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Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro Diferenciação da Tutela Antecipada e Tutela Cautelar Patricia de Souza Barbosa Rodrigues Rio de Janeiro 2010

Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro … · 2 DIFERENCIAÇÃO ENTRE TUTELA ANTECIPADA E TUTELA CAUTELAR Patricia de Souza Barbosa Rodrigues Graduada pela Faculdade de

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  • Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro

    Diferenciao da Tutela Antecipada e Tutela Cautelar

    Patricia de Souza Barbosa Rodrigues

    Rio de Janeiro

    2010

  • PATRICIA DE SOUZA BARBOSA RODRIGUES

    Diferenciao de Tutela Antecipada e Tutela Cautelar

    Artigo Cientfico apresentado Escola de

    Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, como

    exigncia para obteno do ttulo de Ps-

    Graduao.

    Orientadores: Prof. Mnica Areal

    Prof. Nli Fetzner

    Prof. Nelson Tavares

    Rio de Janeiro

    2010

  • 2

    DIFERENCIAO ENTRE TUTELA ANTECIPADA E TUTELA CAUTELAR

    Patricia de Souza Barbosa Rodrigues

    Graduada pela Faculdade de Direito Cndido

    Mendes. Advogada.

    Resumo: sabido que as tutelas antecipada e cautelar vm sendo utilizadas com muita

    frequncia e servindo de tema para inmeras discusses com relao aplicao correta de

    cada uma delas. Marcantes so as diferenas tcnicas e tericas entre tais medidas, porm,

    com as recentes alteraes introduzidas pela Lei 10.444/02, que disciplinou o princpio da

    fungibilidade, tornou-se mais difcil visualizar critrio que possibilite a precisa identificao

    da cautelaridade (tutela cautelar) e da satisfatividade (tutela antecipada).

    Assim, de modo a evitar dvidas quanto ao cabimento de uma ou outra, inclusive a

    possibilidade de sucumbncia por equvoco na formulao do pedido, imprescindvel a

    compreenso das distines e divergncias acerca deste tema.

    Palavras-chave: cautelaridade, satisfatividade

    Sumrio: Introduo; 1. Histrico da Antecipao de Tutela no Direito Brasileiro; 1.1. A

    Tutela Antecipada; 1.2. Pressupostos; 1.3. Requisitos inseridos nos pargrafos do art. 273 do

    CPC; 1.4. Antecipao de Tutela contra a Fazenda Pblica; 2. Tutela cautelar; 3. Distines

    entre a Tutela Antecipada e a Tutela Cautelar; 4. Fungibilidade. Concluso. Referncias.

    INTRODUO

    Identificar o correto manejo das tutelas cautelar e antecipada nunca foi tarefa das mais

    fceis para os operadores do direito. Com as alteraes introduzidas pela Lei 10.444/02,

    aumentou-se ainda mais essa zona nebulosa existente entre os dois institutos, ao disciplinar o

    princpio da fungibilidade, acrescentando-se um novo pargrafo 7 ao artigo 273, do Cdigo

    de Processo Civil.

    Justamente em razo da dificuldade em distinguir, em circunstncias concretas, as

    diversas espcies de tutela de urgncia, a jurisprudncia, com amparo no mencionado

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    pargrafo 7 do art. 273 do Cdigo de Processo Civil em vigor, tem admitido a fungibilidade

    procedimental entre as medidas cautelares e satisfativas atpicas, estando presentes os

    requisitos essenciais, e levando-se em conta o preceito constitucional do acesso ordem

    jurdica justa e a efetividade da jurisdio. Todavia, h quem recuse a fungibilidade quando

    haja erro grosseiro na apresentao do pedido, e quem no admita a apreciao de pedido de

    tutela satisfativa veiculado por meio do procedimento cautelar, j que o novo dispositivo

    contempla expressamente apenas a hiptese inversa.

    De modo a evitar erros graves, e assim a possibilidade de sucumbncia por equvoco

    na formulao do pedido, imprescindvel a compreenso das distines e divergncias

    acerca do tema. Sendo assim, alguns cuidados podem ser assumidos de modo que as medidas

    sejam aproveitadas, mesmo quando consideradas inadequadas, por fora da admisso legal e

    jurisprudencial da fungibilidade.

    Por fora de expressa dico legal, tem o julgador a oportunidade de antecipar a tutela

    almejada pela parte; contudo, impe-se, desde logo, diante da fora que a mens legis (Esprito

    da Lei) inspira, assentar fundamental diferena entre a antecipao de tutela e a cautela.

    Dessa forma, o presente trabalho visa analisar a diferenciao entre a tutela antecipada

    e a tutela cautelar, destacando-se a possibilidade de aplicao e seus efeitos.

    1. HISTRICO DA ANTECIPAO DE TUTELA NO DIREITO BRASILEIRO

    Pode-se dizer que, desde h muito tempo, existe a previso de medidas urgentes.

    O direito romano j apresentava instrumentos que, de forma provisria, buscavam

    proteger o direito do requerente, como por exemplo, as interdicta, que constituam ordens

    emanadas do pretor em cognio sumria, provisria, e que tinham carter proibitrio,

    exibitrio ou restitutivo. Outros instrumentos ainda surgiram no direito romano, apresentando

  • 4

    enorme similaridade com as tutelas de urgncia atuais. Porm, somente nos tempos modernos

    a tutela de urgncia tornou-se um dos elementos principais no cotidiano da atividade

    jurisdicional, dada a agilidade da vida moderna, em descompasso com a lentido da prestao

    da tutela jurisdicional,

    A tutela antecipada j existe no ordenamento processual brasileiro bem antes de sua

    introduo no art. 273 do CPC, o que se deu com a micro-reforma realizada em 1994,

    especificamente por meio da Lei n 8.952, de 13 de dezembro de 1994.

    J houve reconhecida a antecipao de tutela desde o CPC de 1939, com a

    possibilidade de decises liminares nas aes possessrias, sendo tais medidas de urgncia

    uma execuo para a garantia, entregando ao requerente, enquanto pende o processo, o bem

    da vida que busca receber ao final, satisfazendo antecipadamente o direito perseguido.

    Diversas outras situaes de satisfao antecipada do direito do requerente foram

    reconhecidas pelo legislador antes e aps o CPC de 1973, seja ao permitir a tutela liminar em

    sede de mandado de segurana, seja ao admitir a execuo dos ttulos executivos

    extrajudiciais ou mesmo a possibilidade de liminares em sede de ao civil pblica. Outros

    exemplos que podem ser citados como situaes particulares em que havia a antecipao de

    tutela, so as liminares em ao de busca e apreenso (Decreto-Lei n 911/69), em ao de

    despejo etc.

    Dessa forma, pode-se afirmar que o art.273 do CPC no criou efetivamente o instituto

    da tutela antecipada, mas apenas converteu em regra geral o que j estava prescrito para

    aquelas situaes particulares.

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    1.1 A TUTELA ANTECIPADA

    A tutela antecipada uma forma de tutela jurisdicional satisfativa, prestada com base

    em juzo de probabilidade, tratando-se de fenmeno prprio do processo de conhecimento.

    A forma tradicional de prestao da tutela jurisdicional se d por meio dos chamados

    procedimentos comuns, e no processo de conhecimento esses procedimentos so dois:

    ordinrio e sumrio. O procedimento ordinrio, porm, quase que onipresente em nosso

    sistema de direito positivo, uma vez que, nos termos do artigo 272, pargrafo nico, do CPC,

    suas disposies so aplicveis subsidiariamente a todos os demais procedimentos do

    processo de conhecimento. Ocorre que, esse procedimento por natureza longo, visto que o

    juiz chamado a proferir, nos processos que o seguem, julgamentos baseados em juzo de

    certeza.

    H, porm, muitas situaes em que no se pode esperar o tempo necessrio

    formao do juzo de certeza, exigido para a prolao de sentena no processo cognitivo,

    havendo a necessidade, para se tutelar adequadamente o direito material, de se prestar uma

    tutela jurisdicional satisfativa mais rpida.

    De acordo com MARINONI (2008), a tutela antecipatria satisfativa do direito

    material, permitindo sua realizao, e no a sua segurana, mediante cognio sumria ou

    verossimilhana. Na verdade, a tutela antecipatria tem a mesma substncia da tutela final,

    com a nica diferena de que lastreada em verossimilhana e, por isso, no fica acobertada

    pela imutabilidade inerente coisa julgada material. A tutela antecipatria a tutela final

    antecipada com base em cognio sumria.

    Assim, se a tutela antecipada permite o gozo ou fruio de um direito, mesmo que em

    cognio sumria e provisria, fundada em juzo de aparncia, ela satisfativa da pretenso

    de direito material, em parte ou totalmente.

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    A tutela jurisdicional antecipada, consistente em permitir a produo dos efeitos da

    sentena de procedncia do pedido do autor desde o incio do processo (ou desde o momento

    em que o juiz se convencido da probabilidade de existncia do direito afirmado pelo

    demandante), exige alguns requisitos para a sua concesso. No basta estar presente a

    probabilidade de existncia do direito alegado, fazendo-se necessrio que haja uma situao

    capaz de gerar fundado receio de dano grave, de difcil ou impossvel reparao, ou que tenha

    ocorrido abuso de direito de defesa por parte do demandado (art. 273, I e II, CPC).

    Trata-se, pois, de tutela jurisdicional diferenciada, que por isso mesmo deve ser

    considerada como excepcional. A tutela antecipada s poder ser prestada nos casos em que

    se faa estritamente necessria, ou seja, nos casos em que esta for a nica forma de prestao

    da tutela jurisdicional adequada tutela do direito substancial.

    1.2 PRESSUPOSTOS

    Impe o art. 273, caput do CPC, a observncia dos pressupostos genricos, para

    qualquer hiptese de antecipao de tutela.

    Inicialmente, fala a lei em prova inequvoca, que convena o juiz da

    verossimilhana da alegao. Prova inequvoca no aquela que conduza a uma verdade

    plena, absoluta, real, j que essas so atingidas to-somente aps uma cognio exauriente.

    Trata-se de prova robusta, consistente, que conduza o magistrado a um juzo de probabilidade,

    o que perfeitamente vivel no contexto da cognio sumria.

    No entanto, a antecipao no dever ser concedida base de simples alegaes ou

    suspeitas. Haver de apoiar-se em prova preexistente, que, todavia, no precisa ser

    necessariamente documental. Ter que ser clara, evidente, portadora de grau de

    convencimento tal que a seu respeito no se possa levantar dvida razovel.

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    inequvoca, em outros termos, a prova capaz, no momento processual, de autorizar

    uma sentena de mrito favorvel parte que invoca a tutela antecipada, caso pudesse ser a

    causa julgada desde logo. No momento, pode haver prova suficiente para a acolhida

    antecipada da pretenso do autor. Depois, porm, da resposta e contraprova do ru o quadro

    de convencimento pode resultar alterado, e o juiz ter de julgar a lide contra o autor.

    No que tange verossimilhana da alegao, essa refere-se ao juzo de convencimento

    a ser feito em torno do quadro ftico invocado pela parte que pretende a antecipao de tutela,

    no apenas quanto existncia de seu direito subjetivo material, mas tambm e,

    principalmente, no que concerne ao perigo de dano e sua irreparabilidade, bem como ao abuso

    dos atos de defesa e de procrastinao praticados pelo ru.

    Assim, como a certeza obtida atravs de cognio exauriente, e a verossimilhana

    alcanada na cognio rarefeita, ao unir estes dois conceitos radicalmente opostos, pretende a

    lei a afirmao de um conceito que se coloque em posio intermediria entre aqueles dois: a

    cognio sumria, a qual leva formao de juzos de probabilidade.

    Portanto, conclui-se que o primeiro requisito para a concesso da tutela antecipatria

    a probabilidade de existncia do direito afirmado pelo demandante.

    Exige, tambm, o art. 273 do CPC, o pedido do interessado para a concesso da tutela

    antecipada. Veda-se, assim, a tutela antecipada ex officio (de ofcio). Trata-se de regra

    coerente com o princpio da congruncia adotado pelo nosso Cdigo nos arts. 128 e 460.

    No entanto, h casos em que o pedido de concesso da tutela antecipada se reputa

    como implcito, como, por exemplo, o pedido de fixao de alimentos provisrios em ao de

    alimentos (art. 4 da Lei Federal n 5.478/1968).

    No parece ser possvel a concesso ex officio, ressalvadas as hipteses expressamente

    previstas em lei, no s em razo de uma interpretao sistemtica da legislao processual,

    que se estrutura no princpio da congruncia. A efetivao da tutela antecipada d-se sob

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    responsabilidade objetiva do beneficirio da tutela, que dever arcar com os prejuzos

    causados ao adversrio, se for reformada a deciso. preciso que a parte requeira a

    concesso, exatamente porque, assim, conscientemente se coloca em uma situao em que

    assume o risco de ter de indenizar a outra parte, se restar vencida no processo.

    As partes legitimadas a pleitear a antecipao de tutela jurisdicional devero ser

    verificadas. O autor, obviamente, poder faz-lo. Isto decorre do fato de se permitir, com o

    art. 273, a antecipao de tutela pretendida no pedido inicial, e este, como parece bvio, o

    formado pelo demandante. Pode, ainda, pleitear a antecipao da tutela o assistente, simples

    ou qualificado, uma vez que este dispe dos mesmos poderes da parte assistida (art. 52 do

    CPC). No nos parece possvel, de outro lado, que o Ministrio Pblico, atuando como custus

    legis, possa postular a tutela antecipada, o que decorre de sua posio de sujeito imparcial do

    processo.

    O ru no poder pleitear a antecipao da tutela jurisdicional, salvo nos casos em que

    tenha ajuizado demanda ele prprio (como nos casos de reconveno, ou de pedido

    contraposto formulado na contestao, o que possvel, por exemplo, no procedimento

    sumrio), mas nesses casos, o ru se torna demandante, sendo tratado como se autor fora.

    A lei permite que a antecipao da tutela jurisdicional seja total ou parcial, sendo

    assim, pode o juiz, ao incio do processo, e com base em cognio sumria, conceder desde

    logo tudo aquilo que o autor pleiteou, ou apenas parte do que fora pedido. Basta pensar numa

    demanda em que se pea a condenao de ru ao pagamento de uma certa quantia em

    dinheiro. Presentes os requisitos da antecipao de tutela jurisdicional, poder o juiz conceder,

    desde logo, tudo o que foi pedido, ou apenas parte daquele valor.

    O aludido dispositivo do CPC (art. 273) condiciona o deferimento da tutela antecipada

    a dois outros requisitos, a serem observados de maneira alternativa, alm dos pressupostos

    genricos de natureza probatria acima mencionados. So eles: o fundado receio de dano

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    irreparvel ou de difcil reparao (inc. I); ou o abuso de direito de defesa ou o manifesto

    propsito protelatrio do ru (inc.II).

    Estes dois requisitos, como dito anteriormente, so alternativos, bastando a presena

    de um deles, ao lado da probabilidade de existncia do direito, para que se torne possvel a

    antecipao da tutela jurisdicional.

    J o fundado receio o que no provm de simples temor subjetivo da parte, mas que

    nasce de dados concretos, seguros, objeto de prova suficiente para autorizar o juzo de

    verossimilhana, ou de grande probabilidade em torno do risco de prejuzo grave.

    Com efeito, os simples inconvenientes da demora processual, no podem, por si s,

    justificar a antecipao de tutela. indispensvel a ocorrncia do risco de dano anormal, cuja

    consumao possa comprometer, substancialmente, a satisfao do direito subjetivo da parte.

    Dessa forma, alm de ser provvel a existncia do direito afirmado pelo autor, existe o

    risco de que tal direito sofra um dano de difcil ou impossvel reparao (art. 273, I, do CPC).

    Este requisito nada mais do que o periculum in mora (perigo na demora), tradicionalmente

    considerado pela doutrina como pressuposto da concesso da tutela jurisdicional de urgncia.

    Diante do risco do direito substancial sofrer dano de difcil, dever o juiz conceder

    antecipao da tutela jurisdicional.

    de se notar que tal hiptese no se trata de tutela cautelar, no sendo possvel a

    confuso entre as duas modalidades de tutela jurisdicional. Isto porque tanto a tutela cautelar

    como a tutela antecipada, prestada com base neste inciso I do art. 273, tm como fundamento

    de concesso o periculum in mora, o risco de dano. Ocorre que, na tutela cautelar, o que

    corre o risco de sofrer dano irreparvel (ou de difcil reparao) a efetividade do processo,

    do provimento jurisdicional. O direito substancial, nesta hiptese, no est em risco. J na

    tutela antecipada o que corre risco de perecer o prprio direito material.

  • 10

    O abuso do direito de defesa se d quando o ru apresenta resistncia pretenso do

    autor, totalmente infundada ou contra direito expresso ou, ainda, quando emprega meios

    ilcitos ou escusos para forjar sua defesa. Esse abuso, tanto pode ocorrer na contestao, como

    em atos anteriores propositura da ao, como notificao, interpelaes, protestos ou troca

    de correspondncia entre os litigantes.

    J na prpria inicial pode o autor demonstrar o abuso que vem sendo praticado pelo ru, para

    pleitear a antecipao da tutela. Especialmente em torno de atos extraprocessuais que se

    pode falar em caracterizao do manifesto propsito protelatrio do ru.

    Assim, esta modalidade de tutela antecipatria, prestada com fulcro no inciso II do art.

    273, do CPC, no tem relao com o estado de perigo do direito, razo pela qual se mostra

    inadequada a denominao tutela de segurana. Trata-se de hiptese em que, ao lado da

    probabilidade de existncia do direito do autor, ocorre abuso do direito de defesa do

    demandado, o qual apresenta defesa manifestamente protelatria.

    Nesse caso, pode-se dizer que h verdadeira antecipao- sano, j que a tutela

    antecipada atua como sano contra o abuso do direito de defesa. A rigor, no h sano mais

    grave para quem pretende protelar, do que imprimir uma maior acelerao entrega da

    prestao jurisdicional. Foi o que fez o legislador, criando-se, deste modo, uma tcnica

    sancionadora, eficiente contra o abuso do direito de defesa.

    Dessa maneira, se o ru apresenta a defesa com o nico propsito de protelar a entrega

    da prestao jurisdicional, deve-se tutelar antecipadamente o direito substancial que, em razo

    da defesa abusiva, mais do que provvel, j se revela evidente. Constitui exemplo uma ao

    de despejo por denncia vazia, em que o ru contesta to-somente para alegar a injustia

    da denncia imotivada da locao. A defesa, claramente, despida de fundamento srio que

    permita sua apreciao. Trata-se de defesa protelatria, que permite a imediata prestao da

    tutela jurisdicional, atravs da antecipao dos efeitos da sentena de mrito.

  • 11

    Cabe ressaltar que, nesta ltima hiptese, s se pode admitir antecipao de tutela

    jurisdicional aps o oferecimento da contestao do demandado, ao contrrio da hiptese de

    tutela antecipada de segurana, em que se torna possvel a concesso de medida inaudita

    altera parte, ou seja, antes da manifestao do ru no processo.

    1.1. REQUISITOS INSERIDOS NOS PARGRAFOS DO ART.273 DO CPC

    Determina o pargrafo 1 do art. 273 do CPC que, a deciso que antecipa a tutela

    jurisdicional seja fundamentada de modo claro e preciso. A necessidade de fundamentao,

    obviamente, se estende tambm s decises que indeferem a antecipao, por fora do

    princpio da motivao das decises judiciais, previsto no art. 93, IX, da Constituio da

    Repblica.

    O pargrafo 2 cuida da irreversibilidade dos efeitos da tutela, norma segundo a qual

    no se pode antecipar a tutela jurisdicional quando esta puder produzir efeitos irreversveis.

    Em primeiro lugar, h que se afirmar que no trata a norma, apesar de sua expresso

    literal, de irreversibilidade de provimento jurisdicional que antecipa a tutela, mesmo porque

    tal provimento no se torna irreversvel, j que pode ser modificado ou revogado a qualquer

    tempo (art. 273 4). da irreversibilidade dos efeitos da tutela jurisdicional antecipada que

    trata a lei, erigindo-a condio de requisito de concesso da tutela jurisdicional.

    Deseja a lei que o direito ao devido processo legal, com os seus consectrios do

    contraditrio e ampla defesa, seja preservado, mesmo diante da excepcional medida

    antecipatria.

    A necessidade de valorao do princpio da efetividade da tutela jurisdicional no deve

    ser pretexto para a pura e simples anulao do princpio da segurana jurdica. Adianta-se a

    medida satisfativa, mas se preserva o direito do ru reverso do provimento, caso a final seja

    ele, e no o autor, o vitorioso no julgamento definitivo da lide.

  • 12

    O periculum in mora (perigo na demora) deve ser evitado para o autor, mas no

    custa de transport-lo para o ru. Em outros termos, o autor tem o direito a obter afastamento

    do perigo que ameaa seu direito. No tem, todavia, a faculdade de impor ao ru que suporte

    tal perigo. A antecipao de tutela, em suma, no se presta a deslocar ou transferir risco de

    uma parte para a outra.

    Nos termos do pargrafo 3 do artigo 273, a efetivao da tutela antecipada

    observar, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 475-O, 461,

    4 e 5, e 461-A. Significa isto, que a efetivao da deciso concessiva de tutela antecipada

    se far, quando se tratar de obrigao pecuniria, na forma do art. 475-O, do CPC; tratando-se

    de tutela antecipada referente obrigaes de entregar coisa diversa de dinheiro, ser

    aplicvel o disposto no art. 461-A.

    Essas regras, todavia, so aplicveis apenas no que couber, o que significa dizer que

    as mesmas devem ser vistas como parmetros operacionais, cabendo ao juiz, se verificar

    que alguma das regras a referidas no adequada efetivao da tutela antecipada em

    determinado caso concreto, determinar que a atuao da medida se d pelo meio que se revele

    mais eficiente, e que atender exigncia constitucional de tutela jurisdicional efetiva e

    adequada.

    O pargrafo 4 do art. 273 trata da possibilidade de revogao ou modificao a

    qualquer tempo da tutela antecipada. De acordo com o disposto neste pargrafo, observamos

    que a lei processual impe que a deciso que antecipa a tutela jurisdicional pode ser revogada

    ou modificada a qualquer tempo, desde que em deciso fundamentada.

    Esta possibilidade de revogao ou modificao conseqncia da natureza sumria

    da cognio exercida pelo juiz para o fim de conceder a antecipao da tutela jurisdicional,

    sendo possvel toda vez que surgirem novas circunstncias - de fato ou de direito que sejam

    capazes de alterar a convico do juiz.

  • 13

    Convm mencionar, todavia, que a revogao ou modificao da tutela antecipada

    exige requerimento da parte interessada, no podendo se dar de ofcio.

    Dispe o pargrafo 5 do artigo em anlise, que se concedida ou no a antecipao da

    tutela jurisdicional, dever o processo seguir at o final julgamento. Trata-se de regra afinada

    com a ideia de que no processo de conhecimento a obteno de certeza quanto existncia ou

    inexistncia do direito do autor um dos objetivos a serem alcanados, e tal s ser possvel

    com o exerccio, pelo juiz, de cognio exauriente. Por esta razo, dever o processo seguir

    at a prolao da sentena, a qual estar embasada em juzo de certeza, e permitir o

    encerramento do processo com a integral satisfao da pretenso.

    A possibilidade da concesso da tutela antecipada com relao a pedidos

    incontroversos encontra-se prevista no pargrafo 6, introduzido no artigo 273, pela Lei

    10.444/02. Tal dispositivo determina que a tutela antecipada tambm poder ser concedida

    quando um ou mais pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso. Na

    realidade, essa norma significa que toda vez que uma parcela do objeto do processo tornar-se

    incontroversa, dever o juiz, com relao a tal parcela, proferir imediata deciso,

    prosseguindo o feito apenas com relao ao que ainda controvertido.

    Convm mencionar que, se todo o objeto do processo se torna incontroverso, no o

    caso de se pensar em tutela antecipada, mas em julgamento imediato de todo o mrito (arts.

    329 e 330 do CPC). Basta pensar, por exemplo, no caso de reconhecimento da procedncia do

    pedido, ou de confisso por uma das partes de todos os fatos narrados pela outra, no

    aduzindo o confitente qualquer outro fato em seu favor. Nessas hipteses, dever o juiz

    proferir a sentena, no sendo aplicvel este 6, do art. 273.

    Porm, existem casos em que o objeto do processo composto (quando so

    formulados dois pedidos cumulados) ou decomponvel (quando se formula um s pedido, o de

    condenao do demandado a entregar uma certa quantidade de coisas divisveis, como no

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    caso de pedido de condenao pecuniria). Nessas hipteses, pode acontecer de uma parcela

    do objeto do processo tornar-se incontroversa, como por exemplo, quando o ru reconhece a

    procedncia de um dos pedidos cumulados, ou reconhece a parcial procedncia do pedido

    (quando o autor quer ver o ru condenado a pagar cem e o demandado contesta dizendo dever

    apenas trinta).

    Nesses casos, forma-se um juzo de certeza, baseado em cognio exauriente, quanto

    parcela incontroversa do objeto do processo, o que deve levar o magistrado a proferir

    imediata deciso a respeito da mesma.

    Pode-se observar que, o caso do 6, do art. 273, a deciso antecipatria

    interlocutria, sendo, pois, impugnvel por agravo (na forma do art. 522 do CPC). Trata-se,

    porm, de deciso baseada em cognio exauriente, capaz de declarar a prpria existncia ou

    inexistncia do direito material, razo pela qual ser tal provimento, ao se tornar irrecorrvel,

    capaz de alcanar a autoridade de coisa julgada material. No se tratando de uma antecipao

    provisria, mas de uma antecipao definitiva da tutela, a tutela antecipada concedida com

    fulcro no dispositivo em questo, pode ter natureza meramente declaratria, constitutiva ou

    condenatria.

    Por fim, cumpre analisar o pargrafo 7, de forma breve, j que ser objeto de anlise

    especfica em item prprio. O referido pargrafo, acrescentado tambm pela Lei n 10.444/02,

    dispe acerca da fungibilidade entre a tutela antecipada e a tutela cautelar, e representa

    importante inovao, pois, no permite que o juiz indefira uma medida cautelar sob o

    fundamento de que ela deveria ter sido requerida em processo autnomo, bem como probe ao

    juiz o indeferimento de tutela sumria satisfativa, sob o fundamento de que esta no deve ser

    postulada em demanda autnoma, mas incidentemente ao processo de conhecimento.

  • 15

    1.2. ANTECIPAO DE TUTELA CONTRA A FAZENDA PBLICA

    Assim que editada a lei instituidora da antecipao genrica dos efeitos da tutela,

    intensa discusso doutrinria surgiu sobre a possibilidade de se anteciparem os efeitos da

    tutela de mrito contra a Fazenda Pblica.

    Atualmente, parece no haver mais discusso sobre a possibilidade de antecipao dos

    efeitos da tutela em face do Poder Pblico, haja vista a existncia de uma lei que a disciplina

    (Lei Federal n 9.494/1997).

    Em princpio, como corolrio do direito fundamental do acesso justia, a

    antecipao da tutela haveria de ser disciplinada pelas leis infraconstitucionais, e por isso, a

    Lei n 9.494/1997 regulou a antecipao da tutela contra a Fazenda Pblica, proibindo-a em

    certos casos. Se uma lei veio regul-la porque a antecipao possvel.

    Aqueles que defendiam o no-cabimento arguiam que o reexame necessrio

    configuraria um obstculo admissibilidade de tutela antecipada contra a Fazenda Pblica,

    pois, se a sentena final contra a Fazenda s pode produzir efeitos depois de confirmada pelo

    tribunal, uma deciso antecipatria, meramente interlocutria, jamais poderia produzir efeitos

    imediatamente. Alegavam, tambm, que o regime de pagamentos em dinheiro da Fazenda

    Pblica, que se d por meio dos precatrios (art.100, CPC), seria um bice antecipao dos

    efeitos da tutela, pois impediria a satisfao imediata das obrigaes pecunirias.

    Tais argumentos, desfavorveis a concesso da tutela antecipada contra a Fazenda

    Pblica, segundo DIDIER JR. (2008), revelam-se descabidos. Entende o referido autor que,

    isto se deve, pois, a necessidade do precatrio para o pagamento de quantia no pode servir

    como empecilho para a admissibilidade da tutela antecipada contra a Fazenda Pblica, sendo

    que, na pior das hipteses, a deciso antecipatria j colocaria a parte vitoriosa na fila de

  • 16

    espera para a sua expedio, cujo procedimento findaria com o depsito judicial da quantia,

    que somente poderia ser levantada em caso de procedncia definitiva da demanda.

    Com efeito, o problema dos precatrios diz respeito, apenas, s demandas

    condenatrias a uma prestao de pagar quantia, espcie executiva em que a Fazenda goza de

    prerrogativas procedimentais. Quanto s demais prestaes (fazer, no-fazer e entregar coisa)

    no h qualquer diferena no formalismo processual.

    No h apenas demandas condenatrias contra a Fazenda Pblica, sendo plenamente

    admissveis as meramente declaratrias e constitutivas, cujos efeitos podem ser perfeitamente

    antecipados.

    Ademais, h dvidas pecunirias do Poder Pblico, oriundas de deciso judicial, que

    no se submetem ao regime dos precatrios, como por exemplo, as dvidas de pequeno valor

    (art.100, 3, CF/88); os crditos provenientes de sentena de mandado de segurana,

    relacionados a parcelas vencidas aps o ajuizamento da ao (art.1, 2, Lei Federal n

    5.021/1966); dvidas contratuais ou j previstas no oramento, como as dvidas salariais e

    outras.

    No se justifica o argumento da imposio do reexame obrigatrio das decises

    proferidas contra o Poder Pblico, haja vista que o duplo grau obrigatrio s se refere s

    sentenas, sendo que a tutela antecipada concedida por meio de deciso interlocutria. Alm

    disso, j se demonstrou que a tutela antecipada no novidade em nosso ordenamento, pois,

    havia previso em alguns procedimentos especiais.

    Dessa forma, possvel a concesso da tutela antecipada em face da Fazenda Pblica.

  • 17

    2. TUTELA CAUTELAR

    Como detentor da jurisdio, ao Estado, no basta apenas garantir a tutela jurdica,

    instituindo o processo e assegurando o socorro a ele por meio da ao.

    Para que se atinja o objetivo maior do processo, que a paz social, por intermdio da

    manuteno do imprio da lei, no se pode contentar com a simples outorga, parte, do

    direito de ao. Urge assegurar-lhe, tambm e principalmente, o atingimento do fim precpuo

    do processo, que a soluo justa da lide.

    importante lembrar que, se os rgos jurisdicionais no contassem com um meio

    pronto e eficaz para assegurar a permanncia ou conservao do estado das pessoas, coisas e

    provas, enquanto no atingido o estado ltimo da prestao jurisdicional, ela correria o risco

    de cair no vazio, ou de transformar-se em providncia incua. Da a necessidade do processo

    cautelar.

    O processo cautelar exerce funo auxiliar e subsidiria, servindo tutela do processo,

    onde ser protegido o direito.

    A atividade jurisdicional cautelar dirige-se segurana e garantia do eficaz

    desenvolvimento e ao profcuo resultado das atividades de cognio e de execuo,

    concorrendo, dessa maneira, para o atingimento do escopo geral da jurisdio.

    Dessa forma, no tendo a finalidade de solucionar o litgio e sendo seu objetivo tutelar

    o prprio processo, a funo cautelar tem por escopo servir o interesse pblico na defesa do

    instrumento criado pelo Estado para compor lides, isto , a defesa do processo.

    Diante da presena de um processo cautelar como forma de exerccio da jurisdio,

    existe, tambm, uma ao cautelar, no sentido processual da expresso, ou seja, no sentido de

    direito subjetivo tutela jurisdicional; mas a tutela cautelar, diversamente da tutela de mrito,

    , por sua prpria natureza, provisria e subsidiria.

  • 18

    A ao cautelar corresponde ao direito da parte, de provocar o rgo judicial para que

    se realizem providncias para conservar e assegurar a prova ou bens, ou para eliminar de

    outro modo a ameaa de perigo de prejuzo iminente e irreparvel ao interesse tutelado no

    processo principal; vale dizer, a ao cautelar consiste no direito de assegurar que o processo

    possa conseguir um resultado til.

    Pode-se dizer que, o processo cautelar possui como caractersticas a acessoriedade, a

    provisoriedade, a revogabilidade e a instrumentalidade.

    A eficcia da medida preventiva obtida por meio da ao cautelar essencialmente

    temporria e provisria, ou seja, dura apenas enquanto se aguarda a soluo do processo de

    cognio ou de execuo, que o principal, o que soluciona realmente a lide; e destina-se

    forosamente a ser substituda por outra medida que ser determinada, em carter definitivo,

    pelo processo principal.

    por isso mesmo que a admissibilidade do processo cautelar pressupe sempre a do

    processo principal, cuja eficcia h de ser assegurada pelo primeiro.

    Nesse sentido, dispe, textualmente, o art. 796 do nosso Cdigo de Processo Civil que,

    embora o procedimento cautelar possa ser instaurado antes ou no curso do processo principal,

    aquele deste sempre dependente.

    Pode-se dizer que toda medida cautelar caracterizada pela provisoriedade, a fim de

    que a situao preservada ou constituda mediante o provimento cautelar no se revista de

    carter definitivo. Essa provisoriedade significa que as medidas cautelares tm durao

    temporal limitada quele perodo de tempo que dever transcorrer entre a sua decretao e a

    supervenincia do provimento principal ou definitivo. Por sua natureza, esto destinadas a ser

    absorvidas ou substitudas pela soluo definitiva do mrito.

    A sentena proferida em processo cautelar no faz coisa julgada material, que a

    eficcia material que torna imutvel e indiscutvel a sentena de mrito no mais sujeita a

  • 19

    recurso (art. 467). Isto se deve, pois, sumariedade da cognio exercida no processo

    cautelar.

    caracterstica da medida cautelar, como provimento emergencial de segurana, a

    possibilidade de sua substituio (art. 805), modificao ou revogao a qualquer tempo (art.

    807).

    A mutabilidade e a revogabilidade da medida cautelar so inerentes sua prpria

    natureza e objetivos. Se desaparece a situao ftica que levou o rgo jurisdicional a

    acautelar o interesse da parte, cessa a razo de ser da precauo.

    O processo principal (execuo ou cognio) e o processo cautelar existem para atuar

    sobre uma mesma lide, mas diferem quanto ao seu escopo, porque o processo acautelatrio

    serve para garantir o bom resultado do processo definitivo, ao passo que este serve

    imediatamente composio da lide.

    Da a mais importante caracterstica do processo cautelar, sua instrumentalidade, que

    significa que a medida cautelar no tem um fim em si mesma, mas sim, em relao a uma

    providncia definitiva que h de sobrevir e cujos efeitos antecipa, para que assim possa evitar-

    se o dano que derivaria da demora na prolao da futura sentena de mrito.

    Atualmente, a doutrina majoritria, no mais reconhece tutela cautelar o carter de

    antecipao provisria da satisfao do direito material.

    Pode-se afirmar que, enquanto o processo principal serve tutela do direito, o

    processo cautelar serve tutela do processo.

    No so medidas satisfativas, pois seu fim direto e imediato no a satisfao do

    direito substancial da parte, mas apenas servir imediatamente ao processo principal,

    preservando situaes e garantindo-lhe o resultado til.

    Cumpre analisar os requisitos para a concesso da tutela cautelar, quais sejam, o fumus

    boni iuris (fumaa do bom direito) e o periculum in mora (perigo na demora).

  • 20

    Requisito de concesso da tutela jurisdicional cautelar tradicionalmente reconhecido

    por toda doutrina nacional e aliengena, o designado pela expresso latina fumus boni iuris,

    que pode ser traduzida como fumaa do bom direito.

    Conforme mencionado anteriormente, a tutela cautelar constitui modalidade de tutela

    de urgncia destinada a assegurar a efetividade de um provimento jurisdicional, a ser

    produzido no processo principal. Faz-se necessria a existncia da previso da tutela cautelar

    em razo da demora na entrega da prestao jurisdicional, pleiteada no processo principal, que

    pode gerar o risco de que o futuro provimento seja incapaz de alcanar os resultados prticos

    que dele se esperam.

    Desta maneira, a concesso da medida cautelar no pode estar condicionada

    demonstrao da existncia do direito substancial afirmado pelo demandante, devendo o

    Estado-Juiz contentar-se com a demonstrao da aparncia de tal direito. Assim, o que se quer

    dizer que a tutela jurisdicional cautelar deve ser prestada com base em cognio sumria, o

    que significa que a medida cautelar ser deferida ou no conforme um juzo de probabilidade.

    Pode-se observar ento, que a tutela jurisdicional cautelar ser prestada com base em

    cognio sumria, e no em cognio exauriente (como se d, em regra, com a tutela

    jurisdicional de natureza cognitiva). Para que a tutela cautelar no se torne um instrumento

    absolutamente intil, no h que se falar em exigncia de certeza quanto existncia de

    direito substancial para sua prestao.

    Convm mencionar que no pacfica a doutrina quando se trata de definir o fumus

    boni iuris. H quem afirme tratar-se ele da mera aparncia do bom direito. Outros autores,

    por sua vez, definem o fumus boni iuris como a plausibilidade do direito. Parte da doutrina,

    ainda, refere-se a este requisito de concesso das medidas cautelares como a verossimilhana

    do direito afirmado pelo demandante. Todos estes conceitos, embora tenham sutis diferenas

    entre si, conduzem todos, a uma mesma ideia de que a cognio a ser realizada no processo

  • 21

    cautelar sumria, no se exigindo a certeza quanto existncia do direito substancial.

    Assim, nos parece mais adequado definir o fumus boni iuris como a probabilidade da

    existncia do direito invocado pelo autor da ao cautelar.

    O fumus boni iuris no se apresenta apenas como requisito da tutela jurisdicional

    cautelar, sendo sua presena necessria para a concesso de qualquer modalidade de tutela

    jurisdicional sumria, como a j referida tutela antecipatria do art. 273, do CPC.

    Porm, a probabilidade de existncia do direito no requisito suficiente para a

    concesso da tutela cautelar, sendo necessrio, tambm, o periculum in mora (perigo na

    demora).

    Esse requisito consiste na situao de perigo iminente que poder provocar a

    inefetividade do processo principal. Esta iminncia de dano irreparvel (ou de difcil

    reparao) no capaz de afetar o direito substancial, mas gera perigo, to-somente, para a

    efetividade do processo. H, porm, dois tipos de situao de perigo: a que gera risco de dano

    irreparvel (ou de difcil reparao) para o direito substancial, e a que provoca risco de dano

    (tambm aqui irreparvel ou de difcil reparao) para a efetividade do processo. No primeiro

    caso, adequada ser a tutela antecipatria; no segundo, a tutela cautelar.

    Cabe ressaltar, no entanto, que tambm no pacfica a doutrina quanto forma de

    definir o periculum in mora. Alguns processualistas, ao definir este requisito, limitam-se a

    afirmar que o mesmo deve ser entendido como probabilidade de dano a uma das partes de

    futura ou atual ao principal, resultante da demora no ajuizamento ou no processamento e

    julgamento desta, sem fazer distino entre o perigo para a efetividade do processo e o

    perigo para o direito substancial.

    No entanto, outros autores expressamente afirmam que, tanto nos casos em que haja

    perigo para o direito material, como naqueles em que h risco para a efetividade do processo,

    estar presente o requisito da tutela cautelar. H autores, por fim, que no estudo do periculum

  • 22

    in mora, como requisito de concesso da tutela jurisdicional cautelar, ligam-no apenas ao

    direito substancial.

    Assim sendo, havendo o fundado receio de que a efetividade do processo venha a

    sofrer um dano iminente, grave, de difcil ou impossvel reparao, estar presente o

    periculum in mora autorizador da concesso da tutela cautelar.

    Presentes, ento, o periculum in mora e o fumus boni iuris, ser concedida pelo

    Estado-Juiz a tutela jurisdicional cautelar.

    3. DISTINES ENTRE A TUTELA ANTECIPADA E A TUTELA CAUTELAR

    As medidas cautelares e as antecipatrias so tecnicamente distintas, apesar de suas

    caractersticas comuns e da sua identidade quanto funo constitucional que exercem. Tendo

    por base o art. 273 do Cdigo de Processo Civil, pode-se definir medida antecipatria como a

    medida pela qual o juiz antecipa, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no

    pedido inicial. Ao lograr-se identificar, no conjunto das medidas de tutela provisria, as que

    apresentam essas caractersticas, pode-se, ainda que por excluso, distingui-las das demais,

    sujeitas ao regime do processo cautelar.

    Tendo em vista a estruturao do Cdigo de Processo Civil brasileiro de 1973, ficou

    reservado Livro prprio para o Processo Cautelar e nele o legislador, alm de disciplinar

    diversos procedimentos especiais, alguns, inclusive, sem natureza genuinamente cautelar,

    atribuiu ao juiz o que se convencionou denominar poder geral de cautela, ou seja, o poder de

    determinar as medidas provisrias que julgar adequadas quando houver fundado receio de que

    uma das partes, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra leso grave e de difcil

    reparao (art. 798 do CPC). A interpretao desse instituto sempre foi controvertida na

    doutrina, especialmente no que respeita o alcance e contedo das tais medidas provisrias

  • 23

    adequadas. A polmica girou em torno de se saber se essas medidas eram apenas consistentes

    de garantias do processo, restritamente consideradas, ou se, ao invs, poderiam comportar

    tambm providncias que representassem a prpria antecipao do direito material afirmado

    pelo interessado. Questionou-se, portanto, sobre a legitimidade ou no, no mbito do processo

    cautelar, das chamadas medidas cautelares satisfativas.

    Atualmente a doutrina se inclina no sentido de que o processo cautelar consiste em

    instrumento de proteo a outro processo. O que se quer dizer que, com o processo cautelar,

    combate-se situaes em que existe risco para a efetividade de um processo. E, quando o

    tempo de durao do processo gerar uma situao de perigo para o prprio direito material,

    no ser adequada a utilizao do processo cautelar, mas sim do instituto da tutela

    antecipatria. Assim, por exemplo, pode-se vislumbrar a hiptese em que algum v a juzo

    pedindo a condenao do demandado a pagar um tratamento mdico de que o demandante

    necessita, sendo essencial que o tratamento se realize desde logo, custa do demandado, sob

    pena de o demandante no sobreviver. Neste caso, como parece bvio, o que sofre risco de

    dano se no for tutelado de imediato o prprio direito substancial do demandante, razo pela

    qual ter o Estado de prestar a ele a tutela jurisdicional antecipatria. Situao diversa seria

    aquela em que o demandante j tivesse se submetido ao tratamento, e pretendesse ser

    ressarcido dos gastos que teve, verificando-se que o demandante, para se furtar ao pagamento,

    estivesse se desfazendo de todos os seus bens penhorveis. Neste caso, seria a efetividade do

    futuro processo executivo que estaria sofrendo o risco, pois nenhuma utilidade se pode

    esperar de uma execuo se o executado no dispe de bens de valor suficiente para assegurar

    a realizao do crdito do exeqendo. Seria necessrio, ento, a realizao de uma apreenso

    de bens do devedor, tantos quantos fossem necessrios para assegurar que, na futura

    execuo, seu patrimnio fosse ainda capaz de assegurar a realizao do direito material do

    credor.

  • 24

    Na hiptese em que se pretende assegurar de forma mediata a tutela jurisdicional,

    evitando-se a consumao do dano que a efetividade do processo poderia sofrer, ser cabvel a

    tutela jurisdicional de ndole cautelar.

    Desta maneira, o processo cautelar , pois, instrumento atravs do qual se presta uma

    modalidade de tutela jurisdicional consistente em assegurar a efetividade de um provimento a

    ser produzido em outro processo, dito principal. Ao contrrio do que ocorre com os outros

    dois tipos de processo (cognitivo e executivo), o processo cautelar no satisfaz o direito

    substancial, mas apenas garante que o mesmo possa ser realizado em momento posterior,

    permitindo assim, uma forma de tutela jurisdicional mediata.

    4. FUNGIBILIDADE

    Diante da alterao, j mencionada anteriormente, introduzida pela Lei n 10.444 de

    2002, que disciplinou o princpio da fungibilidade ao acrescentar um novo pargrafo 7 ao

    artigo 273 do Cdigo de Processo Civil, identificar a correta aplicao das tutelas cautelar e

    antecipada tornou-se tarefa mais complexa.

    O pargrafo 7 prev que se o autor, a ttulo de antecipao de tutela, requerer

    providncia de natureza cautelar, poder o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos,

    deferir a medida cautelar em carter incidental no processo ajuizado.

    Por constiturem modalidades de tutela jurisdicional de urgncia distintas, no

    significa que no se possa ter um sistema unificado de prestao das mesmas, o que permite a

    simplificao do processo, evitando-se que por razes de tcnica processual se deixe de

    prestar a tutela jurisdicional adequada.

    No entanto, surgiram interpretaes distintas acerca do novo pargrafo, no que tange

    sua fungibilidade. Alguns doutrinadores entenderam que no seria correto falar, no caso, em

    fungibilidade de procedimentos, como est na justificativa do projeto. O procedimento

  • 25

    poderia ser at o mesmo, ou seja, a disciplina formal dos atos processuais a realizar, porm,

    no se trata de proceder de um modo, havendo o autor pedido que se procedesse por outro.

    Trata-se de autntica fungibilidade de pedidos, no sentido de que, nominalmente postulada

    uma daquelas medidas, ao juiz lcito conceder a tutela a outro ttulo. Desta forma, entendem

    que no existe fungibilidade em uma s mo de direo.

    De maneira oposta, afirmam outros que, a fungibilidade estabelecida no pargrafo 7

    do art. 273, tem mo nica, e, diz respeito to-somente medida cautelar, que pode ser

    deferida em carter incidental. Sendo que no autoriza, todavia, o contrrio, ou seja, que a

    medida antecipatria possa ser requerida, como a cautelar, por ao autnoma. Se assim fosse

    entendido, estar-se-ia atentando contra a lgica do sistema atual, um dos principais avanos

    trazidos pelo movimento reformador do sistema, que a de concentrar em uma nica relao

    processual, tanto quanto possvel, toda a atividade jurisdicional.

    Convm mencionar que, segundo CARREIRA ALVIM (2004), a introduo do

    pargrafo 7 do art.273 foi o ponto mais importante da ltima reforma, sendo legtima

    manifestao do que ele denomina fenmeno do sincretismo processual. Segundo o referido

    autor, o sincretismo processual traduz uma tendncia do direito processual de combinar

    frmulas e procedimentos, de modo a possibilitar a obteno de mais de uma tutela

    jurisdicional (de forma simples e imediata), no bojo de um mesmo processo com o que, alm

    de evitar a proliferao de processos, simplifica a prestao jurisdicional.

    Assim, diante das vrias opinies doutrinrias, cabe tambm demonstrar essa questo

    em mbito jurisprudencial. Essa inovao veio consagrada em acrdo unnime da 12

    Cmara do 1. TACSP, proferido no julgamento do Agravo de Instrumento 806.046-6,

    relatado por Jos Roberto Bedaque, do qual se extrai que, tratando-se de tutela de urgncia e

    provisria, faz-se possvel a incidncia da regra da fungibilidade, cabendo ao julgador adotar

  • 26

    a soluo mais adequada preservao da utilidade do resultado final, desde que atendidos os

    limites objetivos da demanda.

    Portanto, pode-se observar que, estando presentes os requisitos essenciais, o juiz

    dever aplicar o princpio da fungibilidade dos pedidos.

    CONCLUSO

    Tendo em vista esclarecer a correta aplicao da medida cautelar e da medida

    antecipatria, por meio de critrios que possibilitam a precisa identificao da cautelaridade e

    da satisfatividade, pode-se concluir que, tanto a medida cautelar propriamente dita (objeto de

    ao cautelar) como a medida antecipatria (objeto de liminar na prpria ao principal)

    representam providncias, de natureza emergencial, executiva, e sumria, adotadas em carter

    provisrio.

    Todavia, o que as distingue, em substncia, que a tutela cautelar apenas assegura

    uma pretenso, enquanto a tutela antecipatria realiza de imediato a pretenso.

    Dessa maneira, pode-se dizer que, na tutela cautelar o que corre o risco de sofrer dano

    irreparvel ou de difcil reparao a efetividade do processo, do provimento jurisdicional.

    Porm, na tutela antecipada o que corre risco de perecer o prprio direito material. A tutela

    cautelar uma modalidade de tutela do processo, enquanto a tutela antecipada destinada a

    proteger o direito substancial.

    Cabe ressaltar, por fim, que esses dois institutos do nosso direito processual so

    fungveis como determina o pargrafo 7 do art. 273 do Cdigo de Processo Civil, o que

    significa dizer que, defeso ao juiz indeferir uma medida cautelar sob o fundamento de que

    ela deveria ter sido requerida em processo autnomo e no incidentemente ao processo em

    que se busca a tutela satisfativa, bem como no permite ao juiz o indeferimento de tutela

  • 27

    sumria satisfativa sob o fundamento de que esta no deve ser postulada em demanda

    autnoma, mas incidentemente ao processo de conhecimento.

    Talvez esta regra seja o primeiro passo na formao de uma nova cultura jurdica, que

    dispense a formao de dois processos (cognitivo e cautelar) para que se obtenha um

    resultado que pode ser alcanado com um s processo.

  • 28

    REFERNCIAS

    ALVIM, Carreira. Cdigo de Processo Civil Reformado, 2004.

    CAMARA, Alexandre Freitas. Lies de direito processual civil. v.1. 15.ed. Rio de Janeiro:

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    DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. V. 2. 3.ed. Salvador: Editora

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    DINAMARCO, Cndido Rangel. A reforma da reforma. 6.ed. So Paulo: Malheiros, 2003.

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    Brasileiro. Niteri: Impetus, 2009.

    FUX, Luiz. Tutela de segurana e tutela da evidncia. So Paulo: Saraiva, 1996.

    MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do processo de conhecimento: a tutela jurisdicional

    atravs do processo de conhecimento. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

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    ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipao da Tutela. So Paulo: Saraiva, 2009.