Desarmamento:

    Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depsito,

    transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar,

    manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessrio oumunio, de uso

    permitido, sem autorizao e em

    desacordo com determinao legal ou regulamentar:

    Pena recluso, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

    Sujeito ativo: crime comum, ou seja, pode ser praticado por qualquer

    pessoa.

    A pena ser aumentada da metade se o crime for praticado por integrante

    dos rgos e empresas referidas nos arts. 6, 7 e 8 do Estatuto do Desarmamento.

    Houve importante alterao no Estatuto do Desarmamento em relao

    Lei n 9.437/1997. Atualmente, possuir o agente condenao anterior por crime

    contra a pessoa ou por trco ilcito de entorpecentes no qualica o crime de

    porte ilegal de arma de fogo de uso permitido.

    Sujeito passivo: a coletividade.

    Cuida-se de tipo misto alternativo (prev vrias condutas). tambm

    conhecido como tipo de conduta mltipla ,de conduta variada ou plurinuclear. Se

    forem cometidas no mesmo contexto ftico, ser crime nico. Por exemplo, o indivduo

    que est portando em via pblica duas armas de fogo de uso permitido responder

    apenas por um crime.

    Elemento normativo: sem autorizao ou em desacordo com determinao

    legal. O sujeito ativo no porta a arma de fogo de acordo com o Estatuto do

    Desarmamento.

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    Diferena do crime de porte para o crime de posse

    Ambos tm como objetos materiais armas de fogo, munio e acessrios de

    uso permitido.

    No se pode confundir posse irregular de arma de fogo com o porte ilegal de

    arma de fogo, pois tais condutas restaram bem delineadas.

    A posse consiste em manter a arma de fogo no interior de residncia (ou

    dependncia desta) ou no local de trabalho .O porte, por sua vez, pressupe que a arma

    de fogo esteja fora da residncia ou local de trabalho.

    Portar arma de fogo desmuniciada congura crime?

    Atualmente, a circunstncia de estar a arma municiada ou no,

    relevante para a congurao do delito de porte ilegal de arma de fogo .

    H duas correntes:

    Primeira corrente: arma desmuniciada congura crime, pouco importando

    se possvel o rpido municiamento. a posio do STJ na maioria dos julgados.

    Habeas corpus. Penal. Estatuto do Desarmamento. Porte ilegal (art. 14 da

    Lei n 10.826/2003). Abolitio criminis temporria. Inocorrncia. Extino da

    punibilidade. Impossibilidade. Desnecessidade de a arma estar municiada

    para caracterizar crime de porte ilegal. Precedentes do STJ. 1. Consoante o

    entendimento desta corte, diante da literalidade dos artigos relativos ao prazo

    legal para regularizao do registro da arma (arts. 30, 31 e 32 da Lei n

    10.826/2003), a descriminalizao temporria ocorre exclusivamente em

    relao s condutas delituosas relativas posse de arma de fogo. 2. No se

    pode confundir a posse de arma de fogo com o porte de arma de fogo.

    Segundo o estatuto do desarmamento, a posse consiste em manter no interior

    de residncia (ou dependncia desta) ou no local de trabalho a arma de fogo,

    enquanto que o porte, por sua vez, pressupe que a arma de fogo esteja fora

    da residncia ou do local de trabalho. 3. Na espcie, o paciente restou

    denunciado pelo porte ilegal de arma (art. 14, da Lei n 10.826/2003). Nesse

    contexto, a hiptese de aboli o criminis temporria no alcana a conduta pra

    cada, tornando-se, pois, invivel o acolhimento da pretenso ora deduzida. 4.

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    No prospera a alegao de que a arma, estando desmuniciada , no

    atingiria nenhum bem juridicamente tutelado, inexistindo, assim, o

    delito de porte ilegal de arma. que, a teor da jurisprudncia

    consolidada desta corte, congura-se o referido crime ainda que a arma

    esteja desmuniciada. 5. Ordem denegada. (STJ HC n 200501561630

    (48117-GO) 5 Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 16/10/2006, p. 390)

    Recurso ordinrio em habeas corpus.

    Penal. Porte ilegal de arma de fogo de uso restrito.

    Art. 14 da Lei n 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento).

    Trancamento da ao penal. A titipicidade. Inexistncia. Desnecessidade de

    a arma estar municiada para caracterizar crime de porte ilegal. Precedentes

    desta Corte Superior. 1. Para a congurao do delito previsto no art. 14 da

    Lei n 10.826/2003, basta que o agente porte a arma de fogo sem autorizao

    ou em desacordo com a determinao legal, o que torna irrelevante o fato de

    a arma encontrar-se desmuniciada.

    Precedentes do Superior Tribunal de Justia. . 2. Recurso desprovido. (STJ

    RHC n 200601953462 (20136-SC) 5 Turma, Rel. Min. Laurita Vaz,

    DJU de 13/11/2006, p. 275)

    Em 2012, a 6 Turma do STJ decidiu:

    Arma de fogo desmuniciada. Titipicidade.

    A Turma, acompanhando recente assentada, quando do julgamento, por

    maioria, do REsp 1.193.805-SP, manteve o entendimento de que o porte

    ilegal de arma de fogo crime de perigo abstrato, cuja consumao se

    caracteriza pelo simples ato de algum levar consigo arma de fogo sem

    autorizao ou em desacordo com determinao legal sendo irrelevante a

    demonstrao de efetivo carter ofensivo. Isso porque, nos termos do

    disposto no art. 16, pargrafo nico, IV, da Lei n 10.826/2003, o legislador

    teve como objetivo proteger a incolumidade pblica, transcendendo a mera

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    proteo incolumidade pessoal, bastando, assim, para a congurao

    do delito em discusso a probabilidade de dano, e no sua ocorrncia.

    Segundo se observou, a lei antecipa a punio para o ato de portar arma de

    fogo; , portanto, um tipo penal preventivo, que busca minimizar o risco de

    comportamentos que vm produzindo efeitos danosos sociedade, na

    tentativa de garantir aos cidados o exerccio do direito segurana e

    prpria vida. Conclui-se, assim, ser irrelevante aferir a eccia da arma para

    a congurao do tipo penal, que misto-alternativo, em que se

    consubstanciam, justamente, as condutas que o legislador entendeu por bem

    prevenir, seja ela o simples porte de munio ou mesmo o porte de arma

    desmuniciada. Relativamente ao regime inicial de cumprimento da pena,

    reputou-se mais adequada ao caso a xao do semiaberto; pois, apesar da

    reincidncia do paciente, a pena-base foi xada no mnimo legal trs anos

    aplicao direta da Sm. n 269/STJ. HC n 211.823-SP, Rel. Min. Sebas o

    Reis Jnior, julgado em 22/3/2012.

    E ainda:

    Porte. Arma de Fogo desmuniciada. Munio incompatvel.

    In casu, o paciente foi agrado em via pblica com uma pistola calibre 380

    com numerao raspada e um cartucho com nove munies, calibre 9 mm,

    de uso restrito. Em primeiro grau, foi absolvido do porte de arma, tendo em

    vista a falta de potencialidade lesiva do instrumento, constatada por meio de

    percia. Entendeu, ainda, o magistrado que no se justicaria a condenao

    pelo porte de munio, j que os projteis no poderiam ser u lizados. O

    tribunal a quo deu provimento ao apelo ministerial ao entender que se

    consubstanciavam delitos de perigo abstrato e condenou o paciente, por

    ambos os delitos, a quatro anos e seis meses de recluso no regime fechado e

    vinte dias-multa. A Turma, ao prosseguir o julgamento, aps o voto-vista do

    Min. Sebastio Reis Jnior, denegando a ordem de habeas corpus, no que foi

    acompanhado pelo Min. Vasco Della Gius na, e o voto da Min. Maria

    Thereza de Assis Moura, acompanhando o voto do Min. Relator, vericou-

    se o empate na votao. Prevalecendo a situao mais favorvel ao acusado,

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    concedeu-se a ordem de habeas corpus nos termos do voto Min. Relator,

    condutor da tese vencedora, cujo entendimento rmado no mbito da

    Sexta Turma, a partir do julgamento do AgRg no REsp 998.993-RS, que,

    tratando-se de crime de porte de arma de fogo, faz-se necessria a

    comprovao da potencialidade do instrumento, j que o princpio da

    ofensividade em direito penal exige um mnimo de perigo concreto ao bem

    jurdico tutelado pela norma, no bastando a simples indicao de perigo

    abstrato. Quanto ao porte de munio de uso restrito, apesar de tais

    munies terem sido aprovadas no teste de ecincia, no ofereceram perigo

    concreto de leso, j que a arma de fogo apreendida, alm de ineciente, era

    de calibre distinto. O Min. Relator ressaltou que, se a Sexta Turma tem

    proclamado que a pica a conduta de quem porta arma de fogo

    desmuniciada, quanto mais a de quem leva consigo munio sem arma

    adequada ao alcance. Alis, no se mostraria sequer razovel absolver o

    paciente do crime de porte ilegal de arma de fogo ao fundamento de que o

    instrumento ineciente para disparos e conden-lo, de outro lado, pelo

    porte da munio. Precedente citado: AgRg no REsp 998.993-RS,

    DJe8/6/2009. HC n 118.773-RS, Rel. Min. Og Fernandes,julgado em

    16/2/2012.

    Segunda corrente: no configura crime previsto no Estatuto se arma de

    fogo es ver desmuniciada e sem possibilidade de pronto municiamento. No RHC n

    81.057, 1 Turma, DJ de 29/4/2005, o STF decidiu que

    No porte de arma de fogo desmuniciada, preciso distinguir duas situaes,

    luz do princpio de disponibilidade: (1) se o agente traz consigo a arma

    desmuniciada, mas tem a munio adequada mo, de modo a viabilizar

    sem demora signicativa o municiamento e, em consequncia, o eventual

    disparo, tem-se arma disponvel e o fato realiza o tipo; (2) ao contrrio, se a

    munio no existe ou est em lugar inacessvel de imediato, no h a

    imprescindvel disponibilidade da arma de fogo, como tal isto , como

    artefato idneo a produzir disparo e, por isso, no se realiza a gura tpica.

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    Adotando o posicionamento do STF, o STJ no HC n 113.050-SP, 6

    Turma, contrariando posio anteriormente adotada, decidiu pela a titipicidade

    material da conduta de porte de arma de fogo sem munio, e em consequncia

    determinou o arquivamento da ao penal.

    Recentemente, a 6 Turma do STJ raticou seu posicionamento:

    Conforme o juzo de primeiro grau, a paciente foi presa em agrante quando

    trazia consigo uma arma de fogo calibre 22 desmuniciada que, periciada,

    demonstrou estar apta a realizar disparos. Assim, a Turma, ao prosseguir o

    julgamento, por maioria, concedeu a ordem com base no art. 386, III, do

    CPP e absolveu a paciente em relao acusao que lhe dirigida por porte

    ilegal de arma de fogo de uso permitido, por entender que o fato de a arma

    de fogo estar desmuniciada afasta a titipicidade da conduta, conforme

    reiterada jurisprudncia da Sexta Turma. Precedentes citados do STF: RHC

    81.057-SP, DJ 29/4/2005; HC 99.449-MG, DJe 11/2/2010; do STJ: HC

    76.998-MS, DJe 22/2/2010, e HC 70.544-RJ, DJe 3/8/2009. HC 124.907-

    MG, Rel.

    Min. Og Fernandes, julgado em 6/9/2011.

    Em 9 de Junho de 2009, conforme no cia veiculada no site , a 2 Turma do STF arquivou denncia contra acusado de porte ilegal de

    arma:

    Por 3 votos a 2, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF)

    determinou o arquivamento de ao penal aberta com base em acusao de

    porte ilegal de arma porque o denunciado no dispunha de munio para

    efetuar disparos.

    A deciso foi tomada nesta tera-feira (9), no julgamento de Habeas Corpus

    (HC n 97.811) impetrado em defesa de C.N.A., denunciado aps ter sido

    preso na cidade de Suzano (SP) com uma espingarda. Ele foi detido porque

    carregava a espingarda no banco de trs do seu carro e no tinha porte de

    arma.

    Segundo a defesa, apesar de a arma estar sem munio e envolvida em um

    plstico, os policiais militares prenderam C.N.A. em agrante pelo crime de

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    porte ilegal de arma de fogo. A priso foi conrmada pelo delegado,

    mas, posteriormente, o juiz concedeu a liberdade provisria. No entanto,

    C.N.A. passou a responder a uma ao penal pelo crime.

    Para os ministros Eros Grau, Cezar Peluso e Celso de Mello, a conduta de

    C.N.A. no est prevista no Estatuto do Desarmamento (10.826/2003).

    Arma desmuniciada e sem munio prxima no congura o tipo [penal],

    ressaltou Peluso.

    O ministro acrescentou que no relatrio do caso consta que a denncia

    descreve que a espingarda estava sem munio. que espingarda, [para se

    estar] com munio prxima, s se ele [o acusado] se comportasse que nem

    artista de cinema, com cinturo etc, disse Peluso.

    Para a ministra Ellen Gracie, relatora do habeas corpus, e o ministro

    Joaquim Barbosa, o arquivamento da ao penal nesses casos prematuro

    quando existe laudo pericial que ateste a eccia da arma para a realizao

    de disparos.

    No caso, a arma foi periciada e encontrava-se [em plenas condies de

    uso], disse a ministra. Segundo ela, o laudo pericial registra que a arma se

    mostrou ecaz para produzir disparos, bem como apresentou vestgios de

    resduos de tiros.

    Conforme veiculado no Informativo n 550, o STF, a 1 Turma, decidiu:

    Porte ilegal de arma e ausncia de munio.

    Para a congurao do delito de porte ilegal de arma de fogo irrelevante o

    fato de a arma encontrar-se desmuniciada e de o agente no ter a pronta

    disponibilidade de munio. Com base nesse entendimento, a Turma

    desproveu recurso ordinrio em habeas corpus interposto por condenado

    pela prtica do crime de porte ilegal de arma de fogo (Lei n 9.437/1997, art.

    10), no qual se alegava a titipicidade do porte de revlver desmuniciado

    ante a ausncia de leso ao bem jurdico penalmente protegido. Assentou-se

    que

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    a objetividade jurdica da norma penal transcende a mera proteo da

    incolumidade pessoal para alcanar a tutela da liberdade individual e do

    corpo social como um todo, asseguradas ambas pelo incremento dos nveis

    de segurana coletiva que a lei propicia. Enfatizou-se, destarte, que se

    mostraria irrelevante, no caso, cogitar-se da eccia da arma para

    congurao do tipo penal em comento isto , se ela estaria, ou no,

    municiada ou se a munio estaria, ou no, ao alcance das mos , porque a

    hiptese seria de crime de perigo abstrato para cuja caracterizao

    desimporta o resultado concreto da ao. (RHC n 90.197/DF, Rel. Min.

    Ricardo Lewandowski,9/6/2009)

    Mais recentemente, a 2 Turma do STF decidiu:

    Porte Ilegal de Arma e Ausncia de Munio

    O fato de a arma de fogo encontrar-se desmuniciada torna a tpica a conduta

    prevista no art. 14 da Lei n 10.826/2003 [Portar, deter, adquirir, fornecer,

    receber, ter em depsito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente,

    emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo,

    acessrio ou munio, de uso permitido, sem autorizao e em desacordo

    com determinao legal ou regulamentar:

    Pena recluso, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.]. Com base nesse

    entendimento, a Turma, por maioria, deferiu habeas corpus impetrado em

    favor de condenado pela prtica do crime de porte ilegal de arma de fogo de

    uso permitido (Lei n 10.826/2003, art. 14), haja vista que a arma

    encontrava-se desmuniciada. Vencida a Min. Ellen Gracie, relatora, que, por

    reputar pica a conduta em tela, indeferia o writ. HC n 99.449/MG, rel. orig.

    Min. Ellen Gracie, red. p/ o acrdo Min. Cezar Peluso, 25/8/2009.

    Em 2009, a Sexta Turma do STJ decidiu:

    A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, deu provimento ao

    agravo regimental a m de conceder a ordem de habeas corpus para

    restabelecer a sentena. Para o Min. Nilson Naves, o condutor da tese

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    vencedora, conforme precedente, a arma de fogo sem munio no

    possui eccia, por isso no pode ser considerada arma.

    Consequentemente, no comete o crime de porte ilegal de arma de fogo

    previsto na Lei n 10.826/2003 aquele que tem consigo arma de fogo

    desmuniciada. Precedente citado: HC n 70.544-RJ, 6 Turma, DJe 3/8/2009.

    AgRg no

    HC n 76.998-MS, Rel. originrio Min. Haroldo Rodrigues (Desembargador

    convocado do TJ-CE), Rel. para acrdo Min. Nilson Naves, 6 Turma,

    julgado em 15/9/2009.

    Assim, de acordo com o posicionamento do STJ, a ttulo de exemplo,

    imaginemos que Alfredo, imputvel, transportava em seu veculo um revlver de

    calibre 38, quando foi abordado em uma operao policial de trnsito. A diligncia

    policial resultou na localizao da arma, desmuniciada, embaixo do banco do

    motorista. Em um dos bolsos da mochila de Alfredo foram localizados 5 projteis

    do mesmo calibre. Indagado a respeito, Alfredo declarou no possuir autorizao

    legal para o porte da arma nem o respectivo certicado de registro. O fato foi

    apresentado autoridade policial competente. Nessa situao, caber autoridade

    somente a apreenso da arma e das munies e a imediata liberao de Alfredo,

    visto que, estando o armamento desmuniciado, no se caracteriza o crime de porte

    ilegal de arma de fogo.

    H quem defenda que, pelo simples fato de portar acessrio ou munio, j

    h congurao de crime, com mais razo se punir quem estiver com uma arma de

    fogo sem munio. Para ns, crime portar munies de arma de fogo.

    Sobre o porte ilegal de munio, decidiu o STJ:

    Trata-se da necessidade ou no de comprovao da potencialidade lesiva

    para congurao do delito de porte ilegal de munio. Nas instncias

    ordinrias, o juiz condenou o ora recorrido, como incurso no art. 14 (caput)

    da Lei n 10.826/2003, a dois anos de recluso em regime aberto e 10 dias-

    multa, substituda a sano por duas medidas de direitos, mas o Tribunal a

    quo proveu sua apelao, absolvendo-o. Da que o MP estadual interps o

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    REsp, armando que o porte de munio sem autorizao e em

    desacordo com a determinao legal ou regulamentar no depende da

    comprovao da potencialidade lesiva da munio, tal como , tambm, no

    caso da presena de arma de fogo. O Min. Relator, invocando precedente do

    STF. Consta HC n 93.876-RJ, 1 Turma, julgado em 28/4/2009, ainda no

    publicado, entendeu que se est diante de crime de perigo abstrato, de forma

    que to s o comportamento do agente de portar munio sem autorizao

    ou em desacordo com determinao legal ou regulamentar suciente para a

    congurao do delito em debate. Observou, ainda, que no via previso

    pica em que o legislador tenha desejado a anlise caso a caso da

    comprovao de que a conduta do agente produziu concretamente situao

    de perigo. Porm, essa posio cou vencida aps a divergncia inaugurada

    pelo Min. Nilson Naves, que concluiu pela a tipicidade da conduta,

    conforme posio similar ao porte de arma sem munio, que, por no

    possuir eccia, no pode ser considerada arma. Precedente citado: HC n

    70.544-RJ, 6 Turma, DJe 3/8/2009. REsp n 1.113.247-RS, Rel. originrio

    Min. Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ-CE), Rel. para

    acrdo Min. Nilson Naves, 6 Turma, julgado em 15/9/2009.

    Em 2012, a 5 Turma do STJ decidiu que:

    Porte ilegal de munio. Ausncia de arma de fogo.

    A Turma, por maioria, absolveu o paciente do crime de porte ilegal de

    munio; ele fora preso com um nico projtil, sem ter havido apreenso da

    arma de fogo. O Min. Relator entendeu que se trata de crime de perigo

    abstrato, em que no importa se a munio foi apreendida com a arma ou

    isoladamente para caracterizar o delito. Contudo, no caso, vericou que no

    houve leso ao bem jurdico tutelado na norma penal, que visa resguardar a

    segurana pblica, pois a munio foi u lizada para suposta ameaa, e no

    esse po de perigo, restrito a uma nica pessoa, que o po penal visa evitar. E,

    por se tratar de apenas um projtil, entendeu pela ofensividade mnima da

    conduta, portanto por sua a tipicidade. A Min. Maria Thereza de Assis

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    Moura e o Min. Og Fernandes tambm reconheceram a a tipicidade da

    conduta, mas absolveram o paciente sob outro fundamento: o crime de

    porte de munio de perigo concreto, ou seja, a munio sem arma no

    apresenta potencialidade lesiva. Precedente citado do STF: HC n 96.532-

    RS, DJe 26/11/2009. HC n 194.468- MS, Rel. Min. Sebastio Reis Jnior,

    julgado em 17/4/2012.

    Porte de arma desmontada congura crime previsto no art. 14? Depende

    do caso concreto; se possvel mont-la rapidamente e munici-la, pode congurar o

    delito. J o porte de arma inapta para efetuar disparos congura crime impossvel.

    Sobre a necessidade de realizao de exame pericial na arma de fogo, com a

    nalidade de se determinar sua capacidade de efetuar disparos, a 1 Turma do STF

    decidiu que:

    Porte Ilegal de Arma de Fogo e Exame Pericial

    A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus impetrado pela Defensoria

    Pblica da Unio em favor de condenado pela prtica do crime de porte

    ilegal de arma de fogo (Lei n 9.437/1997, art. 10) no qual se sustentava a

    necessidade de exame pericial para a congurao do delito. Alegava que,

    embora a percia vesse sido feita na arma de fogo apreendida, esta fora

    realizada por policiais que atuaram no inqurito e sem qualicao

    necessria. Reputou-se que eventual nulidade do exame pericial na arma

    no descaracterizaria o delito atualmente disposto no art. 14, caput, da Lei n

    10.826/2003, quando existir um conjunto probatrio que permita ao julgador

    formar convico no sentido da existncia do crime imputado ao ru, bem

    como da autoria do fato. Salientou-se, ainda, que os policiais militares,

    conquanto no haja nos autos a comprovao de possurem curso superior,

    teriam condies de avaliar a potencialidade lesiva da arma. Registrou-se,

    contudo, que a sentena condenatria sequer se baseara na percia feita por

    esses policiais, mas sim na declarao do prprio paciente que, quando

    interrogado, dissera que usava aquela arma para a sua defesa pessoal,

    demonstrando saber de sua potencialidade. Vencido o Min. Marco Aurlio,

    que deferia o writ por considerar que o laudo pericial, ante o teor do art. 25

  • proibida a reproduo total ou parcial do contedo deste material todos os direitos reservados. 25

    da Lei n 10.826/2003 [As armas de fogo apreendidas, aps a elaborao

    do laudo pericial e sua juntada aos autos, quando no mais interessarem

    persecuo penal sero encaminhadas pelo juiz competente ao Comando

    do Exrcito, no prazo mximo de 48 (quarenta e oito) horas, para destruio

    ou doao aos rgos de segurana pblica ou s Foras Armadas, na forma

    do regulamento desta Lei.], seria formalidade essencial, que deveria ser

    realizada por tcnicos habilitados e no por policiais militares. Precedente

    citado: HC n 98.306/RS (DJE de 19/11/2009, 2 Turma). HC n

    100.008/RS, rel. Min. Dias Tooli, 1Turma, 18/5/2010. (HC-10.008).

    Porte de munio congura crime?

    Sim, pois crime de perigo abstrato (aquele cuja existn cia dispensa a

    demonstrao efetiva de que a vtima cou exposta a uma situao concreta de risco

    STJ Recurso Especial n 803.824, 6 Turma).

    Acerca do tema, a 1 Turma do STF decidiu

    Porte Ilegal de Munio e Ausncia de Laudo Pericial

    A Turma deferiu habeas corpus em que se discutia se o crime de porte ilegal

    de munio (Lei n 10.826/2003, art. 14) imporia, ou no, a realizao de

    percia atestando-se a potencialidade lesiva das munies para a

    congurao do delito. Asseverou-se que, no caso, a questo envolveria a

    problemtica da aplicao da lei no tempo, perquirindo-se qual norma estaria

    em vigor na data da prtica criminosa. Salientou-se que, na poca do crime,

    o art. 25 da Lei n 10.826/2003 determinava a realizao de percia em

    armas de fogo, acessrios ou munies apreendidos (Armas de fogo,

    acessrios ou munies apreendidos sero, aps elaborao do laudo pericial

    e sua juntada aos autos, encaminhados pelo juiz competente, quando no

    mais interessarem persecuo penal, ao Comando do Exrcito, para

    destruio, no prazo mximo de 48 horas.), sendo tal dispositivo alterado

    pela Lei n 11.706/2008, a qual estabeleceu que a percia caria restrita s

    armas de fogo. Aduziu-se no ter cabimento tomar preceitos legais como

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    incuos, mormente quando disserem respeito a certo tipo. No ponto,

    consignou-se haver, no artigo aludido, a exigncia de elaborao do

    laudo pericial e a juntada do processo, sendo nica a sua razo de ser:

    comprovar a potencialidade quer do revlver, quer do acessrio ou da

    munio apreendidos. Frisou-se, assim, que, ante o fato de a formalidade

    estar ligada ao prprio tipo penal, no caberia a inverso do nus da prova

    para se atribuir ao acusado a comprovao da falta de potencialidade quer da

    arma, do acessrio ou da munio. Ordem concedida para restabelecer o

    entendimento sufragado pelo Tribunal de Justia. do Estado de Santa

    Catarina que implicara a absolvio do paciente. HC n 97.209/SC, rel. Min.

    Marco Aurlio, 16/3/2010. (HC n 97.209)

    A 2 Turma do STF decidiu recentemente acerca do tema em comento:

    Porte Ilegal de Munio - 3

    A Turma retomou julgamento de habeas corpus em que se pretende, por

    ausncia de potencialidade lesiva ao bem juridicamente protegido, o

    trancamento de ao penal instaurada contra denunciado pela suposta prtica

    do crime de porte de munio sem autorizao legal (Lei n 10.826/2003,

    art. 14), sob o argumento de que o princpio da interveno mnima no

    Direito Penal limita a atuao estatal nesta matria v. Informativos nos 457

    e 470. O Min. CezarPeluso, em voto-vista, por reputar a tpica a conduta

    imputada ao paciente, deferiu o writ para determinar o trancamento da ao

    penal. Observou, de incio, que a matriz denidora e legitimadora do Direito

    Penal residiria, sobretudo, na noo de bem jurdico, sendo ela que

    permitiria compreender os valores aos quais o ordenamento concederia a

    relevncia penal, de acordo com a ordem axiolgica da Constituio, e, por

    isso, legitimaria a atuao do instrumento penal. Ressaltou que, na chamada

    sociedade do risco, com a pretenso de se atenuar a insegurana decorrente

    da complexidade, globalidade e dinamismo social, demandar-se-ia a

    regulao penal das atividades capazes de produzir perigo, na expectativa de

    que o Direito Penal fosse capaz de evitar condutas geradoras de risco e de

    garantir um estado de segurana. Considerou que, para jus car a

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    antecipao da tutela penal para momento anterior efetiva leso ao

    interesse protegido, falar-se-ia em preveno e controle das fontes de

    perigo a que esto expostos os bens jurdicos, para tratar situaes antes no

    conhecidas pelo Direito Penal tradicional. Frisou reprovvel, construir-se-ia

    uma relao meramente hipottica entre a ao incriminada e a produo de

    perigo ou dano ao bem jurdico. Destacou que o ilcito penal consistiria na

    infrao do dever de observar determinada norma, concentrando o injusto

    muito mais no desvalor da ao do que no desvalor do resultado, que se faria

    cada vez mais difcil identicar ou mensurar.

    [...]

    Assim, enfatizou que, em vez do tradicional elemento de leso ao bem

    jurdico, apareceria como pressuposto legitimador da imputao a

    desaprovao do comportamento que vulnera dever denido na esfera

    extra-penal. Asseverou, no ponto, que essa tendncia poderia entrar em

    choque com os pressupostos do Direito Penal clssico, fundado na estrita

    legalidade, na proporcionalidade, na causalidade, na subsidiariedade, na

    interveno mnima, na fragmentariedade e lesividade, para citar alguns dos

    seus princpios norteadores. Evidenciou, destarte, que grave dilema se poria

    no fato de que, de um lado se professaria que o Direito Penal deveria

    dedicar-se apenas proteo subsidiria repressiva dos bens jurdicos

    essenciais, por meio de instrumentos tradicionais de imputao de

    responsabilidade, segundo princpios e regras clssicos de garan a, e, de

    outro, postular-se-ia a exibilizao e ajuste dos instrumentos dogmticos e

    das regras de atribuio de responsabilidade, para que o Direito Penal

    reunisse condies de atuar na proteo dos bens jurdicos supra individuais,

    e no controle dos novos fenmenos do risco. Esclareceu que as normas de

    perigo abstrato punem a realizao de conduta imaginada ou hipoteticamente

    perigosa sem a necessidade de congurao de efetivo perigo ao bem

    jurdico, na medida em que a periculosidade da conduta tpica seria

    determinada antes, por meio de uma generalizao, de um juzo hipottico

    do legislador, fundado na ideia de mera probabilidade. Avaliou que, nos

    tipos de perigo concreto, se exigiria o desvalor do resultado, impondo o risco

    do bem protegido, enquanto, nos tipos de perigo abstrato, ocorreria claro

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    adiantamento da proteo do bem a fases anteriores efetiva leso.

    Asseverou, todavia, que deveria restar caracterizado um mnimo de

    ofensividade como fator de delimitao e conformao de condutas que

    merecessem reprovao penal. Nesse sentido, registrou que a aplicao dos

    instrumentos penais de atribuio de responsabilidade s novas realidades

    haveria de se restringir aos casos em que fosse possvel compatibilizar a

    nova tipicao com os princpios clssicos do Direito Penal.

    [...]

    Salientou ser certo que a lesividade nem sempre signicaria dano efetivo ao

    bem jurdico protegido, mas, para se entender e justicar como tal, exigiria,

    pelo menos, que de algum modo se pusesse em causa uma situao de

    perigo. Reportou que, ainda nos delitos de perigo abstrato, seria preciso

    acreditar na perigosidade da ao, no desvalor real da ao e na

    possibilidade de resultado perigoso, no sendo punvel, por isso, a conduta

    que no pusesse em perigo, nem sequer em tese ou por hiptese, o bem

    jurdico protegido. Entendeu que a conduta considerada perigosa de um

    ponto de vista geral e abstrato poderia no o ser em verdade e, no casodos

    autos, no haveria possibilidade de leso in-

    columidade pblica em virtude do transporte de 10 projteis, de forma

    isolada, sem a presena de arma de fogo. Sustentou que da no se poderia

    admitir a comparao com eventual trco ou transporte de grande

    quantidade de material de munio. Nesse diapaso, compreendeu que a

    conduta de portar munio, uma das vrias previstas pelo art. 14 da Lei n

    10.826/2003, no seria aprioris camente detentora de dignidade penal,

    porquanto se haveria de se vericar, em cada caso, se a conduta seria capaz

    de, por si, representar ameaa real ou potencial a algum bem jurdico.

    Consignou que, se no se vislumbrar ofensividade da conduta, a

    criminalizao do porte de munio fulmina a referncia material, que,

    segundo os padres clssicos, deveria no s justicar a interveno do

    Direito Penal, mas presidir a interpretao dos tipos com vistas a determinar

    a sua realizao.

    [...]

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    Assinalou que, se a conduta em questo no detm dignidade penal, a

    aplicao do art. 14 da Lei n 10.826/2003, na espcie, representaria

    unicamente o uso do Direito Penal para a manuteno do sistema de controle

    do comrcio de armas e munies. Ou seja, tal modelo imporia a aceitao

    de um discurso eminentemente funcional, mediante preveno em geral

    negativa, procurando intimidar toda a sociedade quanto prtica criminosa.

    Assentou que isso justicaria, do ponto de vista da poltica criminal, certa

    antecipao da tutela, derrogando-se o princpio da lesividade, em funo de

    necessidades da administrao, o que, denitivamente, no seria e nem

    poderia ser o seu papel, nem sequer no contexto de uma sociedade de risco.

    Acrescentou, ademais, que o conceito material do delito e a ideia de

    subsidiariedade do Direito Penal, como diretriz poltico-criminal,

    pressuporiam que, antes de lanar mo do Direito Penal, o Estado adotasse

    outras medidas de poltica social que visassem proteger o bem jurdico,

    podendo faz-lo de maneira igual e at mais eciente. Armou que a

    condenao do paciente pelo porte de 10 projteis apenas como incurso em

    tipo penal tendente a proteger a incolumidade pblica contra efeitos

    deletrios da circulao de arma de fogo no pas seria um exemplo do

    exerccio irracional do jus puniendi ou do crescente distanciamento entre

    bem jurdico e situao incriminada, o que, fatalmente, conduzir

    progressiva indenio ou diluio do bem jurdico protegido que a razo

    de ser do Direito Penal. Aps, pediu vista dos autos a Min. Ellen Gracie. HC

    n 90.075/SC, rel. Min. Eros Grau, 2 Turma, 20/4/2010. (HC n 90.075)

    Entendendo como crime o simples porte ilegal de munio, vale a pena

    trazer a colao o seguinte julgado da 2 Turma do STF:

    Porte ilegal de arma de fogo e ausncia de munio 3

    Em concluso ,a2Turma,pormaioria,denegou habeas corpus no qual

    denunciado pela suposta prtica do crime de porte ilegal de arma de fogo de

    uso permitido pleiteava o trancamento de ao penal v. Informavos 601 e

    612. Entendeu-se que, aps a entrada em vigor da Lei n 10.826/2003, a

    hiptese seria de crime de perigo abstrato, para cuja caracterizao no

  • proibida a reproduo total ou parcial do contedo deste material todos os direitos reservados. 30

    importaria o resultado concreto da ao. Aduziu-se que a referida lei,

    alm de tipicar o simples porte de munio no exigiria para

    configurao do crime sob anlise que a arma es vesse municiada, de acordo

    com que se extrairia da redao do art. 14 daquele diploma legal. Avaliou-

    se, ainda, que o trancamento de ao penal seria medida reservada a

    situaes excepcionais, como a manifesta a tipicidade da conduta, a presena

    de causa de extino da punibilidade do paciente ou a ausncia de indcios

    mnimos de autoria e materialidade delitivas, inocorrentes na espcie. Para

    evitar supresso de instncia, no se conheceu da alegao, no apreciada

    pelo STJ nem pelo tribunal estadual, de que o paciente fora autorizado, por

    presidente da Corte estadual, a portar arma, a qual s no estaria registrada

    em seu nome porque, poca dos fatos, ainda vigoraria o prazo legal para o

    devido registro. No obstante, explicitou-se que esse prazo, espcie de

    vacatio legis indireta, teria sido des nado aos proprietrios e possuidores de

    arma de fogo (Lei n 10.826/2003, art. 12), e no queles acusados de porte

    ilegal (art. 14) . Vencido o Min. Celso de Mello, que concedia a ordem por

    entender destituda de tipicidade penal a conduta imputada ao paciente. HC

    n 96.759/CE, rel. Min. Joaquim Barbosa, 28/2/2012.(HC n 96.759)

    Aps a exposio acerca do tema do porte de arma desmuniciada, vlido

    trazer ao conhecimento dos operadores do direito, o texto da lavra do Professor

    Fernando Capez, cujo ttulo Para crime, o estado do artefato no importa, disponvel

    em , acesso no domingo, 31/10/2010, s 22:28:

    Recentemente a 1 Turma do Supremo Tribunal Federal, reformulando

    antigo posicionamento, passou a se pronunciar no sentido de que, para o

    perfazimento do crime de porte de arma de fogo arts. 14 e 16 do Estatuto

    do Desarmamento , no importa se o artefato est ou no municiado ou,

    ainda, se apresenta regular funcionamento.

    Com base nessa nova linha diretriz albergada pela aludida Turma, nos

    diversos arestos referidos, sero reputadas criminosas as condutas de: (a)

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    portar arma sem munio; (b) portar arma inecaz para o disparo; (c)

    portar arma de brinquedo; e (d) portar munio isoladamente.

    O venervel entendimento, no entanto, passvel de questionamento, pois

    considera que o perigo pode ser presumido de modo absoluto, de maneira a

    considerar delituosos comportamentos totalmente inecazes de ofender o

    interesse penalmente tutelado, menoscabando o chamado crime impossvel,

    em que a ao jamais poder levar leso ou ameaa de leso do bem

    jurdico, em face da impropriedade absoluta do objeto material, ou

    ineccia absoluta do meio empregado.

    Por essa razo, analisaremos aqui cada uma das referidas situaes,

    primeiramente, luz da antiga jurisprudncia da Egrgia Corte e de outros

    tribunais, e, posteriormente, sob a perspectiva da doutrina.

    O porte de arma sem munio

    Segundo anterior interpretao sedimentada pela 1 Turma do STF, haveria a

    a tipicidade do porte de arma desmuniciada e sem que o agente vesse nas

    circunstncias a pronta disponibilidade de munio, luz dos princpios da

    lesividade e da ofensividade, porquanto incapaz a conduta de gerar leso

    efetiva ou potencial incolumidade pblica. Assim, decidiu-se que: (a) se o

    agente traz consigo a arma desmuniciada, mas tem a munio adequada

    mo, de modo a viabilizar sem demora signicativa o municiamento e, em

    consequncia, o eventual disparo, tem-se arma disponvel e o fato realiza o

    tipo; (b) ao contrrio, se a munio no existe ou est em lugar inacessvel

    de imediato, no h a imprescindvel disponibilidade da arma de fogo, como

    tal isto , como artefato idneo a produzir disparo e, por isso, no se

    realiza a gura tpica.

    O porte de arma inecaz

    Da mesma forma que a arma desmuniciada, sobredita Turma, no RHC n

    81.057/SP, vinha se manifestando no sentido da no congurao do tipo

    penal do porte de arma de fogo inapta para disparo ou de arma de brinquedo,

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    pois Para a teoria moderna que d realce primacial aos princpios da

    necessidade da incriminao e da lesividade do fato criminoso o

    cuidar-se de crime de mera conduta no sentido de no se exigir sua

    congurao um resultado material exterior ao no implica admitir sua

    existncia independentemente de leso efetiva ou potencial ao bem jurdico

    tutelado pela incriminao da hiptese de fato.

    Com efeito, na gura criminal cogitada, os princpios bastam, de logo, para

    elidir a incriminao do porte da arma de fogo inidnea para a produo de

    disparos: aqui, falta incriminao da conduta o objeto material do po. No

    importa que a arma verdadeira, mas incapaz de disparar, ou a arma de

    brinquedo possam servir de instrumento de intimidao para a prtica de

    outros crimes, particularmente, os comissveis mediante ameaa pois

    certo que, como tal, tambm se podem u lizar outros objetos da faca

    pedra e ao caco de vidro , cujo porte no constitui crime autnomo e cuja

    utilizao no se erigiu em causa especial de aumento de pena.

    Porte de munio isoladamente

    Havia julgados no sentido de que, embora a conduta estivesse formalmente

    prevista na Lei n 10.826/2003, a ausncia de potencialidade lesiva

    conduziria a tipicidade, porque, do contrrio, haveria violao ao princpio

    da ofensividade. Nesse sentido: Artefato que no oferece ofensividade

    incolumidade pblica, uma vez que a munio, por si s, no gera perigo

    algum, pelo fato de que no pode ser utilizada sozinha (TJ-RS, Apelao

    Crime n 70.013.631.122, Sexta Cmara Criminal, Rel. Min. Paulo Moacir

    Aguiar Vieira, Julgado em 23/3/2006). Na mesma linha: TJ-RS, Apelao

    Crime n 70.012.863.270, Stima Cmara Criminal, Rel. Min. Nereu Jos

    Giacomolli, Julgado em 13/10/2005; TJ-RS, Apelao Crimen

    70.012.651.477, Sexta Cmara Criminal, Rel. Des.

    Joo Batista Marques Tovo, Julgado em 6/10/2005.Do mesmo modo, j

    havia se pronunciado a 1 Turma do STF, I Paciente que guardava no

    interior de sua residncia 7 (sete) cartuchos munio de uso restrito, como

    recordao do perodo em que foi sargento do Exrcito. II Conduta

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    formalmente tpica, nos termos do art. 16 da Lei n 10.826/2003. III

    Inexistncia de Potencialidade lesiva da munio apreendida,

    desacompanhada de arma de fogo. A tipicidade material dos fatos. IV

    Ordem concedida (STF, 1 Turma, HC n 96.532/RS, Rel. Min. Ricardo

    Lewandowski, j. 6/10/2009, DJE 27/11/2009)

    A nova jurisprudncia do STF

    Consoante o novo esclio sedimentado pela 1 Turma do STF, nos acrdos

    j mencionados, haver a congurao de crime em todas as situaes acima

    aludidas, na medida em que o Estatuto do Desarmamento, em seu art. 14,

    tipicou criminalmente a simples conduta de portar munio, a qual,

    isoladamente, ou seja, sem a arma, no possui qualquer potencial ofensivo.

    Alm do que, segundo a Egrgia Corte, a objetividade jurdica dos delitos

    previstos na Lei transcende a mera proteo da incolumidade pessoal, para

    alcanar tambm a tutela da liberdade individual e de todo o corpo social,

    asseguradas ambas pelo incremento dos nveis de segurana coletiva que ele

    propicia.

    Por derradeiro, em conformidade com essa inovadora diretriz, passou a ser

    dispensvel a confeco de laudo pericial para aferio da materialidade do

    delito.

    Crticas ao posicionamento do STF

    Tal entendimento passvel de questionamento, pois o perigo no pode ser

    presumido de modo absoluto, de maneira a considerar criminosas condutas

    totalmente inecazes de ofender o interesse penalmente tutelado.

    O bem jurdico precipuamente tutelado pela Lei n 10.826/2003 a

    incolumidade pblica. Em ltima anlise, o que o Diploma Legal pretende

    proteger o direito vida, integridade corporal, e, com isso, garantir a

    segurana do cidado em todos os aspectos. Para atingir esse objetivo, o

    legislador procurou coibir o ataque a to relevantes interesses de modo

    bastante amplo, punindo a conduta perigosa ainda em seu estgio

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    embrionrio. Com efeito, tipica-se a posse ilegal de arma de fogo, o

    porte e o transporte dessa arma em via pblica, o disparo, o comrcio e o

    trco de tais artefatos, com vistas a impedir que tais comportamentos,

    restando impunes, evoluam at se transformar em efe vos ataques. Em outras

    palavras, pune-se o perigo, antes que se convole em dano. Perigo abstrato ou

    presumido aquele cuja existncia dispensa a demonstrao efetiva de que a

    vtima cou exposta a uma situao concreta de risco. Contrape-se ao

    perigo concreto, que exige a comprovao de que pessoa determinada ou

    pessoas determinadas caram sujeitas a um risco real de leso. Trata-se de

    situao de real modicao no mundo exterior, perceptvel

    naturalisticamente e consistente na alterao das condies de

    intangibilidade do bem existente antes da prtica da conduta. O perigo

    concreto deui de dada situao objetiva em que o comportamento humano

    gerou uma possibilidade concreta de destruio do bem jurdico tutelado, at

    ento no existente (antes da conduta no havia risco de leso, e depois se

    constatou o surgimento dessa possibilidade).

    No o que ocorre com os delitos previstos nos arts. 12 a 18 da Lei n

    10.826/2003, cujos tipos penais no mencionam, em momento algum, como

    elemento necessrio congurao tpica, a prova da efetiva exposio de

    outrem a risco. Basta a realizao da conduta, sendo desnecessria a

    avaliao subsequente sobre a ocorrncia, in casu, de efetivo perigo

    coletividade. Assim, por exemplo, um sujeito que sai noite perambulando

    pelas ruas com uma arma de fogo na cinta, sem autorizao para port-la,

    cometer a infrao prevista nos arts. 14 (arma de uso permitido) ou 16

    (arma de uso proibido), independentemente de se comprovar que uma pessoa

    determinada cou exposta a situao de perigo. No fosse assim e o autor de

    to grave infrao restaria impune, bastando alegar que no havia ningum

    por perto, para ver-se livre da imputao.

    Por outro lado, isso no signica que a lei possa presumir o perigo em

    qualquer conduta. Seno, vejamos. Na hiptese de arma absolutamente

    inapta a efetuar disparos, o fato ser a pico, no porque no se logrou

    comprovar a efetiva exposio de algum a uma situao concreta de risco,

    mas porque a conduta jamais poder levar a integridade corporal de algum

  • proibida a reproduo total ou parcial do contedo deste material todos os direitos reservados. 35

    a um risco de leso. A lei no pode presumir a existncia de perigo para

    a vida, na ao de golpear o peito de um adulto com um palito de

    fsforo; no pode presumir que a ingesto de substncia abortiva capaz

    de colocar em risco a vida intrauterina de mulher que no esteja grvida; no

    pode presumir que a vida j inexistente de um cadver foi ameaada por um

    atirador mal informado; no pode, enm, presumir que o porte de arma

    totalmente inecaz para produzir disparos seja capaz de ameaar a

    coletividade, de reduzir o seu nvel de segurana. Evidentemente, nesta

    ltima hiptese, estaremos diante de um crime impossvel pela ineccia

    absoluta do objeto material (CP, art. 17). A lei s pode presumir o perigo

    onde houver, em tese, possibilidade de ele ocorrer. Quando, de antemo, j

    se verica que a conduta jamais poder colocar o interesse tutelado em risco,

    no h como presumir o perigo. Em suma, no existe crime de perigo

    quando tal perigo for impossvel. Coisa bem diferente sustentar que uma

    conduta em tese apta a colocar em risco outras pessoas no seja considerada

    pica apenas porque no se comprovou a exposio de pessoas determinadas

    a situao de perigo concreto.

    certo que o princpio da ofensividade no deve ser empregado para tornar

    obrigatria a comprovao do perigo, mas para tornar a picos os

    comportamentos absolutamente incapazes de lesar o bem jurdico. a

    aplicao pura e simples do art. 17 do CP, que trata do chamado crime

    impossvel (tambm conhecido por tentativa inidnea, que aquela que

    jamais pode dar certo). Assim, se, por exemplo, um casal de namorados

    pratica atos libidinosos em local ermo e em horrio de nenhuma circulao

    de pessoas, no se pode falar em ato obsceno, uma vez que o bem jurdico

    pudor da coletividade no foi sequer exposto a uma situao real de

    perigo. Quando o art. 233 do CP tipica o delito em questo, pressupe que

    a conduta tenha idoneidade para, ao menos, submeter o interesse social

    tutelado a algum risco palpvel. Se impossvel o risco de leso ao bem

    jurdico, no existe crime. Do mesmo modo, se o sujeito mantm arma de

    fogo dentro de casa, sem ter o registro legal do artefato, est realizando uma

    conduta descrita como delito pelo art. 12 do Estatuto do Desarmamento. No

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    de casas estiver descarregada, em um ba trancado no sto da edcula,

    no fundo do quintal, no se poder falar na ocorrncia de ilcito penal,

    uma vez que, nessa hiptese, a conduta jamais redundar em reduo do

    nvel de segurana da coletividade. Presumir perigo no signica inventar

    perigo onde este jamais pode ocorrer. Perigo presumido no sinnimo de

    perigo impossvel.

    Em suma, entendemos que a ofensividade ou lesividade um princpio que

    deve ser aceito, por se tratar de princpio constitucional do direito penal,

    diretamente derivado do princpio da dignidade humana (CF, art. 1, III).

    Sua aplicao, no entanto, no pode ter o condo de abolir totalmente os

    chamados crimes de perigo abstrato, mas to somente temperar o rigor de

    uma presuno absoluta e inexvel. A ofensividade deve ser empregada

    para afastar as hipteses de crime impossvel, em que o comportamento

    humano jamais poder levar o bem jurdico a leso ou a exposio a risco de

    leso. No mais, deve-se respeitar a legtima opo poltica do legislador de

    resguardar, de modo mais abrangente e ecaz, a vida, a integridade corporal

    e a dignidade das pessoas, ameaadas com a mera conduta, por exemplo, de

    algum possuir irregularmente arma de fogo no interior de sua residncia ou

    domiclio. Finalmente, no tocante equiparao legal da posse ou do porte

    de acessrios ou munio arma de fogo, vale mencionar que o sujeito que

    for de do transportando somente a munio de um armamento de uso restrito

    incidir nas mesmas penas que aquele que transportar a prpria arma

    municiada. No parece ser a medida mais justa, pois o projtil, sozinho, isto

    , desacompanhado da arma de fogo, pode no ter idoneidade vulnerante.

    Alm do que, a pena para quem mantm consigo, porta ou transporta, dentre

    outras condutas, apenas a munio ou o acessrio elevadssima, ou seja,

    recluso, de 3 a 6 anos, mais multa, nos termos do artigo 16 da nova Lei, e,

    portanto, mais grave at mesmo que as sanes cominadas a alguns crimes

    contra a vida, tais como o induzimento, instigao ou auxlio ao suicdio

    (CP, art. 122: Pena, recluso, de 2 a 6 anos, se o suicdio se consuma); o

    infanticdio (CP, art. 123: Pena, deteno, de 2 a 6 anos); o aborto provocado

    pela gestante ou com seu consentimento (CP, art. 124: Pena, deteno, de 1 a

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    3 anos); o aborto provocado por terceiro com o consentimento da

    gestante (CP, art. 126: Pena, recluso, de 1 a 4 anos); e a leso corporal

    de natureza grave (CP, art. 129, 1: Pena, recluso, de 1 a 5 anos).

    Verique-se que a interrupo criminosa da vida intrauterina, a contribuio

    para que algum ponha m prpria vida, a ofensa integridade corporal de

    outrem com sequelas denitivas, por exemplo, so comportamentos que

    agridem diretamente o bem jurdico, provocando-lhe efetiva leso. Desse

    modo, no tem sentido punir o perigo potencial representado pela mera

    posse de munio ou acessrio com maior rigor do que se pune o dano

    concreto, muitas vezes provocado pelo uso efetivo da arma e sua munio.

    Por todas as razes acima expendidas, cremos que as situaes tratadas pela

    1 Turma do STF merecem ser analisadas luz do princpio da ofensividade,

    como forma de temperar o rigor de uma presuno absoluta e inexvel dos

    crimes de perigo abstrato, sob pena do come mento de graves injustias.

    Assim, a ofensividade dever ser utilizada para rechaar as hipteses de

    crime impossvel, em que o comportamento humano jamais poder levar o

    bem jurdico a leso ou a exposio a risco de leso. Quando, de antemo, j

    se verica que a conduta jamais poder colocar o interesse tutelado em

    risco, no h como presumir o perigo.

    A consumao do art. 14 se d com a prtica de uma das duas condutas.

    A conduta ter em depsito torna o crime permanente.

    possvel tentativa no art. 14? Em determinadas condutas possvel a

    tentativa, como, por exemplo, tentar adquirir.

    Objeto material: arma de fogo e o exame pericial dispensvel. (AgRg no

    Resp. n 917.040- SC, 6 Turma, Rel. Min. Paulo Gallo , julg. em 29/4/2008).

    No mesmo sentido, a Primeira Turma do STF decidiu que:

    Porte Ilegal de Arma de Fogo e Exame Pericial

    Em concluso de julgamento, a Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus

    impetrado em favor de condenado pela prtica do delito de porte ilegal de

    arma de fogo de uso permitido (Lei n 10.826/2003, art.14) no qual se

    sustentava a indispensabilidade de

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    exame pericial vlido na arma apreendida. Salientou--se a peculiaridade

    do caso, pois o prprio paciente conrmara, em juzo, que havia

    comprado a pistola. Asseverou-se, inclusive, que o paciente fora preso por

    ter feito uso da arma em suposto crime contra a vida , e que ela se

    mostrara ecaz. Vencido o Min. Marco Aurlio, relator, que concedia a

    ordem por entender indispensvel a feitura de percia quando da apreenso

    de armas de fogo. Acrescentava que o CPP revelaria impedimentos

    relativamente atuao dos peritos e que, assim, a um s tempo, o policial

    no poderia exercer atividade que lhe fosse inerente e atuar como perito.

    HC n 96.921/RS, rel. orig. Min. Marco Aurlio, red. p/ acrdo Min. Dias

    Tooli, 14/9/2010. (HC n 96.921)

    Dispunha o pargrafo nico do art. 14: [...] Pargrafo nico. O crime

    previsto neste artigo inaanvel, salvo quando a arma de fogo es ver registrada em

    nome do agente.

    Esse artigo foi declarado inconstitucional pelo STF na ADI n 3.112

    (2/5/2007, Tribunal Pleno). O fundamento dado a essa inconstucionalidade do art. 14 do

    Estatuto do Desarmamento que, por ser crime de mera conduta, desproporcional e

    desarrazoado compar-lo com os crimes hediondos.

    Vejamos a ementa da deciso proferida pelo pleno do STF:

    EMENTA: AO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N

    10.826/2003. ESTATUTO DO DESARMAMENTO.

    INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL AFASTADA. INVASO DA

    COMPETNCIA RESIDUAL DOS ESTADOS. INOCORRNCIA.

    DIREITO DE PROPRIEDADE. INTROMISSO DO ESTADO NA

    ESFERA PRIVADA DESCARACTERIZADA. PREDOMINNCIA DO

    INTERESSE PBLICO RECONHECIDA. OBRIGAO DE RENOVA-

    O PERIDICA DO REGISTRO DAS ARMAS DE FOGO. DIREITO

    DE PROPRIEDADE, ATO JURDICO PERFEITO E DIREITO

    ADQUIRIDO ALEGADAMENTE VIOLADOS. ASSERTIVA

    IMPROCEDENTE. LESO AOS PRINCPIOS CONSTITUCIONAIS DA

    PRESUNO DE INOCNCIA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.

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    AFRONTA TAMBM AO PRINCPIO DA RAZOABILIDADE.

    ARGUMENTOS NO ACOLHIDOS. FIXAO DE IDADE

    MNIMA PARA A AQUISIO DE ARMA DE FOGO.

    POSSIBILIDADE. REALIZAO DE REFERENDO. INCOMPETNCIA

    DO CONGRESSO NACIONAL. PREJUDICIALIDADE. AO

    JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE QUANTO PROIBIO

    DO ESTABELECIMENTO DE FIANA E LIBERDADE PROVISRIA. I

    Dispositivos impugnados que constituem mera reproduo de normas

    constantes da Lei n 9.437/1997, de iniciativa do Executivo, revogada pela

    Lei n10.826/2003, ou so consentneos com o que nela se dispunha, ou,

    ainda, consubstanciam preceitos que guardam anidade lgica, em uma

    relao de pertinncia, com a Lei n 9.437/1997 ou com o PL n 1.073/1999,

    ambos encaminhados ao Congresso Nacional pela Presidncia da Repblica,

    razo pela qual no se caracteriza a alegada inconstitucionalidade formal. II

    Invaso de competncia residual dos Estados para legislar sobre segurana

    pblica inocorrente, pois cabe Unio legislar sobre matrias de

    predominante interesse geral. III O direito do proprietrio percepo de

    justa e adequada indenizao, reconhecida no diploma legal impugnado,

    afasta a alegada violao ao art. 5, XXII, da Constituio Federal, bem

    como ao ato jurdico perfeito e ao direito adquirido. IV A proibio de

    estabelecimento de ana para os delitos de porte ilegal de arma de fogo de

    uso permitido e de disparo de arma de fogo, mostra--se desarrazoada,

    porquanto so crimes de mera conduta, que no se equiparam aos crimes que

    acarretam leso ou ameaa de leso vida ou propriedade. V

    Insusceptibilidade de liberdade provisria quanto aos delitos elencados nos

    arts. 16, 17 e 18. Inconstitucionalidade reconhecida, visto que o texto magno

    no autoriza a priso ex lege, em face dos princpios da presuno de

    inocncia e da obrigatoriedade de fundamentao dos mandados de priso

    pela autoridade judiciria competente. VI Identicao das armas e

    munies, de modo a permitir o rastreamento dos respectivos fabricantes e

    adquirentes, medida que no se mostra irrazovel. VII A idade mnima

    para aquisio de arma de fogo pode ser estabelecida por meio de lei

    ordinria, como se tem admitido em outras hipteses. VIII Prejudicado o

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    exame da Inconstitucionalidade formal e material do art. 35, tendo em

    conta a realizao de referendo. IX Ao julgada procedente, em parte,

    para declarar a Inconstitucionalidade dos pargrafos nicos dos arts. 14 e 15

    e do art. 21 da Lei n 10.826, de 22 de dezembro de 2003.

    O homicdio absorve o crime do art. 14 do Estatuto do Desarmamento?

    Primeira corrente: responde sempre pelos dois crimes, porque os tipos

    penais protegem bens jurdicos distintos. O crime de homicdio protege o bem jurdico

    vida, enquanto o crime de disparo protege a coletividade.

    Segunda corrente: se o crime de porte de arma foi praticado apenas para a

    execuo do homicdio, ou seja, se foi fase normal e necessria para a execuo do

    delito, car absorvido, tendo em vista o princpio da consuno. No caso, o porte de

    arma seria crime-meio para a prtica do delito de homicdio.

    o posicionamento da Sexta Turma do STJ, seno vejamos: Sexta Turma

    Consuno. Porte ilegal. Arma de fogo.

    Em habeas corpus, o impetrante defende a absoro do crime de porte ilegal

    de arma de fogo pelo crime de homicdio visto que, segundo o princpio da

    consuno, a primeira infrao penal serviu como meio para a prtica do

    ltimo crime. Explica o Min. Relator que o princpio da consuno ocorre

    quando uma infrao penal serve inicialmente como meio ou fase necessria

    para a execuo de outro crime. Logo, a aplicao do princpio da consuno

    pressupe, necessariamente, a anlise de existncia de um nexo de

    dependncia das condutas ilcitas para vericar a possibilidade de absoro

    daquela infrao penal menos grave pela mais danosa. Assim, para o Min.

    Relator, impe-se que cada caso deva ser analisado com cautela, deve-se

    atentar viabilidade da aplicao do princpio da consuno, principalmente

    em habeas corpus, em que nem sempre possvel um profundo exame dos

    fatos e provas. No entanto, na hiptese, pela descrio dos fatos na instruo

    criminal, na pronncia e na condenao, no h dvida de que o porte ilegal

    de arma de fogo serviu de meio para a prtica do homicdio. Diante do

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    exposto, a Turma concedeu a ordem para, com fundamento no princpio

    da consuno, excluir o crime de porte de arma de fogo da condenao

    do paciente. Precedentes citados: REsp. n 570.887-RS, DJ 14/2/2005; HC

    n 34.747-RJ, DJ 21/11/2005, e REsp. n 232.507- DF, DJ 29/10/2001. HC

    n 104.455-ES, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 21/10/2010.

    Disparo de arma de fogo

    Rege o art. 15 da lei em estudo:

    Art. 15. Disparar arma de fogo ou acionar munio em lugar habitado ou em

    suas adjacncias, em via pblica ou em direo a ela, desde que essa conduta

    no tenha como nalidade a prtica de outro crime:

    Pena recluso, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

    Sujeito ativo: crime comum (pode ser praticado por qualquer pessoa). A

    pena ser aumentada da metade se o crime for praticado por integrante dos rgos e

    empresas referidas nos arts. 6, 7 e