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Tutela Antecipada Contra União e Viação Cidade Integra da decisão consta a partir da página seis
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VARA DO TRABALHO DE ARARANGUÁ
PROCESSO No. 01403/2013
Vistos, etc.
I - Pretende o Ministério Público do Trabalho, pela
Procuradoria Regional do Trabalho da 12ª Região, a antecipação dos
efeitos da tutela de mérito para que seja determinado às rés VIAÇÃO
CIDADE LTDA. e EMPRESA UNIÃO DE TRANSPORTE LTDA., o
cumprimento das obrigações de fazer e não fazer expostas nos tópicos “a”
a “c” da exordial (fls. 15v.-16). Sustenta, em síntese, que as requeridas
integram o mesmo grupo econômico; que tomou conhecimento que as
requeridas prorrogam a jornada de trabalho, excedendo o limite
estabelecido pela ordem jurídica; que elas não concedem integralmente o
intervalo interjornada; que também tomou conhecimento, após a
instauração de Inquérito Civil, que as rés exigem de seus empregados
motoristas a acumulação de funções de venda de bilhetes de passagem e
a condução de veículos, bem como que foi declarado que não será
respeitada a legislação municipal no que concerne à operação do
transporte urbano de passageiros, mediante a contratação de empregados
cobradores.
As requeridas, devidamente citadas, apresentaram
contestação escrita, em conjunto, requerendo a denunciação à lide do
Município de Araranguá, do Departamento de Transportes e Terminais do
Estado de Santa Catarina – DETER/SC, e da Agência Nacional de
Transportes Terrestres – ANTT e, no mérito, pugnando pela improcedência
dos pedidos, ao argumento de que a legislação municipal que regula a
questão da contratação de empregados exercentes da função de cobrador
é inconstitucional e que impetrou mandado de segurança perante o Juízo
Cível atinente a essa questão; que não há descumprimento da legislação
VARA DO TRABALHO DE ARARANGUÁ
de trânsito quanto à realização acumulada das funções de motorista e
cobrador; que a realização conjunta das atividades é ocasional e eventual,
visto que adota o sistema de venda de passagens antecipada, mediante
aquisição de créditos inseridos em cartão magnético, sendo que o usuário
apenas passa o seu cartão junto à catraca eletrônica ou apenas apresenta
a sua passagem ao motorista habilitado; que não há óbice na legislação
trabalhista atinente ao exercício dessas atribuições, ao argumento de que o
empregado se obriga a todo e qualquer serviço compatível com a sua
condição pessoal; no tocante ao intervalo interjornada, aduz que observa o
período destinado ao descanso do trabalhador e que as fichas juntadas
com a exordial “não refletem a realidade laborativa dos funcionários” (fl.
287), pois “não haviam sido aferidos pelo Setor de Pessoal das requeridas,
frente aos discos de tacógrafo, e aos contratos de viagem executados
pelos Motoristas” (fl. 287).
O Sindicato dos Trabalhadores em Transportes
Rodoviários do Vale do Araranguá, na condição de assistente simples,
apresenta manifestação às fls. 293-297.
Manifestação do requerente às fls. 860-862, requerendo
o desentranhamento de documentos apresentados pelas requeridas, às fls.
381-849, por terem sido juntados extemporaneamente, bem como por não
terem relação com o processo. Requer, ainda, a apreciação do pedido de
antecipação de tutela. Informa, na mesma peça, que não teve vista da
mídia apresentada com a defesa, porque não acompanhou os autos no
momento oportuno.
É o breve relatório.
Vieram-me os autos conclusos para deliberações.
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VARA DO TRABALHO DE ARARANGUÁ
I- DA JUNTADA DE DOCUMENTOS DAS FLS. 381-849
Embora os documentos não tenham sido acostados aos
autos com a defesa, não constato a ocorrência de óbice na sua juntada,
visto que apresentados antes do encerramento da instrução, não havendo
prejuízo para o requerente, por observados os princípios do contraditório e
da ampla defesa.
No tocante à sua pertinência para o deslinde do feito, tal
questão será apreciada por ocasião da prolação da sentença.
Indefiro o requerimento de desentranhamento dos
documentos.
II- DA DENUNCIAÇÃO À LIDE
As requeridas denunciam à lide o Município de
Araranguá, o Departamento de Transportes e Terminais do Estado de
Santa Catarina – DETER/SC, e a Agência Nacional de Transportes
Terrestres – ANTT, ao argumento de que se forem compelidas a contratar
novos empregados para a execução da atividade de cobrador, tal fato
repercutirá no aumento do custo operacional para a prestação de serviço e,
por consequência, no equilíbrio econômico-financeiro que baliza os
contratos firmados entre os Poderes concedentes e as concessionárias
(ora rés). Asseveram, assim, que “surgirá um dever natural aos Poderes
Concedentes de indenizar os prejuízos decorrentes da relação custo
operacional e defasagem tarifária, bem como, emergirá o dever de
reajustar as tarifas e/ou os coeficientes tarifários em patamar justo e
equânime, no intuito de restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro dos
contratos.” (fl. 258).
O entendimento doutrinário dominante é no sentido de
que é incabível a denunciação à lide nesta Justiça Especializada, inclusive
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quanto à hipótese do inciso III do art. 70 do CPC, por ser a Justiça do
Trabalho incompetente para julgar o litígio que decorre da relação existente
entre o denunciante e o denunciado.
Neste sentido:
“DENUNCIAÇÃO DA LIDE. IMPOSSIBILIDADE NO PROCESSO
TRABALHISTA. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência majoritária têm
convergido pela impossibilidade da denunciação da lide no processo do
trabalho, tendo em vista a incompetência desta Justiça Especializada para
julgar a relação existente entre denunciante e denunciado, ou seja, entre
duas pessoas jurídicas.” (RO 0006243-97.2010.5.12.0050 - Juíza Mari
Eleda Migliorini - Publicado no TRTSC/DOE em 10-12-2013).
Além disso, infiro da alegação contida na defesa que a
situação não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no art. 70
do CPC.
Rejeito o pedido.
III- DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
No caso sob apreciação, encontra-se demonstrada a
verossimilhança das alegações deduzidas pelo requerente, ante à farta
documentação acostada aos autos, tais como o Relatório de Fiscalização
efetuado pela Gerência Regional do Trabalho e Emprego de Criciúma, que
confirmou a ocorrência da supressão do intervalo interjornada no ano de
2010, bem como os documentos de controle de jornada de trabalho do
período correspondente a 26-03-2013 a 25-04-2013 (especialmente o de fl.
131 – dias 08 e 09; de fl. 131v. - dias 21 e 22; de fl. 135, dias 01 e 02; 04 e
05; e 08-09; de fl. 135v., dias 15 a 19; de fl. 138, dias 28 e 29.
exemplificativamente).
Embora os documentos de controle de jornada do
período acima referido tenham sido impugnados pelas rés, a argumentação
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articulada na defesa não encontra fundamento legal, já que inexiste
previsão de validação de registros de horários, apenas revelando a
existência de eventual manipulação de documentos pelo empregador.
No tocante ao exercício acumulado das funções de
motorista e cobrador, este fato não é negado pelas requeridas.
Por sua vez, a Lei Municipal nº 3.182/20131 determina
que as empresas permissionárias do Transporte Coletivo Municipal
disponibilizem dois funcionários (motorista e cobrador), para trabalhar
dentro de cada ônibus, mesmo que adotado o sistema eletrônico de
passagem, a fim de que o cobrador auxilie o motorista e os usuários no
critério de segurança e comodidade dos passageiros, cuja obrigação não
está sendo observada pelas requeridas, conforme reconhecido na defesa.
Apesar de as rés terem impetrado mandado de
segurança perante o Juízo Cível questionando a validade da aludida Lei
Municipal, verifico que a segurança foi denegada, em primeira instância,
conforme cópia da decisão carreada às fls. 863-865. De todo modo, a
matéria ventilada na presente ação civil pública deve ser apreciada à luz
das normas trabalhistas.
Nesse sentido, esta Magistrada já adotou
posicionamento no sentido de que o exercício conjunto das funções de
motorista e cobrador caracteriza o abuso quantitativo de atribuições, visto
que, além de o trabalhador-motorista ter que zelar pela segurança dos
passageiros, dos demais transeuntes e condutores de veículos, necessita
se concentrar nas tarefas de receber numerário, dar troco, e fornecer
relatório de vendas, sob pena de ressarcir o empregador dos prejuízos
eventualmente ocorridos.
1 “Art. 1º As empresas permissionárias do Transporte Coletivo Municipal, deverão disponibilizar 2 (dois) funcionários, motorista e cobrador, trabalhando dentro de cada ônibus, devendo o cobrador auxiliar o motorista e os usuários no critério de segurança e comodidade dos passageiros, ainda que as empresas disponibilizem do sistema eletrônico de passagens.” obtida no site www.leismunicipais.com.br
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VARA DO TRABALHO DE ARARANGUÁ
Não obstante as rés tenham adotado o sistema de
bilhetagem eletrônica, depreendo dos autos da RT 792/2013, a qual tramita
perante este Juízo, quando da produção da prova oral, esta Magistrada
colheu o depoimento pessoal da primeira requerida, que confessou que
ainda há cerca de 20% dos usuários de transporte que efetuam a compra
de passagem no embarque, mediante o pagamento por numerário, o que
afasta a tese de que apenas eventualmente o motorista efetiva a referida
cobrança após a implementação do sistema eletrônico.
Desta forma, impor ao empregado-motorista a obrigação
de exercer também a função de cobrador fere as normas atinentes à saúde
e segurança do trabalho, uma vez que a atividade de motorista já exige de
quem a exerce extrema concentração no trânsito (assim entendido como
os demais veículos e transeuntes), no itinerário a ser desempenhado, nos
horários a serem cumpridos, e nas paradas a serem realizadas; e a função
de cobrador, por outro lado, implica a lida com numerário, o que, por
consequência, causa desgaste físico e mental no trabalhador, aumentando,
assim, os riscos de acidentes e doenças ocupacionais.
Diante desse contexto, comprovada a verosimilhança
das alegações, e considerando-se que a ausência de prestação
jurisdicional poderá causar danos irreparáveis aos trabalhadores sujeitos
às situações descritas na exordial, acolho o pedido para determinar que: as
requeridas VIAÇÃO CIDADE LTDA. e EMPRESA UNIÃO DE
TRANSPORTE LTDA. observem as seguintes obrigações:
a) abstenham-se de exigir que seus empregados
motoristas profissionais cumulem as funções de cobradores, permitindo o
exercício exclusivo, pelos motoristas profissionais, das funções e deveres
próprios da profissão, notadamente no que se refere àqueles previstos no
disposto pelo art. 235 B, inciso III, da CLT, sob pena de multa de R$
50.000,00 (cinquenta mil reais), incidente a cada veículo conduzido por
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motorista profissional em cumulação de função, a ser revertida a instituição
a ser definida por ocasião da prolação da sentença;
b) deverão, no caso do transporte urbano de
passageiros disciplinado pela Lei Municipal nº 3.182/2013, assegurar que
sejam contratados, no prazo de noventa dias, tantos cobradores quantos
forem os veículos necessários à operação do sistema, sob pena de multa
de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), incidente a cada veículo conduzido
apenas por motorista profissional em cumulação de função, a ser revertida
a instituição a ser definida por ocasião da prolação da sentença;
c) abstenham-se de prorrogar a jornada normal de
trabalho além do limite legal de prorrogação de 2 (duas) horas
suplementares diárias, sem qualquer justificativa legal, nos termos do artigo
59 c/c 61 da CLT, sob pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais),
incidente a cada veículo conduzido por motorista profissional em excesso
ilegal de jornada, sendo que, em caso de acidente envolvendo motorista
durante o excesso ilegal de jornada, a multa deverá ser majorada em
100%, a ser revertida a instituição a ser definida por ocasião da prolação
de sentença; e
d) deverão conceder o período mínimo de 11 (onze)
horas consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho de seus
empregados motoristas profissionais, nos termos do art. 66 da CLT, sob
pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) incidente a cada
constatação de descumprimento do intervalo, e, em caso de acidente
envolvendo motorista durante a jornada inciada sem o descanso previsto
pelo art. 66 da CLT, a multa deverá ser majorada em 100%, a ser revertida
a instituição a ser definida por ocasião da prolação de sentença.
Intimem-se as requeridas para cumprimento, conforme a
fundamentação supra, por meio de seu procurador constituído nos autos,
pelo Sistema DOE.
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Cientifique-se o Ministério Público do Trabalho,
encaminhando-se os autos, com todos os seus volumes, inclusive o
envelope contendo um “CD”, para manifestação acerca do teor da
mencionada mídia, no prazo de dez dias.
Após, inclua-se o feito em pauta de prosseguimento
Araranguá, 31 de julho de 2014, às 18h52min.
SANDRA SILVA DOS SANTOS
Juiz do Trabalho
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