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II Encontro Científico da Semana
Jurídica da
50ª Semana Jurídica da Universidade Estadual de Londrina
Anais do II Encontro Científico da Semana Jurídica da UEL |
24.05.2012 | UEL | Londrina/PR
ISSN 2237-5287
Anais do II Encontro
Científico da Semana
Jurídica da UEL ISSN 2237-5287
50ª Semana Jurídica da Universidade Estadual
de Londrina 21 a 24 de maio de 2012
Londrina
2012
II Encontro Científico da Semana
Jurídica da
50ª Semana Jurídica da Universidade Estadual de Londrina
Anais do II Encontro Científico da Semana Jurídica da UEL |
24.05.2012 | UEL | Londrina/PR
ISSN 2237-5287
Organização Rodolfo Ciciliato João Carlos Leal Junior João Éder Furlan Ferreira de Souza Henrique Gomes Neto Samantha Doroso Luiz Henrique Egydio Lucas Rezende Marcos Vinícius Kozan Renan Mendes Rodrigues Christian Menin Lucas Garcia Cadamuro Arte Digital/Revisão Ortográfica/Impressão Rodolfo Xavier Ciciliato Realização Universidade Estadual de Londrina Centro Acadêmico Sete de Março Mestrado em Direito Negocial
II Encontro Científico da Semana
Jurídica da
50ª Semana Jurídica da Universidade Estadual de Londrina
Anais do II Encontro Científico da Semana Jurídica da UEL |
24.05.2012 | UEL | Londrina/PR
ISSN 2237-5287
APRESENTAÇÃO
Apresentados no II Encontro Científico da Semana Jurídica da Universidade Estadual de Londrina, os trabalhos trazidos nestes anais retratam o labor acadêmico de estudantes de graduação, pós-graduação e de pesquisadores docentes da Universidade Estadual de Londrina, além de contar com a colaboração de pesquisadores de outras Instituições de Ensino Superior.
A diversidade dos temas jurídicos abordados, assim como a relevância que detêm na contemporaneidade, refletem a importância da pesquisa científica no âmbito do Direito, por fomentar o pensamento crítico e proporcionar o intercâmbio de conhecimento entre os pesquisadores, além apresentar os estudos desenvolvidos à sociedade, colaborando, enfim, com o processo de adequação do Direito à realidade social em que se insere.
A realização do II Encontro Científico da Semana Jurídica da UEL em parceria entre o Centro Acadêmico Sete de Março e o Mestrado em Direito Negocial denota o propósito de integração entre os cursos de graduação e pós-graduação em Direito da Universidade Estadual de Londrina.
Fica registrado o compromisso de dar continuidade a este evento, por ter-se alcançado satisfação dos participantes, que puderam trocar experiências durante as exposições de seus trabalhos, o que certamente amplia as possibilidades de conhecimento.
Comissão Organizadora
II Encontro Científico da Semana
Jurídica da
50ª Semana Jurídica da Universidade Estadual de Londrina
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ISSN 2237-5287
SUMÁRIO ARTIGOS COMPLETOS .......................................................................................... 16
O DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE
EQUILIBRADO E A ECONOMIA DE MERCADO. ................................................... 17
ANTÔNIO MARCOS BOAVENTURA
PRINCÍPIOS E GARANTIAS DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL ............... 32
CÁSSIO BENVENUTTI DE CASTRO
TRISTE FIM DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA PELO ADIMPLEMENTO ................. 77
CÁSSIO BENVENUTTI DE CASTRO
A AMEAÇA À SOBERANIA E À AMAZÔNIA BRASILEIRAS. .............................. 114
ANA CLÁUDIA DUARTE PINHEIRO
GUSTAVO MELLO DOS SANTOS
PARALELO ENTRE OS PRINCIPAIS DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS
MULHERES BRASILEIRAS E DAS MULHERES MUÇULMANAS ....................... 128
EXTRAFISCALIDADE TRIBUTÁRIA NA PROTEÇÃO AMBIENTAL .................... 143
ANDRÉA MADUREIRA GOMES DE OLIVEIRA
A ISONOMIA TRIBUTÁRIA NO CONTEXTO DOS ARTIGOS 5º, CAPUT E ARTIGO
150, INCISO II DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL .................................................... 154
YURI JOHN FORSELINI
O PREJUÍZO DA SOCIEDADE PELA FALTA DA TUTELA PENAL DIANTE DAS
CONDUTAS ATENTATÓRIAS AO DIREITO À IMAGEM DO INDIVÍDUO ............ 171
GEALA GESLAINE FERRARI
PROF. PEDRO FARACO NETO
PSICOPATIA: VITIMIZAÇÃO E PUNIÇÃO ............................................................ 185
SORAYA ROSA
FRANCIELLE CALLEGARI
A UTILIZAÇÃO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL PARA A DEFESA DO
MEIO AMBIENTE ................................................................................................... 194
RENATA CALHEIROS ZARELLI
VÂNYA SENEGALIA MORETE
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O NOVO ENFOQUE DO ACESSO À JUSTIÇA: UMA ANÁLISE À ADOÇÃO DE
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO ESPECIAL ........................................... 208
RODOLFO CARVALHO NEVES DOS SANTOS
IVAN MARTINS TRISTÃO
INDENIZAÇÃO ESTATAL PELA PERDA DE UMA CHANCE DEVIDO A
PRECARIEDADE DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE ............................................ 219
DANIELA BRAGA PAIANO
LARA CAXICO MARTINS
LARISSA MOYA NASCIMENTO
O ACESSO À JUSTIÇA E A NOVA HERMENÊUTICA JURÍDICA ........................ 235
PAMELA DE MOURA SANTOS
DO EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA PELAS SOCIEDADES DE ECONOMIA
MISTA: O CASO DA COMPANHIA MUNICIPAL DE TRÂNSITO E URBANIZAÇÃO
DE LONDRINA ....................................................................................................... 249
LUCAS FRANCO DE PAULA
NAIARA DEPERON CARDOSO
THAISA ROVINA MARTINS
DIREITOS SOCIAIS E AS EMENDAS CONSTITUCIONAIS 26/00 E 64/10:
PERSPECTIVA A PARTIR DA REALIDADE BRASILEIRA .................................. 264
MARÍLIA RODRIGES MAZZOLA
MÁRCIA TESHIMA
O EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO NOS CONTRATOS
ADMINISTRATIVOS DA LICITAÇÃO PÚBLICA .................................................... 281
LUCAS FRANCISCO PADIAL MILIORINI
PAMELA DE MOURA SANTOS
AS AÇÕES AFIRMATIVAS E O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE
................................................................................................................................ 299
LUIZ HENRIQUE SANTOS DA CRUZ
SANÇÕES ADMINISTRATIVAS NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR . 328
LUIZ HENRIQUE SANTOS DA CRUZ
RESPONSABILIDADE CIVIL NO PÓS-CONSUMO: POR UMA AMPLIAÇÃO DA
RESPONSABILIDADE COMPARTILHADA ........................................................... 352
ANTÔNIO CARLOS EFING
SILVIO ALEXANDRE FAZOLLI
PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE: EVOLUÇÃO E CONTROVÉRSIAS ATUAIS ...... 365
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CAROLINE GONZALEZ CASTRO
IVAN MARTINS TRISTÃO
RESUMOS EXPANDIDOS...................................................................................... 379
BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA HERMENÊUTCA CONTRATUAL .... 380
KARINA ALVES TEIXEIRA SANTOS
A CONCILIAÇÃO COMO FORMA DE PACIFICAÇÃO SOCIAL DOS NEGÓCIOS
JURÍDICOS PRIVADOS - ACESSO À ORDEM JURÍDICA JUSTA ...................... 381
MAYNA MARCHIORI DE MORAES
ROZANE DA ROSA CACHAPUZ
DIREITO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO DA EMPRESA
CONTEMPORÂNEA ............................................................................................... 382
JULIANA HINTERLANG DOS SANTOS
LAETI FERMINO TUDISCO
A DESIGUALDADE SOCIOEDUCACIONAL NA RELAÇÃO NEGOCIAL E OS
OBSTÁCULOS AO ACESSO À JUSTIÇA PELA PARTE HIPOSSUFICIENTE .... 383
GUSTAVO ROSSETTO MENDES BATISTA
MEDIDAS CAUTELARES NO PROCESSO CAUTELAR E NO PROCEDIMENTO
ARBITRAL .............................................................................................................. 384
MARIA GABRIELA STAUT
A INFLUÊNCIA DAS “CLASS ACTIONS” NORTE-AMERICANAS NAS AÇÕES
QUE TUTELAM DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS................................... 386
MARIA GABRIELA STAUT
A NECESSIDADE DE APLICAÇÃO CONJUNTA DOS PRINCÍPIOS DA
PREVENÇÃO E DA OBRIGATORIEDADE DA INTERVENÇÃO ESTATAL NA
PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE ........................................................................ 388
KAMYLA MARANHO
ANA CLÁUDIA DUARTE PINHEIRO
FUNÇÃO SOCIAL E RESPONSABILIDADE SOCIAL: UM ESTUDO SOBRE AS
BASES DA ÉTICA EMPRESARIAL ....................................................................... 389
FERNANDES, JÉSSIKA PIOVEZAN;
CENCI, ELVE MIGUEL;
O DIREITO E O CONTROLE DO MARKETING ..................................................... 391
VIANA, F. ANDRÉIA
KEMPFER, MARLENE
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REINTEGRAÇÃO SOCIAL DO DETENTO: O TRABALHO PENITENCIÁRIO
EXTRAMUROS E AS ENTIDADES BRASILEIRAS DO SISTEMA “S” ................ 393
PEZARINI, MARIANA DE OLIVEIRA.
KEMPFER, MARLENE.
DA FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA NA PRESERVAÇÃO DA SAÚDE DO
TRABALHADOR .................................................................................................... 394
SPITI, CHRISTIANE; OLIVEIRA, LOURIVAL JOSÉ DE
INTERNACIONALIZAÇÃO ECONÔMICA E TRANSFORMAÇÕES NO ESTADO
CONTEMPORÂNEO E NA ORDEM INSTITUCIONAL INTERNACIONAL: ........... 395
LUCAS FRANCO DE PAULA
TÂNIA LOBO MUNIZ
A DEFESA DO EXECUTADO COM FUNDAMENTO NOS ARTS. 475-L, § 1º E 741,
PARÁGRAFO ÚNICO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: A COISA JULGADA
INCONSTITUCIONAL ............................................................................................. 396
NATHÁLIA MARIÁH MAZZEO SÁNCHEZ
MARCOS ANTÔNIO STRIQUER SOARES
PRINCÍPIO DA UNIVERSALIDADE NO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL:
CASO PROMOTOR V. OMAR HASSAN AHMAD AL BASHIR ............................. 397
ALESSANDRA CARIA BUGES.
PATRÍCIA AYUB DA COSTA LIGMANOVSKI.
REFÚGIO E SUAS TRANSFORMAÇÕES SOB A ÓTICA DAS NORMAS ........... 399
BRUNA GABRIELA ECHES PERUGINI;
PROFA. Mª JULIANA KIYOSEN NAKAYAMA;
O CONFLITO ENTRE A LIBERDADE DE INFORMAÇÃO E A PRESUNÇÃO DE
INOCÊNCIA ............................................................................................................ 403
AMANDA QUERINO BARBOSA
GUILHERME BARBOSA DA SILVA
A DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO E A CRISE DE GESTÃO NO
JUDICIÁRIO. ........................................................................................................... 405
EDUARDO GOMES DA SILVA
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES; .............................................................................. 407
GÓIS, PAULA BARBOSA;
BANNWART JÚNIOR, CLODOMIRO JOSÉ.
TUTELA INIBITÓRIA: PREVENÇÃO, CESSAÇÃO OU EVITAÇÃO DA PRÁTICA
DO ILÍCITO. ............................................................................................................ 409
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ALDO ARANHA DE CASTRO
MARIA DE FÁTIMA RIBEIRO
A BOA-FÉ OBJETIVA COMO LIMITAÇÃO DA AUTONOMIA DA VONTADE NO
DIREITO CONTRATUAL. ....................................................................................... 411
MARÍLIA VIZZOTO
DIREITOS SOCIAIS COMO LIMITES MATERIAIS À REFORMA
CONSTITUCIONAL ................................................................................................ 412
DHYEGO CÂMARA DE ARAUJO
PRINCÍPIO DA INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO .................. 414
DHYEGO CÂMARA DE ARAUJO
A TRIBUTAÇÃO COMO FORMA DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NA
ECONOMIA ............................................................................................................. 415
ALDO ARANHA DE CASTRO
MARIA DE FÁTIMA RIBEIRO
ACESSO À JUSTIÇA E GLOBALIZAÇÃO: O PROCESSO NA ORGANIZAÇÃO
MUNDIAL DO COMÉRCIO ..................................................................................... 417
RAFAEL DE SOUZA BORELLI,
MARCOS ANTÔNIO STRIQUER SOARES,
DIREITO E DECISÃO ............................................................................................. 418
LARISSA MOYA NASCIMENTO
ESTUDOS PARA A CONSTRUÇÃO DE UM ENSINO JURÍDICO
EMANCIPATÓRIO .................................................................................................. 419
AUTIERES OLIVEIRA COSTA
DA INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ECONOMIA: NO CASO DA
SUPRANACIONALIDADE ...................................................................................... 421
YGOR MARCEL CARLI ALBINO
ELVE MIGUEL CENCI
O ACORDO TRIP E A INSERÇÃO DE NOVOS PARÂMETROS POR MEIO DA LEI
DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL. ........................................................................ 423
YGOR MARCEL CARLI ALBINO
MARLENE KEMPFER
O ACESSO À MAGISTRATURA DO TRABALHO EM SEUS DIFERENTES GRAUS
DE JURISDIÇÃO .................................................................................................... 424
NELSON LUIZ PEREIRA JUNIOR
JULIANA KIYOSEN NAKAYAMA
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O PACTO GLOBAL DA ORGANIZAÇÃO DAS NACÕES UNIDAS, A
VALORIZAÇÃO DO TRABALHO E A INCLUSÃO DE EGRESSOS DO SISTEMA
PENITENCIÁRIO NO MERCADO DE TRABALHO ............................................... 425
LARA CAXICO
MARLENE KEMPFER
INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO: O PLANEJAMENTO
ECONÔMICO COMO MEIO DE INTEGRAÇÃO PÚBLICO-PRIVADO .................. 426
EDVANIA FÁTIMA FONTES GODOY
MARLENE KEMPFER
COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA E A TUTELA DO MEIO
AMBIENTE .............................................................................................................. 427
KAWANE CAROLINE KUBASKI SILVA
A QUESTÃO AMBIENTAL-URBANA: OBSTÁCULOS POLÍTICOS À EFETIVAÇÃO
DO DIREITO À MORADIA. ..................................................................................... 431
RODOLFO CARVALHO NEVES DOS SANTOS
MIGUEL ETINGER DE ARAUJO JUNIOR
BREVE HISTÓRICO E ATRIBUIÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO .. 432
JULIANA KIYOSEN NAKAYAMA
RAQUEL VIOTTO MARTINS
FLEXIBILIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO E O ASPECTO NEGOCIAL DA FUNÇÃO
DO JUIZ À LUZ DO FORMALISMO-VALORATIVO NO PROCESSO CIVIL ......... 433
MAITÊ PEREIRA LAMESA
DESAFIO DA ANÁLISE PRÉVIA DOS ATOS DE CONCENTRAÇÃO .................. 435
VIEIRA, ARIANE SACCON; PRADO, MARTHA ASUNCÍON ENRÍQUEZ.
A CRIANÇA E O ADOLESCENTE NA PRAÇA: ANÁLISE DO CASO DA PRAÇA
PEDRO PEZZARINI. ............................................................................................... 437
GUSTAVO MELLO DOS SANTOS.
ERIKA JULIANA DMITRUK.
A POSSIBILIDADE DA ALTERAÇÃO DE PRENOME NO REGISTRO CIVIL EM
CASOS DE TRANSEXUALISMO ........................................................................... 439
JULIANA KIYOSEN NAKAYAMA
WHANDER INÁCIO MARQUES
DA APLICABILIDADE DO ARTIGO 475-J DO CPC NO PROCESSO
TRABALHISTA ....................................................................................................... 440
SOBREIRA, RAFAEL MIAKI
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DA APLICAÇÃO DOS INSTITUTOS DE GERENCIAMENTO DO PROCESSO
NORTE-AMERICANOS NA REDUÇÃO DA DURAÇÃO DO PROCESSO FRENTE
À VIABILIDADE DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS .................................................... 442
HENRIQUE VOLPATO MALUTA
FRANCISCO EMILIO BALEOTTI
A AUTONOMIA DA VONTADE NOS NEGÓCIOS JURÍDICOS INTERNACIONAIS
SEGUNDO UMA CONCEPÇÃO PÓS-MODERNA DO DIREITO INTERNACIONAL
PRIVADO: UM ESTUDO SEGUNDO A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO .... 443
TÂNIA LOBO MUNIZ.
DIREITO E INTERPRETAÇÃO: REFLEXÕES CRÍTICAS DE DWORKIN AO
POSITIVISMO E A CONCEPÇÃO DE DIREITO COMO INTEGRIDADE ............... 445
JOSÉ EDUARDO RIBEIRO BALERA
PATRÍCIA AYUB COSTA LIGMANOVSKI
ANÁLISE DA SOBERANIA NO CASO CESARE BATTISTI NA SUSTENTAÇÃO
ORAL DE LUIZ ROBERTO BARROSO ................................................................. 446
CAROLINA ITIMURA DE CAMARGO
O DIREITO DE ASSOCIAÇÃO NO ÂMBITO DA ORGANIZAÇÃO
INTERNACIONAL DO TRABALHO ....................................................................... 447
SOUZA, MAYRA DO AMARAL GURGEL ALVES DE; MUNIZ, TÂNIA LOBO;
DOS DIREITOS TRABALHISTAS DAS GESTANTES .......................................... 448
LÍVIA NOBUKO MORIYAMA
DA MEDIAÇÃO E DA ARBITRAGEM .................................................................... 449
LÍVIA NOBUKO MORIYAMA
REINTEGRAÇÃO SOCIAL DO DETENTO: O TRABALHO PENITENCIÁRIO
EXTRAMUROS E AS ENTIDADES BRASILEIRAS DO SISTEMA “S” ................ 450
PEZARINI, MARIANA DE OLIVEIRA.
KEMPFER, MARLENE.
O DIREITO DE ESCOLHA DO CONSUMIDOR NA AQUISIÇÃO DE PRODUTOS
TRANSGÊNICOS ................................................................................................... 451
DESIRÉE BAHLS TOMELERI
TATIANE RIBEIRO CAMPOS
SANEAMENTO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE: ESSENCIALIDADE À VIDA
HUMANA E À PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE ................................................ 453
DESIRÉE BAHLS TOMELERI
TATIANE RIBEIRO CAMPOS
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PROJETO QUEM AMA CUIDA: UMA ANÁLISE DA GESTÃO DAS PRAÇAS DE
LONDRINA A PARTIR DOS MECANISMOS DE GESTÃO DEMOCRÁTICA DA
CIDADE................................................................................................................... 455
DEÍSE CAMARGO MAITO
NÁDIA MAMI MARCOLINO,
ESTADO DE DIREITO, INVESTIGAÇÕES BIOANTROPOLÓGICAS DE
DELINQUÊNCIA E ÉTICA EM PESQUISA ............................................................ 456
JOSÉ EDUARDO RIBEIRO BALERA
NILZA MARIA DINIZ
NEGÓCIO JURÍDICO AMBIENTAL: A EFETIVIDADE DO PROCESSO ATRAVÉS
DA TUTELA ESPECÍFICA ...................................................................................... 458
LÍVIA ROSSI DE ROSIS PEIXOTO
FRANCISCO EMILIO BALEOTTI
A IMPORTÂNCIA DA DEMOCRACIA DELIBERATIVA PARA A CONCRETIZAÇÃO
DA CIDADANIA ...................................................................................................... 459
ANA PAULA DE OLIVEIRA MAZONI
A DISCRICIONARIEDADE DO MAGISTRADO NAS DIFERENTES ESPÉCIES DE
VALORAÇÃO DA PROVA ..................................................................................... 461
EDLEIDE DE ALMEIDA COSTA
JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA E POLITIZAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO .... 462
ANA PAULA DE OLIVEIRA MAZONI
O ACESSO À JUSTIÇA VIABILIZADO PELO USO DA MEDIAÇÃO COMO MEIO
ALTERNATIVO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS NA SEARA EMPRESARIAL. ... 464
RENATA MAYUMI SANOMYA E FRANCISCO EMÍLIO BALEOTTI.
A GÊNESE DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ................................ 466
VICTOR HAYASHI
MARINNO ARTHUR BERNO
A OMC E A PROMOÇÃO DO DESENVOLVIMENTO. .......................................... 467
MENIN, CHRISTIAN EDUARDO; MUNIZ, TÂNIA LOBO.
ARBITRAGEM NOS CONFLITOS NEGOCIAIS DO COMÉRCIO INTERNACIONAL
................................................................................................................................ 468
LEAL JÚNIOR, JOÃO CARLOS
MUNIZ, TÂNIA LOBO
ADEQUAÇÃO PROCEDIMENTAL E DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO:
EFETIVANDO O ACESSO À JUSTIÇA ................................................................. 470
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LEAL JÚNIOR, JOÃO CARLOS;
A RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO NO ÂMBITO DO
SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA: SEGURANÇA
JURÍDICA PARA OS NEGÓCIOS PRIVADOS ...................................................... 472
LEAL JÚNIOR, JOÃO CARLOS
KEMPFER, MARLENE
MUDANÇAS NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL: EMBATE ENTRE
LIBERALIDADE E CONSTITUCIONALIDADE ...................................................... 474
DESIRÉE BAHLS TOMELERI
TATIANE RIBEIRO CAMPOS
O DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA DA FORMAÇÃO
HUMANA INTEGRAL E DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL NO CONTEXTO DO
MUNDO GLOBALIZADO: ATIVIDADE ORÇAMENTÁRIA E “RESERVA DO
POSSÍVEL” ............................................................................................................. 475
FERNANDA RAQUEL THOMAZ DE ARAÚJO
LUIZ FERNANDO BELLINETTI
DANOS CIVIS DECORRENTES DO PREJUÍZO AO ACESSO À JUSTIÇA ......... 477
MARINNO ARTHUR BERNO
IVAN MARTINS TRISTÃO
A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA E A RESPONSABILIDADE PELO RESPEITO
AO MEIO AMBIENTE NATURAL ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO .............. 478
MARINNO ARTHUR BERNO
JOAO CARLOS LEAL JUNIOR
OS PROBLEMAS DA ATUAÇÃO ESTATAL FRENTE AOS DESAFIOS DA
SUSTENTABILIDADE. ........................................................................................... 480
FÁBIO YUJI YOSHIDA HAYASHIDA
MIGUEL ETINGUER DE ARAUJO JUNIOR
O ACESSO À JUSTIÇA PROPORCIONADO AOS ACIONISTAS MINORITÁRIOS
NOS TERMOS DO ARTIGO 246 DA LEI 6.404/66 ................................................ 481
VICENTINI, FERNANDA;
MARQUES FILHO, VICENTE DE PAULA;
COGNIÇÃO, COISA JULGADA E EXECUÇÃO EM SEDE DE ARBITRAGEM:
NOVAS CONCEPÇÕES À LUZ DA LEI N. 9.307/96*............................................. 482
SANTOS, LUCIANO ALVES RODRIGUES DOS
BALEOTTI, FRANCISCO EMILIO
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OS LIMITES JURÍDICOS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS EM FACE DA
HIERARQUIA NORMATIVA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS* ..................... 483
NASCIMENTO, VICTOR HUGO ALCALDE DO;
MUNIZ, TÂNIA LOBO;
SEGURANÇA HUMANA E O DEVER JURÍDICO DAS EMPRESAS BRASILEIRAS*
................................................................................................................................ 484
KEMPFER, MARLENE;
DO ESTADO LIBERAL AO AMBIENTAL: A SUSTENTABILIDADE NOS
NEGÓCIOS JURÍDICOS* ........................................................................................ 486
SOUZA, MARIA CLAUDIA DE;
BANNWART JÚNIOR, CLODOMIRO;
O ARTIGO 2.035 DO CÓDIGO CIVIL E A INCIDÊNCIA DA FUNÇÃO SOCIAL DA
PROPRIEDADE E DO CONTRATO NOS NEGÓCIOS CELEBRADOS
ANTERIORMENTE À SUA VIGÊNCIA ................................................................... 487
RIBAS, THAÍS CASADO;
LEAL JÚNIOR, JOÃO CARLOS;
SUPERENDIVIDAMENTO E OS NEGÓCIOS JURÍDICOS CONSUMERISTAS:
PERSPECTIVA LEGISLATIVA ANTE A AUSÊNCIA DE TUTELA LEGAL NO
BRASIL ................................................................................................................... 489
KADRI, NÁDIA SAFADE EL;
ESPOLADOR, RITA TARIFA;
A RESPONSABILIDADE CIVIL DAS CLÍNICAS DE REPRODUÇÃO ASSISTIDA
EM RELAÇÃO AO CONSUMIDOR ........................................................................ 490
FRANÇA, LOREANNE MANUELLA DE CASTRO;
AMARAL, ANA CLAUDIA CORRÊA ZUIN MATTOS DO;
COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA: ATO ADMINISTRATIVO
NEGOCIAL EFICAZ NA TUTELA DO MEIO AMBIENTE ...................................... 491
SILVA, KAWANE CAROLINE KUBASKI;
MARQUES FILHO, VICENTE DE PAULA;
DA APLICAÇÃO DOS INSTITUTOS DE GERENCIAMENTO DO PROCESSO
NORTE-AMERICANOS NA REDUÇÃO DA DURAÇÃO DO PROCESSO SOB A
ÓTICA DA REALIZAÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS *.................................... 493
MALUTA, HENRIQUE VOLPATO;
BALEOTTI, FRANCISCO;
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FLEXIBILIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO E O ASPECTO NEGOCIAL DA FUNÇÃO
DO JUIZ À LUZ DO FORMALISMO-VALORATIVO NO PROCESSO CIVIL* ........ 495
LAMESA, MAITÊ PEREIRA;
BALEOTTI, FRANCISCO;
A IMUTABILIDADE DO JUIZ NATURAL FIXADO EM RAZÃO DA COMPETÊNCIA
PELA PRERROGATIVA DE FUNÇÃO;.................................................................. 496
RODRIGUES, RENAN MENDES;
A CONSTITUCIONALIDADE DA LEI MARIA DA PENHA ..................................... 497
FACHIN, JÉSSICA;
CONFLITO ENTRE ÁREA DE PROTEÇÃO PERMANENTE E DIREITO À
MORADIA: REFLEXÕES A PARTIR DO VALE DOS TUCANOS EM LONDRINA
................................................................................................................................ 498
DEÍSE CAMARGO MAITO,
MIGUEL ETINGER DE ARAUJO JUNIOR,
PROTEÇÃO AOS INVESTIDORES NO MERCADO DE CAPITAIS E A GARANTIA
DE ACESSO À JUSTIÇA ....................................................................................... 499
FERNANDA VICENTINI
VICENTE DE PAULA MARQUES FILHO
ACESSO À JUSTIÇA E AS AÇÕES COLETIVAS CONSUMERISTAS: EFEITOS
NA FORMAÇÃO DE RELAÇÕES NEGOCIAIS FUTURAS ................................... 500
BUGES, ALESSANDRA CARIA
MARQUES FILHO, VICENTE DE PAULA;
O ATUAL REGIME DE PRECATÓRIOS E SUA OFENSA À CONSTITUIÇÃO ..... 502
CONRADO AUGUSTO CARVALHO DE MAGALHÃES
RESPONSABILIDADE CIVIL APLICADA AO CONTRATO DE ASSISTÊNCIA
MÉDICA .................................................................................................................. 503
LOREANNE MANUELLA DE CASTRO FRANÇA
ANA CLAUDIA CORRÊA ZUIN MATTOS DO AMARAL
A RESPONSABILIDADE ÉTICA DA EMPRESA PELA PROMOÇÃO DO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ................................................................. 505
CLODOMIRO JOSÉ BANNWART JÚNIOR
CINTHIA OKAZAKI TERASACA.
O TRÁFICO DE PESSOAS COM FINS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL. ................. 506
CINTHIA OKAZAKI TERASACA.
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A LIVRE CONCORRÊNCIA COMO INSTRUMENTO DE EFETIVAÇÃO DE
DIREITOS FUNDAMENTAIS .................................................................................. 508
ESTRALIOTO, WILDEMAR ROBERTO
CARNEIRO, RUY DE JESUS MARÇAL
ANÁLISE DA SOBERANIA NO CASO CESARE BATTISTI NA SUSTENTAÇÃO
ORAL DE LUIZ ROBERTO BARROSO ................................................................. 509
CAROLINA ITIMURA DE CAMARGO
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O DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE
EQUILIBRADO E A ECONOMIA DE MERCADO.
Antônio Marcos Boaventura
Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Belo Horizonte – UNI-BH;
Especialista em Direito Público pelo Centro Universitário Newton Paiva; Mestrando
em Direito Ambiental pela Escola Superior Dom Helder Câmara - ESDHC
SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 O meio ambiente como direito fundamental. 3 O princípio
da atividade econômica. 4 Meio ambiente ecologicamente equilibrado e a economia
de mercado. 5 Função socioambiental da propriedade. 6 Conclusão.
1 INTRODUÇÃO
A proteção do meio ambiente se tornou nos dias de hoje o principal e mais
importante tema das reuniões envolvendo as várias nações do planeta.
Mas a tarefa não é fácil, pois, preservar o meio ambiente e continuar a
crescer economicamente nos padrões americanos ou chineses, a cada dia se torna
um sonho de todos os países em desenvolvimento, que por coincidência ou não, são
os que detêm a maior parte dos recursos naturais disponíveis no planeta.
Essa busca pelo desenvolvimento econômico traz um iminente risco de
extinção da vida na terra, fazendo do meio ambiente um verdadeiro “meio” na busca
desse ideal.
A garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado para todos
choca-se diretamente com o principio da atividade econômica, é claro nos termos
que a econômica de mercado mundial hoje vem atuando, sem se preocupar com a
preservação ambiental para as presentes e futuras gerações.
Essa compatibilidade entre crescimento econômico e preservação ambiental
é o novo paradigma do século XXI, e é desta solução que dependerá a qualidade de
vida das futuras gerações.
2 O MEIO AMBIENTE COMO DIREITO FUNDAMENTAL
Primeiramente devemos lembrar que os direitos fundamentais não se
restringem apenas aos direitos previstos no artigo 5º da nossa Carta magna. Os
direitos que de alguma forma repercutem sobre a estrutura do Estado ou da
sociedade, são reconhecidos direitos fundamentais devido a sua materialidade.
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O meio ambiente ecologicamente equilibrado é visto pela maioria dos
doutrinadores como um direito fundamental de 3ª geração.
Autor da divisão dos direitos fundamentais em gerações do direito, Karel
Vasak foi quem primeiro discursou neste sentido, em uma aula inaugural dos cursos
do Instituto Internacional dos Direitos do homem em Estrasburgo na França, no ano
de 1979, quando usando os ditames da Revolução francesa (liberdade, igualdade,
fraternidade) dividiu os direitos humanos no tempo em gerações, teoria que se
tornou mundialmente conhecida através do autor Norberto Bobbio.
Apenas para lembrar, temos os direitos de liberdade, os direitos civis e
políticos na primeira geração, os direitos sociais, mais voltados para a coletividade e
não apenas para o indivíduo como segunda geração. E por fim os direitos de terceira
geração, conhecidos como direitos metaindividuais, providos de uma abrangência
não limitada apenas ao individuo ou a coletividade, mas de um alto teor de
humanismo com fundamentos na fraternidade, tendo como principais conquistas o
direito do trabalho e o direito ambiental.
Reconhecido pela nossa Constituição Federal de 1988 em seu artigo 225
como um direito fundamental difuso, que elegeu o meio ambiente ecologicamente
equilibrado como bem de uso comum do povo, e essencial à sadia qualidade de
vida.
Dizem-se direitos difusos e não coletivos pelo fato de que os direitos difusos
têm seus destinatários indeterminados ou indetermináveis, enquanto nos interesses
coletivos podemos identificar os interessados, como por exemplo, os membros de
um sindicato trabalhista.
Portanto, hoje temos o meio ambiente saudável e equilibrado como um dos
direitos fundamentais do ser humanos, garantidos não só para a presente geração
mais também para as futuras como um pacto intergeracional adotado pela nossa
Constituição Federal.
3 O PRINCÍPIO DA ATIVIDADE ECONOMICA
Um dos principais “efeitos colaterais” ocorridos com o desenvolvimento
econômico ocorrido a partir da revolução industrial e da revolução tecnológica, foram
as mudanças climáticas provocadas pela devastação ambiental.1
O meio ambiente visto como recurso natural ou como ambiente das relações
sociais sofre diretamente os impactos gerados através da atividade econômica.2
Em busca da proteção ambiental para as presentes e futuras gerações,
através do desenvolvimento sustentável, a nossa carta magna de 88 preconizou
1 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. Salvador: Juspodivm, 2011, pag.705.
2 FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. Temas de Direito Ambiental e Urbanístico. São Paulo: Max
Limonad,1998, pag.99.
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normas de Direito Econômico buscando o exercício desta atividade em equilíbrio
com o meio ambiente.3
A Constituição Federal, em seu artigo 170, enumera os fundamentos e
princípios da ordem econômica. Vejamos:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e
na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os
ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I – soberania nacional;
II – propriedade privada;
III – função social da propriedade;
IV – livre concorrência;.
V – defesa do consumidor;
VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado
conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de
elaboração e prestação; (grifo nosso)
VII – redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII – busca do pleno emprego;
IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas
sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer
atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo
nos casos previstos em lei.
Desta forma, a fim de se respeitar o direito fundamental ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, o inciso VI do artigo 170 da Constituição Federal
declara que a atividade econômica deve ser pautada na defesa do meio ambiente,
ou seja, por mais importante que seja o desenvolvimento econômico para nossa
sociedade ele não pode deixar de analisar os impactos causados pela atividade
econômica, a fim de permitir a manutenção dos meios de produção e a preservação
dos recursos naturais para as presentes e futuras gerações.4
Exercer a atividade econômica em detrimento do meio ambiente, colocando
em risco a qualidade de vida dos seres que habitam o planeta é um contra-senso,
pois, temos duas liberdades ditadas pelo direito se contrapondo de forma que uma
acaba anulando a efetividade da outra.5
Na prática, do ponto de vista da economia, existe uma tendência a visualizar
os bens apenas no seu momento de produção e consumo, excluindo do campo
3 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. Salvador: Juspodivm, 2011, pag.706.
4 FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. Temas de Direito Ambiental e Urbanístico. São Paulo: Max
Limonad,1998, pag.99. 5 Idem, pag.99.
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econômico os reflexos da exploração dos recursos naturais bem como os impactos
causados por seus resíduos.6
O artigo 170 traz como finalidade assegurar a todos através do
desenvolvimento econômico uma existência digna.7
Mas até que ponto o desenvolvimento econômico e o meio ambiente podem
caminhar juntos em busca da verdadeira qualidade de vida, com justa distribuição da
renda gerada pela produção capitalista e o respeito com os recursos naturais e com
o meio ambiente?
Assim, aceitando a existência de uma forte ligação entre a preservação do
meio ambiente e o desenvolvimento econômico, a Constituição Federal de 88
consagrou a defesa do meio ambiente como um dos princípios gerais da atividade
econômica e, para isso se faz necessário a utilização adequada dos recursos
naturais, tendo neste aspecto grande importância à propriedade privada, que deve
atender a sua função social.8
4 MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO E A ECONOMIA DE
MERCADO
É incontroverso que a economia de mercado capitalista, principalmente no
pós-guerra, é o grande impulsionador das devastações ambientais sofridas pelo
nosso planeta.
Nas décadas de 70 e 80 havia uma expectativa de que a aceleração do
crescimento econômico em sua fase inicial denominada de take off9 traria através da
geração de empregos e distribuição de rendas o bem estar social chamado de
processo trickle down.10
Na busca deste processo trickle down, áreas cobertas por vegetação natural
foram vistas como propriedades improdutivas ou insuficientemente utilizadas, sendo
passiveis de desapropriação, no contexto constitucional da visão social da
6 CARNEIRO, Ricardo. Direito Ambiental: uma abordagem econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2001,
pag.35. 7 DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. São Paulo: Saraiva, 2008, pag.236.
8 FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. A propriedade no Direito Ambiental. 4ª ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2010, pag.44. 9 s.m. (pal. ing.) Fase do desenvolvimento econômico de um país a partir da qual este não mais pode ser
qualificado de subdesenvolvido; arrancada de um sistema econômico. Disponível em:<
http://www.verbetes.com.br/def:131873:Take-off>, acesso em: 01 dez 2011. 10
O conceito de economia trickle down assenta na idéia de que “ o crescimento econômico, mesmo que chegue a
beneficiar primeiro os mais ricos, acaba por ajudar a todos”. Esta linha de pensamento vai naturalmente no
sentido da teoria liberal, que faz a separação entre o economico (maximização da riqueza produzida) e o social
(ou político) com repartição posterior desta riqueza produzida.
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propriedade, passando a exploração de grandes empreendimentos
agroexportadores.11
O otimismo levantado no passado acerca de que o desenvolvimento
econômico traria progresso e qualidade de vida se transformou no pesadelo da
sociedade pós-moderna, trazendo consigo a desigualdade social, o desemprego
estrutural nos centros urbanos, os conflitos fundiários com a exclusão de grupos que
foram marginalizados como os índios, quilombolas, seringueiros e, principalmente a
devastação ambiental. 12
Nas palavras de Luis Roberto Barroso: “ no país da malária, da seca, da
miséria absoluta, dos menores de rua, do drama fundiário, dos sem-terra, há, por
certo, espaço para mais uma preocupação moderna: a degradação ambiental.13
A abordagem existente entre o sistema econômico e o ecológico do ponto
de vista econômico apresenta distorções, no meu ponto de vista propositalmente, no
momento que trata exclusivamente dos mecanismos de funcionamento de mercado,
considerando os bens exclusivamente no seu momento de produção e consumo,
sem levar em conta os reflexos da utilização dos recursos naturais, assim como os
impactos gerados no meio ambiente como um todo.14
Nos dias de hoje, não se pode fechar os olhos para os impactos causados,
principalmente ao meio ambiente, pelos meios de produção capitalista. A atividade
econômica retira da natureza os elementos essenciais para o seu normal
desenvolvimento, devolvendo-os mais tarde sob diversas outras formas, causando
impactos em todo o meio ambiente.15
O nosso sistema capitalista moderno se mostra totalmente dependente da
utilização intensiva dos recursos naturais, sem se preocupar com os limites
espaciais e temporais impostos pela natureza, seja na utilização de insumos do
processo econômico, seja com relação aos rejeitos gerados por essa atividade, que
de alguma forma retornam ao meio ambiente de forma poluidora.16
A busca pela acumulação de capital através da geração de lucros, demanda
do sistema econômico um crescimento contínuo e uma busca frenética por
mercados consumidores.17
11
Desenvolvimento e conflitos ambientais. Andréa Zhouri, Klemens Laschefski, organizadores. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2010, p.11 12
Desenvolvimento e conflitos ambientais. Andréa Zhouri, Klemens Laschefski, organizadores. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2010, p.12. 13
SARLET, Ingo Wolfgang. Direito Constitucional Ambiental: Estudos sobre a Constituição, os Direitos
Fundamentais e a Proteção do Ambiente. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p.89. 14
CARNEIRO, Ricardo. Direito ambiental: uma abordagem econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2001, pag.35. 15
Idem, pag.36. 16
Ibidem, pag.36/50. 17
Ibidem, pag.50.
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Para isso a estratégia utilizada pelo capitalismo é a de influenciar o
comportamento das pessoas, criando necessidades através dos meios de
comunicação, moldando assim hábitos consumistas.18
O sistema econômico deixa assim de ser um mecanismo que atenda as
necessidades para se tornar um mecanismo de criação de necessidades,
influenciando nas escolhas individuais, hábitos e nos gostos dos consumidores.19
O consumidor deixa de controlar o fluxo dos mercados de forma
unidirecional, através de sua demanda por produtos e assim impulsionando os
respectivos produtores e fornecedores para aumento ou diminuição na produção. 20
Hoje os próprios agentes de produção controlam o comportamento dos
mercados, inserindo as tendências consumistas no mercado, influenciando assim a
oferta e a demanda de produtos.21
Neste contexto, a economia de mercado existente no capitalismo atual se
utiliza de outra prática comum, implícita nos modos de produção, que é conhecida
como obsolescência planejada.22
Nesta prática industrial da obsolescência planejada, os bens produzidos são
programados para ter sua durabilidade ou utilidade reduzida de várias formas, ou
seja, a sua vida útil fica obsoleta, seja por defeitos técnicos previstos no ato da
produção, seja por lançamento de um novo designer, ou por melhoramentos
tecnológicos.23
Essa obsolescência programada, juntamente com um bombardeio de
campanhas publicitárias inserindo comportamentos na sociedade, faz com que o
consumo se torne cíclico24 mantendo o sistema capitalista ativo através do
consumismo.25
Assim, a atual economia de mercado, baseada no consumo cíclico
incentivado pela obsolescência planejada e pelas estratégias de marketing, causam
impactos significativos ao meio ambiente, através do dispêndio material e energético
dos meios de produção, visando as mais variadas necessidades criadas por essa
indústria, além da imposição da cultura do descartável que transforma recursos
naturais em toneladas de lixo.26
18
Ibidem, pag.50. 19
Ibidem, pag.50. 20
CARNEIRO, Ricardo. Direito ambiental: uma abordagem econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2001, pag.51. 21
Idem, pag.51. 22
Ibidem, pag.51. 23
Ibidem, pag.51. 24
Documentário Zeitgeist: moving forward. Disponível
em:<http://www.youtube.com/watch?v=4Z9WVZddH9w> acesso em: 01 nov.2011. 25
CARNEIRO, Ricardo. Direito ambiental: uma abordagem econômioca. Rio de Janeiro: Forense, 2001,
pag.51. 26
Idem, pag.51.
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Com a crescente conscientização da sociedade em relação a preservação
ambiental, o marketing ecológico passou a fazer parte das estratégias capitalistas.27
Mas esse discurso ecológico tem seus limites delineados pela economia de
mercado, ou seja, o uso de tecnologias limpas, o respeito ao meio ambiente, a
redução na emissão de poluentes, não podem interferir na competitividade da
economia tanto em nível global com local.28
Em suma, a diminuição do crescimento econômico e a sustentabilidade são
buscadas pelo mercado, desde que não haja afetação dos níveis de emprego nem
sejam prejudicadas as comodidades e facilidades da vida moderna. 29
Talvez esse seja o grande paradigma a ser vencido nessa batalha pela
preservação do meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
5 FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE
A constituição de 1988 trouxe mudanças pertinentes no que diz respeito ao
direito a propriedade, que passa obrigatoriamente a atender a sua função social.
Em seu artigo 5º incisos XXII e XXIII o direito de propriedade é assegurado
desde que comprovado o cumprimento da sua função social.
O direito de propriedade originário das revoluções burguesas teve enorme
influência no progresso pós-revolução industrial e formação do Estado moderno,
sendo um dos fatores predominantes na escalada de degradação ambiental, que a
partir da cultura de utilização da propriedade privada como direito absoluto,
exclusivo e ilimitado (John Locke), não sendo passível de interferência pelo poder
soberano do Estado, nascendo a cultura de uso e dilapidação do patrimônio natural
ao bel prazer do seu proprietário. 30
Influenciados pela Revolução francesa e americana, no Brasil, a
Constituição Imperial previa o direito de propriedade como um direito pleno,
constando também o direito de indenização em caso de desapropriação por
interesse público.31
O código civil de 191632, com influência do liberalismo do código
napoleônico, definia o direito de propriedade como um direito absoluto e ilimitado,
27
Ibidem, pag.52. 28
CARNEIRO, Ricardo. Direito ambiental: uma abordagem econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2001, pag.52. 29
Idem, pag.52. 30
PADILHA, Norma Sueli . Fundamentos Constitucionais do Direito Ambiental Brasileiro. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2010, pag.268. 31
PADILHA, Norma Sueli . Fundamentos Constitucionais do Direito Ambiental Brasileiro. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2010, pag.268. 32
Art. 524. A lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los do poder
de quem quer que injustamente os possua.
Art. 527. O domínio presume-se exclusivo e ilimitado, até prova em contrário.(código civil brasileiro de
1916).
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devendo o proprietário respeitar apenas os direitos de terceiros e o poder normativo
do Estado, ou seja, ao interesse público.33
O direito de propriedade como direito de uso, gozo e fruição teve uma
evolução lenta do sentido individual para o social, ingressando no Direito
Constitucional moderno do pós-guerra ao ser inserido nos textos constitucionais de
Weimar(1919), do México (1917), da Polônia (1921) e de Portugal (1933), sendo
tratado com maior importância com a constituição Italiana de 1940 e no preâmbulo
da Constituição francesa de 1947. 34
A constituição brasileira de 193435 deu o primeiro passo para a reformulação
do direito de propriedade fazendo constar em seu texto que esse direito não pode
ser exercido contra os interesses sociais e coletivos, além de prever também que a
propriedade das riquezas minerais são distintas da propriedade do solo,
diferentemente das legislações anteriores.36
Já na constituição de 1946 a propriedade privada passou a ter como
condicionante o bem estar social, prevendo também em seu texto as primeiras
normas com cunho de reforma agrária, no momento que dispôs que a lei poderia
promover a justa distribuição da propriedade. 37
Já na constituição de 1967 a função social da propriedade é introduzida
como princípio da atividade econômica e mesmo tendo a norma constitucional
evoluído no conceito de propriedade, o código civil permanecia sem alterações,
tornando-se uma barreira a legislação ambiental até final da década de 80.38
Somente em 1962 com a edição da lei 4132 (Define os casos de
desapropriação por interesse social e dispõe sobre sua aplicação) e da lei
33
PADILHA, Norma Sueli . Fundamentos Constitucionais do Direito Ambiental Brasileiro. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2010, pag.269. 34
Idem, pag.269. 35 Art 113 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos
direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
XVII- É garantido o direito de propriedade, que não poderá ser exercido contra o interesse social ou
coletivo, na forma que a lei determinar. A desapropriação por necessidade ou utilidade pública far-se-á nos
termos da lei, mediante prévia e justa indenização. Em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção
intestina, poderão as autoridades competentes usar da propriedade particular até onde o bem público o exija,
ressalvado o direito à indenização ulterior.
Art 118 - As minas e demais riquezas do subsolo, bem como as quedas d'água, constituem propriedade
distinta da do solo para o efeito de exploração ou aproveitamento industrial. (Constituição Federal do Brasil de
1934).
36 PADILHA, Norma Sueli . Fundamentos Constitucionais do Direito Ambiental Brasileiro. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2010, pag.270. 37
PADILHA, Norma Sueli . Fundamentos Constitucionais do Direito Ambiental Brasileiro. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2010, pag.270. 38
Idem, pag.270.
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4504/64(Estatuto da terra), o direito passa a ser relativizado, mesmo que de forma
insuficiente, em prol do interesse social.39
Enfim a constituição cidadã, como era chamada pelo Deputado Constituinte
Ulisses Guimarães a Constituição Federal de 1988, contemplou a função social da
propriedade nos direitos e garantias fundamentais bem como princípio geral da
ordem econômica, inserindo neste contexto a preservação do meio ambiente.40
A propriedade privada passa a ter um interesse social em detrimento do
interesse individual sem diminuir ou limitar o direito de propriedade, passando a
esfera de um poder-dever do proprietário no cumprimento das funções sociais da
propriedade, que cumprida todas as suas funções, garantido esta o direito de
propriedade.41
Desta forma, perde-se o direito a propriedade o seu caráter absoluto,
ilimitado e inatingível previsto anteriormente no código civil de 1916, de cunho liberal
e individualista, ganhando assim um cunho mais social visando o bem estar de
todos.42
A visão de que a função social da propriedade é uma limitação ao direito de
propriedade se encontra ultrapassado na doutrina jurídica.
A idéia da função social como uma limitação à propriedade, portanto, não
deve mais ser reconhecida como correta. Hoje, com base nos arts. 5º., XXIII, 170, III,
182, parágrafos 2º. e 4º., 184 e 186, da Constituição Federal, deve-se reconhecer
que a função social integra a propriedade; a função social é a propriedade, e não
algo exterior ao direito de propriedade. E, uma vez não cumprida a função social, o
direito de propriedade será esvaziado43.
Esse interesse social passa a reger todo o direito ambiental juntamente com
sua legislação, passando o meio ambiente a ser reconhecido como um interesse
difuso pertencente a toda coletividade, limitando o seu uso pelo particular.44
Neste diapasão, a propriedade rural é vista pela Constituição de 88 com uma
maior responsabilidade social, maior até do que a propriedade urbana, tendo em
vista a sua função contributiva para a produção de alimentos, que proporciona
desenvolvimento e bem estar social a partir do uso eficiente e adequado dos
recursos sem deixar de lado a preservação ambiental e os direitos dos
trabalhadores.45
39
Ibidem, pag.270. 40
Ibidem, pag.271. 41
Ibidem pag.271. 42
THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. Salvador: Juspodivm, 2011, pag.705. 43 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Função social no Direito Civil. 2. ed.
São Paulo: Atlas, 2008, pag 51. 44
PADILHA, Norma Sueli . Fundamentos Constitucionais do Direito Ambiental Brasileiro. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2010, pag.272. 45
Ibidem, pag.272.
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Assim, nesse entendimento, uma propriedade efetivamente produtiva,
geradora de empregos, mas descompromissada com a preservação ambiental,
deixa de cumprir a sua função social, estando passível de desapropriação46 para fins
de reforma agrária.47
Em suma, as funções sociais da propriedade funcionam em conjunto e de
forma indissociáveis, tendo que ser cumpridos de forma simultânea,e na ausência
de um deles fica descaracterizada essa função social.48
O princípio da função social da propriedade se superpõe à autonomia
privada, que rege as relações econômicas, para proteger os interesses de toda a
coletividade em torno de um direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Somente a propriedade privada que cumpra a sua função social possui proteção
constitucional.49
Acompanhando a evolução legislativa, o Código Civil Brasileiro no seu artigo
1228, §1º50 dispõe que o direito de propriedade deve estar em conformidade com
suas finalidades econômicas e sociais, preservando também a fauna e a flora, o
equilíbrio ecológico, o patrimônio artístico e cultural, bem como evitando o
proprietário de poluir o do ar e as águas.
Na busca do equilíbrio entre sustentabilidade e meio ambiente, o Direito
ambiental encontra resistências por parte dos proprietários dos bens de produção e
consumo, tornando difícil a implementação do principio da função social da
propriedade.51
Nesta busca para disciplinar a propriedade dos bens de produção e
consumo, o direito ambiental esbarra na propriedade privada, que se constitui o
núcleo do capitalismo.52
46
Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que
não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com
cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua
emissão, e cuja utilização será definida em lei.(Constituição Federal de 1988). 47
PADILHA, Norma Sueli . Fundamentos Constitucionais do Direito Ambiental Brasileiro. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2010, pag.273. 48
Ibidem, pag.274. 49
AYALA, Patryck de Araújo. Deveres ecológicos e regulamentação da atividade econômica na Constituição
Brasileira. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional
Ambiental brasileiro. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 289-326. 50
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de
quem quer que injustamente a possua ou detenha.
§ 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais
e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as
belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e
das águas.(Código Civil brasileiro de 2002). 51
FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. A propriedade no Direito Ambiental. 4ª ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2010, pag.28. 52
Idem, pag.29.
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A expansão do capitalismo trouxe grandes desigualdades entre os países do
norte e do sul, além de desigualdades dentro de um mesmo país, como é o caso do
Brasil, gerando comunidades ricas em detrimento dos pobres.53
Essa crescente desigualdade social avança em todo o mundo, repercute de
certa forma que os espaços ambientais mais degradados e poluídos, são divididos
entre as populações mais pobres, sendo que essa contaminação global tem forte
relação com a desigual distribuição das riquezas.54
Não podemos viver na ilusão de que a edição de legislações em prol do
meio ambiente, mas que chocam-se com as visões capitalistas atuais, vão
apresentar resultados positivos nessa luta pela preservação.55
A propriedade privada no atual estágio do capitalismo tem grande influencia
no aprofundamento das desigualdades sociais, sejam elas regionais ou continentais,
concorrendo principalmente para a desigual distribuição de recursos.56
Para que as atividades econômicas desenvolvidas em espaços privados
tenham resultados positivos para o meio ambiente, o direito necessita de princípios
que amenizem a liberdade no direito de propriedade, tendo como o principal deles a
função social da propriedade.57
Na concepção atual a propriedade não é vista com uma função social, mais
o seu direito se justifica através dessa função social.58
Ainda temos a função social da propriedade e seus requisitos de
atendimento muito ligados a sua função produtiva, esquecendo-se na maioria das
vezes da sua função ambiental.59
Neste raciocínio entra o direito ambiental, demonstrando a importância de se
produzir para alcançar o desenvolvimento econômico, mas sem se descuidar da
proteção ambiental.60
Lembrando que não podemos visualizar o direito de propriedade apenas no
que diz respeito a propriedade imóveis, terras, etc. Todo e qualquer bem apropriável,
seja ele móvel, imóvel ou até mesmo imaterial, de produção de consumo, tem que
atender a função social da propriedade.61
Importante frisar que nessa função social da propriedade, alem da
destinação econômica de sua utilização e do meio ambiente, a propriedade tem que
atender sua função social respeitando as relações de trabalho. Não cumpre a função
53
Ibidem, pag.31. 54
Ibidem, pag.31. 55
Ibidem, pag.32 56
FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. A propriedade no Direito Ambiental. 4ª ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2010, pag.32. 57
Idem, pag.33. 58
Ibidem, pag.33. 59
Ibidem, pag.34. 60
Ibidem, pag.34. 61
Ibidem, pag.34.
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social, por exemplo, a propriedade que explora o trabalho escravo, ou não cumpre
com os direitos de seus empregados.62
Podemos concluir que o princípio da função social da propriedade não esta
adstrito apenas a função ambiental, mas é amplamente aplicado em outros ramos
como o constitucional, administrativo, civil, agrário, econômico, do trabalho e
principalmente aos direitos humanos.63
Assim, tendo em vista o seu caráter global, interdisciplinar, o Direito
ambiental age em todos estes ramos de forma solidária, indissociável e
emancipadora e, por essa interdisciplinaridade podemos dizer que a função social
da propriedade sob a perspectiva ambiental tem uma adequação maior e mais
efetiva.64
O desenvolvimento e a proteção ambiental se interligam de forma
indissociável, não sendo possível a implementação de um sem o outro, sendo
ambos de interesse comum de toda a humanidade.65
6 CONCLUSÃO
Quando Locke insere na sociedade um conceito de propriedade baseado na
existência de excedentes suficientes para todos, conquistada através da integração
do seu trabalho à utilização da propriedade, defendendo também a proteção desta
propriedade contra danos, vivíamos em uma sociedade feudal baseada na troca de
produtos entre feudos.
O que excedia ao consumo próprio era trocado com outros produtores, já
que a moeda ainda que existente, era pouco utilizada.
O dinheiro surge como moeda de troca, a fim de se evitar o desperdício, pois
o dinheiro, seja ouro ou prata, não estraga, podendo ser guardado por muito tempo,
diferentemente da troca de produção que tinha um período de eficácia.
Assim surge a capacidade de se acumular capital, riquezas e com isso a
propriedade não mais é garantido pela nossa mão de obra, pois, o dinheiro compra.
Não existe mais a preocupação com excedentes para todos, mas a capacidade de
comprar o excedente dos outros.
Assim a propriedade privada perdeu a sua função inicial, protegida contra o
poder absoluto do estado, e como forma de garantir um "mercado" que girava em
torno da troca de bens reais, tangíveis e que sustentavam a vida.
A acumulação de capital é o principal problema do nosso tempo, provocando
desigualdade social, que por sua vez cria a fome, miséria, criminalidade e os
62
Ibidem, pag.34. 63
Ibidem, pag.34. 64
FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. A propriedade no Direito Ambiental. 4ª ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2010, pag.35. 65
Idem, pag.29.
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desastres ecológicos, pois é através da extração exagerada de recursos da natureza
que o sistema econômico funciona, girando através de um espiral infinito que
culmina com o acumulo de capital nas mãos de poucos.
Hoje, florestas viram carne, água vira milho através de irrigação, enquanto
muitos sofrem com falta de água, comida, pois, a produção é destinada aqueles que
detêm o poder de compra.
Pessoas que vivem próximas as propriedades produtoras de alimentos
passam fome ou vivem na miséria extrema, pois, aquela produção é toda destinada
à exportação para países ricos que tem seu espaço ambiental aumentado através
do poder do dinheiro.
Os países do norte vivem as expensas dos países do sul, que trocam seus
recursos naturais e a pobreza de seu povo por um aumento no PIB impulsionado
pela exportação da safra de grãos para os ricos países do norte.
O modo de vida do norte passou a ser visto como um modelo de vida a se
buscar pelos países abaixo do equador, impulsionando cada vez mais o
desmatamento e a devastação ambiental em busca desse ideário fabricado no pós-
guerra.
Enfim, o capitalismo consumista, baseado na acumulação de capital tornou-
se, no meu ponto de vista, é o grande vilão na busca por um meio ambiente
ecologicamente equilibrado e uma sadia qualidade de vida.
Não existe uma econômica sustentável que trabalhe juntamente com a
acumulação de capital, pois a sustentabilidade esta ligada principalmente a
economia de recursos naturais e a sua utilização de maneira correta evitando o
desperdício.
Mas como evitar o desperdício se o modelo utiliza o teoria da obsolescência
programada?
Um computador que é fabricado para durar apenas um ou dois anos e ficará
obsoleto devido aos avanços tecnológicos, indo parar no lixo juntamente com metais
preciosos de difícil mineração como ouro, cobre, fazendo girar o consumo e gerando
enorme desperdício de recursos naturais.
Por que não fabricar máquinas facilmente atualizáveis, evitando assim o
descarte de computadores inteiros para se ter acesso a novas tecnologias?
Por que trocar o designe de um veículo, muitas vezes mudando um farol, ou
um friso lateral, apenas para desvalorizar o modelo anterior e manter o ritmo de
vendas das fabricar como forma de manter a produção?
É essa a sustentabilidade que se busca, computadores atualizáveis através
de pequenos chips, veículos com modelos que permaneçam atuais por mais tempo,
evitando assim a troca permanente, a fim de manter o status social do indivíduo e as
vendas das indústrias automobilísticas.
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Neste trabalho não prego o socialismo, pois tanto o capitalismo quanto o
socialismo falharam na tentativa de preservação do meio ambiente. O que tem que
ser analisado que não bastam leis de proteção ambiental, se o próprio estado
incentiva o consumo a fim de arrecadar mais impostos e gerar mais empregos para
aumentar o PIB.
É necessária uma mudança global na forma com que vemos o sistema de
mercado. É necessário mudar não apenas a consciência das pessoas para evitar o
desperdício de água, luz, ou reciclar papel, plásticos, mas devemos conscientizar as
pessoas que o consumo exagerado, desnecessário, fútil, visando o consumismo, o
status social, é o principal problema a ser combatido acerca da preservação do meio
ambiente.
Somente um mundo mais igual, fraterno e consciente poderá salvar o meio
ambiente do previsível colapso da vida.
BIBLIOGRAFIA
THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. Salvador: Juspodivm, 2011.
FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. Temas de Direito Ambiental e
Urbanístico. São Paulo: Max Limonad,1998.
CARNEIRO, Ricardo. Direito Ambiental: uma abordagem econômica. Rio de
Janeiro: Forense, 2001.
DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. São Paulo: Saraiva, 2008.
FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. A propriedade no Direito Ambiental. 4ª
ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
Desenvolvimento e conflitos ambientais. Andréa Zhouri, Klemens Laschefski,
organizadores. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.
SARLET, Ingo Wolfgang. Direito Constitucional Ambiental: Estudos sobre a
Constituição, os Direitos Fundamentais e a Proteção do Ambiente. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2011.
PADILHA, Norma Sueli . Fundamentos Constitucionais do Direito Ambiental
Brasileiro. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Função social no Direito Civil. 2. ed. São
Paulo: Atlas, 2008.
AYALA, Patryck de Araújo. Deveres ecológicos e regulamentação da atividade
econômica na Constituição Brasileira. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes;
LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional Ambiental brasileiro. 3. ed. São
Paulo: Saraiva, 2010.
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PRINCÍPIOS E GARANTIAS DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL
PRINCIPLES AND WARRANTIES OF THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT
Cássio Benvenutti de Castro66
Resumo: Analisar paradigmas do Tribunal Penal Internacional subentende a precisa
distinção entre o direito internacional penal e o direito penal internacional. Dessa
sistematização, permite-se definir onde estamos, em termos dogmáticos (‘lege lata’),
bem como para aonde nos conduzimos, na linguagem operativa da axio-deontologia
proposta no Estatuto de Roma (abertura da ‘lege ferenda’). Sobremaneira, o
construtivismo culturalista do direito internacional imbrica-se à profusão dialético-
argumentativa da jurisdição pretensamente universal. Daí a crescente importância
do estudo das ‘garantias’ (processuais) e dos ‘princípios’ (materiais) elencados no
Tratado: balizar tendências do novo direito internacional penal, de maneira a se
emprestar previsibilidade às decisões da Corte Permanente de Haia.
Abstract: Review International Criminal Court paradigms implies distinguish between
international criminal law categories. With this systematization, allows to define
where we are, in dogmatic terms (‘lege lata’), as well as where are we conducting
ourselves in the language of ethics-operative proposed in the Rome Statute (the
opening of ‘lege ferenda’). Significantly, the cultural constructivism of international
law overlaps to the profusion of dialectical argument supposedly universal
jurisdiction. Hence, the growing importance of studying the ‘warranties’ (procedural)
and the ‘principles’ (materials) listed in the Treaty: the new trends to delimit
international criminal law, in order to lend predictability to the decisions of the
Permanent Court of Haia.
66
Juiz de Direito no RS. Especialista em Ciências Penais. Mestrando em Direito na UFRGS. Articulista. Autor
dos livros ‘Temas de Ciências Penais: na perspectiva neoconstitucional’ e ‘(Neo)Soberania e Tribunal Penal
Internacional’. Email para críticas e/ou sugestões: [email protected]
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Sumário: Intróito 1. Direito Internacional Penal e crimes internacionais 1.1. Direito
Penal Internacional 1.2. Direito Internacional Penal 1.2.1. Fontes do Direito
Internacional Penal 2. Axiologia do Tribunal Internacional Penal 2.1. Dignidade da
pessoa humana 2.2. Jurisdição universal 2.3. Complementaridade 3. Deontologia do
Tribunal Internacional Penal 3.1. Garantias (processuais) 3.1.1. Institucional 3.1.2.
Competência 3.1.3.. Cooperação executiva e entrega de nacionais 3.1.4.
Imunidades ‘propter officium’ 3.1.5. Coisa julgada e revisão 3.1.6. Instrumentalidade
das formas e direitos do acusado 3.1.7. ‘Standard’ probatório para condenação 3.2.
Princípios 3.2.1. Legalidade, taxatividade e irretroatividade 3.2.2. Imputabilidade ao
maior de dezoito anos 3.2.3. Responsabilidade67 individual da pessoa física na
medida da culpabilidade 3.2.4. Requisito subjetivo (‘mens rea’) 3.2.5. Estrutura
bipartida dos crimes 3.2.5.1. Problemática do erro 3.2.6. Imprescritibilidade da
persecução 3.2.7. Tutela efetiva das vítimas. Conclusão. Referências
Palavras-chave: Tribunal Penal Internacional – normas – princípios – garantias
Keywords: International Criminal Court – standards – principles – guarantees
Intróito
Classicamente, a doutrina aborda três semânticas para definir
o Direito: (a) ele representaria um conjunto de normas (corrente metafísica); (b)
significaria apanhado fático (escola real-concretista); (c) ou constituiria a simbiose de
ambas as indigitadas expressões – o Direito enquanto fato normatizado. Apertada
lembrança dessa triplicidade auxilia na compreensão da crescente importância do
Direito Internacional Penal enquanto disciplina autônoma.
A escola normativa do Direito divulgou formalismo legalista,
então consagrador da soberania ortodoxa, que fora responsável pela afirmação dos
Estados Nacionais. Deveras, o Direito sinônimo de norma preocupou-se na
67
A terminologia ‘responsabilidade’ não fora utilizada de acordo com a concepção roxiniana, em oposição ao
juízo retrospectivo da culpabilidade. O estatuto açambarca a punibilidade em sentido amplo: tanto em termos da
imputação (incidência da norma ao caso) como nos foros da delimitação da conduta de cada agente
(culpabilidade).
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manutenção da “ordem”, institucionalizando uma contratação social na qual os
(outrora) súditos deviam obediência à coerção em troca do rescaldo de ‘segurança’,
garantido pela entidade pública, numa ciranda autofágica nitidamente sufragada na
centralização (ideologizada como “organização”) do poder. Tal dialética cidadão-
poder, fulcrada no princípio reitor coerção, no plano internacional, resulta na
conclusão: se não há Estado no plano internacional, onde estaria o Direito? Na
verdade, ele sequer existiria, tornando inexplicável a Corte Internacional Penal
através do raciocínio normativo.
Antitética, a corrente realista profligou noção do Direito no
sentido de fato, uma vez que realiza cotejo concretista das questões científicas,
embasado em metodologia tópica-zetética – das problemáticas para as soluções (e
vice-versa) –, depurando-se de atarracado tecnicismo metafísico (viciado na regra).
Para além do monopolismo criativo do Direito (não somente através das normas), as
decisões judiciais (compreendidas enquanto fatos sensíveis) avultam em
importância, desencadeando abertura hermenêutica do certame. Agora, o Direito
lidaria com entidades reais, não metafísicas: o fato (em si) e a sentença68 – como
também seria fenômenos físicos o dever jurídico, o direito subjetivo, e a relação
negocial entre as pessoas, etc. Dessa sorte, possibilita-se autonomia de algumas
fontes jurídicas em relação ao poder (centralizador) dos Estados – perspectiva que
enseja a criação das organizações internacionais enquanto sujeitos de direitos no
plano forâneo. Afinal, essas organizações estão na realidade sensível!
Note-se que o sistema do realismo é operativamente69
maleável, ratificando sua própria disposição dialogal cognitiva. Entretanto, essa
disposição teórica não assegura efetiva coercibilidade para o cumprimento das
proposições jurídicas. Carece-lhe a nota institucional, sem falar no eventual
decisionismo de uma jurisprudência (vide a escola de direito livre), que talvez
flertasse com infinita casuística tendente a retrocessos fadados (mais) à politização
que à (pretensa) técnica jurídica.
O furacão nazista contribuiu para arrefecer propostas
extremistas. Com efeito, a corrente (a) normativista demonstrou-se passível de
instrumentalização por um regime ditatorial; de seu turno, o realismo (b) ostentou
deficiências quanto à controlabilidade das próprias decisões. Críticas que
68
O que existe é o fato ‘x’ e a conseqüência jurídica a ser concretizada na sentença – aos entes reais: o fato e a
sentença. 69
Em geral, fala-se no sistema como cognitivamente aberto e operativamente fechado. Não identifico extremismo
dessa ordem, quando as decisões judiciais são macro e micro influenciáveis por multifatores de questões
técnicas, sociais, ideológicas e, infelizmente, políticas. Daí concluo, também, a possibilidade da abertura
operativa do sistema – se não é evidente, quiçá tal dialética apareça velada, através de rarefeita fundamentação.
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propiciaram encampação de vertente intermédia, para explicar o significado do
Direito através de racionalidade culturalista.
A escola eclética não dispensa as normas tampouco os fatos70.
Ora, notório que o Direito recolhe emaranhado normativo. Essa malha deontológica
é influenciadora da realidade fática sobre a qual incide e, por decorrência lógica,
também por ela é influenciada, quando da elaboração/modificação das próprias
normações. Trata-se de recurso inerente aos desforços de abertura e regeneração
hetero e autopoiética da ordem jurídica no sentido largo, em obviedade circular-
construtivista axio-deôntica: o Direito interfere na realidade social, mas por ela é
moldado (relação de parte para o todo e vice-versa).
Nesses termos culturalistas (também denominados ecléticos),
baseia-se a crescente importância do direito internacional. Cuida-se de realidade
não frutificada no bojo de um Estado-nação, tampouco advém de elaboração
meramente casuística. Justamente, sua meta não é tornar o mundo mais seguro, daí
por que transcende a reles centralização do poder. Pelo contrário, o direito
internacional visiona a contemplar a todos com um planeta melhor, independente da
geografia dos problemas enfrentados. Natural que, ao invés da concentração do
poder – outrora reflexo do positivismo –, deva se falar na funcionalização e na
mitigação do poder dos Estados em benefício de algo maior: a própria subsistência
da espécie humana na terra.
O positivismo jurídico (normativismo) bem como o realismo não
explicam o Direito do Tribunal Penal Internacional. No máximo, cogitam filosofias
idealistas pré-jurídicas e não coercitivas às soluções da nova instituição
transnacional, sobremaneira resultante de nova ordem glocalizada, de uma
neosoberania fulcrada na funcionalização dos direitos do homem e na superposição
do indivíduo enquanto sujeito de direitos no plano metanacional. De outra parte,
representando uma intermediação teórico-pragmática, a corrente culturalista
trabalha com os fatos e com as normas. Para tanto, não despreza ‘marcos’, porque,
além de serem fatos, eles fincam e consolidam as balizas de inéditas instituições,
cuja importância trafega aos sobressaltos no terreno das ciências sociais.
Refletir sobre cultura é pensar em finalidades. E a eleição das
finalidades (norteadoras das ciências humanas) varia na relação espaço-tempo,
sendo conatural à diversidade dos compromissos sociais assumidos pelas políticas
realizadoras das necessidades comunitárias. Considerações subjacentes de
expressões éticas, econômicas, políticas ou ideológicas determinam a contingência
orgânica relativizável de premissas em diuturna tensão. A noção do Direito como
70
O fenômeno do ‘fato jurídico’ comporta essa diagramação – fato e norma.
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instrumento71 do homem (não o contrário) – meio para atingimento dessas
dinâmicas vivenciadas – remete-lhe a filtro de concreção dos propósitos escolhidos
e, a partir daí, também o vetoriza por intermédio das estruturas sócio-culturais
imanentes a quaisquer objetos de conhecimento racional.
Refere Alvaro de Oliveira: “a noção de fim entrelaça-se,
necessariamente, com o valor ou valores a serem idealmente atingidos por meio do
processo. Impõe-se, portanto, a análise dos valores mais importantes para o
processo: por um lado, a realização de justiça material e a paz social, por outro, a
efetividade, a segurança e a organização interna justa do próprio processo. Os dois
primeiros estão mais vinculados aos fins do processo, os três últimos ostentam uma
face instrumental em relação àqueles”72. Posteriormente, o autor infere como
sobreprincípios as noções da efetividade e segurança. E de fato, valor trata do
‘ótimo’ que é melhor ao grupo, sendo indisponível por natureza; princípio relaciona-
se ao que ‘deve ser’, um mandado imediatamente finalístico, porém, relativizável.
Mister a separação entre finalidades e funções73. As primeiras indicam o resultado
da chegada: a justiça e a paz social; os segundos, alguns caminhos a serem
percorridos: a efetividade e a segurança como ‘entre-lugares’ instrumentais, fazendo
a ligação do Direito com os fins. O próprio Alvaro de Oliveira deixa implícita
semelhante conclusão.
A analogia sustenta a utilização do Direito enquanto matéria de
possibilidade da sobrevivência do homem no planeta. Resumo: o Direito é “condição
de possibilidade da convivência”. E para tanto, preconiza-se o estabelecimento de
pautas (garantias) para, no segundo momento, o próprio Direito partir à
programação finalístico-principiológica. Em molde cronológico, uma garantia pode
ser compreendida enquanto ‘marco’ histórico. Ela estabelece limítrofe às demandas
sociais, representando “eficácia de trincheira”. Daí o interesse na fixação de
garantias: tributar limites de intervenção de alters (público e privado) na vida das
pessoas. A seguir, após tal consolidação, procurar-se amplificação desse rol
garantístico através de instrumental bifronte, porque inerente à principiologia –
princípios são normas imediatamente finalísticas, iluminam-se pelos valores
basilares e tendem concretizar programas consectários da racionalidade jurídica.
Agora, um princípio não sobrevive sem exame conjuntivo de fatos que lhe subjazem.
Ele ganha força argumentativa fulcrado nos fatos. Portanto, o culturalismo tributa
metodologia contemplativa de fatos e de nova ordem normativa, atualmente
subsidiada pelas regras, princípios e valores.
71
Saliento cuidado com a expressão ‘instrumento’. Aqui, na visão culturalista, ele não se desgarra do ‘ético’.
Pelo contrário, coordena-se a ele, diversamente do instrumental- normativo de positivismo extremo, no qual a
norma pode quase tudo, inclusive, sustentar regimes ditatoriais – como se fez no nazi-fascismo. 72
OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. O formalismo-valorativo no confronto com o formalismo excessivo.
In: DIDIER JR., Fredie (org.). Leituras complementares de processo civil. Salvador: Jus Podivm, 2008. p. 372. 73
Ferrajóli remonta essa distinção. Direito e razão, passim.
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Essa visão (eclética) proporciona sistematização das garantias
e dos princípios através de um corte funcional, consoante proponho. Evidentemente,
não desço ao complexo arcabouço histórico, mas apenas sistematizo as questões
com força na topologia, seja processual (garantia) ou material (principiologia) das
espécies – critério igualmente passível de convincente dogmatização.
No ensaio, merecedora de incansável lembrança, ictu oculi
localizo a matéria-prima do Tribunal Internacional Penal – o Direito Internacional
Penal, não o Direito Penal Internacional. Ato contínuo, comento os valores que
sufragam a Corte, diuturnamente relacionados tais como ‘princípios do Tribunal
Penal Internacional’. Agora, de princípios não se tratam, porque se apresentam
distantes da efetiva implementação. Finalmente, descrevo alguns princípios e
garantias do Tribunal de Haia, seguindo eleição dogmática do Tratado de Roma,
com breves cotejos em relação à realidade pragmática brasileira.
1. Direito Internacional Penal e crimes internacionais
A distinção entre Direito Internacional Penal74 e Direito Penal
Internacional não é meramente acadêmica. Desencadeia utilização de principiologia
específica para cada matéria. Certamente, existem pontos de contato identificados
em alguns institutos de ambas as disciplinas. Inclusive, os caracteres deontológicos
que as diferem do direito penal sem a ‘nota’ da internacionalidade é de cunho
objetivo75 e subjetivo76: em termos objetivos, a matéria-prima tópica observa
incidência de algum elemento normativo de estraneidade, de conexão77 com o
direito estrangeiro; nos termos subjetivos, depende da cooperação bilateral ou
multilateral dos Estados para persecução delitiva.
74
Existem autores que adotam a terminologia ‘direito penal internacional’ de forma amplíssima, abrangendo o
direito internacional penal e o direito penal internacional no sentido estrito. Respeitando tal concepção, no caso,
utilizo compartimentação bifronte, que se especifica ao longo deste capítulo ‘2’ e serve de cenário para
delimitação da categoria ‘crimes internacionais próprios’. Ver CASTRO, Cássio Benvenutti de. (Neo)Soberania
e Tribunal Penal Internacional. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2011. 75
‘Objetivo’ no sentido de ‘externo’ ao agente, sem depender da intencionalidade do sujeito. 76
Esse caráter objetivo-subjetivo de aproximação do direito penal internacional para com o direito internacional
penal pode ser resumido na dupla acepção: teoria das fontes (questão da estraneidade) e necessidade da
cooperação bi ou multilateral para repressão e prevenção dos crimes. 77
À guisa ‘objetiva’, portanto inerente ao elemento de ‘conexão’ internacionalista, tanto direito penal
internacional quanto o direito internacional penal não ostentam significativas diferenças. A diversidade
escancara-se em termos do requisito ‘subjetivo’, porque o direito penal internacional resolve conflito ‘horizontal’
entre Estados interessados na aplicação soberana de seu próprio ‘jus puniendi’ e, no direito internacional penal,
há relação de ‘verticalidade’ em cotejada a posição ‘suprapartes’ – em relação aos Estados – do Tribunal Penal
Internacional.
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Com efeito, a peculiaridade metanacional recolhe aspectos
objetivo-subjetivo de especialidade, situação que aproxima o direito internacional
penal do direito penal internacional. Entretanto, tal similitude internacionalista não os
deve confundir, como sói acontece quando valiosos doutrinadores definem apenas a
terminologia genérica de ‘direito internacional penal’ (sentido largo), arrepiando as
dessemelhanças compartimentais. De fato, a relação do direito penal ortodoxo com
a ‘internacionalidade’, consoante sintetizam Zaffaroni e Pierangeli78, reproduzem
duas disciplinas diferentes e coordenadas – o Direito Internacional Penal e o Direito
Penal Internacional, inconfundíveis entre si.
Respeitando as concepções unitarizantes, uma vez
identificadas as particularidades científicas do direito internacional penal e do direito
penal internacional, entendo inexpugnável a diferenciação. Essas conceituações, ora
escansionadas, cuidam de mecanismos peremptórios para aconselhável cognição
da magnitude do direito internacional penal (sentido estrito) operacionalizado pelo
Estatuto de Roma. A partir disso (e vice-versa, sendo causa e consequência),
delimita-se o respectivo tratamento aos crimes internacionais próprios (objetos deste
ensaio), ineditamente codificados com caráter permanente e, por decorrência,
avulta-se o desenlace institucional do Tribunal Penal Internacional como pessoa
jurídica internacional, de natureza independente e autônoma.
Deveras, existe distinção entre o grau de internacionalidade
das questões tratadas por um e pelo outro ramo do direito penal metanacional,
fazendo-se necessária a pecha disjuntiva: “O direito internacional penal (ligado ao
direito internacional público) tem como principal atribuição o estudo da tipificação
internacional de delitos por via de tratados e o estabelecimento da jurisdição penal
internacional (cortes internacionais de justiça penal). O direito penal internacional
(ligado ao direito internacional privado) determina o âmbito de validade da lei penal
de cada Estado e a competência de seus tribunais penais”79. As semânticas
apresentam similitudes, inexiste separação ontológica80, no entanto, vale ressalvar:
a diferença é ‘de grau’81 – enquanto o direito penal internacional versa interesses de
dois ou mais países em aplicarem a ordem jurídica nos seus respectivos territórios
(soberania no sentido clássico), o Direito Internacional Penal visualiza horizonte
amplificado, cuja previsão imbrica-se ao direito dos tratados e das convenções, ora
transcendente da soberania ortodoxa.
78
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro, parte geral,
vol. I, 7ª. ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 135. 79
Idem, ibidem. 80
Na verdade, a diversidade é axiológica ou, quando muito, de amplitude deontológica. 81
Precisamente, os conceitos não se distanciam estruturalmente. A disjunção é ‘de grau’, observada a soberania
em sua evolução – do classicismo ortodoxo à (neo)soberania funcionalizada pelos direitos humanos.
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1.1. Direito Penal Internacional
Para situar o local do crime, o Brasil adota a teoria mista ou da
ubiquidade (art. 6º., do Código Penal). Logo, tanto onde aconteceu a conduta, como
o iter criminis e o resultado, são considerados territórios aptos a julgamento do fato.
O problema exsurge quando o resultado ocorre em nosso país e a conduta em outro
Estado, ou vice-versa, ensejando aparente conflituosidade acerca do sistema
jurídico regulador da espécie.
Com efeito, o protraimento analítico do fato-crime em diversos
terrenos nacionais – seja por questões de nacionalidade ou de territorialidade –
desencadeia conflito interespacial de normas, fator de conexão (estraneidade), que
tornaria possivelmente aplicável o direito estrangeiro. Hipóteses a perquirir: qual lei
reguladora da situação concreta, a nacional ou a de outro país aparentemente
interessado em processar a celeuma? Justamente, o direito penal internacional,
como faceta da soberania clássica, recolhe principiologia tendente a solucionar a
indagação. As regulações dos arts. 7º., 8º. e 9º. do Código Penal brasileiro
ponderam interesses do ‘jus puniendi’ versus o princípio da ‘não intervenção
externa’, prevendo normativas domésticas cuja dimensão supranacional
universalizante82, no sentido estrito (direito internacional penal), é estranha – citados
dispositivos cuidam de relações horizontais entre os Estados que teriam interesses
em apurar determinados fatos. Refriso, situação bem diferente da observada no
Direito Internacional Penal estrito, no qual a transnacionalidade não pertine ao direito
interno do nosso país.
Para solucionar a questão da lei aplicada ao caso
aparentemente ‘conectado’ a dois sistemas jurídicos diversos (brasileiro e/ou
forasteiro), prescreveu-se principiologia inerente à soberania bodiniana, cuja
densificação normativa coordena-se pela ‘não intervenção’ e pelas relações
‘horizontais’ consentidas entre os Estados interessados. Em apertada digressão,
para finalidade referencial, relaciono alguns aspectos dessa deontologia codificada:
a) Princípio da territorialidade: em regra, a lei penal brasileira
aplica-se aos fatos cometidos ou cujo resultado aconteça neste país, a despeito da
nacionalidade do agente. Para tanto, o Código Penal (art. 5º.) reconhece a extensão
82
Leia-se que o princípio da ‘justiça universal’ não é sinônimo da ‘jurisdição universal’. Esta é prevista no
Estatuto de Roma e será objeto de análise; aquela é diretiva da extraterritorialidade positivada no Código Penal
brasileiro.
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do território pátrio, especificando-o dogmaticamente, como no caso das
embarcações e aeronaves públicas, onde forem encontradas, e os navios e aviões
particulares localizados, respectivamente, em alto-mar ou no espaço-aéreo
correspondente (parágrafo 1º.). A leitura dessa norma não atine, especificamente, ao
conflito interespacial de leis. De maneira geral, apenas conduz à solução genérica
dos casos.
Leia-se, a territorialidade ‘previne’ o conflito interespacial de
leis, marcando incidência do direito doméstico – soberania interna – às situações
contextualizadas em determinado Estado. Os demais princípios que observarão a
discussão inerente ao direito aplicável em caso de aparente conflito, como típicas
exceções à territorialidade – a regra geral.
b) Princípio da extraterritorialidade: o art. 7º., do Código Penal,
define aplicação da lei brasileira aos crimes cometidos fora do país. Capez salienta:
“a jurisdição é territorial, na medida em que não pode ser exercida no território de
outro Estado, salvo em virtude de regra permissiva, emanada do direito internacional
costumeiro ou convencional. Em respeito ao princípio da soberania, um país não
pode impor regras jurisdicionais a outro. Nada impede, contudo, um Estado de
exercer, em seu próprio território, sua jurisdição, na hipótese de crime cometido no
estrangeiro”83.
A extraterritorialidade estabelece duas categorias de crimes, na
classificação de Zaffaroni e Pierangeli84. Na primeira, denominada
extraterritorialidade incondicionada, aplica-se a lei brasileira, embora tenha o crime
sido praticado no estrangeiro, forte no princípio ‘real ou da defesa’ (art. 7º., I, ‘a’, ‘b’ e
‘c’), ou como decorrência do princípio da ‘justiça universal’ (art. 7º., I, ‘d’ e II, ‘a’).
Observe-se a precisão técnica desses autores: utilizam, estritamente, a terminologia
‘justiça universal’, que não se confunde tampouco é sinônima do conceito de
‘jurisdição universal’.
O princípio da ‘jurisdição universal’ reflete natureza da
competência do Tribunal Penal Internacional supranacional, cuja institucionalização
pautou-se para o julgamento dos crimes internacionais em sentido estrito. Portanto,
trata-se de instrumento vertical em relação aos demais Estados signatários do
Estatuto de Roma. Está para além dos Estados.
Isso posto, a ‘jurisdição universal’ diferencia-se da ‘justiça
universal’, norma atinente à relação horizontal entre determinados Estados que,
convencionados, submetem à competência interna de um ou de outro desses
83
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, parte geral, vol. I, 12ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 91. 84
Op. cit., p. 138.
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países, o julgamento da causa na qual se avistou conflito interespacial de sistemas
jurídicos. Definitivamente, o advento do Tribunal Penal Internacional fora o
responsável pela consagração efetiva da ‘jurisdição universal’. Inclusive, para
finalidade da evitação de confusões terminológicas, proponho a utilização de outra
nomenclatura. Ao invés de ‘justiça universal’, utilizar-se a denominação de princípio
da ‘justiça interestatal’, à medida que tal norma apenas resolve a pergunta: a lei de
qual Estado será aplicada à espécie fática? Obviamente, a horizontalidade da
relação tribunal doméstico versus tribunal de outro país, ambos de mesma
envergadura, difere da natureza permanente e supranacional do TPI.
A situação do genocídio poderia ensejar discussões razoáveis.
Está presente tanto como crime internacional, tipificado no Estatuto de Roma,
quanto fora tipificado ilícito doméstico pela Lei 2.889/56. Aplica-se-lhe o princípio da
‘justiça universal’ (art. 7, I, ‘d’, do CP), inerente ao direito penal internacional, ou o
princípio da ‘jurisdição universal’, previsto no Tratado instituidor do TPI e, portanto,
norma do direito internacional penal?
Embalde, a relevância do crime despertou dupla tutela –
doméstica e supranacional. Cuida-se de um plus de proteção aos direitos humanos.
No entanto, inviável a dupla responsabilização. Para isso, coordenadamente a essa
principiologia, vigora o princípio da complementaridade em termos da deontologia
justicial da corte permanente, consoante descrito abaixo. Isso é, incide o sistema
normativo brasileiro e, somente no caso de não atuação das instituições nacionais, a
matéria relega-se ao Tribunal Penal Internacional, de forma a se manejarem tanto o
princípio da ‘justiça universal’ como o da ‘jurisdição universal’ à espécie. A ratio da
complementaridade sinaliza-se à proteção da humanidade, haurindo-se dessa
norma a dupla proteção, em termos lógico-subsequente.
Finalmente, a extraterritorialidade condicionada subordina a
incidência do sistema jurídico brasileiro a cinco condições: “entrar o agente no
território nacional; ser o fato punível também no país em que foi praticado; estar o
crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; não ter
sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; não ter sido o
agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a
punibilidade, segundo a lei mais favorável”. Reunidos tais requisitos, ainda carece a
verificação do princípio da ‘justiça universal’ (art. 7º., II, ‘a’), antes mencionado, bem
como os princípios da ‘nacionalidade ativa’ (art. 7º., II, ‘b’) e da ‘representação’ (art.
7º., II, ‘c’). Outras condições, ressalto, foram positivadas para a verificação do
princípio da ‘nacionalidade passiva’ (art. 7º., parágrafo 3º.).
Sintetizando, as hipóteses discriminadas sinalizam aspectos
nos quais, pela virtude de algum elemento de conexão (de estraneidade) com o
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direito estrangeiro, ensejar-se dúvida sobre qual ordenamento aplicável ao caso – o
nacional ou o forasteiro, de algum outro país determinado pelas regras de conexão.
A territorialidade é a regra. Os princípios da extraterritorialidade decantados pela
deontologia da defesa (art. 7º., I, do CP), da personalidade ativa (art. 7º., II, ‘b’) e
passiva (art. 7º., par. 3º.), da universalidade (art. 7º., II, ‘a’) e do pavilhão (art. 7º., II,
‘c’), além da repercussão da sentença estrangeira no direito pátrio (art. 9º.), refletem
mecanismos de internalização de situações e, por decorrência, juridicização da
questão aparentemente internacional, pela legislação brasileira.
Ou seja, o direito penal internacional nada mais representa que
um capítulo do direito interno. Em virtude do aparente (ou evidente) conflito entre
mais de uma norma de diferentes nacionalidades – normas de países determinados
pelas regras de conexão –, utiliza-se a qualificação85 do caso concreto para, a
seguir, ponderá-lo pelo direito aplicável, seja de um ou de outro país, em relação de
horizontalidade. Evidente o ‘conflito espacial de leis’ (antinomia geográfica latente), a
lançar guarida ao desdobramento normativo referido.
O Direito Penal Internacional careceria de monografia à parte,
tanto pela importância como pela complexidade. Todavia, o presente estudo
somente firma a noção de internacionalidade ‘imprópria’ ou meramente ocasional
entre Estados determinados. Como refere Guido Soares86, a cogência deste ramo
esbarra na própria conceituação sistêmica: falece-lhe um mecanismo de legitimação
de um órgão central como titular das funções de aplicar a sanção penal, tanto na
codificação dos crimes (definição das condutas e das penas) quanto na efetivação
das reprimendas (execução penal). Na prática, o direito penal internacional é singelo
reflexo da soberania clássica da teoria de Hugo Grotius (aut dedere, aut punire).
Vale dizer, os Estados continuam exercendo o jus puniendi soberano ou,
excepcionalmente, determinam a extradição dos agentes para outro Estado.
Diferentemente, inovando a sistemática punitiva, o Estatuto de
Roma – limite tópico deste ensaio – recolhe panorama diverso: atualmente, firmou-
se o direito internacional penal como disciplina autônoma. Respectivos princípios
transcendem a horizontalidade da relação interestatal acima concebida. Logo,
merece abordagem a disjuntiva.
85
O direito penal internacional está para o direito internacional privado assim como o direito internacional penal
está para o direito internacional público. Logo, o direito penal internacional depende dos pressupostos de
conexão, identificação das normas (aparentemente) conflitantes e qualificação do caso concreto. Trata-se de
capítulo do direito doméstico, interno a cada país. 86
SOARES, Guido Fernando Silva. O terrorismo internacional e a Corte Internacional de Justiça. In: BRANT,
Leonardo Nemer Caldeira (coord.). Terrorismo e direito: os impactos do terrorismo na comunidade internacional
e no Brasil: perspectivas político-jurídicas. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 221 e 223.
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1.2. Direito Internacional Penal
O Direito Internacional Penal (estrito senso) – matéria deste
trabalho – cuida de disciplina do direito internacional (sentido largo), que recolhe o
‘sistema global de proibições e sanções individuais’. Nessa diretriz, abrange a
proteção penal da comunidade internacional e dos bens jurídicos supranacionais,
através da previsão e julgamento dos crimes transnacionais. Diversamente do direito
penal internacional – ramo do direito interno que abrange aspectos de estraneidade
e conexão pelo conflito sinalagmático interespacial de leis entre Estados
horizontalmente equivalentes –, o direito internacional penal atine aspectos penais
do direito internacional, eleição de bens jurídicos universais e cooperação
interestatal em prol de um núcleo institucional superpartes – o Tribunal Internacional
Penal.
Segundo Kai Ambos87, para além da territorialidade e da
extraterritorialidade, fala-se na ‘jurisdição universal’ e na ‘complementaridade’, cujas
naturezas não se conectam pelo elemento de estraneidade a ordens jurídicas
horizontalmente predispostas no conflito interespacial de leis, mas se resolvem
através de um “mandado de optimização jurídico-internacional” – pressuposto
político criminal que supera interesses da soberania clássica. Tal complexo
normativo visa à repressão e prevenção das violações ao direito internacional
propriamente dito, estabelecendo-se por normas de tratados ou convenções
metanacionais88.
Significativa causa (e consequência) distintiva do direito
internacional penal para com o direito penal internacional é, decididamente, a
definição do conceito do crime internacional. Justamente, dessa semântica, advém a
(possível) nebulosidade genealógica entre as temáticas: historicamente, o exemplo
preambular de crime internacional fora a ‘pirataria’. Sucederam-se preocupações
referentes à traficância de escravos, drogas, mulheres e crianças para, finalmente,
com o avanço terrorista e a lavagem de dinheiro, exsurgir perfunctória
sistematização da delituosidade interestatal (naquela ocasião pretérita,
interestatalidade era sinônimo de supranacionalidade89). No entanto, o atual
87
AMBOS, Kai. Los fundamentos del jus puniendi nacional, em particular su aplicación extraterritorial. In
Estudios de derecho penal internacional. Lima: 2007, p. 77. 88
DOTTI, René Ariel. Breves notas sobre a emenda n. 45. In WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al (coord.).
Reforma do Judiciário: primeiros ensaios críticos sobre a EC n. 45/2004. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2005. p. 638. 89
Até pela origem da preocupação dogmática da definição de ‘crimes internacionais’ – pirataria, tráfico,
terrorismo –, apesar do advento do Estatuto de Roma, ainda persiste aparente confusão entre direito internacional
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contexto dogmático positivado pelo Estatuto de Roma exclui esses ilícitos do
caractere de crimes internacionais (sentido estrito). Obviamente, referidos delitos
‘especiais’, pela plurilocalização, assumem importante expressão, que desperta
inúmeras convenções multilaterais de investigação e cooperação internacional.
Todavia, pela natureza não institucionalizada a um órgão central e superpartes das
ofensas perpetradas, atinem ao Direito Penal Internacional. Logo, extrapola a
contemporânea medida do Direito Internacional Penal, ora balizada pelo Tribunal
Penal Internacional.
Repito: os crimes internacionais objeto do Direito Internacional
Penal são delitos de nítida feição político-institucional. Kai Ambos, sob a epígrafe
capitular de ‘macrocriminalidade política como objeto do direito internacional penal’,
sistematiza: “La ‘macrocriminalidad comprende, fundamentalmente,
comportamientos conforme al sistema y adecuados a la situación dentro de una
estructura de organización, aparato de poder u otro contexto de acción colectiva,
macroacontecimientos con relevância para la guerra y el derecho internacional; ella
se diferencia, por tanto, cualitativamente de las conocidas formas ‘normales’ de
criminalidad y también de las conocidas formas especiales (terrorismo, criminalidad
de estupefacientes, criminalidad ecnonómica, etc) debido a las condiciones políticas
de excepción y al rol activo que em ésta desempena el Estado. La
macrocriminalidad es más limitada que la ‘criminalidad de los poderosos’, ya que
ésta, discutida con frecuencia en la criminologia, se refiere por lo general a los
hechos cometidos por los ‘poderosos’ para la defensa de su posición de poder, y ni
estos ‘poderosos’ ni el ‘poder’ (econômico) que defienden son necesariamente
idénticos al Estado o al poder Estatal”90. Coaduno-me à caracterização dessa nota
institucional da macrocriminalidade, cuja repercussão incrementa-se por cuidar de
espécie criminosa ‘fortalecida pela ingerência do Estado’ em seu conteúdo.
Todavia, impende consignar a possibilidade de perpetração de
crimes internacionais por agentes particulares, totalmente estranhos aos quadros ou
funções estatais, posição intermédia pesquisada em Alicia Gil Gil: “Si bien es cierto
que la limitación a los órganos estatales excluiria la posibilidad de calificar como
crímenes contra la humanidad, por ejemplo, los cometidos por una facción rebelde o
grupo revolucionário enfrentado al gobierno, lo que no parece deseable, el
extenderlo a cualquier tipo de grupo u organización incluiría, por ejemplo, los
crímenes cometidos por organizaciones de tipo mafioso o de ideología extremista
cuya represión puede asumir perfectamente el ordenamiento interno. Sólo cuando la
penal e direito penal internacional. O referido tratado considera outros delitos como ‘internacionais’, demitindo-
se da genealogia dessa angústia teórica. 90
AMBOS, Kai. La parte general del derecho penal internacional: bases para uma elaboración dogmática. Trad.
Ezequiel Malarino. Montevideo: Fundación Konrad-Adenauer, 2005, p. 44-45.
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organización o grupo há alcanzado tal poder que neutraliza el poder del Estado o
controla de facto uma parte del território, puede hablarse de la necesidad de la
intervención susidiaria del Derecho Internacional Penal”91. Ou seja, cum granu salis,
admite-se o cometimento dos graves crimes, quando codificados pelo Estatuto de
Roma, por particulares, uma vez observada a contundência plausível de infirmar a
própria governabilidade local.
Kai Ambos defende tal possibilidade, admitindo que a
superafetação ocasionada pelo crime, em certas hipóteses, dá-se ao menos por
omissão do próprio Estado, desencadeando verdadeira problemática de
‘autolegitimação’ ou da aplicação da máxima normativa do ‘ne venire contra factum
proprium’. “El concepto de macrocriminalidad política compreende, ciertamente,
también a los crímenes internacionales de actores no estatales. En cuanto a esto, es
de importância secundaria si estas actividades pueden ser atribuídas al concepto
tradicional de macrocriminalidad. En su favor hablaría el hecho de que también em
estos casos el Estado territorialmente competente sería responsable, al menos por
omisión, de no garantizar a sus ciudadanos la protección de derecho constitucional e
internacional que les correponde”92, obviamente, apenas em se tratando dos graves
delitos internacionais que afetam a própria consistência dos poderes constituídos.
Cassese93 menciona que os crimes internacionais no sentido
estrito (adotado pelo Tratado de Roma) seriam graves violações às regras do direito
internacional94, elencando pressupostos comuns: (a) os ilícitos devem violar o direito
consuetudinário supranacional ou os tratados vigentes; (b) as regras desobedecidas
aludem a valores precípuos da comunidade internacional, sendo inerentes à grande
maioria ou totalidade dos Estados e indivíduos; (c) interesse universal de repressão,
uma vez que quaisquer Estados poderiam investigar e julgar os suspeitos; (d)
finalmente, o agente deve exercer função oficial do Estado e responder
individualmente, sem invocação da teoria do órgão. A quadratura não inclui delitos 91
GIL, Alicia Gil. Los crímenes contra la humanidad y el genocídio en el Estatuto de la Corte Penal
Internacional a la lus de ‘los elementos de los crímenes’. In: AMBOS, Kai; CARVALHO, Salo de. (org.). O
direito penal no Estatuto de Roma: leituras sobre os fundamentos e a aplicabilidade do Tribunal Penal
Internacional. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p. 231. 92
AMBOS, Kai. La parte general del derecho penal internacional: bases para uma elaboración dogmática. Trad.
Ezequiel Malarino. Montevideo: Fundación Konrad-Adenauer, 2005, p. 45. 93
Apud JAPIASSÚ, Carlos Eduardo A. O direito penal internacional e os crimes internacionais. In GRECO,
Luís; LOBATO, Danilo (coord.). Temas de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 77. 94
De fato, a semântica ‘grave violação aos direitos humanos internacionais’ configura conceito jurídico
indeterminado, cujo conteúdo é preenchido pela noção de direito costumeiro. Dalièle Lochak destaca: “La
répression internationale de certains crimes se justifie par deux types de considérations: d’une part, l’idée que ces
crimes, en raison de leur nature, concernent la communauté internationale tout entière; d’autre part, lê constat,
que, à défaut de répression internationale, ces crimes, en dépit de leur gravite, risqueraient de rester impunis. La
liste de ces <crime internationaux> - qui peut varier en fonction des textes – inclut toujours au moins lê
génocide, les crimes contre l’humanité et les crimes de guerre”. LOCHAK, Delièle. Les droits de l’homme.
Paris: Éditions La Découverte, p. 54.
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graves e, potencial ou necessariamente transnacionais, como tráfico, contrabando,
terrorismo, etc. Observe-se peculiaridade do item ‘a’: enquanto os crimes
internacionais fazem parte do direito consuetudinário e afetam não apenas a própria
sanidade institucional do Estado, mas a condição existencial da nação, a traficância,
lavagem, etc, são previstos em tratados internacionais ou resoluções de algumas
organizações, sendo perpetrados contra o Estado95. Aspecto de distinção, explicável
pela teoria das fontes: contrário ao panorama do direito penal internacional, o Direito
Internacional Penal e seu objeto precípuo – os crimes internacionais – consagram-se
diuturnamente pela normatividade costumeira, jurisprudencial e tratadista, em
sistema normativo deveras flexível, que por vezes se remete às regras internas dos
Estados-partes (art. 21 e 38 do Estatuto), denotando o universalismo da jurisdição a
ser consolidada por ‘jus cogens’.
Embalde, a distinção dogmática hoje acertada pelo tratado
romano, para além da consideração acerca dos bens jurídicos ou
plurinacionalidades afetadas pelos crimes, atendeu a paradigmas técnicos96
estruturantes e recorrentes à organização da agenda dialogal das nações (em
especial, influenciada pelo prisma da ONU). A coerência (ou tendência) da
legislação eminentemente supranacional é, justamente, abstrair do legado
pragmático dos costumes, a abstrativização em prol do direito positivado. As práticas
meramente ideológico-políticas adotadas pelo direito penal de transição, dos
Tribunais ‘ad hoc’ de Nuremberg e Ruanda, legaram a necessidade da ‘segurança
jurídica’ pré-codificada aos fatos em exame. Daí, a história anunciou que o Estatuto
de Roma não deveria criminalizar ou sancionar com base em direito costumeiro,
apesar dessa fonte tradicional ter influenciado grandemente a atual codificação de
alguns dos crimes demarcados no tratado do TPI.
Definitivamente, os costumes e a experiência jurisdicional dos
tribunais do direito penal de transição (‘ad hoc’) ilustraram os Estados acordantes
que, comprometidos à máxima da legalidade, elencaram os crimes internacionais na
positivação do Estatuto de Roma. Hoje, são crimes internacionais (sentido estrito): o
crime de guerra, contra a humanidade, de genocídio e agressão. Ilícitos que
delimitam a presente monografia e, no sentido estrito, comportam o significado
contemporâneo dos ‘crimes internacionais no sentido estrito’, objetos de julgamento
95
JANKOV, Fernanda F. Fernandes. Processo de elaboração do direito internacional penal: o papel das fontes no
conceito de crimes internacionais. In Revista do Curdo de Direito do Centro Universitário das Faculdades
Metropolitanas Unidas, SP, v. 20, n. 28, 2006, p. 66. 96
Ao me reportar à ‘técnica’, consigno implícito tanto aspectos administrativos da corte como peculiaridades
orçamentárias.
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da jurisdição universal independente e autônoma do Tribunal Penal Internacional97 –
paradigma institucional do atual direito internacional penal.
De fato, o referido tratado pautou marco de porvir dogmático do
Direito Internacional Penal. Kai Ambos98 assegura a contemporânea ampliação do
âmbito normativo e dos fundamentos materiais não apenas dos crimes e dos
procedimentos, como estabelecimento de setores acessórios, tais qual o direito
sancionatório, a execução das penas e a cooperação internacional. Tudo sob a
autonomia codificada que verticaliza o sistema à Corte Internacional Penal. “La
cooperación vertical se diferencia de la cooperación horizontal entre Estados
soberanos de igual jerarquía, en que en ésta no existe una obligatión de cooperación
general del Derecho internacional, sino que depende de las decisiones soberanas de
los Estados afectados. Por ello, este tipo de cooperación tiene numerosas
condiciones, como por ejemplo, el princípio de reciprocidad, la consideración de
determinados impedimentos, etc., que la tornan poço eficiente. El fin de un sistema
(regional) eficiente de cooperación horizontal justamente tiene que consistir en la
reducción de estos impedimentos”99 – teleologia universalista pautada na agenda
supranacional, deveras estranha aos patamares deontológicos do direito penal
internacional acima classificado.
Para alguns, a diferença entre o direito internacional penal e o
direito penal internacional amealha virtualidade meramente acadêmica. Todavia, a
leitura disjuntiva, quiçá de fagulhas inesperadamente tecnicista, torna-se
peremptória ao desenlace compreensivo do Tribunal Penal Internacional enquanto
verdadeira conquista da humanidade. Os mecanismos outrora horizontais, hoje
dispõem de instituição verticalizada, permanente e suprapartes estatais. Nada mais
natural que, para coerente examínio do ‘novo’, despertem-se consentâneos pontos
de ‘novas’ observações, de molde a nos reportar fidedignidade ao (rectius) Tribunal
Internacional Penal100.
1.2.1. Fontes do Direito Internacional Penal
97
A diferenciação raciocinada, inclusive, fomenta outra reflexão: mais interessante que utilizar a terminologia
Tribunal Penal Internacional, seria lançar a expressão Tribunal Internacional Penal – consentâneo à
supranacionalidade vertical da instituição. 98
La internalización del derecho penal y América Latina. In Estudios de derecho penal internacional. Lima:
2007, p. 64. 99
AMBOS, Kai. La implementación del estatuto de la Corte Penal Internacional en Alemania. In Estudios de
derecho penal internacional. Lima: 2007, p. 339. 100
Por todas considerações do presente capítulo, resta evidente que a tradução ‘Tribunal Penal Internacional’, de
alguma forma, rarefaz a pureza da semântica ‘direito internacional penal’. Seria mais correto o denominar
‘Tribunal Internacional Penal’, porque ora julgador dos crimes internacionais no sentido estrito. Entretanto, para
fins de fixação do ensaio, continuarei utilizando, também, a expressão doutrinariamente divulgada.
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A sistematização das diferenças entre o Direito Penal
Internacional e o Direito Internacional Penal possibilita examinar algumas
consequencias dessa repartição. Com efeito, se a metodologia de cada uma das
disciplinas é autônoma, natural que também o seja a questão atinente às fontes
jurídicas – matéria-prima normativa da tipificação dos crimes internacionais no
sentido estrito.
Nessa porfia, o art. 21 do Tratado de Roma estabelece ordem
de prejudicialidade das normas ponderáveis aos casos a serem julgados pela Corte:
(a) em primeiro lugar, incide o próprio Estatuto, pertinente aos requisitos dos crimes
(tipicidade) internacionais típicos e ao regulamento processual; (b) em seguida,
faculta-se aplicação aos tratados e às normas do direito internacional; (c) na falta
dos dois primeiros, manejam-se os princípios do direito abstraídos do direito interno
dos diferentes sistemas jurídicos existentes, incluindo, se for o caso, o direito
doméstico dos Estados que exerceriam normalmente a sua jurisdição relativamente
ao crime, sempre que esses princípios não sejam incompatíveis com o Tratado.
Além dessa pirâmide das fontes jurídicas, a alínea 2 do art. 21
explicita valência de normatividade (rectius, coercibilidade) à jurisprudência da Corte
Internacional de Haia, ao dispor que “o Tribunal poderá aplicar princípios e normas
de direito tal como já tenham sido por sido por si interpretados em decisões
anteriores”. Peculiaridade que demonstra influencia da common law na pragmática
estatutária.
2. Axiologia do Tribunal Internacional Penal
O Tribunal Penal Internacional funda-se em tríade valorativa,
causa e decorrência da universalização101 dos direitos humanos na totalidade. Uma
concepção cultural do Direito subentende finalidades que, analogamente, sintetizam
valores, a saber: a (a) dignidade da pessoa humana, a (b) jurisdição universal e o (c)
valor da complementaridade.
Esse tripé semântico positiva-se nos tratados e nas normas
constitucionais de diversos Estados. Formalmente, até chegariam a assumir
caracteres de ‘princípios’, cuja força normativa é inegável. Todavia, classifico essas
101
CUNHA, Guilherme da. As dimensões política e humanitária da criação do Tribunal Penal Internacional. in
Revista do Centro de Estudos Jurídicos, Brasília, CJF, vol. 11, ano 2000, p. 14.
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espécies enquanto ‘valores’, pelo fato delas sinalizarem indicações finalístico-ideais,
ombreadoras da otimização da vida no planeta e, quiçá, sufragadoras das
necessidades práticas da própria subsistência da espécie humana. Ou seja, para
além do deôntico, o axiológico visualiza metas diuturnamente almejadas,
propulsionando o horizonte de ‘para onde’ o Direito Internacional Penal está
evoluindo – e não, apenas, ‘onde’ o Direito Internacional Penal se encontra.
Abaixo, refiro o tripé102 valorativo do Estatuto de Roma.
Constituem reflexos da escola culturalista do Direito (=fato normado).
2.1. Dignidade da pessoa humana
O Direito Constitucional é ramo do Direito Público inerente à
basilar organização e funcionamento do Estado. Avultou-se, normativamente, da
preocupação – oriunda da latente soberania popular – de limitação sistêmica103 do
poder. Para tanto, o movimento constitucionalista consagrou-se por mecanismos
precípuos de controlabilidade da autoridade no sentido material: a separação dos
poderes (com a respectiva coordenatividade das tarefas estatais); e a consagração
dos direitos humanos, matéria-prima topologicamente estipulada como ponto de
partida e verdadeira meta axio-deontológica limitadora dos pretensos abusos
burocráticos eventualmente observados. Dentre essas realidades, deduz-se
pressuposição da condição humana. Ora, se o poder – funcionalmente – existe para
a boa convivência social dos indivíduos, quaisquer tarefas formais de organização
(separação dos poderes104) impulsionam-se da ontologia racional humanista, isto é,
102
A sistematização imbrica-se à concepção do “Direito igual a fatos normados”. Ora, a tríade valorativa
evidencia fato (dignidade humana pela condição da espécie) mais argumentos institucionais (jurisdição universal
e complementariedade), que representam normas programáticas a serem efetivadas. 103
Situo a compleição ‘sistêmica’ no sentido operacional do encerramento da teoria luhmanniana. Com efeito, os
sistemas sócio-normativos são analisados de maneira bifronte: por ‘dentro’, numa coordenatividade homogênea
a horizontal (equivalente à separação dos poderes); e por ‘fora’, de molde heterogêneo, como fator de
diferenciação e recíproca limitação do exterior-interior (poder em relação aos direitos humanos). Trata-se de
antítese filosófica: definindo o que ele é, acaba por caracterizar o que ele não é.Verificar LUHMANN, Niklas.
Introdução à teoria dos sistemas. Trad. Ana Cristina Arantes Nasser. Petrópolis: Vozes, 2009. Em especial, p. 80
e seguintes. 104
Embora inicialmente depreendido como princípio fundamental para organização do Estado moderno, a
separação dos poderes não é um valor em si mesmo. Ana Paula de Barcellos refere que a formulação das funções
estatais “derivou da percepção histórica de que o poder concentrado, sem controle, tende sempre a ser exercido
de forma abusiva, arbitrária ou caprichosa, em detrimento daqueles que lhe estão subordinados, de modo que, em
se tratando do poder político, era imperioso dividir seu exercício para que as liberdades e os direitos dos
indivíduos fossem preservados”. A precisão da autora converge ao entendimento da natureza material do Estado
efetivamente ‘democrático’ – ao invés da retórica de governo do povo e para o povo, ‘democracia’ significa
consagração dos direitos humanos como vértices do sistema de sustentabilidade da relação Estado-cidadão. Ver
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a própria sobrevivência/coexistência digna. Em outras palavras, os direitos humanos
– matizes valorativos (ou princípio reitor105 normativo) do neoconstitucionalismo –, a
despeito da inicial imprecisão conceitual, verticalizou a própria gênese do Estado
Constitucional atual. Cláudio Ari Mello106 remata, ao inferir que os direitos humanos
consubstanciam o eixo normativo em torno do qual devem se ajustar e movimentar
as relações públicas e privadas da vida comunitária107.
Com efeito, a origem dos direitos humanos arraiga-se à noção
da dignidade da pessoa humana, que se trata de valor fundante desenvolvido a
partir da tradição cristã108 ocidental e da filosofia kantiana. Definitivamente, a
racionalidade antropocentrista de Kant, caracterizadora dos seres humanos como
‘finalidades em si mesmos’, diagnosticou a dúplice atribuição da dignidade: vértice
de partida valorativo e valência promocional teleológica de todas as ações estatais.
Agora, para uma existência digna, faz-se mister assegurar os mínimos direitos
humanos à liberdade, providência e participação política dos indivíduos, à medida
que, segundo Marcelo Novelino109, torna-se inexpugnável a relação de
interdependência entre a dignidade e seus consectários – os direitos humanos. Ou
seja, o conteúdo material da dignidade humana depende precipuamente do elenco
dos direitos humanos, em relação de complementaridade recíproca.
Advém aparente paradoxo (político) evolucionista: no contexto
inicial do constitucionalismo, os direitos humanos foram antitéticos – por limitadores
– à concepção de poder estatal; atuaram no sentido ‘negativo’ para refrear os
abusos do absolutismo. Atualmente, na senda pós-positiva, atribuem-se-lhes
BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da
pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 215. 105
Desde a noção kantiana, o conceito de sistema organiza-se ao entorno de um seu princípio unificador.
COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Efetividade do processo penal e golpe de cena: um problema às
reformas processuais. In: WUNDERLICH, Alexandre (org.). Escritos de direito e processo penal em
homenagem ao professor Paulo Cláudio Tovo. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002. p. 140. 106
MELLO, Cláudio Ari. Democracia constitucional e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2004, p. 125. 107
A concepção de que os direitos humanos precedem a limitação do poder (inclusive, antecedendo a própria
separação dos poderes – reles mecanismo funcional de restrição sistêmica) é também interpretada pela então
Desembargadora Federal – hoje magistrada do TPI –, Sylvia Helena Steiner, ao referir que a origem da
preocupação com os direitos fundamentais avultam sob duas premissas basilares: debates sobre a tolerância
religiosa, pela laicização do Estado e aceitação do protestantismo no século XVII e pretensão burguesa de
participar das decisões sufragada na premissa da liberdade e da igualdade. Ver STEINER, Sylvia Helena F.
Tribunal Penal Internacional – a proteção dos direitos humanos no século XXI. In: Revista do Advogado,
Publicação da Associação dos Advogados de São Paulo, ano XXII, n. 67, agosto de 2002, p. 71. 108
Em diversas passagens, a Bíblia é expressa ao referir a igualdade entre os homens, corolário da derivação do
ser humano em relação à divindade. Vide o livro ‘Gênesis, capítulo 5, versículo 1’: “No dia em que Deus criou o
homem, à semelhança de Deus o fez”. 109
CAMARGO, Marcelo Novelino. O conteúdo jurídico da dignidade da pessoa humana. In: CAMARGO,
Marcelo Novelino (org.). Leituras complementares de constitucional: direitos fundamentais. Salvador: Jus
Podivm, 2007, p. 116.
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intrínseca legitimação democrática: afinal, a dignidade da pessoa humana – e por
decorrência consequencial, os direitos humanos – elevaram-se a valor supremo dos
contemporâneos ordenamentos jurídicos deste século. E tal fenômeno representa
não apenas a reconstrução da racionalidade da dignidade humana posterior à
segunda guerra mundial, como a ênfase de novo aspecto da soberania dos Estados,
assevera Flávia Piovesan110.
O nazismo demonstrou que a condição humana não é
propriedade de nenhum Estado que se intitula de direito. Em contrapartida, a
proteção dos direitos humanos não deve se reduzir a domínio reservado de
quaisquer países e das respectivas soberanias, porque revela interesse da
comunidade internacional para preservação da própria espécie racional! Logo, os
Estados devem participar dessa nova ordem social internacional demonstrando o
que têm de comum – o interesse na promoção da dignidade humana: facilitando
essa proteção no plano global-universal, demonstra ato da (nova) soberania por
excelência. Do contrário – ao Estado que se demite do dever-poder de proteger a
dignidade do homem –, carece mínima legitimação sócio-política de
sustentatibilidade jurídica: contra eles, pesa a nota da ausência de sustentatibilidade
jurídica.
A despeito do local onde se encontrar, toda pessoa humana
merece a tutela do Direito que, no caso dos graves crimes contra a humanidade, é
realizada (complementarmente) pelo Tribunal Internacional Penal. Aspecto valorativo
reflexo da concepção culturalista do Direito (=fato normado).
2.2. Jurisdição universal111
Mitigando axiomas clássicos da soberania depreendida no
direito continental, o Tribunal Penal Internacional recolhe pretensão globalizante.
Assim, cada Estado-parte deve julgar o seu próprio nacional pelos crimes graves
contra a humanidade, sendo impassível de alegação que os “regramentos do Estado
estrangeiro onde o delito foi eventualmente cometido não têm correspondência no
país de onde o criminoso é natural ou, ainda, absolvê-lo por instrução probatória
110
PIOVESAN, Flávia. Princípio da complementaridade e soberania. In Revista CEJ, n. 11, ago/dez 2000,
acessado na Internet em abril/2011: www2.cjf.jus.br 111
Recapitulando reflexão anterior, esse princípio não é sinônimo da norma da ‘justiça universal’, reflexo da
extraterritorialidade e previsto no direito interno (Código Penal brasileiro, art. 7º., II, ‘a’). A ‘justiça universal’ é
paradigma do direito penal internacional, não do direito internacional penal, objeto das presentes linhas.
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deficiente. Ou julga, ou entrega ao TPI para fazê-lo”112. Trata-se de apanágio da
natureza ‘permanente’ da corte, com foro e jurisdição para processar e julgar
qualquer indivíduo, de qualquer Estado-parte113, independentemente de onde
estiver, pelos crimes de lesa-humanidade, de guerra e de genocídio. Em um primeiro
momento, os Estados devem julgar – por questão de territorialidade – os crimes
internacionais praticados nos seus limites geográficos: aplicação da máxima
complementaridade, examinada abaixo; em caso de inércia, a competência ultima-
se no TPI. Como não admite reservas às suas diretrizes (art. 120), estipula-se duplo
dever de investigação e julgamento: aos Estados-partes e à Corte Internacional.
Todavia, pairam críticas às condições prévias ao exercício da
jurisdição do Tribunal Penal Internacional (art. 12). Segundo Kai Ambos114, a
sistemática de adstringir a competência da Corte apenas aos Estados-partes ou
àqueles que aceitarem, ‘ad hoc’, a jurisdição permanente, exclui significativa gama
de conflitos contra a humanidade. De fato, a propalada jurisdição universal é,
tecnicamente, condicionada à territorialidade do fato-crime ou à nacionalidade do
agente – em ambas as situações, alternativamente, deve-se identificar elemento de
‘conexão’: o local do evento ou a participação de pessoa nacional de algum dos
Estados-parte. Ressalvada a hipótese da intervenção do Conselho de Segurança da
ONU (capítulo VII da Carta das Nações), forte no art. 13, ‘b’, do Estatuto – neste
caso sim, a jurisdição é cosmopolita ou universal. Justamente, por remeter a
jurisdição universal ao consenso do Estado nacional respectivo, que persiste
confusão acerca da diferenciação entre tal instituto e o da ‘justiça universal’
(princípio do direito penal internacional).
Apesar da gênese claudicante e permeada por hermenêutica
arraigada em institutos clássicos, a grande tendência é que a jurisdição universal
assuma ineditismo almejado pelo Estatuto, futuramente se desvinculando da noção
extrema da soberania, uma vez vetorizando nova tendência do Direito Internacional
Penal no sentido estrito. Reflexo do mundo glocalizado em contínua expansão bem
como da efetivação do primeiro valor – a dignidade da pessoa humana.
112
Alexandre Concesi, op. cit., p. 12. 113
Inviável que um Estado-parte alegue inexistência do crime internacional em seu próprio ordenamento
jurídico. Com efeito, o Estatuto de Roma enumerou lista tipificada dos delitos sujeitos à jurisdição do Tribunal
Penal Internacional. Mais que isso, em termos precisos, elaborou verdadeiro ‘código internacional criminal’.
Logo, a utilização do Tratado – como lei universal, supranacional, de natureza protetiva dos direitos humanos – é
admitida a todas cortes do planeta, sejam locais, regionais ou supranacionais. 114
AMBOS, Kai. A nova Corte Penal Internacional. O difícil equilíbrio entre uma persecução penal eficiente e a
‘realpolitik’. In Boletim IBCCrim, n. 70, set/1998, p. 16-17.
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2.3. Complementaridade115
Ao invés do princípio da ‘primazia’116 – adotado nas cortes da
ex-Iuguslávia e de Ruanda –, o Estatuto de Roma, expressamente, exclui possível
julgamento em duplicidade (‘ne bis in idem’ previsto no art. 20 e art. 1º.). Ou seja,
caso já tenha sido julgada em outro tribunal, em regra, no país de origem, afasta-se
a competência do TPI. Com Sylvia Steiner117, reconhece-se a prevalência das
jurisdições internas no cotejo à internacional, à medida que o Tribunal não antecede
ou dispõe de privilégio hierárquico se comparado às instituições nacionais. Na
verdade, a corte deve ser compreendida como um ‘plus’. Para Flávia Piovesan118,
uma garantia programática a mais à dignidade humana, no sentido de que os
Estados devem se aprimorar para o julgamento de seus nacionais; apenas ao
vacilarem, a questão será submetida à jurisdição de reserva.
O julgamento pelo TPI é exasperador, subsidiário,
complementar, situação que lhe confere legitimação política por privilegiar os
padrões da justiça local. Apenas nos casos de tentativa de fraude – especificados
pela subtração dos acusados à responsabilização ou ausência de imparcialidade e
vícios processuais garantistas (art. 30, ‘3’) –, a jurisdição universal decide a celeuma
independentemente da solução examinada pelas instituições nacionais.
3. Deontologia do Tribunal Internacional Penal
A perspectiva do neoconstitucionalismo revolucionou a
metodologia jurídica, seja propondo inéditos padrões filosóficos como, também,
115
Apesar de festejado, o princípio da complementariedade merece atenção dos operadores e teóricos.
Observe-se que, em 05/11/2006, após um julgamento conturbado, o tribunal iraquiano condenou Saddam
Hussein à pena de morte por enforcamento por crimes contra a humanidade. No dia 26/12/2006, um tribunal
de apelação do Iraque confirmou a sentença contra o ditador. À míngua das considerações político-ideológicas,
chama atenção a ‘urgência’ que permeou o julgamento por uma corte especial daquele país invadido. Diversas
vezes, inclusive, o acusado referia-se ao inquiridor refutando a legitimidade daquela instrução, alegando que
tudo era produto da influência de Bush. Ver http://pt.wikipedia.org/wiki/Saddam_Hussein, acesso em
10/04/2011.
116 ‘Primazia’ representou um poder avocatório (porque potestativo).
117 Op. cit., p. 75.
118 PIOVESAN, Flávia. Princípio da complementaridade e soberania. In Revista CEJ, n. 11, ago/dez 2000,
acessado na Internet, em abril/2011: www2.cjf.jus.br
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estipulando novas tendências normativas. No plano teórico-normativo, descortina-se
a influência dos valores, dos princípios e das regras, todos os quais a representarem
aspectos de uma profusão lingüístico-operativa, de maneira se conferir
maleabilidade às construções hermenêuticas.
Nos moldes teórico-normativos, que ora interessam, pode-se
alinhavar duas perspectivas: (a) uma primeira, de cunho histórico-cultural119 e a
outra, (b) de natureza funcional. Elas não deixam de coordenarem diretrizes, pela
indelével coarctação do histórico ao jurídico. Entretanto, em vista do apertado
dessas linhas, resumo os comentários ao caráter funcional da sistematização, à
medida que a intercorrência histórica fomentaria contundente retorno à etiologia
multifatorial da deontologia do TPI – questão de complexidade extrema.
A classificação funcional entre as garantias e os princípios
correspondente a contornos pragmáticos. Vale dizer, atine às funções que tais
espécies desepenha(ra)m no certame jurídico: (a) no sentido clássico120, ‘garantias’
representam institutos processuais e, por isso, com função de salvaguarda (vedação
do retrocesso); em contrapartida, (b) ‘princípios’ denotam normativas percebidas no
Direito Internacional Penal material, cuja função concebe previsibilidade às
ponderações jurisdicioniais. Cediço que inexiste pureza entre um caractere do
processo e estoutro, do direito material; logo, tal classificação assegura tendenciosa,
apesar de significativa compreensão dos relevantes aspectos do Tribunal
Internacional Penal, em se considerada a totalidade do Estatuto de Roma no cotejo
aos ditames da teoria geral do direito e do processo penal.
As ‘garantias’ possuem enfoque de cariz técnico,
mantenedoras de prerrogativas processuais, porquanto seduz eficácia de ‘trincheira’
(vedação do retrocesso). Avançando na reconstrução neopositiva da ordem jurídica,
os ‘princípios’ raciocinam abertura121 cognitiva do sistema, para além da mera
técnica regrada. Deveras, hoje se dispõem das normas em constante diálogo, todos
sufragados culturalmente pelos precípuos valores que vetorizam as tendências
ético-sociais em profusão.
Além do funcional, a decantação abaixo proposta não deixa de
assumir foros dogmáticos. Com efeito, malgrado a impossível pureza classificatória –
porque garantia e princípios miscigenam-se no desenlace evolutivo –, o Tratado de
1998 recolhe capítulos emblemáticos: no Capítulo III, arts. 22 a 33, tem-se os 119
Em termos históricos, a pesquisa talvez aprofundasse monografia específica. 120
Ao comentar o sentido “clássico”, evidencia-se o contato entre o histórico e o funcional. 121
A ortodoxia dos “sistemas” supõe cognitividade aberta e operatividade fechada. No Direito Internacional,
pelas peculiaridades culturalistas (transestatais), observo uma fenomenologia de abertura bifronte – tanto na
cognição quanto na operação. Basta cotejar o valor da complementariedade: ele nada mais representa que uma
subsidiária abertura.
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“Princípios Gerais de Direito Penal”, com significativa parcela dos ‘princípios’ do
Tribunal; no Capítulo VI, encontram-se os “Direitos do Acusado”, nos quais
reportam-se inúmeras ‘garantias’. Claramente, o aspecto dogmático soma-se à
sistematização pelas funções.
3.1. Garantias (processuais)
O Capítulo VI, do Estatuto de Roma, elenca diversas
prerrogativas processuais do acusado. Cediço que um ‘estatuto’ significa
regulamento com disposições materiais e processuais (vide o Estatuto da Criança e
do Adolescente). Logo, a sistematização e os comentários propostos assumem
caráter exemplificativo, na tentativa de introduzir os valiosos acenos normativos no
Tribunal Internacional Penal, uma vez inexistir depuração absoluta na divisão
proposta (garantia e princípio) tampouco possibilidade da concentração positiva das
garantias no bojo de unívoco capítulo.
3.1.1. Institucional
No cenário internacional – palco de macroinfluenciação dos
interesses globalizados –, a proporcionalidade também assume dúplice vertente: o
imperativo de tutela (proteção) não apenas reprime abusos como exige a
institucionalização de normas e mecanismos para efetivação das máximas da
humanidade. Logo, superada a discussão do ‘se’ deveria haver punição aos
criminosos pelo direito internacional penal. Atualmente, desencadeia-se a questão
do ‘como’ fazê-lo: através da instituição do tribunal permanente, independente,
complementar e universal – no caso, o Tribunal Penal Internacional122.
Definitivamente, o Estatuto de Roma, além de tipificar delitos
contra a humanidade, estabelece medidas instrumentais de punição e garantias ao
acusado. Cumpre a preordenação bifronte da proporcionalidade (a vedação do
122
Além das questões jurídico-políticas, Guilherme da Cunha ressalva o aspecto humanitário do TPI: o desafio
da instituição é garantir a segurança dos indivíduos; não há segurança aos Estados caso inexista segurança aos
cidadãos, à medida que a perpetuação da insegurança desencadeia movimentos de refugiados, êxodo e diversas
vicissitudes a sobrecarregarem a incerteza no cenário internacional. CUNHA, Guilherme da. As dimensões
política e humanitária da criação do Tribunal Penal Internacional. in Revista do Centro de Estudos Jurídicos,
Brasília, CJF, vol. 11, ano 2000, p. 15.
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excesso e a vedação da proteção deficiente). Trata-se da justicialização123 dos
direitos da humanidade. Esse panorama (nos termos da tradição continental)
contrapõe-se à clássica percepção da soberania e respectivos desdobramentos
instrumentais: a territorialidade e a proteção dos nacionais. Segundo Alexandre
Concesi124, tais noções advindas da idade média fincam “limites à justiça”,
pontualmente por elidirem da persecução, pela qualificação subjetiva, diversos
atentados à humanidade. Afinal, testemunha-se época de ductibilização do direito:
soma-se à constitucionalização do direito internacional a internacionalização do
direito constitucional – havendo interação em prol do referencial ético, a dignidade
humana. Fenômeno analisado por Flávia Piovesan: “nenhum direito é
verdadeiramente assegurado se não for resguardado por uma corte competente. As
cortes internacionais simbolizam e fortalecem a ideia de que o sistema internacional
dos direitos humanos é um sistema de direitos legais, que compreende direitos e
obrigações juridicamente vinculantes. A ideia de Estado de direito, e desse Estado
de direito global, requer a existência de cortes imparciais, internacionais, capazes de
proferir decisões obrigatórias e vinculantes. Vive-se hoje, sobretudo, o processo de
justicialização (jurisdicionalização) do direito internacional dos direitos humanos, que
contribuirá para reduzir o grau de politização desse sistema”125.
Com Salo de Carvalho126, desde uma perspectiva
heteropoiética de funcionalização da (neo)soberania em privilégio dos direitos
humanos, o Estatuto de Roma aprimorou dogmática idônea da tutela da
humanidade: (a) elaborou estruturas normativas a possibilitarem sanções aos
praticantes de graves crimes contra a dignidade da pessoa humana; bem como (b)
edificou sistema de jurisdição internacional para efetivação desses valores. “Não
obstante as previsões normativas, imprescindível a capacitação de órgãos
123
À medida que a justicialização (ou jurisdicionalilzação) dos crimes graves internacionais contra os direitos
humanos protege, imediatamente, as prerrogativas da primeira dimensão, inviável se argumentar suposta
‘judicialização da política’ pelo advento do Tribunal Penal Internacional. Cediço que, mormente no plano
supranacional, político e jurídico apresentam pontos de contato. Outrossim, a tutela – no caso – garante a
primeira geração dos direitos humanos, especialmente atinente à vida, à liberdade e à qualidade mínima
existencial. Logo, tratam-se de direitos cuja exigibilidade perante as ordens instituídas é imediata: fator a
distanciá-la do fenômeno da ‘judicialização da política’ – nesta, a exigibilidade deveria ser progressiva, como
acontecem nos direitos sócio-econômicos, de segunda dimensão. Ver MELO, Ronivalda de Andrade;
BEZERRA, Ana Elisabete Tavares (org.). Anais do seminário internacional ‘os desafios contemporâneos para
os direitos humanos’, 23 a 25 de fevereiro de 2005, Recife-PE. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 2005, p. 157. 124
O autor reconstrói, como origens da soberania, o contratualismo feudal: em troca da proteção do suserano,
titular unívoco do poder de punição dos próprios súditos, os vassalos creditavam obediência ao senhor. Ver
CONCESI, Alexandre. A jurisdição universal. In Boletim científico, Escola Superior do Ministério Público da
União, ano II, n. 8, jul/set 2003, Brasília, p. 11. 125
PIOVESAN, Flávia. Princípio da complementariedade e soberania. In Revista CEJ, n. 11, ago/dez 2000,
acessado na Internet em abril/2011: www2.cjf.jus.br 126
CARVALHO, Salo de. Os fundamentos do Tribunal Penal Internacional e sua incorporação no direito
interno. In: AMBOS, Kai; CARVALHO, Salo de. (org.). O direito penal no Estatuto de Roma: leituras sobre os
fundamentos e a aplicabilidade do Tribunal Penal Internacional. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p. 83-4.
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jurisdicionais, visto que as normas, por elas mesmas, não garantem absolutamente
nada, se não forem amparadas por sistemas legítimos de processualização,
julgamento e punição das lesões aos direitos”127. Fatores expressamente
contemplados no Estatuto de Roma, segundo trecho do preâmbulo do Estatuto de
Roma: “Afirmando que os crimes de maior gravidade, que afetam a comunidade
internacional no seu conjunto, não devem ficar impunes e que a sua repressão deve
ser efetivamente assegurada através da adoção de medidas em nível nacional e do
reforço da cooperação internacional, decididos a pôr fim à impunidade dos autores
desses crimes e a contribuir assim para a prevenção de tais crimes”, os Estados-
partes convencionaram a instituição do Tribunal Penal Internacional.
Os direitos fundamentais, através do cunho objetivo, merecem
proteção efetiva. A proporcionalidade bifronte expressa-se, institucionalmente, pela
tutela justicial/jurisdicional concretizadora dessas prerrogativas substanciais. A Corte
Permanente de Haia salienta uma faceta deontológica desse fenômeno128.
3.1.2. Competência
A delimitação da jurisdição do Tribunal Internacional Penal
estabelece quatro critérios de competências, cuja leitura coordenada se positiva no
Estatuto: em razão da (a) matéria, pela ocasião (b) temporal do fato-crime129, do (c)
lugar e na virtude da (d) pessoa.
a) Ratione materiae: os delitos internacionais atentam contra
valores relevantes da humanidade, ressalvados peremptórios pela comunidade
internacional, a respeito dos quais se formou convicção130 no sentido do dever da
tutela (juridicizada e justicializada). Os artigos 6º. a 8º. do Estatuto de Roma
apontam descrição básica dos delitos de genocídio, contra a humanidade e de
guerra. Entretanto, a tipificação pormenorizada desses eventos, com respectivos
127
Idem, p. 84. 128
Trata-se de fenomenologia de neoinstitucionalismo, na esteira de Neil MacCormick. 129
Há respeitosa doutrina que, a esta classificação, acrescenta a competência ratione loci (art. 12 e 13) e a
ratione personae (art. 1º., 25 e 26). Particularmente, penso que a primeira apenas ratifica o caráter
‘convencional’ da jurisdição pretensamente universal, ora estipulada no Estatuto de Roma; esta segunda, ao
invés de competência, cuida realmente de questões de imputação individual da responsabilidade. Ver JANKOV,
Fernanda F. Fernandes. Processo de elaboração do direito internacional penal: o papel das fontes no conceito de
crimes internacionais. In Revista do Curdo de Direito do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas
Unidas, SP, v. 20, n. 28, 2006, p. 54. 130
A pretensa ‘convicção’ é objeto de tremendas vicissitudes históricas. As mais significativas são demarcadas
por dois episódios recentes: o holocausto da segunda guerra mundial e os ataques terroristas de 11/09/2001.
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elementos e circunstâncias, fora objeto de um anexo ao Tratado, denominado
‘elementos dos crimes’.
Cedendo às pressões dos Estados Unidos da América, o
Tratado de Roma previu a cláusula opt-in em relação aos crimes de guerra (art.
124). Isto é, a adesão de algum Estado ao Estatuto não o vincula, automaticamente,
à jurisdição do TPI, significando exceção ao art. 12. Clarividente o interesse político
ianque pela vinculação dessa espécie delitiva à dupla aceitação. Atinente aos
demais crimes submetidos à jurisdição internacional, inexiste a ressalva, vigorando o
consenso imediato (opt-out). Observada a limitação temática, examinarei alguns
aspectos da normatividade central.
b) Ratione temporis: o Tratado regula (art. 11): “O Tribunal só
terá competência relativamente aos crimes cometidos após a entrada em vigor do
presente Estatuto”. Se algum Estado ratificar o acordo internacional posteriormente,
somente para os fatos ocorridos após essa formalização é que a jurisdição
(universal) da Corte poderá efetuar julgamento. Atitude que representa completa
inovação do panorama ‘excepcional’ institucionalizado pelos organismos ‘ad hoc’ da
segunda guerra e da década de 1990131.
Com efeito, o Estatuto congrega deontologia do direito e do
processo penal. É reunião híbrida de normas. Os processualistas trazem bem
presentes o princípio da ‘imediatidade’ para os atos processuais; de outro lado, no
direito material, tem-se verdadeira regra da ‘irretroatividade’. A simbiose diretiva não
causa dúvidas: prevalece a proteção garantística do direito penal com espeque na
irretroatividade dos institutos e da competência inauguradas pelo TPI.
c) Ratione loci: impende uma distinção – competência em
razão do lugar é modalidade diferente da abrangência da jurisdição do Tribunal
Internacional Penal. Com efeito, em virtude da própria axiologia da ‘universalidade’,
mesmo situado em Haia, a Corte possui jurisdição possível de incidência, em tese,
sobre toda superfície do planeta, desde que atendidos determinados pressupostos,
dentre os quais, a competência ratione loci (medida da abrangência pretensamente
universal daquela jurisdição).
Daí a importância dos arts. 12 e 13 do Estatuto, por identificar
que o Tribunal julga os crimes (uma vez obedecidas as demais competências)
praticados nos Estados-partes signatários, ou desde que o agente seja pessoa
nacional desses Estados. Excepcionalmente, por interferência do Conselho de
Segurança da ONU (art. 13, ‘b’), mesmo aos delitos praticados nos Estados
131
Os Tribunais ad hoc não ostentavam a nota da permanência. Portanto, julgavam os fatos ocorridos no período
delimitado de tempo para o qual foram instituídos.
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estranhos ao Tratado de Roma, incide a possibilidade do julgamento. Portanto,
melhor que falar em competência ratione loci, seria a tratar como reles aspecto da
jurisdição (pretensamente) universal132.
À vista dessas disposições, critica-se o esquecimento do
princípio da ‘proteção’, comumente utilizado em Direito Penal Internacional. Ora, e
quando as vítimas forem nacionais dos Estados-partes, mas o crime praticado fora
do território delas e por agente não abrangido no Estatuto? Laconismo draconiano
da referida Carta.
d) Ratione personae: os arts. 1º, 25 e 26 do Estatuto mais
explicitam regras de imputação que, propriamente, de competência. Com efeito, a
Corte tem poder para julgar pessoas físicas maiores de dezoito anos, que sejam
responsáveis pelos graves delitos recolhedores das demais delimitações
competenciais acima elencadas.
3.1.3.. Cooperação executiva e entrega de nacionais
Nossa Constituição Federal veda a extradição de brasileiros
(art. 5º., LI), instituto de Direito Penal Internacional (e não Internacional Penal),
oportunidade na qual, atendidos certos pressupostos, o tribunal competente de outro
Estado julgará algum nacional tupiquinim. As situações previstas no Estatuto de
Roma (art. 89) não se tratam de espécie de extradição, mas peculiaridade autônoma
– e inédita – em que o acusado será entregue ao Tribunal Penal Internacional.
Entrega de nacional para o TPI não se confunde com a
extradição133. É reflexo do cumprimento de tratado multilateral134 de Roma.
Outrossim, em virtude da natureza supranacional da Corte julgadora, inexiste
violação de soberania brasileira. Pelo contrário, a execução das decisões
dependente da cooperação dos Estados-partes (arts. 86 e seguintes), que devem
convergir para tutela efetiva dos direitos da humanidade. Inclusive, no caso de
132
A doutrina insiste em meter, no bojo do Direito Internacional Penal, caracteres do Direito Penal Internacional
– competência ratione loci é instituo doméstico. Jurisdição universal é outra coisa muito mais abrangente,
internacionalista. Todavia, comenta-se para fins de salientar. 133
O próprio Estatuto prevê a distinção, art. 102. 134
Na extradição, a problemática é horizontal, envolvendo dois Estados soberanos. Surge quando, praticado o
delito no território de um país, o responsável refugia-se em outro local independente. Os acordos bilaterais
solucionam essas questões, diversamente do conteúdo multifacetado do Estatuto de Roma. Ver VIDAL, Hélvio
Simões. Direitos humanos e o direito internacional penal. In Revista dos Tribunais, n. 877, nov/2008, p. 470 e
482.
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condenação do acusado, ele poderia cumprir a pena no Estado que o entregou,
demonstrando a extraordinariedade do instituto, cuja sistemática é compatível ao
regulamento pátrio135.
3.1.4. Imunidades ‘propter officium’136
O art. 27 do Estatuto afasta a imunidade eventualmente
conferida aos ocupantes de altos cargos oficiais. De fato, o Tribunal Penal
Internacional tutela os direitos humanos atingidos pelas graves violações,
geralmente objeto de atitudes de chefes de Estados, membros de governos ou
parlamentares. A imunidade seria instituto inerente à jurisdição interna, não
suscitável perante a Corte supranacional, cujo enfoque é reprimir os mais nefastos
ataques à humanidade.
3.1.5. Coisa julgada e revisão
Sob a epígrafe do ‘ne bis in idem’, veda-se o rejulgamento de
acusado anteriormente sentenciado, seja a pretérita decisão emanada de Tribunal
competente ordinário, ou da própria Corte de Haia (art. 20, 1 e 2).
Excepcionalmente, o Estatuto prevê meio impugnativo rescisório de suas
respectivas sentenças, observados alguns requisitos específicos, à semelhança do
instituto da ‘revisão criminal’ do direito brasileiro (art. 84).
3.1.6. Instrumentalidade das formas e direitos do acusado
O procedimento configura a espinha dorsal do formalismo
processual. Em geral, a estrutura do processo penal observa regras
significativamente rígidas. Nem por isso se incompatibiliza o manejo da norma da
instrumentalidade das formas, com o aproveitamento dos atos processuais em
procedimento heterotípico, uma vez atendidas as garantias à defesa nos moldes
135
Márcio Medeiros Furtado, op. cit., p. 492. 136
Frequentemente, utiliza-se a terminologia privilégios de ‘ordem pessoal’. Com a devida vênia, essas
prerrogativas não atinem às individualidades, mas aos órgãos/funções relevantes que ocupam.
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nucleares/essenciais. Mormente sob influxos da common law, o julgamento da Corte
de Haia será conduzido da maneira equitativa e célere, sem o engessamento de
pretenso formalismo-excessivo (não valorativo), segundo art. 64, 2, do Estatuto. Vale
dizer, a despeito do procedimento regrado, viabiliza-se a instrumentalidade das
formas.
Sopesada tal flexibilização, o Tratado (art. 67) prevê garantias
processuais ao acusado que, em última análise, diagramam pormenorizadamente o
contraditório e a ampla defesa. Assim, o réu possui direito de informação
(desdobrado na prerrogativa de audiência, de presença e de ser ouvido) e de
contraposição à acusação (refletido na possibilidade de não produzir prova contra si
mesmo, o nemo tenetur se detegere, bem como dispor de meios e tempo
adequados à defesa). Nada mais que o binômio ‘ciência + participação’, corolários
do contraditório/ampla defesa. Também se explicitou a vedação da utilização de
provas ilícitas (art. 69, 7).
Dois pontos merecem atenção. O primeiro refere a garantia de
o réu ser julgado sem atrasos indevidos, atualmente internalizada no programa137
constitucional brasileiro. A discussão remanesce ao qualificativo ‘indevido’ do atraso,
ou melhor, qual o tempo ‘razoável’ do processo.
Finalmente, impende saliência ao ineditismo do postulado da
‘cooperação das partes entre si, e para com o juízo’, dignos de um certame
processual transparente e regulado pela boa-fé. Diz o art. 67, 2, do Estatuto: “Além
de qualquer outra revelação de informação prevista no presente Estatuto, o
Procurador comunicará à defesa, logo que possível, as provas que tenha em seu
poder ou sob o seu controle e que, no seu entender, revelem ou tendam a revelar a
inocência do acusado, ou a atenuar a sua culpa, ou que possam afetar a
credibilidade das provas de acusação. Em caso de dúvida relativamente à aplicação
do presente número, cabe ao Tribunal decidir”. Essa regra evidencia rotação
espistêmico-cultural, elencando novo paradigma do processo acusatório criminal.
Em terrae brasilis, infelizmente, o processo permanece como ‘guerra ou jogo’,
sendo-nos bastante difícil imaginar uma efetiva cooperação dessa grandeza – em
todos os sentidos imaginados.
3.1.7. ‘Standard’ probatório para condenação
137
Até por se tratar de norma programática, pode-se inferir que a não dilação do julgamento seja um princípio,
ao invés de garantia. Todavia, pela utilização do critério funcional (processual-material) para a sistematização,
mantive-o enquanto garantia.
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A argumentatividade é primeiro-lugar comum do Estado de
Direito. O Direito, entendido (ou não) enquanto ciência argumentativa por
excelência, não permite posições estanques nos respectivos sobressaltos
evolutivos, mas tangencia a concorrência de racionalidades dialeticamente
defensáveis. Melhor explicando: no Direito, eliminam-se verdades absolutas,
posições e definições unívocas, para a sustentação de pontos de vista juridicamente
defensáveis, verdades aproximativas, a depender da fundamentação sufragadora
das razões expendidas – ora em determinado sentido, noutro momento, em outra
linha de visada. Com efeito, torna-se aprioristicamente quase impossível que uma
demanda acene, de maneira unânime, para certa direção. À medida que a matéria-
prima julgada constitui ‘alegações de fatos’ demonstráveis (ou persuadíveis?!),
dispõe-se de peculiaridade do paradigma linguístico-jurídico: aquilo que, no sistema
normativo, em termos deontológico-valorativo, pode ser enunciado como aceitável,
porque demonstrável/persuadível, torna-se imutável pela carga de
argumentatividade que lhe pacifique a orientação.
Recentemente falecido, o jusfilósofo Neil MacCormick dedica
obra-prima acerca da argumentação no Estado de Direito, defendendo a
versatilidade das valorações jurídicas supostamente corretas, a guisa da
argumentatividade: “Um processo de avaliação da força relativa de argumentos
concorrentes está fadado a ser uma questão, mais ou menos, de opinião, a exigir
julgamento. Se os argumentos frequentemente parecem ter força parecida, como
podemos dizer com certeza qual é mais forte? A resposta é que quase nunca
podemos dizer isso com certeza. No direito, a convicção subjetiva é possível, por
vezes, quando para mim ou para você um certo conjunto de argumentos aponta
firmemente para uma certa conclusão, e todos os contra-argumentos que nos foram
apresentados ou sobre os quais pudemos pensar parecem fatalmente mais fracos
por comparação. Essa convicção pode consistir em uma certeza compartilhada ou
intersubjetiva, quando uma comunidade de especialistas comunga dessa visão ao
ponto até mesmo e tratá-la como praticamente axiomática. Mas essa convicção
compartilhada, assim como a atitude compartilhada de estar certo acerca de algo,
não é aquilo que se quer dizer com a ideia de certeza em seu outro sentido: que é
certamente verdadeiro, não importando se alguém acredita ou não nessa
verdade”138.
Então resulta que, no paradigma jurídico – porque
argumentativo-pragmático –, a questão sobrelevante é a seguinte: sob qual medida
138
MACCORMICK, Neil. O Estado de Direito e o caráter argumentativo do direito. in: Retórica e o Estado de
Direito. Trad. Conrado Hubner Mendes. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008, p. 21.
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de argumentação, determinada solução é reputada correta? Vale dizer, qual o
‘standard’ utilizável pelo juiz para eleição do raciocínio concludente da demanda?
As maiores discussões do capítulo das ‘provas’ no seio
processual, justamente, tendem a mitigar possível arbitrariedade do julgador,
outorgando-se-lhe critérios de racionalidade ao acertamento fático. Deveras,
atualmente se propala a fixação de “pautas”, de “standards”, ou “critérios” de
mitigação da discricionariedade (arbitrariedade), à luz da “teoria dos modelos de
constatação” ilustrada na common law. Ora, o princípio do “livre convencimento
motivado” não é absolutamente livre!
Pelo contrário. Ao invés da liberdade dos julgamentos, cada
vez mais defensável a tributação de balizas ao eventual decisionismo. Apesar do
fenômeno da atual rarefação da densidade normativa de diversas espécies
positivadas (através da pecha principiológica, dos conceitos jurídicos indeterminados
ou das cláusulas gerais), o sistema deve dialogar com as demais valências de
influência social, pena da submissão dos demais atores normativos à indelével
arbitrariedade egoística. Danilo Knijnik ressalta: “o critério não é mais que um meio
para conhecer a verdade. Com isso, quer-se sustentar que existem modelos de
constatação, comumente denominados standards, que funcionam como critérios,
pelos quais o juízo de fato é formalizado. Esse critérios devem ser postos em
discussão para que as opções valorativas do juiz e das partes sejam conhecidas,
debatidas em contraditório e, em sendo o caso, corrigidas”139.
Ressalto: o quadrante atual do Estado de Direito evoluiu para a
minoração das arbitrariedades. O espaço de consenso140 deve ser preservado,
sempre. Daí, mesmo nos atos administrativos discricionários ou no exame da prova
judicial, no bojo dos processos, mister a pautação de critérios, standards, modelos
de constatação, que mitiguem a subjetividade em prol da universalização dos
fundamentos. Peculiaridade digna da preocupação do direito dos precedentes, que
agora vem positivado no art. 66, 3, do Estatuto de Roma.
Malgrado a complexidade das matérias, lembro que se divulga
trilogia de standards fundamentais para análise da prova: (a) em geral, no processo
civil, por haver discussão sobre direitos em relação de horizontalidade (disponíveis
por excelência, observadas algumas exceções, vide processos nos quais figurem a
Fazenda Pública, menores141, entre outros), exige-se o critério da ‘preponderância
139
KNIJNIK, Danilo. A prova nos juízos cível, penal e tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 18. 140
A universalização de conceitos pela uniformização de cognições ‘razoáveis’ faz parte do próprio conteúdo da
democracia (sentido material). 141
As questões do direito de família, do direito administrativo, entre outras, tem flexibilizado o manejo do
processo civil. A causa-consequencia é evidente: o caráter instrumental-valorativo do processo influencia o
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de provas’; (b) no outro extremo da (in)flexão argumentativa, em que vigoram
direitos indisponíveis por excelência, imprescinde-se o modelo da ‘prova acima de
qualquer dúvida razoável’ para a condenação – também pudera, do outro lado, para
a absolvição do réu, existe o primado da presunção de inocência; no médio termo,
entre as balizas do processo civil e do processo penal, (c) para uma solução
administrativa dos procedimentos burocráticos, profliga-se a utilização do standard
da ‘prova clara e convincente’. Tais mecanismos nada mais representam que o ônus
argumentativo para o julgador afirmar a procedência das demandas, por recolherem
a força, a profundidade de verossimilitude, a (in)disponibilidade da
argumentatividade necessária à confirmação da ‘alegação sobre determinado fato’.
Daí resulta natural: no processo civil, para o juiz elidir um
argumento paritário de um sujeito, em benefício de outro – o vencedor –, então no
mesmo nível de igualdade (material) daquele primeiro, o grau de fundamentação é o
menor; em seara administrativa, a situação agrava-se, o julgador precisa
fundamentar pouco mais que no civil; no processo penal, parece notório que a
profundidade cognitiva se avulta – para o julgador refutar a presunção de inocência
ilustrativa das garantias do réu, o grau argumentativo deve ser muito maior. Ou seja,
a diferença entre os standards é ‘de grau’. Rubrica que vinha implícita na
jurisprudência da common law, ora imortalizada no art. 66, 3, do Estatuto – a prova
‘acima de qualquer dúvida razoável’ para se angariar uma condenação em
julgamento do Tribunal Internacional Penal.
3.2. Princípios
O Estatuto de Roma prevê diversos princípios de direito penal
(grande parte, no Capítulo III), assegurando pretensa142 previsibilidade aos
julgamentos. Por vezes, tal elenco principiológico positivado remete à pragmática do
common law para haurir algumas definições e, em outras situações, recorre aos
fundamentos do direito continental, peculiaridade eclética que desperta evidente
interesse hermenêutico – deveras, estuda-se Tratado multilateral, disso resultando a
observância confluente das diferentes culturas globais.
direito, mas também por ele é influenciado. Natural que algumas matérias, pela importância subjacente,
valoradas inclusive a nível constitucional, mereçam qualificação no palco processual – para além dos meros
interesses quiçá (in)disponíveis. 142
Adiciono o ‘pretensamente’ porque, algumas vezes, os princípios carecem da precisa/absoluta densidade
dogmática, reclamando complementação interpretativa – rectius, integrativa.
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Brevemente, impende referência exemplificativa de alguns
princípios basilares.
3.2.1. Legalidade, taxatividade e irretroatividade
Estão previstas nos arts. 22, 23 e 24 do Estatuto. A definição
dos crimes, penas e a respectiva natureza prospectiva dos ilícitos é matéria adstrita
à lei143, mesmo que a regra seja extravagante ao Tratado de Roma. Sensível
discussão doutrinária adstringe-se à fixação máxima das penas privativas de
liberdade em trinta anos, (art. 77) sem, contudo, delimitar ‘espaços do jogo’ à
discrição jurisdicional, refere Sylvia Steiner144. Essa perspectiva não viola o
imperativo da legalidade e taxatividade, somente contemplando solução de direito
consuetudinário. Influenciação que outrora fora utilizada no direito interno brasileiro,
como na Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92). Ao privilegiar mecanismo
do common law, em termos sancionatórios, inexiste violação principiológica digna de
nota, face à natureza supranacional do TPI.
Suposto laconismo do preceito sancionatório, explica Fernanda
Jankov, deve-se ao fato de que “por muito tempo, tanto os tratados, como as normas
consuetudinárias, limitavam-se a proibir certas condutas sem estabelecer sanção
para o desrespeito ao preceito das normas jurídicas”145. Ou seja, trata-se de
fenômeno oriundo do caráter rudimentar do Direito Internacional Penal enquanto
disciplina autônoma.
3.2.2. Imputabilidade ao maior de dezoito anos
O art. 26 estipula-se a inimputabilidade do menor de dezoito
anos. Presumivelmente, seria ininteligível que o menor de dezoito anos pudesse
143
Naturalmente, tratando-se da dignidade da pessoa humana e respectivas fontes supranacionais de direito, a
terminologia ‘lei’ não se restringe à matéria examinada pelo parlamento soberano clássico de algum Estado.
Aléxis Couto de Brito ressalta um novo conceito de ‘lei’, diante das considerações globalizantes de um planeta
diminuto e de fronteiras cada vez menores. O bem jurídico da humanidade demanda interpretação alargada e
cosmopolita-universal do aspecto ‘legal’. Ver BRITO, Aléxis Augusto Couto de. Direito penal internacional:
direitos humanos, tratados internacionais e o princípio da legalidade. In Revista Síntese de Direito Penal e
Processual Penal, n. 27, ago/set 2004, p. 55. 144
Op. cit., p. 77. 145
Op. cit., p. 57.
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cometer delitos de tamanha envergadura. Em geral, não dispõe do aparato técnico
tampouco de gestão para empreitadas violadoras da humanidade.
3.2.3. Responsabilidade146 individual da pessoa física na medida da culpabilidade
O Tratado imputa, na medida da culpabilidade inerente a cada
conduta, a responsabilidade aos autores e partícipes dos crimes (art. 25).
Entretanto, por refletir sistema da common law, inexiste diferenciação dogmática
acerca dos níveis de punibilidade do agente (por exemplo, como verificado na
‘participação de menor importância no Código Penal brasileiro). Daí resulta na
possibilidade assinalada por Jean-Christophe Merle: “um líder político que ordena
massacres de larga escala sem nunca ter ele próprio matado alguém pode ser
sentenciado a uma punição mais severa que o soldado que executou suas ordens e
que é declarado pela corte como não tendo agido sob coação irresistível”147.
Ademais, Japiassú148 constata adoção da estrutura bipartida da
teoria do crime: faz-se referência à responsabilidade individual e às respectivas
causas de exclusão (conhecidas como defences). Pela simpatia do direito
internacional penal ao sistema do common law, impende diagnosticar uma não
separação aritmética das noções de injusto (tipicidade e contrariedade ao direito) e
da culpabilidade, como utilizada no direito pátrio. Quando muito, pode-se sinalizar
aproximação à clássica ‘teoria dos elementos negativos do tipo’, falando-se em
responsabilização quando não há exclusão da responsabilidade – definição pela
negativa, dogmatizada no Estatuto. Salienta-se que a construção bipartida apenas
separa a responsabilidade individual da respectiva exclusão (defences). Trata-se de
exercício cognitivo de ‘imputação’, não da ‘responsabilidade’ enquanto categoria
substitutiva e conglobadora da culpabilidade, segundo a teoria funcionalista
roxiniana.
3.2.4. Requisito subjetivo (‘mens rea’)
146
A terminologia ‘responsabilidade’ não fora utilizada de acordo com a concepção roxiniana, em oposição ao
juízo retrospectivo da culpabilidade. O estatuto açambarca a punibilidade em sentido amplo: tanto em termos da
imputação (incidência da norma ao caso) como nos foros da delimitação da conduta de cada agente
(culpabilidade). 147
Op. cit., p. 175. Caractere que explicita a tendência ‘preventiva’ das sanções estatutárias, de acordo com o
preâmbulo. 148
JAPIASSÚ, Carlos Eduardo A. O direito penal internacional e os crimes internacionais. In GRECO, Luís;
LOBATO, Danilo (coord.). Temas de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 88.
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Os graves delitos contra a humanidade dependem da vontade,
mais a previsão do agente – dolo (art. 30). Inviável a condenação pela
intencionalidade extratípica (crime culposo).
Entretanto, admite-se mitigação do pressuposto subjetivo
doloso. Em ocasiões nas quais a omissão intencional (ou capciosa) do agente
poderia ter evitado resultado danoso, constada pelo cenário probatório objetivo,
torna-se passível a responsabilização. Contexto a depender da gravidade e da
evidência provável, aferível no exame da relação conduta-evento. Kai Ambos indica:
“La ignorancia consciente, en el sentido de cegueira deliberada (wilful blindness) no
excluye la responsabilidad penal. En último término, no estamos tratando con
cualquier negligencia (toute negligence) sino con una modalidad de la negligencia
que desde el punto de vista normativo, puede ser puesta en pie de igualdad con el
intento doloso, esto es, una negligencia tan grave que este a nível del dolo. Sin
embargo, no se debe pasar por alto que ‘intento’ y ‘negligencia’ son estados
mentales muy diferentes que sólo en casos excepcionales de un dolo ‘débil’ (weak
intent, dolus eventualis) y negligencia ‘grave’ (strong, conscious negligence) se
aproximan”149. Panorama doutrinário a denotar pequena margem concretista ao
Tribunal Penal Internacional, ao reconstruir o aspecto subjetivo doloso às condutas
julgadas.
Insta comparar que, no âmbito doméstico brasileiro, não raro,
nos delitos da macrocriminalidade, a jurisprudência examina o ‘dolo’ dos agentes
quando observadas circunstâncias objetivas de verossimilitude. Por exemplo, ao
condenar um alto executivo por crime contra o sistema financeiro ou contra a ordem
tributária, nada mais se faz que o exercício pragmático da teoria do wilful blindness
(cegueira deliberada). O sujeito poderia ‘evitar’ que sua empresa ou seus
subordinados delinqüissem, bastava assumir posição diligente e proativa na
administração dos negócios – nada mais esperado de um diretor do alto escalão.
3.2.5. Estrutura bipartida dos crimes
A leitura do art. 31 do Estatuto desencadeia duas reflexões:
uma, sobre (a) a estrutura analítica do crime; outra, quanto ao (b) caráter pragmático
149
AMBOS, Kai. La responsabilidade del superior en el derecho penal internacional. In: AMBOS, Kai;
CARVALHO, Salo de. (org.). O direito penal no Estatuto de Roma: leituras sobre os fundamentos e a
aplicabilidade do Tribunal Penal Internacional. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p. 210.
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do raciocínio do Tribunal Penal Internacional. Ambas as ideias a se imbricarem
circularmente.
Com efeito, a doutrina majoritária continental sistematiza a
teoria do crime no sentido de fato típico, contrário do direito e com agente culpável.
Trata-se de solução tripartida, porque se fundamenta no tripé de uma teoria geral do
delito – cada qual compartimento, apresentando questões e opções dogmáticas
próprias. Em contrapartida, o Tratado de Roma não cuida dessa trilogia estrutural,
mas de extremos bipartidos – a responsabilidade150 criminal versus a respectiva
exclusão dessa responsabilidade (art. 31), semelhante à velha teoria dos ‘elementos
negativos do tipo’, cunhada por Mezger.
Essa construção bipartida (responsável, ou não) é causa-
consequencia do caráter pragmático do raciocínio do TPI (item ‘b’). Ora, o panorama
do crime internacional propriamente dito não reflete uma ‘teoria geral do delito’,
porque influenciado pela construção jurisprudencial inerente à common law. Assim,
inviável a dogmatização de estruturas analíticas tripartites do delito, à medida que o
‘crime internacional’ é (ou será) produto de construção casuísta. Deveras, o direito
dos precedentes (e o TPI) trabalha com realidades operativas, eminentemente
sufragadas em provas.
E como as provas bifurcam-se em vetores de procedência
versus improcedência – pragmatismo processual –, a estrutura bipartida do crime
internacional condiciona o raciocínio ponderativo do Tribunal Internacional Penal. Da
mesma sorte, é por ele condicionado, numa ciranda de causa-consequencia.
3.2.5.1. Problemática do erro
No direito brasileiro, a construção dogmática distinguiu o erro
de tipo do erro de proibição, resguardando almejada segurança ao exame
ponderativo da espécie (situação melhor articulada pela Teoria Limitada da
Culpabilidade). De outro lado, abrindo ensanchas a perigoso (eventual)
decisionismo, o Estatuto volta-se à etiologia dos institutos, classificando-os como
erro de fato ou erro de direito (art. 32). Tal opção, na literalidade do tratado, chega a
150
Aqui, a responsabilidade açambarca o conjunto da incidência das normas. Como se houvesse dupla valência
da demanda – guilty or not guilty –, bem afeto ao sistema da common law. Ou seja, essa temática da
responsabilidade é inconfundível à ‘responsabilidade’ enquanto categoria do crime, doutrinada por Roxin. Ver
CASTRO, Cássio Benvenutti de. Temas de ciências penais: na perspectiva neoconstitucional. Porto Alegre:
Verbo Jurídico, 2011.
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conferir idêntica solução a ambas as categorias: tanto o erro de fato quanto o de
direito podem excluir, excepcionalmente, o dolo. Na prática, isso representa o efetivo
reconhecimento da defesa pelo ‘erro’ de maneira muito restritiva, consoante Kai
Ambos151. Particularmente, compreendo que há transmutação da técnica em prol da
pragmática.
3.2.6. Imprescritibilidade da persecução
A Constituição brasileira prevê dois casos expressos de
imprescritibilidade à persecução criminal: em delitos de racismo (art. 5º., XLII) e na
ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado democrático (art.
5º, XLIV). Apesar de não previstas outras hipóteses de atemporalidade, considera-se
possível eventual abertura de novas exceções, na perspectiva da proteção dos
direitos humanos e com a razoabilidade premente a graves ilícitos contra a
humanidade, situação que não retira a compatibilidade jurídica do Estatuto de Roma
(art. 29). Todavia, deve-se ressalvar essa possibilidade persecutória à guisa da
competência ratione temporis da corte: o termo a quo (ou, leia-se, a nota da
imprescritibilidade) dos fatos a serem investigados inicia-se com a instituição
(ratificação) do Tribunal Penal Internacional nos sistemas jurídicos dos Estados-
partes.
Essa conclusão, excepcionalmente, pode divergir do princípio
da ‘dupla punibilidade’, iterativamente lembrado pelo Supremo Tribunal Federal ao
decidir pedidos de extradição. Observe-se trecho do julgado: “O postulado da dupla
tipicidade – por constituir requisito essencial ao atendimento do pedido de extradição
- impõe que o ilícito penal atribuído ao extraditando seja juridicamente qualificado
como crime tanto no Brasil quanto no Estado requerente. Delito imputado ao súdito
estrangeiro, que encontra, na espécie em exame, correspondência típica na
legislação penal brasileira. - Não se concederá a extradição, quando se achar
extinta, em decorrência de qualquer causa legal, a punibilidade do extraditando,
notadamente se se verificar a consumação da prescrição penal, seja nos termos da
lei brasileira, seja segundo o ordenamento positivo do Estado requerente. A
satisfação da exigência concernente à dupla punibilidade constitui requisito
essencial ao deferimento do pedido extradicional. Inocorrência, na espécie, de
151
La parte general del derecho penal internacional: bases para uma elaboración dogmática. Trad. Ezequiel
Malarino. Montevideo: Fundación Konrad-Adenauer, 2005, p. 86.
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qualquer causa extintiva da punibilidade”152. Ou seja, caso a pretensão punitiva
prescreva no Brasil, impedindo persecução penal doméstica, por decorrência,
inviabilizada estaria a extradição. Raciocínio análogo a fundamentar o não
processamento e julgamento de indivíduos perante o Tribunal Penal Internacional,
quando prescrita a pretensão no sistema interno. Peculiaridade a ensejar candentes
discussões.
Aproveitando a temática, ressalvo que o capítulo da
temporalidade da persecução reserva debates conturbados no âmbito penal da
tutela dos direitos humanos. Com efeito, a Lei brasileira, número 6.683/79, concedeu
anistia a quem tenha cometido crimes políticos ‘ou conexos’, no período relacionado
à ditadura militar, situação a sufragar argumentos contrapostos em termos da
validação da norma. Contra a benesse legal, advoga-se a necessidade da reversão
da impunidade que se ‘autolegitimou’ na etapa pré-Constituição democrática.
Luciano Feldens afirma que a análise da constitucionalidade da lei de anistia não
deveria ser aferida à luz da lei fundamental de então, nitidamente autoritária, mas
em face dos “Tratados e Convenções de Direitos Humanos aos quais o Brasil
manifestou sua adesão. Nesse tom, a análise desses fatos envolve sua
consideração como graves violações de direitos humanos e mesmo como crimes
contra a humanidade, de sorte a atrair a normatividade das regras do Direito
Internacional dos Direitos Humanos, inclusive no que respeita à imprescritibilidade
desses delitos”153.
De outro lado, alega-se que a anistia estabelece benefícios
bifrontes: não apenas aos titulares do regime – os militares – como àqueles
insurgentes civis que, eventualmente, tenham praticado delitos ‘políticos ou conexos’
positivados.
A complexidade dos argumentos careceria de estudo
específico, transcendente dessas breves linhas. Todavia, insta referir julgado do
Supremo Tribunal Federal, veiculado no informativo 584: “Destacou-se que, no
Estado Democrático de Direito, o Poder Judiciário não estaria autorizado a alterar, a
dar outra redação, diversa da nele contemplada, a texto normativo. Não incumbiria
ao Supremo modificar, portanto, textos normativos concessivos de anistias, mas tão-
somente apurar a sua compatibilidade com a Constituição. A revisão de lei de
anistia, se mudanças do tempo e da sociedade a impuserem, haveria, ou não, de ser
feita pelo Poder Legislativo. Atentou-se, ainda, para o que disposto no art. 4º da EC
152
Extradição 1201/Estados Unidos da América, Relator Min. Celso de Mello, julgamento em 17/02/2011,
Órgão Julgador Tribunal Pleno. 153
FELDENS, Luciano. Direitos fundamentais e direito penal: garantismo, deveres de proteção, princípio da
proporcionalidade, jurisprudência constitucional penal, jurisprudência dos tribunais de direitos humanos. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2008, 125.
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26/85 (“Art. 4º É concedida anistia a todos os servidores públicos civis da
administração direta e indireta e militares, punidos por atos de exceção,
institucionais ou complementares. § 1º É concedida, igualmente, anistia aos autores
de crimes políticos ou conexos, e aos dirigentes e representantes de organizações
sindicais e estudantis, bem como aos servidores civis ou empregados que hajam
sido demitidos ou dispensados por motivação exclusivamente política, com base em
outros diplomas legais. § 2º A anistia abrange os que foram punidos ou processados
pelos atos imputáveis previstos no ‘caput’ deste artigo, praticados no período
compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.”). Explicou-se
que a EC 26/85, cujo art. 1º conferiu aos membros da Câmara dos Deputados e ao
Senado Federal o poder de se reunirem unicameralmente em Assembleia Nacional
Constituinte, livre e soberana, em 1º.2.87, na sede do Congresso Nacional, seria
dotada de caráter constitutivo, instalando um novo sistema normativo. Destarte, a
anistia da Lei 6.683/79 teria sido reafirmada, no texto da EC 26/85, pelo Poder
Constituinte da Constituição de 1988. A emenda constitucional produzida pelo Poder
Constituinte originário teria constitucionalizado a anistia. Assim, afirmada a
integração da anistia de 1979 na nova ordem constitucional, ter-se-ia que sua
adequação à Constituição de 1988 resultaria inquestionável. Assentou-se que se
imporia o desembaraço dos mecanismos que ainda dificultam o conhecimento do
quanto ocorrera durante o período em questão, o que deverá ocorrer quando do
julgamento da citada ADI 4077/DF. Por fim, realçou-se ser necessário dizer, vigorosa
e reiteradamente, que a decisão de improcedência não excluiria o repúdio a todas as
modalidades de tortura, de ontem e de hoje, civis e militares, policiais ou
delinquentes. Vencidos os Ministros Ricardo Lewandowski e Ayres Britto, que
julgavam parcialmente procedente o pedido. O primeiro dava interpretação conforme
ao § 1º do art. 1º da Lei 6.683/79, de modo a que se entendesse que os agentes do
Estado não estariam automaticamente abrangidos pela anistia contemplada no
referido dispositivo legal, devendo o juiz ou tribunal, antes de admitir o
desencadeamento da persecução penal contra estes, realizar uma abordagem caso
a caso, mediante a adoção dos critérios da preponderância e da atrocidade dos
meios, nos moldes da jurisprudência do Supremo, para o fim de caracterizar o
eventual cometimento de crimes comuns com a consequente exclusão da prática de
delitos políticos ou ilícitos considerados conexos. O segundo excluía da anistia os
crimes previstos no art. 5º, XLIII, da CF”. (ADPF 153/DF, rel. Min. Eros Grau,
28.4.2010).
A competência do Tribunal Penal Internacional não
açambarcaria os fatos de nosso regime militar. Deveras, o Estatuto de Roma
irretroage. Mesmo assim, brevemente citei o debate acerca da lei de anistia em face
da questão da prescritibilidade da persecução perfazer matéria acesa e que,
eventualmente, poderá suscitar novos questionamentos perante o Supremo Tribunal
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Federal. Ainda, quiçá a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) poderá se
manifestar sobre o assunto, não para julgar pessoas individuais, como o TPI, mas
para examinar práticas do próprio Estado brasileiro.
3.2.7. Tutela efetiva das vítimas
O Estatuto de Roma positiva instrumentos para tutelar as
pessoas das vítimas – efetivamente funcionalizando a dupla acepção da
proporcionalidade. No art. 43, 6, previu a criação da “Unidade de Apoio às Vítimas e
Testemunhas”154 que, em conjunto com o Gabinete do Procurador, adotará medidas
especializadas de proteção e assistência às pessoas afetadas pelos graves crimes
da competência do Tribunal, sejam elas ofendidas ou testemunhas. Trata-se da
abertura cognitivo-operativa do direito e processo penal Internacional para com a
vitimologia.
Pormenorizando essa protetividade, o art. 68 explicita diversos
meios para salvaguarda das vítimas e testemunhas. Dentre as quais, a possibilidade
da limitação da publicidade dos atos do processo e uma evidente preocupação
quanto às conseqüências psicológicas dos delitos no caso de crimes sexuais.
Chama atenção a abertura dialogal do processo às vítimas afetadas, adotando-se
emblema habermasiano de jurisdicionalização – diz a terceira alínea da indigitada
regra: “Se os interesses pessoais das vítimas foram afetados, o Tribunal permitir-
lhes-á que expressem as suas opiniões e preocupações em fase processual que
entenda apropriada e por forma a não prejudicar os direitos do acusado nem a ser
incompatível com estes ou com a realização de um julgamento equitativo e
imparcial”.
Tal ‘abertura’ dialogal avulta-se com a preocupação normativa
atinente à reparação dos ofendidos (art. 75). Ou seja, imiscui-se ao procedimento,
outrora de feição ortodoxo-penal, caráter também indenizatório. Fatoração que, de
alguma maneira (mesmo longínqua), influenciou a crescente participação do
ofendido com premência da tutela efetiva sobre a forma do procedimento, com
154
Tal ‘Unidade de Apoio’ não deixa de ser uma ‘garantia’ institucional, porque explicita órgão com atribuições
específicas. Entretanto, pela gama deontológica que finaliza, num primeiro momento, não é equívoca sua
aposição na parte dos ‘princípios’ – sempre lembrando que inexiste divisão absoluta, mormente ao se
considerara que um ‘estatuto’, por acepção, reúne normas processuais e materiais.
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aparentes ricochetes dogmáticos no direito brasileiro, vide a recente alteração do
Código de Processo Penal brasileiro (art. 387, IV, do CPP155) e a Lei 11.340/06156.
Conclusão
A visão culturalista do Direito permite conferir normatividade e
coercibilidade às disposições do Estatuto de Roma. Consequentemente, da
estruturação tratadista do Tribunal Internacional Penal, extrai-se a (pretensa) tutela
efetiva da dignidade da pessoa humana – tanto nos termos processuais quanto nos
moldes materiais. O Tribunal de Haia legitima-se através das ‘garantias’
jurisdicionais para dirimir os mais graves ataques à existência da vida no planeta.
Além disso, o Tratado positiva ‘princípios’ que programam a previsibilidade dos
julgamentos – apanágio inerente à dialética ético-operativa (construtivista) do Direito
Internacional –, com vistas à elisão do temerário decisionismo.
Todavia, remanescem incontáveis desafios. No atual
panorama, a universalização da jurisdição não ultrapassa a noção de uma
tendência, porque ainda adstrita aos percalços horizontalizados do paradigma da
‘justiça universal’ (dependente da aceitação dos Estados-partes). Da mesma (má)
sorte, causa espécie a convivência de julgamentos ‘jurídicos’ com a tomada de
(algumas) decisões ‘políticas’, nitidamente influenciadas pelas diretrizes da ONU.
Haure-se disso que, não raro, a competência da Corte submete-se à intervenção do
Conselho de Segurança, nos termos do Capítulo VII da Carta das Nações Unidas
(art. 13, b, do Estatuto de Roma) – peculiaridade mitigadora da almejada
independência do Tribunal – autonomia que refletirá a própria axiologia
metanacional da instituição: a funcionalização da (neo)soberania em benefício da
dignidade da pessoa humana.
Sobremaneira, as ‘garantias’ e os ‘princípios’ do Tribunal
Internacional Penal pautaram inéditas conquistas. Agora, o ser humano não é mais
digno por existir na Europa, nos Estados Unidos, no Brasil ou em Uganda. Ele torna-
se digno pelo privilégio de singela condição especial – a espécie ‘humana’. E o
Tribunal Internacional Penal representa sopro neoinstitucional de austeridade ao
estabelecimento dessas normativas de equitatividade. Evidente que, sufragado este
155 O juiz, ao proferir sentença condenatória: “IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela
infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido”.
156 Na Lei Maria da Penha, a participação processual da vítima assumiu foros inéditos no certame procedimental
penal. Ela deve ser informada dos atos referentes ao acusado, tudo em prol da efetiva proteção – leia-se, tutela.
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primeiro momento de ineditismo – capitaneado por autêntica jurisdicionalização do
direito penal de ‘transição’ –, fomenta-se a construção de uma justiça universal.
Momento no qual, para além da axiologia, pautar-se-á deontologia específica do
crescente compartimento verdadeiramente internacionalista do Direito. Daí sim, a
sobrevivência do homem grassará com a real importância e confiança que
depositaremos em instituições desse porte.
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TRISTE FIM DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA PELO ADIMPLEMENTO
Cássio Benvenutti de Castro157
elaborado em junho/2011
Resumo: As obrigações perfazem ciclo atomístico-natural: nascem, desenvolvem-se
e fenecem. No direito tributário inexiste capital diferença existencial. Deveras, a
mesma linguagem (publicista) que, porventura, reparte competências e define as
vicissitudes dessas relações, também vincula a derradeira especificidade do circuito
obrigacional. Nesse sentido, o art. 156 do CTN reúne tanto modalidades de extinção
formal quanto da resolução material do crédito tributário: dentre as últimas, o
instituto do adimplemento, representação proativa e realizadora do objeto pecuniário
do certame arrecadatório. Do adimplemento – eleito como princípio reitor normativo
da presente análise extintiva obrigacional –, (auto)reproduzem-se decorrências
normativas do sistema jurídico tributante, conjeturadas desde observações
intrínsecas e/ou exógenas ao Código, na proposta (des)consagradora de aliviar
expectativas sociais.
Abstract: The liabilities have a natural cycle: they born, grow and die, as anyone else.
In the tributary law does not exist existential difference. That is, the same language
(publicist) that we may divide responsibilities and defines the development of these
relations, also commits the ultimate specificity of obligational circuit. In this sense, art.
156 of the CTN meets both conditions for the settlement of the formal and the
material resolution of the tax credit: among this one, the institute of payment,
proactive representation of the money object os tributary law. About payment –
elected as the guiding principle of this normative analysis extinctive os obligation –
(self) reproduce normative entailments of the tributary legal system, organized from
inside/outside observations from the Tributary Code, in the proposal to alleviate
social expectations.
Sumário: Pressupostos metodológicos de análise. 1. Extinção direta da obrigação
tributária 1.1. Pagamento 1.1.1. Natureza jurídica e caracteres essenciais (objeto do
pagamento) 1.1.2. Caracteres circunstanciais (tempo e lugar) 1.1.3. Imputação do
pagamento 1.2. Pagamentos especiais 1.2.1. Pagamento antecipado e homologação
do lançamento 1.2.2. Conversão do depósito em renda 1.2.3. Consignação em
pagamento 2. Situações heterotípicas 2.1. Extinção indireta da obrigação tributária
2.1.1. Dação em pagamento 2.1.2. Transação 2.1.3. Compensação 2.1.3.1.
157
Juiz de Direito no Rio Grande do Sul. Especialista em Direito. Mestrando em Direito na UFRGS. Autor
dos livros “Temas de Ciências Penais: na perspectiva neoconstitucional” e “(Neo)Soberania e Tribunal Penal
Internacional”.
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Aproveitamento de créditos em precatórios judiciais 2.2. Repetição do indébito 2.2.1.
Natureza jurídica e requisitos 2.2.2. Consectários legais 2.2.3. Tributos indiretos
2.2.4. Prazo caducificante 2.3. Extinção da punibilidade dos crimes tributários pelo
pagamento 3. Considerações finais. Referências
Summary: Methodological principles of analysis. 1. Direct extinction of tributary
liability 1.1. 1.1.1 Payment. Legal nature and essential characteristics (object of the
payment) 1.1.2. Circumstantial character (place and time) 1.1.3. Allocation of
payment 1.2. Special Payments. 1.2.1. Prepayment and ratification of payment 1.2.2.
Conversion of the deposit 1.2.3. Consignment in payment 2. Heterotypic situations
2.1. Indirect extinction of tributary liability 2.1.1. Payment in kind. 2.1.2. Transaction
2.1.3. Compensation 2.1.3.1. Use of judicial credits payments 2.2. Repetition of the
payment 2.2.1. Nature and legal requirements. 2.2.2. Legal consequences 2.2.3.
Indirect taxes 2.2.4. Decadency time 2.3. Punishment extinction of the crimes by the
payment 3. Final considerations. References
Palavras-chave: tributário; crédito; extinção; adimplemento.
Keywords: tributary; credit; extinction; payment.
Pressupostos metodológicos de análise
As realidades da natureza perfazem ciclo atomístico previsível: nascem
e se desenvolvem com vistas à extinção158. No direito obrigacional – seja público ou
privado – , preserva-se tal finitude, com a especialidade linguística da sistemática
jurídica em regulamentar, tanto os termos da genealogia como os moldes das
derradeiras formas extintivas dos institutos. No caso do direito tributário, a extinção
da obrigação funcionaliza-se, à perspectiva dos mecanismos necessários/úteis à
circulação sustentável de riquezas no tráfego social. Genericamente, o Código
Tributário Nacional prevê as seguintes causas de extinção do ‘crédito tributário’, no
art. 156: pagamento, compensação, transação, remissão, prescrição e a
decadência, conversão de depósito em renda, pagamento antecipado e a
homologação do lançamento, consignação em pagamento, decisão administrativa
irreformável,a decisão judicial passada em julgado, dação em pagamento em bens
imóveis.
158
O ser humano é a única espécie com a noção do final. Peculiaridade que lhe desperta inúmeras
angústias patológicas.
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Observa-se que a capitulação legal promiscui, a despeito do rigor
técnico159, modalidades resolutórias da obrigação tributária e, de outro lado, mera
extinção formalista do consectário creditício. Perplexidade sobremaneira expressa
no parágrafo único, do art. 156, ao subentender possibilidade de novo lançamento,
mesmo com a pretérita extinção do ‘crédito’ tributário. Na verdade, o Código
engendra-se na secular insistência de manutenir o axioma dicotômico obrigação-
crédito tributário, como se fossem duas realidades absolutamente disjuntivas –
normativismo repercutido à extinção da obrigação/crédito tributário, cuja atecnia
grassa na indigitada regra.
Contudo, o título epigrafado recorta o objeto da conturbada regra do
art. 156, depurando-se das causas extintitivas meramente ‘formais’ – desbravadoras
do ‘crédito’ –, para discutir somente o fenecimento ‘material’ da relação tributária.
Deveras, o adimplemento subentende comportamento proativo160 do sujeito passivo,
que exerce o ato-fato resolutório e liberatório da obrigação oneradora. Daí exsurge
a delimitação do presente ensaio: apesar da necessária (porque positivada e
deglutida, na práxis jurisprudencial) aceitação (dogmática) do diferimento lógico (e
cronológico) da obrigação para com o crédito tributário, cujo módulo intermédio
simboliza-se pelo lançamento – não raro, artificial (homologatório) –, verificam-se
pontos de contato entre algumas espécies161 arroladas no art. 156, como extinção
do crédito e que, por acepção semântica, guardam referibilidade ao adimplemento
do conteúdo162 (material) da obrigação. Portanto, o Código Tributário pode abalizar a
159
Por exemplo, a decadência fulmina a obrigação pré-lançamento; em certas espécies, a remissão perdoa
o devedor antes mesmo do ato administrativo tácito/homologatório; por sua vez, há decisões administrativas e
judiciais que podem afastar do mundo jurídico tanto a obrigação como o próprio crédito tributário. Pense-se que
tal “afastamento do mundo jurídico” pode ocorrer por questão anulatória ou nulificatória o que, sobremaneira,
determina diferenciados lapsos temporais da angústia: a primeira, quiçá faz remanescer algum efeito do ato
administrativo; esta última, em regra, excomunga-o do cenário jurídico, como se nunca tivesse existido. 160
Adimplir, cumprir, realizar a obrigação tributária de cunho pecuniário, evidentemente, em regra
subentende atitude do interessado. Diferente dos casos em que fenece o vínculo por inexigibilidade decorrente da
caducidade ou remissão, por exemplo, onde há ‘liberação’ do devedor sem ‘satisfação’ da dívida. Ressalto que,
no direito obrigacional, quando existe o dever de ‘omissão’, o adimplemento perfaz-se pela inércia do devedor –
ou seja, quando falo em comportamento ‘pro-ativo’, leia-se no sentido de cumprir o combinado que, em termos
pecuniários, simboliza a entrega do valor da dívida. 161
Afastadas eventuais situações teratológicas, de regra, entendo inexistir classificações certas ou erradas,
mas algumas mais úteis que outras. Por exemplo, ao invés da sistematização ora proposta, poder-se-ia optar pelo
caráter ‘processual’ das espécies do art. 156, como observado por Conrado, ao inferir que apenas o pagamento
configura fenômeno transprocessual, sendo todas as demais hipóteses passíveis de homologação institucional,
seja pela decisão judicial ou na esfera administrativa. Ver Processualidade e extinção da obrigação tributária. In
CONRADO, Paulo Cesar (coord.). Processo Tributário Analítico. São Paulo: Dialética, 2003, p. 50. 162
Nos termos da teoria geral das obrigações, é temerário comentar de ‘conteúdo’ no capítulo do
‘adimplemento’. Ora, adimplemento está mais para a consequencia, ao invés da causa e conteúdo da relação
obrigacional, uma vez que ela realiza duplo fim da seqüência jurídica – satisfaz e libera. Na perspectiva dos
negócios e trâmites obrigacionais, segundo Pontes de Miranda, o adimplemento é efeito, decorrência, nota de
encerramento, marginalizado à noção do conteúdo do negócio que sufragou a etiologia da dívida. Entretanto, a
breve análise do conteúdo é apenas para diferenciar o artificialismo normativista da sistemática tributária. Afinal,
temos obrigações principais e acessórias, independentes e autônomas entre si. Para aprofundar, MIRANDA,
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estruturação do presente estudo. No primeiro momento, analiso as formas diretas de
adimplir, cujo regramento exaure-se no bojo do CTN; ato contínuo, examino as
espécies indiretas do adimplemento que, para além da lex legum complementar,
carecem de regulamentação ulterior das respectivas entidades tributantes. Esta
última digressão imbrica-se às situações resolutivas heterotípicas (ou
heteronormativas) da obrigação tributária, que podem significar verdadeiras ‘crises’
extintivas, ora sinalizadas tanto pelo indébito163 como pelos efeitos conexos do
adimplemento.
Dúplice consideração metodológica é necessária. Em primeiro lugar,
saliento o caráter exemplificativo164 do rol previsto no art. 156, do CTN, cujas
espécies não estariam adstritas à lei complementar, apenas às leis ordinárias das
entidades tributantes (art. 97, VI, do CTN). Com efeito, vide o art. 146, III, ‘b’, da
CRFB: “Cabe à lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de
legislação tributária, especialmente sobre obrigação, lançamento, crédito, prescrição
e decadência tributários”. Ou seja, pela interpretação literal e a contrário senso, as
duas últimas idéias (prescrição e decadência) grifadas e posteriores à derradeira
vírgula, restringem as formas de extinção do crédito coarctadas à lei complementar.
A pontuação é peremptória. Não fosse restritivo o elenco de causas adstritas à
complementaridade legal, a Constituição escreveria ‘extinção do crédito’, ao invés de
se referir à ‘prescrição’ e à ‘decadência’ – interpretação atualmente reconhecida pelo
STF165 e homologada pela doutrina de Luciano Amaro166: “O rol do art. 156 não é
Francisco Cavaltante Pontes de. Tratado de direito privado, tomo XXIV. 3ª ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971, p.
71 e seguintes. 163
Incauto leitor poderia criticar que o indébito tributário está regulamentado no CTN e, portanto, não seria
caso de “heteronormatividade”. Contudo, a repetição opera-se pela “ausência” de causa-norma jurídica, ao invés
de atinar à simples literalidade do Código. Situação a confirmar a classificação proposta. 164
Na verdade, o argumento de “exemplificatividade” é implicitamente sofístico em nossa dogmática
positivista-dogmática. Observe-se o Novo Código Civil que, superveniente ao CC/16, estipulou novo direito real
de superfície (arts. 1369). Ora, os direitos reais não são taxativos? Certamente, mas nada impede da nova
legislação eleger um inédito direito real. Apesar das críticas, somos positivistas! Logo, dizer que o art. 156, do
CTN, é exemplificativo (ou taxativo) não resolve o problema. A grande questão seria diagnosticar a espécie de
norma regulamentadora pode especificar as causas de extinção da obrigação tributária. E consoante o art. 146, da
Constituição, a lei ordinária da respectiva entidade tributante pode condicionar a extinção das obrigações. 165
Inicialmente, o STF entendia que a extinção do crédito tributário estaria vinculado á lei complementar,
in verbis: “Deferida medida cautelar em ação direta ajuizada pelo Governador do Distrito Federal para sus-
pender a eficácia da Lei 1.624/97, do Distrito Federal, que prevê o pagamento de débitos tributários das
microempresas, das empresas de pequeno porte e das médias empresas, mediante dação em pagamento de
materiais destinados a atender a programas de Governo do Distrito Federal. O Tribunal considerou juridicamente
relevante a alegação de inconstitucionalidade sustentada pelo autor da ação por aparente ofensa à reserva de lei
complementar para a definição das for-mas de extinção do crédito tributário (CF, art. 146, III, b) e à exigência de
processo de licitação para a contratação de obras, serviços e compras pela administração pública (CF, a rt. 37,
XXI)”. ADInMC 1.917-DF, rel. Min. Marco Aurélio, 18.12.98.
Entretanto, na ADI 2.405-RS, rel. Min. Ilmar Galvão, 6.11.2002, houve modificação da jurisprudência
da Côrte, agora permitindo aos entes público, pela via de leis ordinárias, o estabelecimento de modalidades
extintivas do crédito tributário. 166
AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 390.
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taxativo. Se a lei pode o mais (ue vai até o perdão da dívida tributária) pode também
o menos, que é regular outros modos de extinção do dever de pagar tributo”.
Finalmente, asseguro que tratarei da extinção da obrigação tributária principal pelo
adimplemento, ora satisfativo do conteúdo pecuniário da relação jurídica. O
cumprimento (ao invés de adimplemento) das obrigações acessórias perfaz-se pela
prestação de “fazer ou não fazer”, aspectos objetivamente estranhos ao foco deste
ensaio167.
1. Extinção direta da obrigação tributária
Algumas espécies extintivas da obrigação tributária principal são
regulamentadas, essencialmente168, pelo Código Tributário Nacional. Em vista desse
exaurimento normativo, que independe do preenchimento (meta)infracomplementar
pela respectiva entidade tributante, segmentei as hipóteses da resolução direta da
obrigação, pela modalidade adimplemento.
Poderia seguir orientação do velho Pontes169, relacionando dois
sentidos para o termo adimplemento: entendimento largo, a representar qualquer
liberação ou satisfação da dívida; e o sentido estreito, quando o pagamento se
refere à prestação direta, pelo devedor, do objeto devido. Entretanto, quando
comentei alhures sobre a invalidação do ato administrativo viciado, disse que a
doutrina, em geral, preocupa-se com a ontologia do objeto da valoração (ato
inválido), furtando-se ao peremptório fator de classificação sistemática em direito
público – a valoração do objeto, pelo viés da norma definidora da sanção/vício,
inerente ao caráter dogmático do juspositivismo da administração pública. E
prossegui, ao constatar que, no direito público, os institutos merecem percuciência à
vista das normas, consagradas pela heteronomia170 peculiar à Administração: “O
167
Distinções bem apontadas em VANONI, Ezio. Opere Giuriche, vol. II. Milano: Giuffrè, 1962, p. 288. 168
Obviamente, o art. 96, do CTN, abre ensanchas à regulamentação circunstancial de algumas questões.
Agora, nos termos essenciais, como alinhavei abaixo, o Código Tributário exauriu a espécie pagamento, bem
como as demais elencadas neste item “adimplemento direto”. 169
MIRANDA, Francisco Cavaltante Pontes de. Tratado de direito privado, tomo XXIV. 3ª ed. Rio de
Janeiro: Borsoi, 1971, p. 73. 170
Heteronomia é conceito divulgado por Kelsen, inspirado na doutrina kantiana dos binários
segmentadores do circuito jurídico: direito e moral, direito público e privado, direito material e formal, razão
prática e teórica, etc. Kelsen define a heteronomia como uma manifestação de ‘comando’ aos súditos, emanada
pela vontade unilateral do Estado. Enquanto no direito privado, continua Kelsen, “os sujeitos que hão de ser
vinculados participam na criação da norma vinculante – nisto reside precisamente a essência da produção
contratual do Direito –, o sujeito que vai ser obrigado não tem, relativamente ao comando administrativo de
Direito público, qualquer espécie de participação na criação da norma vinculante”. Trata-se de concepção
clássica, a separar normas ‘autônomas’ das ‘heterônomas’. Na verdade, quando se examina o conceito de
democracia participativa e sua vertente material, bem como ao verificar o reconhecimento que a ‘autonomia’,
quando muito, apenas flerta com os ‘espaços de jogo’ deixados pelo próprio sistema normativo, observa-se o
ultraje da doutrina do mestre. A diferença que existe entre as normas de direito privado e as normas de direito
público é a ‘densidade normativa’, menos presente nas primeiras. Justamente por isso, abre-se alternativas à
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vício do ato administrativo, a despeito de ínsito ou atinente ao suporte fático, define-
se pelo grau de reprovação em função do Direito/juridicidade maculado. Logo, o
defeito não vale por si só, em razão de seus efeitos ou genética pressuposta, mas é
corolário da hierarquia da norma contra a qual se confrontou a conduta
administrativa viciada. Decisivamente, o cotejo do ato administrativo contra a norma
maculada é que determina a respectiva ‘sanção’ invalidante em diferentes níveis.
Vale dizer, a contrariedade ao Direito de acordo com o grau hierárquico da
normação violada define a espécie de ato maculado: se inexistente, nulo ou
anulável.”171
Evidente que a reflexão transcrita não refuta a tese de Pontes.
Tampouco representa uma contraditio in terminis à minha própria sistematização,
uma vez adotada a natureza jurídica do pagamento como ato-fato jurídico. Afinal,
ato-fato existe, ou não existe, sem passar pelo plano da validade jurídica! Tão
somente, a indigitada citação de pretérita reflexão, salienta uma categorização
normativ(ist)a do direito público, que veicula-se pela noção dos ‘tipos’ (tipicidades),
paradigma da segurança jurídica justificadora da ingerência do Estado sobre o
patrimônio jurídico dos cidadãos. Logo, a classificação da extinção da obrigação
tributária, nas modalidades ‘direta’ e ‘indireta’, repercute-se ao panorama normativo
– não ao conteúdo172 das hipóteses do suporte fático –, preordenando-se pela
categoria/hierarquia das normas confrontadas. Bem ao encontro do nosso sistema
publicista de (ante)ver173 o direito.
1.1. Pagamento
O pagamento constitui a mais esperada, natural e direta modalidade da
extinção da obrigação tributária. Sobremaneira, recolhe a dupla174 concepção
epistêmica do “final”, em termos obrigacionais: tanto determina o ponto ad quem da
relação jurídica (terminativa-topológica), como vai ao encontro teleológico do direito
subjetivo do credor. Por ocasião dessa importância precípua, o CTN detalhou os
‘autonomia da vontade’ dos sujeitos. Ver KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. João Baptista Machado.
8ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2011, p. 311. 171
CASTRO, Cássio Benvenutti de. Decadência da potestade invalidante do ato administrativo. In Revista
da Ajuris, 116, p. 67. 172
Apesar da tautologia, vou insistir no cuidado com a palavra ‘conteúdo’: o pagamento não incide em
‘conteúdo’ do negócio, mas determina momento ad quem daquele fenômeno jurídico pressuposto. Pagamento é
ato-fato jurídico. À atividade humana, mesmo despida de vontade de solver, incide a regra da resolução mais a
liberação da relação obrigacional. 173
Dogmática jurídica é o conjunto de discursos prévios de fundamentação. Portanto, ‘antevisão’ estrita da
lei de direito público. 174
A duplicidade é teológica e terminativa: pela linha de observação do credor (teleológica), visualiza-se o
pagamento; de outro lado (terminativo-topológico), o devedor efetua o pagamento para verificar extinta a
obrigação que lhe onera. Segundo Pontes de Miranda, adimplemento realiza o binômio do ‘satisfaz’ e ‘libera’.
Op. cit., p. 72.
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caracteres do pagamento, consoante os arts. 157 a 163 e 165 a 169, cuja análise
possibilita sistematização dos elementos essenciais e/ou acidentais desse
adimplemento no sentido estrito.
Ictu oculi, saliento que o regramento pormenorizado do pagamento, via
Código Tributário Nacional, atendeu à seguinte angústia legislativa: afastar possível
aplicação de preceitos do direito civil à espécie, atinentes à autonomia privada175.
Leia-se, refutou-se o perigo da normativamente consectária da boa-fé objetiva incidir
em questões publicísticas, consoante explicitarei no decorrer deste capítulo.
A partir da natureza jurídica do pagamento – enquanto ato-fato jurídico
–, o percuciente leitor poderá questionar sobre a validade científica da
sistematização abaixo, que dividiu os caracteres em essenciais e circunstanciais.
Com efeito, ao paladar do direito civil, seriam “acidentais” ao negócio jurídico, a
condição, o termo e o encargo (arts. 121 a 137, do CC). Agora, essas
“circunstâncias” apõem-se a negócios jurídicos, não aos atos-fatos jurídicos!
Todavia, no direito público, a esquematização proposta transcende tal esclerose
visual privatística, à medida que raciociona os institutos sob a linha de visada das
normas (como salientei acima), quando cotejadas ao ato-fato jurídico – tratando-se
da regulamentação direta176/exauriente pelo CTN, tem-se os caracteres “essenciais”;
em contrapartida, quando se faculta o exaurimento da matéria por atos diversos,
conforme art. 96, do CTN, deduzo os caracteres “circunstanciais”. Singela
metodologia normativa ora desenvolvida, sistemicamente adaptável ao positivismo
tributário.
1.1.1. Natureza jurídica e caracteres essenciais (objeto do pagamento)
A doutrina tergiversa acerca da natureza jurídica do pagamento. É
corrente sustentar-se o adimplemento (sentito estrito) enquanto negócio, ou ato
jurídico. Entretanto, faça-se compreensão lógica: o negócio, ou o ato jurídico, são
fenômenos anteriores ao pagamento; este último, evento humano que não pertence
ao conteúdo dos negócios (ou atos), apenas define o encerramento dos seus
pressupostos – meras causas jurídicas que o pagamento virá a extinguir.
Visualizado um contrato, um ato ilícito, ou a promessa de doação, por exemplo, tem-
se que eles inicialmente delimitam situações protegidas pelo direito. Apenas, no
momento derradeiro é que serão resolvidos e liberados pelo pagamento.
175
Consigno que autonomia privada assume foros normativos, extrínsecos ao ato praticado. Diferente da
autonomia da vontade, cuja incidência faculta relativização dos espaços de atuação das partes no bojo do negócio
jurídico. 176
Consoante referi em nota de rodapé anterior, o qualificativo “direto” não infirma o título do capítulo “1”
epigrafado. Uma situação é o CTN regulamentar o pagamento, sem diferimento normativo aos entes tributantes;
outro fenômeno é terceirizar o regramento a atos infra(meta)legais, segundo o art. 96, do CTN.
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Este – o adimplemento –, em si mesmo, não ostenta requisitos de
negócio, ou de ato jurídico, configurando mero evento ad quem, tópico, a encerrar o
prefacial contexto fenomenológico-jurídico. O negócio jurídico (ou ato) está no
conteúdo da obrigação, cujo efeito é diferido ao momento extintivo da relação,
determinado pelo pagamento. Mecanismo que, incansavelmente, é descrito por
Pontes de Miranda: “O que é essencial é que a realização seja conforme a
obrigação e há realizações, conforme a obrigação, que só exigem o ato-fato, como o
serviço, a obra e as omissões. O louco, que limpou, durante ou depois da loucura, a
casa, de cuja limpeza fora encarregado, ao tempo em que era capaz de obrigar-se,
adimpliu”. Eventual aceitação, por parte do credor, significa um plus, à medida que a
singela incidência da regra liberatória ao evento humano satisfativo (pagamento),
torna-se suficiente para dissolução da relação obrigacional.
Em síntese, o pagamento é ato-fato jurídico, no qual a “norma jurídica
abstrai desse ato qualquer elemento volitivo como relevante. O ato humano é da
substância do fato jurídico, mas, não importa para a norma se houve, ou não,
vontade em praticálo. Ressalta-se, na verdade, a consequencia do ato, ou seja, o
fato resultante, sem se dar maior significância à vontade de praticá-lo”177. Impossível
confundir o negócio, ou o ato jurídico, que dá causa fenomenológica à situação
protegida pelo direito, ao evento humano de encerramento – no conteúdo do qual
não se perquire ‘espaços de jogo’, apenas intenção (não vontade) de adimplir. A
natureza de ato-fato jurídico do pagamento justifica-se, ainda mais, pela nota
heterônoma das relações em direito tributário. Ou seja, a teoria adotada imbrica-se à
lógica tipificadora do direito público.
Pertinente aos caracteres essenciais do pagamento, impende
recapitular que o direito tributário refuta normatividade oriunda da autonomia privada
dos sujeitos da relação obrigacional. Portanto, apesar de alguma identidade teórica
– como nos misteres da natureza jurídica –, nos termos específicos do CTN, o
pagamento não se comunica aos ditames do direito civil, comercial ou
consumeirista.
Embalde, o Código dispõe que a imposição de penalidade não elide o
pagamento do crédito tributário (art. 157), consequência haurida das respectivas
independências interobjetivas da obrigação principal para com a obrigação
acessória. Ora, o objeto da obrigação principal é dívida de valor; de outro lado, o
objeto da obrigação instrumental são prestações de fazer ou não fazer, aptas a
guarnecerem, funcionalmente (teleologicamente), a obrigação principal. Diversas
vezes, inclusive, as obrigações acessórias são mais amplas que de conteúdo
pecuniário, consoante observa Heinrich Wilhem Kruse: “Los distintos deberes de
colaboración del sujeto pasivo permanecen invariables con independencia de la
extinción de la relación obligacional impositiva. Por ejemplo, el sujeto pasivo aún 177
MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 106.
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después del pago, ha de proporcionar informaciones, ha de presentar las
anotaciones, libros y papeles de negocios para su examen y comprobación”178.
Entretanto, inexiste relação de continuidade lógica ou de prejudicialidade entre elas,
porque o sistema engendrou-lhes contornos axio-deontológico179 – a obrigação
instrumental presta-se ao controle da atividade econômica do sujeito passivo,
racionalizando, conferindo segurança, assegurando a possibilidade arrecadatória do
Fazenda.
A relação (vertical) observada entre Fisco-sujeito passivo sufraga a
necessidade de tipos normativos específicos, de maneira a conferirem
previsibilidade (segurança) às demandas estatais. Tanto as obrigações principais
quanto as acessórias devem se funcionalizar a partir de normas autônomas, cada
qual reservando identidade própria. Contingencialmente, elas diferenciam-se em
termos da densidade180 normativa das respectivas disposições.
Com efeito, as obrigações sistematizadas pelo Código são
consequencias imediatas de diferentes suportes fáticos181. Mesmo no (eventual)
caso de conversão da obrigação instrumental em multa pecuniária (art. 113, §3º),
positivou-se cristalina independência da obrigação acessória para com a principal.
Segundo Paulo de Barros Carvalho182, a exigência da multa pressupõe motivo
diverso, que não o estrito fato gerador do tributo. Ou seja, a sanção liquidada em
dinheiro advém de acontecimento definido normativamente como ilícito, contrário à
prestação instrumental. Logo, diferentemente do direito civil, no qual se facultaria
alternativa ao credor – exigir a dívida ou cláusula penal compensatória (art. 410, CC)
–, em direito público, inexiste promiscuidade funcional dos objetos: ambas as
obrigações (principal e acessória) mantêm autonomia e inviabilidade de elisão
recíproca (art. 157, CTN).
Outrossim, o Código inviabiliza a importação açodada de institutos
civilistas183 que, com espeque na boa-fé objetiva (vetor suprressio) e na autonomia
das partes, retirariam a independência dos deveres obrigacionais fundados no direito
tributário. Consoante previsão do art. 158, o pagamento parcial não extingue o
178
KRUSE, Heinrich Wilhelm. Derecho tributario, parte general. Trad. Perfecto Yebra Marful-Ortega e
Miguel Izquierdo Macías-Picavea. 3ª ed. Madrid: Editoriales de Derecho Reunidas, 1978. 179
A “acessoriedade” da obrigação instrumental do direito tributário é peculiar. Ela não segue a sorte da
obrigação principal. Portanto, inexiste logicidade nessa diagramação, apenas coarctação deontológica – ou seja, a
obrigação acessória fomenta o “dever” de pagar tributo, permeando-o de cuidados e garantias fundados nas
prestações de fazer ou não fazer atribuídas ao sujeito passivo. 180
Singela leitura do art. 113, §2º e art. 97, III, do CTN, evidencia a diversidade da densidade normativa
que referi: existe escalonamento “de grau”, sem jamais olvidar da necessidade de previsão – nota essencial do
Estado Constitucional. 181
Com respeito à parcela doutrinária que defende ausência do suporte fático às obrigações tributárias,
implicitamente, consigno entendimento diverso. 182
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 23ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 531. 183
Vide art. 322, do CC.
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crédito tributário. Tampouco o pagamento total de um crédito, acarreta a extinção
presuntiva do mesmo ou de outro tributo, por inexistir adimplemento em ricochete no
direito público.
De fato, o pagamento (no direito civil e tributário) segue a regra
pragmática dos três ‘i’: identidade, integridade e indivisibilidade – o solvens deve
prestar o devido, todo o devido e por inteiro. Obviamente, as variações da autonomia
privada mitigam tal pontuação, no direito civil. A dação em pagamento, oferta de
parcelamento ou desconto, e outros benefícios, constituem diuturnos artifícios do
tráfego social. No direito tributário, qualquer alteração da ‘pontualidade’ do
pagamento depende-se de autorização legislativa. Em virtude da heteronomia
intrínseca ao sistema publicista, a regra dos três ‘i’ solidifica-se, abrindo ensanchas
somente nas hipóteses previstas legislativamente – trata-se da noção de tipicidade,
inerente às disciplinas da administração.
Retomando, o pagamento remete à noção de ‘pontualidade’ que,
analiticamente, perfaz-se na leitura da regra dos três ‘i’. Por questão financeiro-
administrativa, tratando-se do sujeito ativo tributário, cujo crédito é indisponível, essa
‘pontualidade’ grassa densidade normativa. Logo, dedutível que a concessão do
parcelamento, dação em pagamento (aliud pro alio), desconto (transação), ou
demais benefícios, dependem de lei específica da entidade tributante competente.
A delimitação do objeto material do pagamento é decorrente da
‘pontualidade’. Ora, o Código refuta o adimplemento in natura (bens ou serviços
diversos do dinheiro), não obstante a aparência do art. 3º. Isso nada mais significa
que a identidade do adimplemento. Contudo, o CTN prevê ordem de prejudicialidade
dos instrumentos que veiculam valores no tráfego social, privilegiando a moeda
corrente e o cheque, apesar da submissão deste à compensação (datio pro
solvendo). O art. 162 elenca os sucedâneos dessas modalidades, através do
pagamento via estampilha, vale postal ou papel selado. Entretanto, cediço que a
maioria dos tributos é adimplida em caixas eletrônicos, mediante expedientes
bancários de informática – símbolos virtuais do dinheiro vivo.
Se, de um lado, o objeto material do pagamento é infungível – como
supra discriminado (art. 162) –, de outro, o objeto jurídico (dinheiro) fungibiliza-se e
remunera-se, através das perdas e danos e dos lucros cessantes, por imediatizar
dívida de valor. Afinal, a teleologia do adimplemento visiona a geração de riqueza ao
Fisco!
No caso das dívidas de dinheiro (matéria-prima das obrigações
tributária principais), as perdas e danos e os lucros cessantes são ressarcidos pelas
técnicas jurídicas dos juros e da correção monetária. Verificada a (de)mora no
adimplemento de obrigação tributária, independente de culpa/dolo, o art. 161, §1º,
do CTN, estipula incidência automática de juros de 1% ao mês e mais a correção
monetária – esta última para preservar o status quo. O próprio Código ressalva às
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entidades tributantes competentes, supletoriamente, a possibilidade da fixação de
juros diversos, por intermédio de lei expressa (art. 97, I e V, do CTN).
Em âmbito federal, o art. 13, da Lei 9.065/95 c/c art. 84, I, da Lei
8.981/95, tornou aplicável a taxa SELIC às obrigações tributárias vencidas. Esse
indexador reúne juros e correção monetária na mesma cifra percentual
diuturnamente divulgada, razão pela qual inviável a cumulação da SELIC com
qualquer outro índice. Alguns Estados-membros184 da federação, por lei expressa,
adotam a SELIC para remuneração de seus créditos; no silêncio do Fisco, vigora a
regra geral do art. 161, §1º, do CTN. Havendo expressa previsão legal, a
jurisprudência185 admite a capitalização dos juros moratórios, ao elucubrar leitura em
contrario senso do art. 167, § único, do CTN.
Finalmente, o Código (art. 161, §2º) prevê a não incidência dos juros
moratórios, quando formulada consulta administrativa pelo sujeito passivo. Na
verdade, com a amplificação da boa-fé objetiva em questões tributárias, mormente à
vista do art. 100, § único, do CTN, poder-se-ia questionar, inclusive, a oneração via
correção monetária, a depender da verossimilhança do questionamento aviado ao
Fisco.
1.1.2. Caracteres circunstanciais (tempo e lugar)
O Código Tributário Nacional é lex legum em direito tributário. Além de
cumprir determinação constitucional com o estabelecimento das normas gerais (art.
146, da CRFB), define hipóteses de abertura do sistema normativo, diferindo aos
atos infralegais (art. 96, do CTN) a possibilidade da regulamentação de algumas
questões de maior plasticidade. Daí exsurge a sistematização da terminologia
‘caracteres circunstanciais’: tratam-se dos aspectos acidentais/acessórios do
pagamento, nos quais o Código faculta especificação via ‘legislação tributária’.
Portanto, não quero dizer, como na ‘condição, termo e encargo’ do negócio jurídico,
que a acessoriedade é fruto da autonomia da vontade. Consoante expliquei, as
classificações do direito público coarctam-se às normas – paradigmas de um
sistema cujo princípio reitor normativo é a ‘tipicidade’. Assim, à vista das normas
flexíveis que os regulam (atos legislativos), os presentes caracteres de ‘tempo’ e de
‘lugar’ são reputados circunstanciais.
184
Outros tantos Estados-membros dispõem de lei específica para determinar a indexação. Por exemplo, o
Rio Grande do Sul, cujo art. 69, da Lei 6.537/73, fixa juros moratórios de 1% ao mês ou fração. 185
Por exemplo: “A capitalização e a aplicação dos juros de mora acima do limite constitucional de 12%
ao ano, não viola o princípio da legalidade. A incidência da SELIC sobre os créditos fiscais se dá por força de
instrumento legislativo próprio (lei ordinária) sem importar qualquer afronta à Constituição Federal. O princípio
constitucional da vedação ao confisco é dirigido a tributos, inaplicando-se à multa moratória.” (TRF4, AC
2005.72.13.002855-5, Primeira Turma, Relatora Maria de Fátima Freitas Labarrère, D.E. 08/06/2011)
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A regra do art. 327 do Código Civil estipula que o lugar do pagamento
será o domicílio do devedor, facultado a convenção em contrário pelos interessados.
Mais, no caso de inadimplência, o credor deverá exigir (pretensão de tutela) do
devedor a solução da dívida, face o caráter quesível do pagamento. No direito
tributário, a incansável heteronomia supõe automaticidade. Ex lege, desde a origem,
o sistema onera deveres ao sujeito passivo, dentre os quais, a portabilidade
solutória.
O art. 159 do CTN determina que o pagamento deverá ser efetuado na
repartição competente do domicílio do sujeito passivo (art. 127), independentemente
de cobrança – dívida portável. Supletoriamente, o Código possibilita à legislação
tributária excepcionar o local do pagamento, determinando o recolhimento em
repartição diversa daquela de domicílio do devedor. Na prática, a exceção tornou-se
a regra, em vista da corriqueira intermediação do sistema bancário nas relações
extintivas de direito público, de molde a facilitar a arrecadação (art. 7º, §3º, do CTN).
Em poder de qualquer GRU, DARF, entre outros, documentos frequentemente com
identificação eletrônica, independente do local onde se encontrar o devedor, ele (ou
alguém por ele) pode satisfazer a obrigação.
Da mesma sorte, a exceção tornou-se regra quanto ao tempo do
pagamento (vencimento). A legislação tributária de cada entidade, diuturnamente
define o prazo do vencimento dos respectivos créditos. Inclusive, concede descontos
pela eventual antecipação dos adimplementos (vide as corriqueiras hipóteses do
IPTU e do IPVA). Na ausência de atos específicas das entidades tributantes
competentes, o termo ad quem da obrigação ocorre no prazo de trinta dias da
notificação do lançamento, ou da lavratura do auto de infração (art. 160, do CTN), de
maneira automática (ex re).
Deveras, o termo ad quem para adimplir significa o termo a quo da
mora – configuram dois lados opostos de um mesmo átimo extremo, o vencimento.
Por decorrência, o advento do vencimento desencadeia oneração da obrigação
tributária, ao fixar, automaticamente, o momento da incidência dos juros e das
multas. Em vista disso, Sacha Calmon186 critica o art. 160, que deveria remeter à lei
ordinária – não à legislação tributária – o estabelecimento do vencimento do crédito
tributário, sob pena do quantum total da obrigação se homiziar, via extroversa, ao
alvedrio de atos administrativos infralegais.
A faculdade aberta aos atos infralegais, pelo art. 160, é inaplicável aos
lançamentos por homologação. Nessas hipóteses, a lei prevê, de antemão, o prazo
antecipado do pagamento. Ao invés do vencimento antecipado, na prática existe o
186
COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 8ª ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2005, p. 823. Apesar da crítica, a jurisprudência é tranqüila quanto à possibilidade da fixação do prazo
de vencimento (tempo) da obrigação via atos legislativos infralegais.
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pagamento antecipado à própria constituição do crédito – artificialismo dogmatizado
pelo sistema do Código.
1.1.3. Imputação do pagamento
Na hipótese da existência simultânea de vários débitos latentes, do
mesmo sujeito passivo para com único sujeito ativo da obrigação, o CTN estabelece
regras de imputação do pagamento (art. 163). Trata-se de instituto de atribuição do
adimplemento, instituindo escala de prejudicialidade dos saldos a serem resolvidos
em proporção direta à melhor providência arrecadatória do Fisco. O Código
determina quatro critérios: (a) em primeiro, o inciso I positiva paradigma de cunho
pessoal; (b) o inciso II estabelece ordem de vinculatividade, ou não, dos tributos aos
quais se refere; (c) a seguir, o inciso III coteja os prazos de prescrição/caducificação
e, por último, (d) o inciso IV fixa prelação em virtude do quantum das obrigações
pendentes.
A imputação de pagamento do direito tributário é determinada pela
autoridade administrativa. Situação diversa daquela do direito civil (art. 352, do CC),
na qual atribui-se ao devedor o privilégio de eleger a ordem de imputação do
pagamento. Entretanto, na prática, direito civil e tributário aproximam-se, à vista da
maciça intermediação dos mecanismos bancários nos trâmites contemporâneos.
Tornou-se cada vez mais rara a utilização da gradação atributiva predisposta187
pelas regras de imputação do pagamento. Atualmente, a grande parcela dos tributos
(bem como das dívidas civis e consumeiristas) é adimplida através de guias
eletrônicas, muitas das quais são retiradas pela internet, com acessibilidade a
códigos de barras, numéricos, senhas, e outras representações, que resultam na
exclusão contingencial da imputação.
1.2. Pagamentos especiais
O Código Tributário Nacional, diretamente, elenca hipóteses peculiares
do adimplemento. Pela subordinação da extinção da obrigação a determinados
requisitos legais específicos, esses casos merecem consideração particularizada.
1.2.1. Pagamento antecipado e homologação do lançamento
Diversos tributos ostentam sistemática de adimplemento subordinada a
ato complexo, porque intersubjetivo: de um lado, o sujeito passivo efetua o
recolhimento dos valores, nos moldes objetivos e espaço-temporalmente delineados;
em seguida, a entidade tributante fiscaliza essa atividade satisfativa, dispondo do 187
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 23ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 533.
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prazo de cinco anos para retificar, ou não, os limites do adimplemento efetuado (art.
150, §4º, do CTN). No caso do sujeito ativo permanecer inerte, no lustro legal,
reputa-se tacitamente aprovado o pagamento auferido.
Com efeito, verifica-se um ato-fato de pagamento, como em qualquer
outra espécie genérica. A peculiaridade é que a própria lei, de antemão, dispensa o
acertamento vinculado e formal instrumentalizado pelo lançamento, possibilitando ao
sujeito passivo a autonomia de calcular o respectivo débito e efetuar o
adimplemento. Para o mister retificador, o sistema estabelece prazo peremptório. Na
verdade, o ‘lançamento por homologação’ ou ‘pagamento antecipado e
homologação do lançamento’ configuram símbolos linguísticos imputados à
realidade do pagamento sem anterior lançamento. O Fisco transfere a
responsabilidade de apurar o montante do crédito ao sujeito passivo, face à
tremenda carga burocrática de crescentes demandas administrativas. Se
homologação existe – porque, quase sempre, homologa-se tacitamente, pela inércia
–, ela é transparente, e apenas chancela um pagamento sem a interferência do
sujeito ativo. Na prática, o fenômeno ratifica o pagamento enquanto extintiva não do
crédito – até então inexistente, porque ausente um lançamento –, mas da própria
obrigação188.
Versa o art. 150, §1º, do CTN: “O pagamento antecipado pelo obrigado
nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior
homologação do lançamento”. Em primeiro lugar, seria falacioso imaginar ‘condição’
quando, na verdade, a homologação (expressa ou tácita), por obrigação ex lege,
cuida de um ‘termo’ – futuro e certo. Além dessa impropriedade técnica, insta
lembrar ser incompatível a um ato-fato jurídico – pagamento – a aposição de ‘termo’
ou de ‘condição’, categorias eficaciais típicas do negócio jurídico189. Arrepiando a
teoria do direito, meramente à vista da sintaxe normativa (atécnica), o Código
formula axiomas disjuntivos do sistema jurídico global. Críticas à parte, significativa
parcela da esquematização tributária brasileira organiza-se no artificialismo
dogmático da homologação do pagamento.
1.2.2. Conversão do depósito em renda
Na pendência de celeuma administrativa ou judicial entre Fisco e
sujeito passivo, não raro, este último efetua o depósito integral do tributo discutido
para a finalidade de suspensão do crédito tributário (art. 151, II, do CTN). Ao cabo
do procedimento, havendo decisão favorável ao devedor, devolve-se-lhe o
188
DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Manual de direito tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 316. 189
Sacha Calmon formula semelhante crítica, op. cit., p. 828. Entretanto, não distingue a ‘condição’ do
‘termo’ e, contrariamente ao presente entendimento, cuida do pagamento como ato jurídico estrito senso, não
ato-fato jurídico.
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numerário caucionado; em contrário, se a decisão beneficiar a Fazenda, o depósito
inicialmente efetuado é convertido em renda, com a decorrente extinção total (ou
parcial) da obrigação tributária190.
Impende asseverar que o depósito pode, ou não, instrumentalizar-se
para o fim de suspender a exigibilidade do crédito tributário. Quando interposto
recurso administrativo, pelo simples fato do recurso, já existe a suspensão da
exigibilidade (art. 151, III, do CTN). Logo, nesses casos, o depósito é um plus à
suspensão do crédito, de antemão operacionalizada pelo recurso administrativo –
ele é efetuado somente para a finalidade de evitar atualização monetária da dívida.
De similar racionalidade, quando se contesta a relação tributária na esfera do poder
Judiciário, o depósito pode, ou não, apenas elidir a correção como também
suspender a exigibilidade do crédito, a depender da suspensão deferida (ou não) via
tutela antecipatória (art. 151, V, do CTN).
Em ambas as contendas (judicial e administrativa), o valor pecuniário
depositado sujeitar-se-á à conversibilidade em renda191, a depender da sorte no
litígio. Acontece que as recentes Leis Federais 9.703/98192, 10.819/03 e 11.429/06,
determinam o imediato repasse dos depósitos à conta do Tesouro,
desburocratizando a disponibilização do dinheiro à Fazenda. Ou seja, referidas
normas impõem uma espécie de conversão automática dos depósitos em renda,
sem que o dinheiro permaneça em ‘limbos’ administrativo/judicial. Apenas nos casos
de repetição (devolução) ao sujeito passivo, quando ele se sagra vencedor no
certame (secundum eventum litis), observa-se privilégio restitutivo.
As indigitadas leis conferem efetividade aos processos, ao regrarem
peculiar ‘solve et repete’ – primeiro converte-se em renda o depósito e, a depender
do resultado, restitui-se o valor, ou se deixa como está (convertido). Em termos de
processo civil, elas visam a um instrumentalismo substancial – ou melhor,
formalismo-valorativo –, dispensando eventual pedido reconvencional da Fazenda,
ou discussão específica em ações de impugnação autônomas, como nos embargos
à execução. A própria Lei 6.830/80, no seu art. 32, §2º, estabelece diretriz para
imediata conversão do depósito em renda. Deveras, segundo Sacha Calmon193, a
conversão do depósito em renda é reles ‘forma de pagar’, apenas diferida no tempo
por ocasião do depósito e da chancela no decorrer de algum expediente
190
Obviamente, as duas situações podem acontecer – devolução e conversão do depósito em renda – , no
caso da parcial procedência da pretensão. Pela natural fracionabilidade das dívidas de valor, parte do dinheiro
soluciona a dívida e outro tanto é revertido ao depositante, o sujeito passivo. Imperiosa é a demarcação que a
conversão do depósito em renda efetua-se secundum eventum litis. 191
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 23ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 553. 192
À conta da Caixa Econômica, o numerário permanece em situação provisória, que se consolida com o
trânsito em julgado. 193
COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. A obrigação tributária – nascimento e morte – a transação como
forma de extinção do crédito tributário. In: Cadernos de direito tributário, n. 62, 1993, p. 71.
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administrativo ou judicial. Daí, inclusive assegura maiores garantias que o
pagamento simples.
Essa realidade instrumentalista é reconhecida pelo STJ, ao converter
em renda os depósitos efetuados no bojo de ações judiciais extintas, inclusive, sem
julgamento do mérito, in verbis: “Almeja-se definir se seria possível o levantamento
do depósito efetuado para os fins do art. 151, II, do CTN, no caso em que o
processo é extinto sem o julgamento de mérito. O Min. Relator destacou que essa
questão já foi enfrentada em diversas ocasiões neste Superior Tribunal, para o qual
o depósito judicial efetuado para suspender a exigibilidade do crédito tributário é
feito também em garantia da Fazenda e só pode ser levantado pelo depositante
após sentença final transitada em julgado em seu favor, nos termos do consignado
no art. 32 da Lei n. 6.830/1980. O cumprimento da obrigação tributária só pode ser
excluído por força de lei ou suspenso de acordo com o que determina o art. 151 do
CTN. Fora desse contexto, o contribuinte está obrigado a recolher o tributo. No caso
de o devedor pretender discutir a obrigação tributária em juízo, permite a lei que se
faça o depósito integral da quantia devida para que seja suspensa a exigibilidade.
Se a ação intentada, por qualquer motivo, resultar sem êxito, deve o depósito ser
convertido em renda da Fazenda Pública. Essa é a interpretação que deve
prevalecer. O depósito é simples garantia impeditiva do fisco para agilizar a
cobrança judicial da dívida em face da instauração de litígio sobre a legalidade de
sua exigência. Extinto o processo sem exame do mérito contra o contribuinte, tem-se
uma decisão desfavorável. O passo seguinte, após o trânsito em julgado, é o
recolhimento do tributo. Com esse entendimento, a Seção, ao prosseguir o
julgamento, por maioria, conheceu dos embargos e deu-lhes provimento.” (EREsp
215.589-RJ, Rel. Min. José Delgado, julgado em 12/9/2007).
1.2.3. Consignação em pagamento
O pagamento é ato-fato jurídico. Portanto, reunidos os pressupostos
legais que permitam a extinção da dívida, nasce ao devedor o direito de realizar o
débito. Também pudera, o adimplemento soluciona e libera o solvens da obrigação,
sufragando causa de evitação da perenidade das relações, por questões óbvias de
segurança jurídica e da própria garantia da dignidade do sujeito passivo. Pode-se
inferir que, ao pagamento, além do aspecto negativo debitório, reserva-se intrínseco
direito de liberação, razão pela qual Pontes de Miranda194 denomina a imputação de
facilitação do adimplemento.
Consignar em pagamento significa efetivar ‘oferta real’ da prestação,
que no direito tributário operacionaliza-se mediante o depósito judicial do tributo
devido. O art. 164, do CTN, estabelece três hipóteses que se reputa indevido o não 194
Op. cit., p. 192.
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recebimento do débito pelo Fisco, motivos exemplificativos suficientes a fomentar a
ação consignatória. Vale referir: (a) a subordinação do pagamento a outro crédito ou
a diversa obrigação, distinta da que se propõe a pagamento, violando o caráter
heterônomo da obrigação; (b) vinculação do adimplemento a cumprimento de
exigência administrativa sem fundamento, o que denomino “coerção indireta
imprópria, ou extroversa”; (c) e a bitributação.
Em termos processuais, saliento que a demanda195 de consignação
segue o rito previsto no Código de Processo Civil (arts. 890 a 900) e desenvolve-se
em dois módulos: primeiro, com o depósito do valor reputado devido pelo sujeito
passivo, situação a ensejar a suspensão do crédito tributário (art. 151, II, do CPC) –
o depósito chega é condição da ação consignatória; a seguir, com a procedência do
pedido consignatório, extingue-se a obrigação pela conversão do depósito em renda
(ou melhor, fulmina-se o ‘crédito’ tributário, na terminologia do CTN)196. Em última
análise, o julgamento procedente da consignatória reflete a causa extintiva acima
comentada – conversão do depósito em renda. Rejeitada a pretensão consignatória,
o montante pode ser cobrado nos mesmos autos com juros de mora, correção
monetária e as penalidades eventualmente cabíveis (art. 164, §2º, do CTN) – face o
caráter dúplice da tutela declaratória do valor do débito (faltante, ou quitado).
O Código define o caractere anímico da consignação. Quando o sujeito
passivo efetua depósito em ação judicial qualquer, para a finalidade da discussão da
relação obrigacional, inexiste intenção de adimplir197. De outro lado, a intenção do
195
Certamente que a demanda consignatória pode se cumular a outros objetos, como a declaração de
inexistência total ou parcial da relação tributária. Nesse caso, mister adequação procedimental, observada a
ampla defesa e o contraditório sem olvidar, contudo, do princípio da efetividade lançado por aspectos da ação
especial. Ver MAYA, Rômulo. A ação de consignação em matéria tributária. In A abstração do lançamento e a
execução fiscal. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2001, p. 51-60. 196
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 2ª ed, 3ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 857. 197
A consignatória é meio de pagamento. Por isso que o STJ reputa inadequada, por ausente interesse
processual de agir, o manejo da ação de consignação para a finalidade de angariar parcelamento do débito
tributário, consoante se verifica de trechos do Resp 976570/RS, Rel. Min. José Delgado, DJ09/10/07:
“No que se refere ao cabimento de ação de consignação ao caso em comento, confira-se:
- O depósito em consignação é modo de extinção da obrigação, com força de pagamento, e a
correspondente ação consignatória tem por finalidade ver atendido o direito – material – do devedor de liberar-se
da obrigação e de obter quitação. Trata-se de ação eminentemente declaratória: declara-se que o depósito
oferecido liberou o autor da respectiva obrigação.
- Sendo a intenção do devedor, no caso concreto, não a de pagar o tributo, no montante que entende
devido, mas sim a de obter moratória, por meio de parcelamento em 240 meses, é inviável a utilização da via
consignatória, que não se presta à obtenção de provimento constitutivo, modificador de um dos elementos
conformadores da obrigação (prazo).
- Ocorre, porém, que esta Corte pacificou entendimento segundo o qual "o deferimento do parcelamento
do crédito fiscal subordina-se ao cumprimento das condições legalmente previstas. Dessarte, afigura-se
inadequada a via da ação de consignação em pagamento, cujo escopo é a desoneração do devedor, mediante o
depósito do valor correspondente ao crédito, e não via oblíqua à obtenção de favor fiscal em burla à legislação de
regência".
-. A ação consignatória, que é de natureza meramente declaratória, tem por escopo tão-somente liberar o
devedor de sua obrigação, com a quitação de seu débito, por meio de depósito judicial, quando o
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consignante, desde o primeiro momento, manifesta-se no sentido da solução da
dívida (art. 164, §1º, do CTN). Todavia, refere Luciano Amaro198 que, mesmo na
pendência da ação de consignação, há suspensão da exigibilidade da obrigação, à
medida da disponibilização do valor, em latência, para salvaguarda da relação
jurídica (art. 163, §2º, do CTN). Isso é, pragmaticamente, fenece a distinção
engendrada animicamente.
Em termos do procedimento199, pode-se questionar a possibilidade do
depósito extrajudicial, veiculado através do sistema bancário, à conta do suposto
credor (art. 890, §1º, do CPC). Luiz Felipe Difini sustenta incompatibilidade desse
mecanismo em direito tributário, pelo fato do CTN ser lei especial na matéria e
referir-se, univocamente, à consignação judicial (art. 164, caput). Também refere a
impropriedade da comunicação da entidade tributante via carta AR. Argumentos
veementes, porém, não definitivos, haja vista que o procedimento molda-se à feição
dos sujeitos e nada obsta que, formulado depósito bancário, cite-se o Fisco pela
modalidade pessoal. Quando convém, a Administração é a primeira a utilizar-se do
sistema bancário. Portanto, não é de todo estranho o manejo de alguns mecanismos
do procedimento especial do CPC. Entretanto, à vista crescente facilitação operativa
instrumentalizada pelos Tribunais em favor dos depósitos judiciais, a discussão
perde muito do sentido. Mesmo no rito clássico, a consignatória ainda guarda
procedimento expedito.
2. Situações heterotípicas
O Código Tributário Nacional não exaspera a regulamentação de todos
fenômenos jurídicos por ele previsto. Justamente pos enquadrar-se como espécie de
lex legum, determinadas situações diferem-se à normatização legal diversa dessa
lei-base, razão pela qual sistematizo tais institutos como heterotípicos. A
credor injustificadamente se recusa a fazê-lo. Na seara fiscal é servil ao devedor para exercer o direito
de pagar o que deve, em observância às disposições legais pertinentes.
-. O deferimento do parcelamento do crédito fiscal subordina-se ao cumprimento das condições
legalmente previstas. Dessarte, afigura-se inadequada a via da ação de consignação em pagamento, cujo escopo é
a desoneração do devedor, mediante o depósito do valor correspondente ao crédito, e não via oblíqua à obtenção
de favor fiscal em burla à legislação de regência.
-. A ação de consignação em pagamento, prevista no art. 164 do CTN, de índole nitidamente
declaratória, tem por escopo a extinção da obrigação com o pagamento devido, visando a liberação do devedor,
quando satisfeita a dívida em sua integralidade.
-. Hipótese dos autos em que se busca a utilização da ação consignatória para obter parcelamento de
débito tributário, desvirtuando, assim, o instrumento processual em tela.” 198
AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 395. 199
No presente estudo, foquei a problemática nos aspectos materiais da consignação, no sentido de
modalidade extintiva do crédito tributário. Obviamente, em termos processuais, outras tantas angústias merecem
aprofundamento, como os efeitos em que recebida a apelação. Ver MACHADO, Hugo de Brito. Efeito
suspensivo da apelação na ação de consignação em pagamento de tributo. In Revista Dialética de Direito
Tributário, n. 176, 2010, p. 89-92.
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heterotipicidade transcende os “tipos” do CTN, em virtude dos respectivos suportes
fáticos repercutirem-se a partir de regras transcodificadas.
Quanto ao adimplemento, divido as situações heterotípicas em três
forças: (a) a extinção indireta da obrigação tributária; (b) a repetição do indébito e (c)
a extinção da punibilidade pelo pagamento nos crimes tributários.
2.1. Extinção indireta da obrigação tributária
No que pertine ao adimplemento – solução e liberação da dívida –, a
extinção direta da obrigação tributária perfaz-se pelo pagamento e seus
desdobramentos acima ilustrados. Ao comentar a extinção indireta, a densidade
normativa reclama regulamentação legal diversa do CTN. Também pudera, a
extinção das obrigações não é matéria “taxativa” do Código e, ademais, as próprias
entitades públicas podem/devem regulamentar as modalidades satisfativas dos
respectivos créditos – mecanismo de eficiência e racionalidade orçamentário-
administrativa. Por agora, estudo a dação em pagamento, a transação e a
compensação, vazados genericamente no CTN.
2.1.1. Dação em pagamento
A Lei Complementar 104/01 acrescentou a modalidade dação em
pagamento de bens imóveis ao art. 156, XI, do CTN. Consoante defendido retro, a
matéria poderia ser objeto da própria legislação ordinária da entidade tributante. De
qualquer sorte, expressamente, o Código repercutiu aplicabilidade do instituto à
“forma e condições estabelecidas em lei”. Logo, não se trata de regra auto-aplicável,
carecendo de lei ordinária do respectivo sujeito ativo200 para regulamentar os casos
e, principalmente, a modadlidade de avaliação dos bens admitidos pelo Fisco aliud
pro alio. A questão essencial, refere Hugo de Brito201, diz respeito ao preço do bem
imóvel a ser recebido em pagamento, uma vez que a Fazenda, enquanto
Administração Pública, não se deve olvidar das normas licitatórias pertinentes –
afinal, a dação equivaleria a uma compra e venda (art. 356, do CC).
À míngua do art. 24, da LEF, que permite adjudicação de bens
penhorados, não raro, a prática do foro somatiza empeços burocráticos. Deveras,
em país continental, as diveras instruções normativas, ordens de serviços e tantas
outras disposições endeusadas refutam esperada autonomia dos advogados
200
Ao adstringir a possibilidade de dação somente em relação aos bens imóveis, arrepiando competência
legislativa do ente tributante o fazer via lei ordinária, o inciso XI, do art. 156, fomenta desconfiança acerca da
própria constitucionalidade. Ver ICHIHARA, Yoshiaki. Extinção do crédito tributário – dação em pagamento. In
Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 41, 2001, p. 190-197. 201
Curso de direito tributário. 31ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 241
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públicos (AGU, PFN e Procuradoria Autárquica Federal, no plano nacional) para
instrumentalizar a adjudicação, apoucando a previsão legal.
2.1.2. Transação
No Código Civil de 1916, a transação (arts. 1025 a 1036) configurava
modalidade especial de extinção da obrigação sem o pagamento propriamente dito,
constante o título “II – Dos efeitos das obrigações”. A quase centenária topologia
civilista homiziava o conteúdo da transação, transmutando a natureza jurídica fulcral
do instituto – que na realidade é negócio jurídico –, a mero ato, ou a ato-fato
jurídico. Diversamente, o Novo Código Civil, de 2002, retificou a impropriedade e
reposicionou a transação, que agora figura como espécie de negócio jurídico
contratual (arts. 840 a 850). Perspectiva de antemão vislumbrada pelo CTN, cujo art.
171 faculta, nos termos e condições estabelecidas pela lei, aos sujeitos ativo e
passivo da obrigação tributária, celebrarem pacto para terminação de litígio.
O sistema tributário não prevê a transação preventiva que, ictu oculi,
evitaria a obrigação em seu nascedouro. Unicamente, positivou-se a transação
terminativa, observado o seguinte pressuposto: existência de litígio entre Fisco e
sujeito passivo – seja a celeuma de cunho judicial, ou administrativo. E os critérios
cotejados pelo administrador, ao franquear a transação, explicitam-se no art. 172, I a
IV, do CTN.
Exemplos corriqueiros de transações verifica-se quando a Fazenda
confere desconto para o sujeito passivo que antecipa o pagamento de alguns
tributos, como as famosas parcelas únicas do IPTU e do IPVA: a fração devida do
tributo efetivamente recolhida extingue-se pelo pagamento, enquanto o montante
descontado, em suposto benefício ao sujeito passivo que antecipa o adimplemento,
será extinto pela transação202. Pragmatismo que aproxima a transação – sopesada a
natureza negocial – do pagamento propriamente dito, em fenômeno acenado por
Paulo de Barros Carvalho: “curioso verificar que a extinção da obrigação, quando
ocorre a figura transacional, não se dá, propriamente, por força das concessões
recíprocas, e sim do pagamento. O processo de transação tão somente prepara o
caminho para que o sujeito passivo quite sua dívida, promovendo o
desaparecimento do vínculo. Tão singela meditação já compromete o instituto como
forma extintiva de obrigações”203. Penso não chegar a “comprometer” a transação no
sentido de negócio jurídico extintivo da obrigaçaõ tributária – é abissal a eficácia
jurídica do negócio transacional. Agora, pragmaticamente, faculta-se espaço a
similar crítica.
202
Exemplos referidos por Eduardo Sabbag. Manual de Direito Tributário. 2ª ed, 3ª tiragem. São Paulo:
Saraiva, 2010, p. 855. 203
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 23ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 540.
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2.1.3. Compensação
Quando determinado sujeito é credor e devedor, ao mesmo tempo, de
outra pessoa, imaginável o encontro de contas para sinalagmática extinção das
relações obrigacionais dali advindas. Necessária a observância de certos requisitos,
como a exigibilidade (vencimento) e liquidez das dívidas, bem como a fungibilidade
delas entre si (arts. 368 e 369, do CC). O CTN ampliou a possibilidade
compensatória prevista inicialmente no direito civil, ao preconizar a extinção de
dívidas vincendas, com respecitivo ajuste proporcional do valor em compensação,
ao índice deflacionário de 1% ao mês (art. 170, §1º, do CTN). Ou seja, o
pressuposto da “exigibilidade” da dívida, em direito tributário, mitigou-se
dogmaticamente.
O sistema tributário relega à lei especial a normatização da
compensação. Cabe à lei, automaticamente deferir o encontro de contas ou
autorizar, mediante ato administrativo vinculado, que a Administração efetue a
extinção das dívidas. A possibilidade do automatismo legal ensejou o advento da
MP75/2002 que, prontamente à promulgação do então Novo Código Civil realeano
(início dos anos 2000), revogou o art. 374 daquele NCC – este dispositivo dispunha
expressamente da compensação em direito tributário, não a vinculando a limitações
de qualquer ordem.
Diuturnamente, a Fazenda refuta a pretensão compensatória, alegando
que os créditos fiscais seriam “créditos de todos”, impassíveis da extinção virtual.
Opaca fundamentação porque, se os créditos são de “todo”, os débitos também o
são de “todos”, tanto por isonomia como pela solidariedade social. Hugo de Brito204
elenca percuciente relação axio-deontológica a sufragar prerrogativas
compensacionais, dentre os quais: o primado da cidadania, da justiça, da isonomia,
a proteção da propriedade e a salvaguarda da própria moralidade pública.
Requisitos que vinculam todas as facetas de atuação estatal – seja administrativa ou
legislativa.
Ademais, quando a lei atribuir à Administração o exame, “em cada
caso”, da compensação, obviamente tem-se uma competência vinculada. As
condições e garantias quiçá exigidas do sujeito passivo hão de vir, de antemão,
expressas nas regras legais pertinentes. Se faculdade existe para o encontro de
contas, tal discrição é apenas do sujeito passivo, como observado no verbo
“poderá”, do art. 66205, da Lei 8.383/91. Ademais, nesses tempos “líquidos” nos
204
Curso de direito tributário. 31ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 222. 205
“Art. 66. Nos casos de pagamento indevido ou a maior de tributos, contribuições federais, inclusive
previdenciárias, e receitas patrimoniais, mesmo quando resultante de reforma, anulação, revogação ou rescisão
de decisão condenatória, o contribuinte poderá efetuar a compensação desse valor no recolhimento de
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quais os trâmites sociais acham-se cada vez mais dinamizados (relativizados),
natural o crescente remetimento do acertamento das contas ao próprio particular,
sujeitando-o à ulterior homologação institucional. Disposições como as previstas em
tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal (vide art. 74206, da Lei
9.430/96, com a redação da Lei 10.637/02) mitigam a burocracia e agilizam o
encontro dos valores fungíveis entre si.
Impende referir que as duas leis reguladoras da compensação no plano
federal – as leis 8.383/91 e 9.430/96 – não são incompatíveis, mas se coordenam. A
primeira regula hipótese compensatória independente de autorização do Fisco, na
qual o sujeito passivo pode desencadear a compensação de tributos da mesma
espécie. Pela última norma, mais recente, possibilita-se a compensação de
quaisquer créditos (mesmo os não tributários), dependendo de requerimento e
aprovação da Receita – nos termos vinculados, conferiu-se complexidade
interinstitucional à compensação: lei + ato administrativo.
A LC 104/01 inseriu o art. 170A, no bojo do CTN, impondo limitação à
compensação deferida em liminar ou em antecipação de tutela jurisdicional.
Somente após o trânsito em julgado possibilita-se o encontro das contas. Soçobrada
evental discussão acerca da constitucionalidade dessa restrição, certo é que a tutela
jurisdicional provisória pode suspender a exigibilidade do crédito, resguardando o
direito do sujeito passivo para, ao cabo do processo, lograr a compensação, passível
do deferimento em demandas declaratórias e, inclusive, via mandado de
segurança207 (Súmula 213, do STJ). Observada tal fungibilidade instrumentalista, em
última análise efetivadora do art. 571, parágrafo 2º, do CPC, merece reflexão a
tendência ortodoxa de vedação da compensação nos embargos à execução fiscal,
face a interpretação literal do art. 16, parágrafo 3º, da LEF.
2.1.3.1. Aproveitamento de créditos em precatórios judiciais
importância correspondente a período subsequente. §1º. A compensação só poderá ser efetuada entre tributos,
contribuições e receitas da mesma espécie. §2º. É facultado ao contribuinte optar pelo pedido de restituição. §3º.
A compensação ou restituição será efetuada pelo valor do tributo ou contribuição ou receita corrigido
monetariamente com base na variação da UFIR. § 4º. As Secretarias da Receita Federal e do Patrimônio da
União e o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS expedirão as instruções necessárias ao cumprimento do
disposto neste artigo.” 206
“Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a
tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de
ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e
contribuições administrados por aquele Órgão. §1º. A compensação de que trata o caput será efetuada mediante a
entrega, pelo sujeito passivo, de declaração na qual constarão informações relativas aos créditos utilizados e aos
respectivos débitos compensados. §2º. A compensação declarada à Secretaria da Receita Federal extingue o
crédito tributário, sob condição resolutória de sua ulterior homologação.” 207
A teoria quinária das ações (utilizo-me da classificação das ações, consoante a tese pontinana-ovidiana,
apesar de optar não pela diferença entre ações, mas acerca das formas de tutela juridisdicional) rechaçou
conceito monolófilo das tutelas jurisdicionais. Mesmo em mandado de segurança, existe rescaldo declaratório a
ensejar compensação.
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Delimitado o suporte jurídico da compensação, remanesce a discussão
sobre a possibilidade de o sujeito passivo aproveitar créditos de precatórios judiciais
para realizar o encontro das contas. Quanto à hipótese dos saldos de precatórios a
serem pagos em parcelamento de até dez anos, consoante o art. 78, caput, do
ADCT, acrescido pela EC30/2000, a situação está pacificada na letra da
Constituição208. Tratam-se daqueles precatórios não alimentares e pendentes de
pagamento até a data da promulgação da Emenda, ou decorrentes de ações
judiciais ajuizadas até 31-12-1999, exceto os de pequeno valor, cuja previsão do art.
78, parágrafo 2º, do ADCT, dispõe: ‘As prestações anuais a que se refere o caput
deste artigo terão, se não liquidadas até o final do exercício a que se referem, poder
liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora’.
A celeuma remanesce nos demais casos. Para sufragar a
impossibilidade da utilização do precatório judicial para extinção do crédito tributário
via compensação, existem duas ordens de fundamentos: ictu oculi, argúi-se a falta
de lei específica da entidade pública tributante, a permitir tal modalidade resolutória
da obrigação e, também, chega-se a sustentar a quebra da ordem cronológica dos
pagamentos na modalidade dos precatórios.
Com efeito, o pagamento dos débitos pela ordem de apresentação dos
precatórios é medida privilegiada no benefício da Fazenda, embora não absoluta,
como sói acontece a todas prerrogativas constitucionais. Em determinadas
hipóteses, a própria Constituição mitiga a suposta inflexão cronológica, quebrando a
ordem genérica da apresentação, utilizando-se dos critérios do montante devido (daí
exsurgiu a requisição de pequeno valor) ou da natureza dos débitos (precatórios de
natureza alimentar, vide art. 100, caput, da CRFB). A peculiaridade de o sujeito ativo
tributário estar em débito para com o mesmo sujeito passivo da relação tributária,
ainda atrasando os prazos de adimplemento estipulados na CRFB, não evidencia
nova hipótese de flexibilização da cronologia precatorial? Além disso, consoante
Kiyoshi Harada209, a leitura do sistema Constitucional poderia olvidar do art. 78,
parágrafo segundo, do ADCT, adstringindo visão de holofote ao art. 100, caput, da
CRFB? Certamente, pela natureza economicista, eficientista e solidarista da
compensação, segundo perspectiva axio-deontológica de Hugo de Brito Machado210,
208
Vale ressaltar que a possibilidade aventada utiliza-se dos precatórios ‘vencidos’, ou seja, cujo prazo
constitucional para pagamento fora excedido pela mora da respectiva Fazenda. Ver CARVALHO, Luís Ricardo
Fernandes de. O precatório e sua compensação tributária. In Revista dos Tribunais, 834, 2005, p. 143-154,
passim. 209
O autor denomina ‘dação em pagamento’, a oferta do crédito em precatório ao sujeito ativo tributário,
defendendo tal possibilidade extintiva. Ver HARADA, Kiyoshi. Precatório judicial – compensação com crédito
tributário quebra a ordem cronológica? In Repertório de jurisprudência IOB, n. 15/2009, p. 520-521. 210
Curso de direito tributário. 31ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 222.
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nada justificaria tratamento sobremaneira diferenciado ao Fisco, em absoluto
detrimento dos cidadãos – ora credores de precatórios vencidos.
Grassa o entendimento da aplicabilidade imediata e potestativa do
indigitado art. 78, do ADCT que, inclusive, dispõe de privilégio hierárquico
sobrepujante ao elenco infraconstitucional do CTN. Assim, os precatórios judiciais –
créditos contra a Fazenda – constituem representação de pecúnia passíveis de
serem cedidos (art. 286, do CC), oferecidos à penhora (art. 11, I, não VIII, da LEF),
ou garantidos em depósito (art. 151, II, do CTN) para suspensão da exigibilidade do
crédito tributário. Mais: o precatório oferecido em juízo presta-se a angariar Certidão
Positiva com Efeitos de Negativa, do art. 206, do CTN, à medida que título simbólico
da pecúnia controlada pela própria entidade mantenedora do sistema financeira – a
macroinstituição do Estado211. Incoerente, por violação da segurança jurídica, da
boa-fé objetiva e da previsibilidade inerente ao Estado Constitucional, que este
mesmo Estado refute validade ao mecanismo por ele institucionalizado.
A temática assume relevos de dramaticidade àqueles que insistem em
negaciar a faceta compensatória do precatório judicial (inclusive os não vencidos),
quando observada a literalidade do novo parágrafo 9º, do art. 100, da CRFB, na
redação da EC62/09. O dispositivo é auto-explicativo – afasta norma
regulamentadora, explicitando-se por auto-aplicável, e determina a compensação
em benefício da Fazenda Pública – ao regrar: “No momento da expedição dos
precatórios, independentemente de regulamentação, deles deverá ser abatido, a
título de compensação, valor correspondente aos débitos líquidos e certos, inscritos
ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública
devedora, incluídas parcelas vincendas de parcelamentos, ressalvados aqueles cuja
execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial”.
Particularmente, para defender essa compensabilidade, sustentaria
fundamentos atinentes à ‘espiral hermenêutica’, na perspectiva do norte
interpretativo inaugurado pelo art. 78, do ADCT, bem como aspectos da natureza
jurídica não apenas da compensação, mas do próprio pagamento – ato-fato jurídico
por excelência. Entretanto, retrocitado parágrafo nono do art. 100, da CRFB,
arrefeceram-me o pretenso ônus argumentativo. Ora, notória a força do ne venire
contra factum proprium212, que infirma qualquer tentativa de comportamento
paradoxal à atitude anterior do sujeito ativo. Portanto, se a compensação favorece o
Estado, óbvio também favorecer ao cidadão. A compensação é ex lege, tutelada em
211
SILVEIRA, Vladmir Oliveira da; CONTIPELLI, Ernani. Pagamento de tributos com precatórios
judiciais em mora da fazenda pública (parecer). In Revista Forense, n. 397, 2008, p. 379-386, passim. 212
Vale referir: o cenário natural da boa-fé objetiva perfez-se no direito público, ao invés da retórica
pretensamente açambarcante dos civilistas que, submersos ao holofote napoleônico-francês (onde o ‘todo
processo codificado’ seria objeto do direito privado), incorreram no lapso de transmutar o público como
submisso do privado, legando-nos dificuldades operativas inerciais, como inflexão de diversos organismos do
direito tributário, por exemplo.
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pretensão declaratória, daí sua racionalidade sinalagmática, de caráter dúplice. Isso
transcende o jurídico, atine aos foros da “lógica”.
À vista da recente Lei 12.431/11, pode-se alvitrar requintes de
pacificação da possibilidade de compensar débitos tributários pela utilização de
precatórios judiciais. No Brasil, as mutações jurídicas seguem evoluções oriundas de
pressões institucionais: primeiro, a doutrina defendeu a compensação, com a
utilização dos precatórios vencidos; no segundo momento, com as naturais e
peculiares vacilações, a jurisprudência acolheu tal corrente, que fora parcialmente
positivada na CRFB, art. 100, §9º. Digo “parcialmente”, porque a Emenda
Constitucional somente lembrou dos precatórios vencidos. Agora, a matéria granjeou
normatividade (material e procedimental) específica, com o advento da Lei
12.431/11 – fez-se o gosto de alguns resistentes, que insistem em duvidar da força
normativa da Constituição e apegam-se à letra estrita das normas
infraconstitucionais. Não existe mais desculpa!
Assim como a indigitada EC, essa lei não se adstringe aos precatórios
vencidos, nos quais a compensação reportava-se à mora da Fazenda Pública. Para
ela, todos os precatórios expedidos pela União (e autarquias) devem observar a
possibilidade da compensação, inclusive havendo um contraditório preparatório para
requisição do precatório (art. 30, §3º), racionalizando-se o expediente como um todo.
Observadas as limitações materiais (art. 30, §2º), como a não utilização dos débitos
tributários com exigibilidade suspensa (salvo a suspensão via parcelamento),
instrumentaliza-se uma espécie de amortização do quantum a ser efetivamente
requisitado por precatório em benefício do sujeito passivo. Em uma palavra, isso
nada mais representa e especialização/detalhamento do princípio da “eficiência”
administrativa – está prevista no art. 37 da CRFB, mas sempre duvidam da
Constituição.
De plano, certamente os mais ortodoxos alegarão que a lei é federal e,
portanto, inaplicável aos débitos tributários dos Estados e dos Municípios. Essas
entidades se homizia(ria)m na (conveniente) ausência de legislação própria e
deslocam o “azar” da inércia ao calejado contribuinte. Todavia, necessário refletir
que a Lei 12.431/11213 estipula regras materiais e de processo civil. Fixou-se
213
Pela novidade da Lei, vale transcrever os artigos que precipuamente cuidam da temática: “Art. 30. A
compensação de débitos perante a Fazenda Pública Federal com créditos provenientes de precatórios, na forma
prevista nos §§ 9o e 10 do art. 100 da Constituição Federal, observará o disposto nesta Lei. § 1o Para efeitos da
compensação de que trata o caput, serão considerados os débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida
ativa da União, incluídos os débitos parcelados. § 2o O disposto no § 1o não se aplica a débitos cuja
exigibilidade esteja suspensa, ressalvado o parcelamento, ou cuja execução esteja suspensa em virtude do
recebimento de embargos do devedor com efeito suspensivo, ou em virtude de outra espécie de contestação
judicial que confira efeito suspensivo à execução. § 3o A Fazenda Pública Federal, antes da requisição do
precatório ao Tribunal, será intimada para responder, no prazo de 30 (trinta) dias, sobre eventual existência de
débitos do autor da ação, cujos valores poderão ser abatidos a título de compensação. § 4o A intimação de que
trata o § 3o será dirigida ao órgão responsável pela representação judicial da pessoa jurídica devedora do
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verdadeiro incidente de pré-adimplemento do precatório, observado o contraditório,
a possibilidade de impugnação e a decisão judicial sujeita a agravo de instrumento
(art. 34).
Referidos institutos – regrados pela Lei 12.431/11 – constituem espaço
do processo civil! Atine à tutela jurisdicional efetiva, tempestiva e adequada dos
direitos. Logo, cuida-se de matéria da competência privativa da União (art. 22, I, da
CRFB). Não se trata de mero “procedimento”, então sujeito à competência
concorrente dos entes públicos (art. 24, XI, da CRFB). Daí resulta o seguinte: a
natureza da Lei 12.431/11 é nacional, ao invés de meramente federal. Ela tocou o
princípio da eficiência, a questão da tutela jurisdicional e a racionalização dos
expedientes adimplitórios em aspecto global – tanto pela parte do Fisco (devedor do
precatório) quanto do sujeito passivo tributário (pretendente da compensação).
A compensação é via de mão dupla definida pela lei. No caso,
consignou-se vinculatividade, dever-poder ao Fisco. Inclusive, o encontro de contas
é reconhecido por intermédio da tutela declaratória (por isso, também deferida no
mandado de segurança)! Em vista disso, inadmiti-la (ou lhe criar empeços) é medida
ultrajada, no cotejo de uma estrutura pretensamente “gestora” de Administração
fazendária “eficientista”214.
2.2. Repetição do indébito
precatório na ação de execução e será feita por mandado, que conterá os dados do beneficiário do precatório, em
especial o nome e a respectiva inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Nacional da
Pessoa Jurídica (CNPJ). § 5o A informação prestada pela Fazenda Pública Federal deverá conter os dados
necessários para identificação dos débitos a serem compensados e para atualização dos valores pela contadoria
judicial. § 6o Somente poderão ser objeto da compensação de que trata este artigo os créditos e os débitos
oriundos da mesma pessoa jurídica devedora do precatório. Art. 31. Recebida a informação de que trata o § 3o
do art. 30 desta Lei, o juiz intimará o beneficiário do precatório para se manifestar em 15 (quinze) dias. § 1o A
impugnação do beneficiário deverá vir acompanhada de documentos que comprovem de plano suas alegações e
poderá versar exclusivamente sobre: I - erro aritmético do valor do débito a ser compensado; II - suspensão da
exigibilidade do débito, ressalvado o parcelamento; III - suspensão da execução, em virtude do recebimento de
embargos do devedor com efeito suspensivo ou em virtude de outra espécie de contestação judicial que confira
efeito suspensivo à execução; ou IV - extinção do débito. § 2o Outras exceções somente poderão ser arguidas
pelo beneficiário em ação autônoma. Art. 32. Apresentada a impugnação pelo beneficiário do precatório, o juiz
intimará, pessoalmente, mediante entrega dos autos com vista, o órgão responsável pela representação judicial da
pessoa jurídica devedora do precatório na ação de execução, para manifestação em 30 (trinta) dias. Art. 33. O
juiz proferirá decisão em 10 (dez) dias, restringindo-se a identificar eventuais débitos que não poderão ser
compensados, o montante que deverá ser submetido ao abatimento e o valor líquido do precatório. Parágrafo
único. O cálculo do juízo deverá considerar as deduções tributárias que serão retidas pela instituição
financeira. Art. 34. Da decisão mencionada no art. 33 desta Lei, caberá agravo de instrumento. (...) Art.
35. Antes do trânsito em julgado da decisão mencionada no art. 34 desta Lei, somente será admissível a
requisição ao Tribunal de precatório relativo à parte incontroversa da compensação. Art. 36. A compensação
operar-se-á no momento em que a decisão judicial que a determinou transitar em julgado, ficando sob condição
resolutória de ulterior disponibilização financeira do precatório.” 214
Os temas da “gestão” e da “eficiência” hão de serem enfrentadas no plano concreto, não apenas no
rescaldo semântico. A Lei dos Juizados Especiais Federais (10.259/00) e a Lei dos Juizados Especiais da
Fazenda Pública (12.153/09) trouxeram inovações ao sistema jurídico. Entretanto, não imprimiram autonomia
suficiente às respectivas Procuradorias Públicas para desenvolverem a tarefa transacional alvitrada.
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O título “pagamento indevido” epigrafado pelo CTN (arts. 165 a 169)
merece a crítica de Luciano Amaro215, uma vez que não somente o pagamento pode
receber a nota de “indevido”, como quaisquer outras modalidades de extinção da
obrigação tributária. Por exemplo, quando constatada a ocorrência de compensação,
conversão do depósito, ou inclusive se a decisão administrativa determinou anterior
adimplemento, uma vez constatada impropriedade dos requisitos definidores, tanto
do conteúdo da obrigação quanto da formalização do crédito tributário, verifica-se
caso passível da restituição.
Com efeito, independentemente da (ausência de) causa jurídica do
anterior adimplemento, à medida que identificada irregularidade na obrigação (ou no
crédito) tributária, impende a devolução do recolhido. Logo, a terminologia “repetição
do indébito” seria mais adequada apesar de, por questão dogmática, utilizar-me das
indigitadas expressões como sinônimas.
2.2.1. Natureza jurídica e requisitos
A repetição do indébito constitui espécie do gênero ‘enriquecimento
sem causa’. Sufragada em juízo de equidade, assegura-se ao solvens a
possibilidade de restituir-se da quantia inicialmente desembolsada, repristinando-se
as partes – devedor e credor – ao status quo ante da relação obrigacional. Uma vez
constatada a inexistência (sentido largo) da causa jurídica do adimplemento,
garante-se ao devedor a possibilidade de repetição – cuja natureza jurídica consiste
em direito formativo puro.
Caracterizando esses direitos potestativos, Chiovenda sintetiza: “A lei
concede a alguém o poder de influir com sua manifestação de vontade, sobre a
condição jurídica de outro, sem o concurso da vontade deste: (a) ou fazendo cessar
um direito ou um estado jurídico existente; (b) ou produzindo um novo direito, ou
estado ou efeito jurídico”216. São poderes exercitados mediante unívoca
manifestação de vontade do interessado que, por decorrência, submete o
interlocutor à solução jurídica preordenada pelo sistema normativo.
Chiovenda arremata: “São poderes puramente ideais, criados e
concebidos pela lei; e, pois que se apresentam como um bem, não há os excluir de
entre os direitos, como realmente não os exclui o senso comum e o uso jurídico. É
mera petição de princípio afirmar que não se pode imaginar um direito a que não
corresponda uma obrigação. Tampouco se pode recusar a autonomia de tais
poderes: o poder de fazer cessar um direito nada tem que ver com qualquer outro
215
AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 420. 216
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil, vol. I, 2ª Ed. Campinas: Bookseller,
2000, p. 30-31.
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direito, e o poder de constituir um direito não se confunde com um direito ainda
inexistente (nem sequer no estado de direito latente, vaga expressão despojada de
significação jurídica)”217.
Deveras, o adimplemento efetuado sem causa jurídica fenece por
consumação. O sistema jurídico não o guarnece. Pelo contrário, assegura o retorno
dessa situação contrária ao direito ao devido plano da juridicidade. Portanto, a
repetição constitui poder do solvens e, consequentemente, direito potestativo
submetido a prazo decadencial218.
Em resumo, adimplemento do indébito consiste na satisfação de
(suposta) dívida a ‘descoberto’. Natural que a repetição fundamente-se em dois
requisitos: (a) o adimplemento e (b) a ausência de causa jurídica a sufragar a
existência precedente da obrigação que se supôs extinguir – leia-se, inexistência de
causa jurídica.
No geral, os institutos do direito tributário dispensam a verificação do
conteúdo subjetivo das manifestações dos sujeitos obrigacionais. Também aqui no
indébito, ao invés do direito civil, torna-se despicienda o exame da vontade do
solvens que, na espécie, referir-se-ia à análise do “erro”219. Com efeito, o pagamento
de dívida inexistente não importa em ‘confissão de dívida’220. Mesmo que
importasse, o CTN explicita a solução restituitória “independentemente de prévio
protesto”, ainda no caso do pagamento espontâneo (art. 165). Fenomenologia
deflagrada pelo caráter heterônomo que disciplina tal relação obrigacional de direito
público.
Exemplificativamente, o art. 165 elenca três hipóteses passíveis da
restituição: (a) cobrança ou pagamento de tributo indevido; (b) equívoco na
identificação do sujeito passivo; (c) desfragmentação da decisão anterior que
determinou o adimplemento. Todas modalidades reportam-se a ausência de causa
jurídica sufragadora da suposta obrigação (ou crédito tributário). Apenas se
diferenciam em termos de critérios eleitos221. Nos casos, dívida não existiu, mas
houve singelo arremedo de débito. O inciso I, do art. 165, pertine à falta de causa
217
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil, vol. I, 2ª Ed. Campinas: Bookseller,
2000, p. 31-32. 218
Saliento a existência de respeitável corrente defensora da natureza prescricional do lapso à postulação
da repetição do indébito. Por todos, Hugo de Brito Machado, Curso de direito tributário. 31ª ed. São Paulo:
Malheiros, 2010, p. 218 219
A doutrina doméstica converge ao dispensar o ‘erro’ dentre os requisitos da repetição do indébito.
Contra, assumindo posição praticamente isolada, ver DANILEVICZ, Ígor. Extinção do crédito tributário. In
BERNI, Maurício Batista (org.). Direito tributário. Porto Alegre: Síntese, 2000, p. 99. 220
Mesmo que o pagamento fosse considerado ‘confissão de dívida’, face o vetor da legalidade, seria
cabível a restituição na ausência de causa jurídica. Ver ÁVILA, Alexandre Rossato da Silva. Curso de direito
tributário. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2005, p. 281. 221
Situação análoga à comentada quando da imputação do pagamento: para além das hipóteses legais, o
fator preponderante deve se deslocar aos critérios eleitos.
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material; o segundo, adstringe-se à ausência de causa pessoal; e o último,
açambarca o (des)critério do CTN, que disjunta conceitos de obrigação e crédito,
podendo a decisão reformada reportar-se tanto a um como a outra hipótese acima
diagnosticada. A decisão prevista no inciso III atine ao conteúdo da obrigação ou à
formalização do crédito, ensejando, em ambos os casos, a devolução do
adimplemento anterior – as duas (faltas de) causas infirmam a juridicidade da dívida
e não transcendem o que se regrou nas alíneas anteriores. Há nítida redundância no
dispositivo codificado.
2.2.2. Consectários legais
Estipula o art. 167 do CTN: “A restituição total ou parcial do tributo dá
lugar à restituição, na mesma proporção, dos juros de mora e das penalidades
pecuniárias, salvo as referentes a infrações de caráter formal não prejudicadas pela
causa da restituição.” Luciano Amaro222 ressalva: não se pretendeu definir que a
mera devolução do tributo daria ensejo à repetição dos juros e das penalidades;
estes últimos serão devolvidos porque, intrinsecamente, seus recolhimentos foram
indevidos, com a ressalva das infrações formais que sejam autônomas à motivação
da restituição.
Portanto, existem duas situações distintas: primeiro, os juros e as
penalidades indevidas – tais como os tributos indevidos – devem ser restituídos;
segundo, por ocasião de todas essas espécies passíveis de restituição – tanto os
tributos quanto as mulstas originariamente adimplidas sem causa jurídica –, incidem
os consectários legais: correção e juros. Aqui, o ponto do presente versículo. Sobre
o montante a ser devolvido (seja atinente a tributos e/ou a multas), incide a correção
monetária desde o desembolso, como prevista na Súmula 42, do ex-TFR e verbete
162223, do STJ.
Além da correção monetária, as perdas e danos oneram o valor em
restituição. Tratando-se de dívidas de valor, esse ressarcimento é indenizado pelos
juros moratórios a partir do trânsito em julgado da decisão que os determinar (art.
167, parágrafo único, do CTN). Entende-se que os juros não são capitalizáveis. Em
certa época, refere Difini224, sustentou-se o acúmulo dos juros desde a citação,
consoante previsão do art. 219, do CPC. Todavia, pelo critério especialidade do
222
Direito tributário brasileiro. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 427. 223
Súmula 42, do ex-TFR: “Nos casos de devolução do depósito efetuado em garantia de instância e de
repetição de indébito tributário, a correção monetária é calculada desde a data do depósito ou do pagamento
indevido e incide até o efetivo recebimento da importância reclamada”. Súmula 162, do STJ: “Na repetição do
indébito tributário, a correção incide a partir do pagamento indevido”. 224
Manual de direito tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 294.
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CTN, prevaleceu a disposição da lei complementar, pacificada na Súmula 188225, do
STJ.
2.2.3. Tributos indiretos
O CTN não definiu a diferença entre os tributos diretos e os indiretos.
Imaginando eventual repercussão econômica das exações, passível defender-se
que todos encargos tributários ricocheteiam ao consumidor final. Óbvio, a cadeia
econômica do capitalismo perfaz-se em ciranda, onerando todas as extremidades do
tráfego social. Hugo de Brito critica: “Admitir que o contribuinte sempre transfere o
ônus do tributo ao consumidor de bens ou serviços é uma idéia tão equivocada
quanto difundida. Na verdade, o contribuinte tenta transferir não apenas o tributo,
mas todos os ônus que pesam sobre sua atividade. Mas nem sempre consegue. Ou
nem sempre consegue inteiramente. Tudo depende das circunstâncias de cada caso
e de cada momento. Seja como for, o certo é que não se pode confundir a relação
jurídica de direito tributário, existente entre o contribuinte e o Fisco, com a relação
jurídica de Direito Privado, existente entre o comprador e o vendedor dos bens e
serviços”226.
Portanto, somente nas espécies tributárias em que a própria legislação
determina a transferência do encargo a terceiro, em vista da estrita natureza jurídico-
normativa da relação, pode-se cogitar da aplicabilidade do art. 166 do CTN. Nesse
dispositivo, onde se lê que “por sua natureza, transferência do respectivo encargo
financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou,
no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a
recebê-la”, deve-se apor o predicativo “jurídico”227 ao substantivo “natureza” –
resultaria, de lege ferenda, o seguinte: por sua natureza jurídica. Do contrário, a
questão financeira subordinaria o modelo justributário, quedando-se a própria
eficácia jurídica da indigitada regra.
Na verdade, a linearidade econômica do tributo (se direta ou indireta) é
despicienda uma vez observados os requisitos da repetição do indébito. Evidente
225
Súmula 188, do STJ: “Os juros moratórios, na repetição de indébito tributário, são devidos a partir do
trânsito em julgado da sentença”. 226
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 31ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 217. 227
À míngua de respeitáveis posições dissonantes, em diversas ações que demandam a repetição de
tributos repassados ao consumidor nas faturas de telefonia, a jurisprudência do TJRS reflete tal digressão:
“Tratando-se de mera transferência econômica do custo do serviço, a carga tributária relativa a PIS/COFINS
pode ser repassada aos consumidores, que são os contribuintes de fato e devem arcar com tais custos,
permanecendo inalterada a relação jurídico-tributária entre a concessionária e a União. Inteligência do art. 9º, §
3º, da Lei nº 8.987/95. Uniformização de Jurisprudência nº 70018180281, da 1ª Turma Cível desta Corte.
Repercussão Geral. Precedentes do STJ e TJRGS. Apelação a que se nega seguimento.” (Apelação Cível Nº
70042858977, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow
Duro, Julgado em 20/05/2011)
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que, financeiramente, tudo seria tributo direto ou, quiçá, tudo seria tributo indireto – a
depender da linha de visada. Em termos jurídico-normativos, quando ausente a
causa jurídica do recolhimento, essa questão torna-se secundária, porque o direito à
restituição não se extrai do título do encargo, mas da nota indebitória dele advinda,
recolhidos os requisitos supra identidicados. Panorama a sufragar a substituição
jurisprudencial do verbete 71 pelo 546228, ambos do STF.
Daí sobreleva a perspectiva contemporânea do art. 166, do CTN:
definir a quem restituir – mera questão de legitimidade persecutória. Quanto ao
objeto da restituição – o indébito – é matéria pacificada, quando constatado o
preenchimento dos requisitos específicos, a despeito da repercussão econômica do
tributo.
2.2.4. Prazo caducificante
Estudaram-se a natureza jurídica e os requisitos da repetição do
indébito. Agora, analiso o conturbado prazo decadencial de cinco anos, regulado
pelo art. 168 do CTN. Preliminarmente, pela desnecessidade do exaurimento da
esfera administrativa (art. 5º, XXXV, da CRFB), saliento o esvaziamento prático do
art.169 do CTN, depurando o objeto das presentes linhas.
O inciso II do art. 168 não ostenta maiores digressões. O lustro é
contado desde a data que tornar definitiva a decisão administrativa, ou da data do
trânsito em julgado do provimento judicial que tenha determinado o pagamento
indevido. Na prática, formulam-se pedidos em cúmulo sucessivo eventual:
reconhecimento do indébito e a decorrente determinação (condenação) para que a
Fazenda restitua os valores sem causa jurídica.
Nas hipóteses do art. 168, I, do CTN, existem duas ordens de
questões: em relação aos tributos sujeitos a lançamento de ofício ou por declaração,
o prazo de cinco anos conta-se do adimplemento, sem maiores digressões;
entretanto, nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, surgeim diversos
problemas. Nestes casos, a extinção do crédito tributário não se perfaz pelo
pagamento, mas em virtude da homologação do pagamento, consoante acima
examinei. Daí, o ensejo a prementes debates.
Três forças interpretativas foram defendidas quanto à definição do
termo a quo do prazo decadencial, na repetição nos tributos sujeitos a lançamento
por homologação. Em primeiro lugar, por uma incidência pura e simples do prazo de
cinco anos a partir do pagamento, que não mereceu majoritário respaldo na
228
Dizia a Súmula 71: “Embora pago indevidamente, não cabe restituição de tributo indireto”.
Entendimento superado pela Súmula 546, também do STF: “Cabe a restituição do tributo pago indevidamente,
quando reconhecido por decisão que o contribuinte de jure não recuperou do contribuinte de facto o quantum
respectivo”.
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jurisprudência. A seguir, observando o princípio da actio nata, quando havia
declaração de inconstitucionalidade de norma pelo Supremo Tribunal Federal, o STJ
subordinou o início da contagem do prazo de cinco anos à data da publicação do
acórdão (em ADIN) ou à data de publicação da Resolução do Senado (em controle
concentrado) – entendimento mantido até o ano de 2004, oportunidade na qual,
pelos Embargos de Divergência 435.835/SC, o Superior Tribunal de Justiça adotou a
tese dos “cinco mais cinco”.
Até meados de 2005, a jurisprudência majoritária consolidava-se no
seguinte sentido, consoante trecho do mencionado ED: “Está uniforme na 1ª Seção
do STJ que, no caso de lançamento tributário por homologação e havendo silêncio
do Fisco, o prazo decadencial só se inicia após decorridos 5 (cinco) anos da
ocorrência do fato gerador, acrescidos de mais um qüinqüênio, a partir da
homologação tácita do lançamento. Estando o tributo em tela sujeito a lançamento
por homologação, aplicam-se a decadência e a prescrição nos moldes acima
delineados. Não há que se falar em prazo prescricional a contar da declaração de
inconstitucionalidade pelo STF ou da Resolução do Senado. A pretensão foi
formulada no prazo concebido pela jurisprudência desta Casa Julgadora como
admissível, visto que a ação não está alcançada pela prescrição, nem o direito pela
decadência. Aplica-se, assim, o prazo prescricional nos moldes em que pacificado
pelo STJ, id est, a corrente dos cinco mais cinco.”
A Lei Complementar 118/05 adveio para sepultar essa corrente,
enxugar o prazo decadencial da repetição nos tributos sujeitos a lançamento por
homologação, equiparando-os às hipóteses do indébito nos casos dos tributos
sujeitos ao lançamento por declaração ou de ofício – situações díspares, segundo o
próprio Código. Diz o art. 3º dessa lei: “Para efeito de interpretação do inciso I do
art. 168 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a
extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por
homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1o do art. 150
da referida Lei.” Do caráter pretensamente interpretativo da regra, questionou-se: ela
poderia mesmo retroagir?
Após inicial tergiversação, nos Embargos de Divergência no Resp
644.736/PE, o STJ reconheceu que a LC118/05 somente seria aplicada aos
pagamentos posteriores à vigência da norma (09/06/05), conferindo interpretação
conforme à Constituição ao supedâneo normativo, posição defendida pela doutrina
majoritária. De fato, o art. 3º da Lei Complementar procurou, sem alterar a
sistemática da homologação do pagamento, modificar o dies a quo do prazo
caducificante da potestade de repetição do indébito, no escólio de Henry
Lummertz229.
229
LUMMERTZ, Henry Gonçalves. A aplicação do art. 3º da LC 118/2005 e a irretroatividade das leis. In
Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 80, mai-jun/2008, p. 97.
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A constitucionalidade da LC118/05 está pendente de apreciação no
STF, que definirá a sorte do prazo restituitório nos tributos sujeitos a lançamento por
homologação.
2.3. Extinção da punibilidade dos crimes tributários pelo pagamento
O direito tributário penal estuda as infrações formais (administrativas)
da legislação material de direito tributário. De outro lado, o direito penal tributário é
ramo do direito penal, que analisa os delitos contra a sanidade tributária do Estado.
Por ora, impende acenar brevemente sobre os efeitos do adimplemento nos crimes
do direito penal tributário, para finalidade de acertar a inicial sistematização
heterotípica.
Na classe dos delitos econômicos, localizam-se os crimes contra a
ordem tributária, cuja divisão é quatripartite. Tratam-se dos crimes: (a) funcionais ou
próprios, que são praticados por servidores públicos (arts. 316§1º e 318, ambos do
CP, e art. 3º, da Lei 8.137/90); (b) tributário aduaneiro, qual seja o descaminho (art.
334230, do CP); (c) apropriação indébita tributária (art. 168A, do CP, para as
contribuições sociais e art. 2º, II, da Lei 8.137/90, para os tributos em geral); (d)
finalmente, os crimes de sonegação fiscal relativa aos tributos internos (art. 337A, do
CP, para as contribuições sociais e art. 1 e 2º, da Lei 8.137/90)231.
Os delitos praticados por funcionários públicos e os violadores da
ordem tributária aduaneira não comportam extinção da punibilidade pelo
adimplemento. De outro lado, o art. 9ª, da Lei 10.684/03, é clarividente quanto aos
demais: “Art. 9o É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes
previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts.
168A232 e 337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940, durante o
período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes
estiver incluída no regime de parcelamento. § 1o A prescrição criminal não corre
durante o período de suspensão da pretensão punitiva. § 2o Extingue-se a
punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada
230
O contrabando não configura violação do bem jurídico ‘ordem tributária’. Com efeito, o contrabandista
internaliza produtos proibidos – v. g. cigarros vedados à importação –, o que viola os bens jurídicos ‘saúde,
moralidade, ordem, segurança e indústria estatais’. 231
BALTAZAR JR., José Paulo. Crimes federais. 3ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, 415. 232
Na verdade, referida lei não permite o parcelamento dos débitos não adimplidos, mas descontados dos
empregados, pelo empresário, a configurar o delito do art. 168A, do CP. Daí o dispositivo recair em contradição
in terminis quanto a tal crime. Ademais, subsiste a suspensão da punibilidade mesmo para os crimes de
apropriação, caso tenha havido o depósito do montante integral ou diversa causa de suspensão da exigibilidade
do crédito tributário (art. 151, do CTN). Ver ESTURILIO, Regiane Binhara. O depósito integral do montante
exigido e a extinção da punibilidade nos crimes contra a ordem tributária. In Revista de Estudos Tributários,
2008, n. 63, p. 95.
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com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e
contribuições sociais, inclusive acessórios.”
Isso arremata a teleologia liberatória de efeitos abrangentes, no sentido
diagramado por Pontes de Miranda no pórtico do presente.
3. Considerações finais
A extinção da obrigação tributária pelo adimplemento assume dupla
funcionalidade: em termos resolutivos, cumpre missão topológica, pautando
modalidade do fenecimento da obrigação como preconizado pela linguagem jurídica;
sob a perspectiva liberatória, norteia deontologia de todo o sistema jurídico,
fomentando uma teleologia satisfativa do conteúdo material da obrigação – afinal, o
Estado precisa arrecadar. Evidente que o princípio da legalidade ilustra ambas as
facetas do adimplemento. Todavia, existe variação da densidade normativa de
algumas disposições. A Constituição delimita as competências tributárias, o Código
estabelece diretrizes gerais, e as respectivas entidades públicas definem,
finalmente, as especificações jurídicas dos mecanismos de extinção das obrigações
tributárias pelo adimplemento.
No Direito Tributário, parece que tal estrutural (re)vitalizou uma
concepção positivista de operação jurídica. E causas não apenas sistêmicas – da
própria autorreflexividade do ordenamento que, no direito público, ostenta sensível
obediência à ‘tipicidade’ – como situações culturais, também sufragam a estrita
leitura textual do direito.
O direito é fato social. Inclusive, são duas realidades interativo-
concêntricas, cuja fenomenologia atua espiralmente: enquanto a comunidade elege
suas diretrizes precípuas, gravando na tradição essas disposições, o direito devolve
força cogente/atributiva às relações subjacentes, num devir contraposto que
influencia e promove modificações no plano social. Ora, se no direito o pensamento
do grupo, hábitos, símbolos e comportamentos fazem-se sentir, clarividente a
conexão espaço-temporal da pluridiversidade cultural ao respectivo sistema
processual. Natural avultar-se dinâmica pressuposta da abertura dialética dos
membros do grupo em relação ao todo bem como face à convergência dos demais
fatores de influências institucionalizados – Executivo, Legislativo e Judiciário.
Uma visão funcional-estruralista do direito ostenta pretenso
amadurecimento, justamente, pela consolidação da crítica233 evolutiva dos aspectos
233
Ver OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. Do formalismo no processo civil: proposta de um
formalismo-valorativo. São Paulo: Saraiva, 2010. O autor alinhava evolução das estruturas processuais,
remontando a exacerbação do formalismo (privilegiador da autoratividade do grupo sobre o indivíduo),
comentando também as escalas individualistas – no qual a salvaguarda dos interesses particularizados pelo ideal
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histórico-culturais que remontam a epistemologia jusfilosófica. A problematização
dos sobressaltos teóricos à desenfreada procura de uma estabilidade (provisória
e/ou utópica) harmonizadora das antinomias inerentes ao ser humano tem sido o
palco das contemporâneas reformas normativas, com a atual assunção do caráter
funcionalizado do lócus jurídico à vista da efetividade dos resultados eleitos: a
promoção da justiça e da dignidade humana com a pacificação social. Em suma, os
textos legais e mesmo a jurisprudência não podem destoar do substrato social.
O direito há de traduzir, evidentemente, o modo de ser, de viver e
de sentir do respectivo meio social. A cultura recolhe o conjunto de vivências
metafísicas e materiais que singularizam as sociedades em uma determinada época.
Reflete o grau de civilidade dos povos. E o direito tributário, também, como braço de
contundente intervenção ao patrimônio dos cidadãos, presta-se de índice parcelar
dessa evolução social – fator estimulante do reencontro finalístico desta ciência.
No cenário do Estado Constitucional, a noção vertical do Fisco
para com os súditos está ultrajada. Hoje, dispõe-se da visão dialética dos direitos
fundamentais a suportarem dever de efetividade e segurança jurídica com motes em
relação do Fisco para com o cidadão. Com efeito, a interpretação da
problematicidade do direito haure-se em legitimações heterotípicas de forças não
apenas normativas, quiçá sociais, emprestando inclusão definitiva à boa-fé objetiva
e à segurança jurídica nas relações entre Fisco-sujeito passivo.
Agora, qual sociedade estaria o direito influenciando e/ou sendo
por ela influenciado? Certamente, uma comunidade temperada pelo medo, pela
intolerância e pelo consumismo de massa. Daí resulta: como pretender uma
tributação ‘social’, se a grande malha de forças comunais aponta na mesma triste
direção (?!) – o subjugo do homem pelo objeto de dominação – a gana pela justiça
do capital, o nosso triste final.
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vetores normativos internos e exógenos.
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A AMEAÇA À SOBERANIA E À AMAZÔNIA BRASILEIRAS.
Ana Cláudia Duarte Pinheiro234
Gustavo Mello dos Santos235
Resumo: O presente artigo propõe-se a realizar uma análise da situação em que se
encontra o território amazônico, dando ênfase principalmente à questão da perda da
soberania dos Estados Sul-Americanos, especialmente o Brasil, em razão da
ingerência de outras nações, as quais tem por fim, literalmente, saquear os recursos
provenientes de sua reconhecida biodiversidade. A abordagem a seguir realizada
tem como objetivo o despertar da sociedade brasileira para uma ameaça já
apontada há certo tempo por estudiosos brasileiros e que se torna cada vez mais
iminente: a perda da Amazônia. A partir disso, pretende-se, também, demonstrar ao
cidadão brasileiro a necessidade da luta pela propriedade brasileira deste território e,
consequentemente, pela higidez da soberania do Estado Brasileiro.
Palavras-Chave: Amazônia, Perda da Soberania, Cobiça Internacional.
1. Introdução.
A Amazônia, por seus imensos recursos naturais, fauna e flora exuberante,
chama para si os olhares do mundo. Tal afirmação torna-se de fácil entendimento
quando se tem em vista que muitos países não dispõem de tamanha riqueza natural,
por questões inerentes á localização, ou por terem, ao longo do tempo, devastado
os recursos existentes em seu território.
A proposta do presente trabalho é trazer a baila algumas informações
importantes sobre o território amazônico e, como os países sul-americanos estão
deixando que as nações já desenvolvidas interfiram em sua soberania, e comecem,
pouco a pouco, a se apoderarem da região.
Para que tal interferência seja mais bem visualizada, procurou-se
primeiramente definir o termo soberania, discutindo-se sua conceituação de forma
exaustiva, porém sem esgotar o tema, uma vez que a reflexão leva ao
234
Mestre em Direito Negocial, Professora de Direito Ambiental e Urbanístico e Direito Financeiro do Curso de Direito da Universidade Estadual de Londrina, com o seguinte endereço eletrônico: [email protected]. 235
Acadêmico do Curso de Direito da Universidade Estadual de Londrina, Turma 5000/2009, com o seguinte endereço eletrônico: [email protected].
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reconhecimento do verdadeiro “assalto” sofrido pelos países em desenvolvimento
localizados na América do Sul
Após isso, foram expostas de forma sucinta, algumas das intervenções da
nação que, por seu poderio militar e econômico, mais ameaça os países latino-
americanos quanto à apoderação da Amazônia, qual seja, os Estados Unidos da
América. Um breve levantamento relativo a diversas manifestações ao redor do
mundo sobre a quem pertence o território amazônico apresenta-se neste tópico.
Mencionam-se ainda, alguns grupos de interesses duvidosos que se
instalaram na Amazônia, tais quais: antropólogos, pesquisadores, missionários,
dentre outros e que nem sempre buscam a proteção dos recursos e dos povos que
lá mantém suas culturas desde os tempos mais remotos.
Por fim, explicita-se de que forma está se consolidando a estratégia
expansionista americana através da instalação de bases militares na Colômbia e, a
preocupação e polêmica que tal fato está suscitando nos demais líderes sul-
americanos.
Concluindo o texto, há alguns apontamentos com a intenção de tentar
despertar o espírito do cidadão para uma luta iminente e necessária: a propriedade
brasileira sobre a Amazônia e sua soberania.
2. Soberania: definindo o conceito.
A problemática da soberania vem envolvendo muitos publicistas, os quais se
digladiam teoricamente na busca por uma melhor sistematização do conceito.
Com a leitura de alguns compêndios de Teoria do Estado, Direito
Constitucional, e Ciência Política, verifica-se o grande número de definições que o
termo teve no decorrer dos tempos.
Alguns autores, como Sahid Maluf (2003, p. 30), expõe a denominação do
poder de soberania entre os romanos, qual seja o de suprema potestas. Esta
expressão designava um Estado dotado de poder supremo tanto na órbita política
quanto na administrativa. Posteriormente, imperium foi a palavra usada para
designar esse poder com amplitude internacional.
Dalmo de Abreu Dallari, assevera que não é possível encontrar noção
semelhante à idéia de soberania no Direito Romano (1998, p. 75). Isto porque, os
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termos usados designavam circunstâncias diferentes como expressões do poder, ou
referiam-se ao poderio civil ou militar, entre outros motivos, mas “[...] nenhuma delas,
porém, indica poder supremo do Estado em relação a outros poderes ou para decidir
sobre determinadas matérias. ” (DALLARI, 1998, p. 75)
Ponto pacífico de diversos autores, é o fato de que o termo que ora se
debate, tomou vulto com Jean Bodin no século XVI.
Bodin era um grande jurista de sua época. E reclamava uma definição clara
de tal conceito. Barros (apud BITTAR, 2007, p. 135-136) narra a fala desse ilustre
advogado:
Há, de fato, a necessidade de formular a definição de
soberania, porque não existiu nem jurisconsulto nem filósofo
político que a tenha definido, embora seja o ponto principal e o
mais importante a ser entendido no tratado sobre a República
(República I, 8, p. 179).
Soberania para este pensador significa, portanto, o “[...] poder absoluto e
perpétuo de uma república [...]” e, a República nada mais é do que “[...] um reto
governo de várias famílias e do que lhe é comum, com poder soberano. ”
(ACQUAVIVA, 1987, p. 70)
A partir de Bodin, grandes teóricos passaram a se envolver com esta
temática. Assim o fez Rosseau, o qual enquadrou seu estudo sobre a soberania no
problema da titularidade da mesma. Entendia ele, que o povo era detentor desse
poder. Portanto, para o filósofo genebrino, “[...] o pacto social dá ao corpo político
um poder absoluto sobre todos os seus membros, e este poder é aquele que,
dirigido pela vontade geral, leva o nome de soberania. ” (DALARI, op. cit., p. 78)
Saindo da discussão sobre a quem compete ser titular da soberania, e,
entrando propriamente na definição deste conceito, nota-se que a afirmação de
Dallari (op. cit., p. 79) está correta: “[...] a noção de soberania está sempre ligada a
uma concepção de poder [...]”, ao poder supremo de que dispõe o ente estatal.
Simplificadamente, o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (HOUAISS;
VILLAR, 2001, p. 2.589), define a soberania como:
2. Propriedade ou qualidade que caracteriza o poder
político supremo do Estado como afirmação de sua
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personalidade independente, de sua autoridade plena e
governo próprio, dentro do território nacional e em suas
relações com os outros estados.
Pinto Ferreira (apud MALUF, op. cit., p. 30) expõe um conceito normativo
ético-jurídico de soberania: “é a capacidade de impor a vontade própria, em última
instância, para a realização do direito justo.”
Clóvis Beviláqua (apud MALUF, op. cit., p. 30), mentor do Código Civil de
1916, entende que soberania nacional é a “[...] autoridade superior que sintetiza,
politicamente, e segundo os preceitos de direito, a energia coativa do agregado
nacional.”
Paulo Gustavo Gonet Branco (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 848)
define a expressão como “poder de determinação plena, não condicionado a
nenhum outro poder, externo ou interno.”
De Plácido e Silva (2008, p. 668) esclarece que soberania é o poder supremo
do Estado que não está condicionado, portanto, não tem limites, a não ser aqueles
que, voluntariamente, o ente estatal firma em tratados internacionais, ou em
princípios e regras de sua ordem constitucional.
Sampaio Dória (apud FERREIRA FILHO, 2008, p. 51) conceitua o termo: “O
poder que dita, o poder supremo, aquele acima do qual não haja outro, é a
soberania.”
Soberania para Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2008, p. 50-51) é o poder
que dirige um Estado e que, dá condições de igualdade ao mesmo frente aos
demais.
Como já foi dito alhures, existem inúmeras conceituações da expressão
“soberania”. Porém, há que se escolher uma definição que melhor se amolda aos
fins do presente trabalho. A seguir encontra-se uma rápida exposição daquela
definição que mais se identificou com os propósitos desse estudo.
Aderson de Menezes (1998, p. 161), citando Villeneuve, traz à baila uma
“concepção realista da soberania do Estado”. Em sua enumeração, a qual
compreende todos os requisitos para que a doutrina de Villeneuve se efetive,
importa mencionar e transcrever o primeiro item, a seguir:
1. A soberania não é um poder, mas a qualidade de
supremacia definitiva que, em dado domínio, pertence
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a um poder. Implica, então, em poder absoluto desde
que é impossível apelar de suas decisões.
Denota-se então, que a soberania é parte essencial do Estado, da qual o
mesmo não pode prescindir, pois, do contrário, não será caracterizado como tal.
Poderá ser no máximo, um governo dotado de uma ampla autonomia. Maluf (op. cit.,
p. 29), diferente de outros autores como Dallari, afirma que a soberania não constitui
um elemento do Estado, e sim, “[...] se compreende no exato conceito de Estado.”
Consoante o que se expôs até aqui, cumpre-se agora lembrar que o art. 1°, I
da Magna Carta brasileira, tem como fundamento a soberania. Vê-se, portanto, que
cuidou o constituinte de 1988 do estabelecimento desse poder supremo à República
Federativa do Brasil, o qual significa o poder de última instância na ordem interna e,
de relacionamento em condições de igualdade com outros Estados.
Cabe a indagação: será que com a “mexicanização da Amazônia”
(BONAVIDES, 2004, p. 175-183) está a República Federativa do Brasil exercendo
no plano fático a sua independência frente aos demais Estados?
3. O território amazônico como bem jurídico ambiental e sua proteção
constitucional.
A partir de meados do século XX, os bens de natureza difusa passaram a
receber maior atenção dos aplicadores do direito, legisladores e cientistas em geral.
Isso ocorreu, no dizer de Celso Fiorillo (2008, p. 68-83), devido à formação da
“sociedade de massa”.
A Constituição Federal de 1988 criou essa nova categoria de bens no
ordenamento jurídico pátrio, qual seja a dos bens de natureza difusa, confirmando, a
partir de então o reconhecimento de seu caráter social e merecendo elogios da
sociedade internacional.
Anteriormente, no período antecedente à Constituição Cidadã, o Código Civil
de 1916 estabelecia a dicotomia entre bem público e bem privado. O Novo Código
Civil (Lei n. 10.406/2002), no seu art. 99, I, não alterou esse posicionamento, visto
ainda não incluir, mesmo tendo sido promulgado após 1988, os bens difusos. Por
essa razão, Fiorillo afirma que o dispositivo do Novel Diploma Civil supra é
inconstitucional.
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Faz-se necessária, portanto, a conceituação do bem difuso para que,
posteriormente, seja possível perceber a Amazônia como um bem desta natureza e
a importância de se protegê-la com a criação de mecanismos eficazes para sua
preservação.
O art. 225, da Constituição Federal dispõe que:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações.
A partir disto, poder-se-ia retirar da norma constitucional dois elementos
fundamentais para a caracterização do bem ambiental. São eles, o uso comum e o
fato de ser essencial à sadia qualidade de vida. Aquele diz respeito ao titular do
bem, que seria uma dada coletividade de pessoas indefinidas, visto não se reportar
a uma pessoa ou mesmo a um determinado grupo, mas sim a todos236. Este se
relaciona com a norma constitucional insculpida no art. 1º, III, da Constituição
Federal de 1988, pois para que seja proporcionada ao indivíduo real dignidade, é
indispensável um meio ambiente ecologicamente equilibrado, até mesmo como um
dos pisos vitais mínimos a serem garantidos pelo Estado e por seu povo. Afinal, “[...]
ter uma vida sadia é ter uma vida com dignidade.” (FIORILLO, op. cit., p. 74)
A conceituação dada pelo autor retro se faz pertinente (op. cit., p. 70):
236
"O direito à integridade do meio ambiente – típico direito de terceira geração – constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, à própria coletividade social. Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identificam com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade." (MS 22.164, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 30-10-1995, Plenário, DJ de17-11-1995.) No mesmo sentido: RE 134.297, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 13-6-1995, Primeira Turma, DJ de 22-9-1995.
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O bem ambiental é, portanto, um bem que tem como
característica constitucional mais relevante ser ESSENCIAL À
SADIA QUALIDADE DE VIDA, sendo ontologicamente de uso
comum do povo, podendo ser desfrutado por toda e qualquer
pessoa dentro dos limites constitucionais.
Deve-se ressaltar que o bem ambiental não é passível de apropriação, até
pelas características alhures expostas. Não podendo, desta forma, o homem dele
dispor ao sabor de sua vontade. Desta feita, afere-se que os bens desta natureza
não guardam compatibilidade com o direito de propriedade. Ao bem ambiental cabe
a proteção estatal e social, garantindo-se a todos a possibilidade de dele usufruir
sempre e para sempre.
Comente-se ainda, que o art. 225, da Constituição Federal, em seu § 4º, erige
a Floresta Amazônica como um patrimônio nacional. E o faz não para que seja
estaticamente preservada, mas para que sua utilização econômica, seja melhor
regulada e em condições que preservem o meio ambiente (SILVA, 2009, p. 848).
Por fim, resta configurada a Amazônia como um bem ambiental, com
proteção constitucional e várias garantias em legislações infraconstitucionais.
Porém, como é sabido, mormente não há a efetivação das normas no plano fático,
restando, portanto, analisar melhor a situação e buscar soluções para os problemas
propostos no decorrer do presente trabalho.
O texto constitucional, vale lembrar, consolida um rol de princípios
norteadores de políticas públicas voltadas para a proteção do meio ambiente que
evidenciam escolhas axiológicas fundamentais, como o princípio do
desenvolvimento sustentável, da função social da propriedade, da precaução, da
prevenção, da informação, dentre muitos outros.
A título de ilustração, para o presente trabalho, menciona-se o princípio da
informação, como de grande importância, pois se trata de um direito de todos e por
seu intermédio a população pode exercer a opção que mais lhe convém e assumir a
responsabilidade por isso. A população deve, sempre, estar informada da ação
estatal, pois é a maior interessada.
4. A Amazônia: território perfeito para a invasão da soberania brasileira.
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Em face do momento de preocupação mundial com a iminência da destruição
do meio ambiente, a Amazônia teve a sua importância aumentada e, também, o
interesse das potências mundiais em desfrutar dos seus imensos, porém, não
infinitos, recursos.
Paulo Bonavides cunhou a expressão “mexicanização” da Amazônia tendo
em vista que os Estados Unidos estão fazendo com o território brasileiro o mesmo
que fizeram com o México no começo do século XIX. Nessa oportunidade, tendo a
proximidade territorial como forte aliada, os norte-americanos invadiram pouco a
pouco e, depois, através das armas, e com a presença militar ocuparam
definitivamente os estados da Califórnia, rico em ouro, e também, o Texas, com
imensos lençóis petrolíferos.
É preciso saber que a Amazônia ocupa 65,7% do território brasileiro e, ocupa
mais de 40% de toda a superfície da América do Sul, distribuindo-se em nove
países. Óbvio é afirmar, portanto, que o Brasil, por suas dimensões continentais, é o
Estado em que mais se concentra a “megabiodiversidade” existente na maior
floresta tropical do planeta (PIEDRA-CALDERÓN, 2007, p. 57-58). O Estado
brasileiro será o principal afetado, mas não o único, na ação americana que
pretende intervir na Floresta Amazônica pra dela tirar proveito como se lhe
pertencesse.
Antes, porém, de continuar-se a discorrer sobre os riscos iminentes de
invasão do território amazônico, é mister que se faça um breve levantamento de
alguns fatos históricos que marcaram a política imperialista do país que mais
ameaça, tanto a soberania dos Estados sul-americanos, quanto ao território
amazônico a eles pertencentes: os Estados Unidos. Somente dessa forma, poder-
se-á ter dimensão do problema que está sendo analisado.
4.1. As intervenções militares americanas.
Primeiramente, os norte-americanos consolidaram a doutrina Monroe, cujo
lema “América para os americanos” foi proposto para expulsar povos europeus do
novo continente que desejava emancipar-se.
Posteriormente, surgiu a política do big stick, com Theodore Roosevelt, ou
seja, era o expansionismo americano explicitado através da frase: “fale manso e use
um bom porrete, que você vai longe.” (BONAVIDES, op. cit., p. 177). O Corolário
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Roosevelt de 1904, apoiado pela doutrina Monroe, servia, sobretudo, para legitimar
a intervenção dos Estados Unidos, nos demais países da América.
Já no século XX, alguns exemplos são verdadeiras amostras da capacidade
beligerante norte-americana, são eles: a Guerra do Vietnã, ocasião em que o
combate entre o mundo capitalista e o socialista ficou ainda mais exposto. Tal
conflito foi intensamente condenado pela opinião pública americana, causando
protestos em várias partes do país, por diversos grupos, todos estes exigindo a
saída dos Estados Unidos do combate, com o retorno imediato das tropas militares,
tendo em vista os milhares de soldados americanos mortos. Após a evidente
desaprovação popular, o governo aceitou o acordo de paz e celebrou o Tratado de
Paris, de 1973; a Guerra do Golfo, em que interesses petrolíferos estavam em jogo;
a invasão ao Afeganistão em busca de Osama Bin Laden; e, por fim, a Guerra no
Iraque, quando os Estados Unidos pretenderam legitimar sua ofensiva dizendo que
estariam levando a democracia a um povo “amargurado” pela ditadura de Saddam
Hussein, antigo aliado da família Bush, a qual estava no comando do governo na
época.
Através dessa singela exposição, pode-se notar que o país norte-americano
sempre mascarou seus ataques através de lemas cada vez menos convincentes
tanto para seu próprio povo, quanto, principalmente, para o restante do mundo. O
último exemplo é a Guerra no Iraque, pois na verdade o que se buscava não eram
armas nucleares de destruição em massa, nem mesmo dar ao povo iraquiano a
oportunidade de se viver em um regime democrático. O fim dos americanos era,
pura e simplesmente, a satisfação, mais uma vez, de interesses petrolíferos, visto
que o país do Oriente Médio era, e continua a ser, sede de uma das maiores
reservas dessa riqueza natural do mundo.
É importante explicitar nesse momento que não só os Estados Unidos, mas
também diversos países manifestaram seus interesses sobre o território amazônico.
Vale dizer que na grande maioria, tais Estados já reduziram sua biodiversidade a
níveis mínimos. A necessidade de encontrar novos recursos para viabilizar a
sobrevivência econômica leva ao discurso de que a Amazônia é um território de
todos. Isso se torna de fácil percepção com a explanação que se faz logo abaixo.
4.2. Atenção! O mundo quer a internacionalização da Amazônia.
Em diversas ocasiões, líderes de todo mundo já expressaram seus interesses
sobre a Amazônia. Pode-se citar para demonstrar isso, o senador americano Al
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Gore, que em 1989 disse que tal território, é um patrimônio muito maior do que os
Estados que o compartilham, e que "ao contrário do que os brasileiros pensam, a
Amazônia não é sua propriedade, ela pertence a todos nós". 237
Recentemente, também, manifestaram-se os líderes dos países europeus, tal
qual o ex-primeiro-ministro inglês, Tony Blair, que pretendeu privatizar a Amazônia, a
pretexto de evitar a emissão de gases que contribuem para o efeito estufa em
virtude das queimadas nas florestas equatoriais.
Por último, a mais recente expressão do interesse internacional, é afirmação
do conselheiro diplomático do presidente francês Nicolas Sarkozy, Jean-David
Levitte, de que a Amazônia é algo que diz respeito a todos.238
Com as citações supra referidas, é notório que a Amazônia desperta um
grande interesse nas maiores potências mundiais, tanto pelos seus recursos
naturais, quanto pelas vantagens econômicas que a exploração de suas
potencialidades pode trazer.
4.3. O cavalo de Tróia dos países desenvolvidos.
Em rápida síntese, deve-se atentar para o fato de alguns grupos estrangeiros
estarem ocupando de forma silenciosa o espaço amazônico que pertence ao Brasil.
Esse alerta fica claro nessas palavras do mestre cearense Paulo Bonavides (op. cit.,
p. 178):
O cavalo de Tróia de falsos ecologistas, falsos
antropólogos, falsos indianistas e falsos evangelizadores se
introduz sub-repticiamente na Amazônia diante de uma Nação
perplexa, açoitada de três crises sucessivas e cumulativas de
desagregação do País: a crise de governabilidade, de
inconstitucionalidade e retrocesso institucional e, de último, crise
de desnacionalização, para a qual quiseram empurrar com um
237
Amazônia: a quem pertence a floresta tropical? Último Segundo. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/new_york_times/2008/05/19/amazonia_a_quem_pertence_a_floresta_tropical_1317710.html>. Acesso em: 26 ago. 2009. 238
Lula e Sarkozy devem assinar três acordos sobre a Amazônia. Tempo Presente. Disponível em: <http://www.tempopresente.org/index.php?option=com_content&task=view&id=4485&Itemid=148>. Acesso em: 26 ago. 2009.
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separatismo de opereta e fancaria, cuja fragilidade ridícula pode,
todavia, principiar como comédia e acabar como tragédia.
Assim sendo, é oportuno para uma maior elucidação da ameaça que, já em
nível acentuado, cerca a soberania brasileira, mostrar-se os acontecimentos
recentes que provam a preocupação com o tema do qual se ocupa este trabalho.
4.4. O espaço amazônico faz parte do plano expansionista americano.
A América do Sul vive um momento de grande preocupação. Isto se deve ao
fato da Colômbia, governada por Álvaro Uribe, ter aceitado que fossem instaladas
sete bases militares americanas em seu território afim de ampliar o combate ao
narcotráfico.
Este acordo, assinado no dia 16 de agosto de 2009, está causando muita
polêmica entre os chefes de Estados sul-americanos, principalmente por parte da
Venezuela, que entende ser mais uma ofensiva norte-americana mascarada e, por
isso, rompeu ligações diplomáticas com a Colômbia até que seja desfeito o acordo.
O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, assim como os demais
líderes da Unasul (União das Nações Sul-Americanas), teme a invasão tanto da
soberania colombiana, quanto dos demais países latino-americanos. Lula ainda
mostrou que a sua maior preocupação quanto à instalação de tais bases é quanto a
Amazônia, isso fica claro na frase a seguir: "Ellos se creen que la Amazonia es suya,
pero no es así. Es nuestro problema, y somos nosotros quienes deberíamos
reunirnos para tratar los problemas ambientales" [...]. (GALLEGO-DÍAZ, 2009)
Claramente, percebe-se que o temor dos países sul-americanos está
centrado na possibilidade da perda de suas soberanias. Pois, se for o caso de uma
ofensiva militar norte-americana, independente da existência ou não das bases
militares posicionadas no território colombiano, nenhum dos Estados latino-
americanos terá forças para subsistir a isso, visto que não possuem o aparato bélico
indispensável e nem uma economia que permita gastos excessivos com uma
eventual guerra.
Está-se diante de um grande problema, o qual deve ser combatido por todos
os países: a afetação da soberania, bem máximo e fundador do poderio estatal.
Portanto, é preciso pensar em algumas soluções para os seguintes
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questionamentos: como frear a ingerência americana na América do Sul? E,
também, como proteger a Amazônia da cobiça dos Estados Unidos e dos demais
países desenvolvidos?
Tais perguntas devem povoar as mentes de cada cidadão, tendo em vista que
se nada for feito a perda do patrimônio incomensurável do território amazônico, com
toda sua potencialidade em biodiversidade e beleza magistral, pode deixar o plano
de conjecturas e se tornar realidade.
5. Conclusão.
A cobiça internacional pela Amazônia é notória. O que é evidente, também, é
que há uma grande necessidade de integração dos países sul-americanos tendo em
vista preservar seus territórios e suas soberanias frente aos demais.
O assalto à soberania, mencionado por Paulo Bonavides, está prestes a
acontecer. A instalação dos militares norte-americanos na Colômbia começa a impor
um clima de tensão e receio por parte dos demais países da região.
Quanto à política brasileira de proteção à Amazônia, pode-se asseverar que a
mesma ainda encontra-se em condições precárias, clamando por uma solução que
se coadune com a preservação desse território tão rico em recursos, fauna e flora, e,
também, com o princípio constitucional da soberania.
Cabe aos cidadãos brasileiros e dos demais países sul-americanos cobrarem,
de seus respectivos governos, respostas para os problemas que aqui foram
suscitados. Dever-se-á proceder à discussão dos meios a serem utilizados para
impedir os Estados Unidos de continuar a imiscuir-se nessa região como se fossem
suas colônias; e, ainda, de que forma poder-se-á proteger eficazmente o território
amazônico contra a cobiça internacional para, então, todos entenderem de vez que
tal território não é propriedade de todos!
A informação, conforme mencionado, é sem dúvida uma das principais armas
para combater a ação nefasta contra o meio ambiente. Quem sabe por intermédio
da informação seja possível viabilizar a proteção do território amazônico sem que
haja necessidade de um confronto bélico, que é para onde apontam as evidências a
partir da instalação das bases militares.
O princípio da informação é um dos fundamentos da construção normativa
ambiental e as populações do continente americano – do sul e do norte – devem ter
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ciência dos acontecimentos, para nortear suas escolhas. Os Estados Unidos da
América, na Guerra do Vietnã perdeu no confronto bélico e também na opinião
pública tanto externa quanto interna e somente a informação é que possibilitará
realizar a proteção que a Amazônia merece.
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PARALELO ENTRE OS PRINCIPAIS DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS
MULHERES BRASILEIRAS E DAS MULHERES MUÇULMANAS
Parallels between the main fundamental rights of Brazilian and Muslim women
Resumo: A presente comunicação tem o objetivo de discutir, brevemente, um
paralelo entre os principais direitos fundamentais das mulheres brasileiras e das
mulheres muçulmanas na atualidade, dessa maneira fazendo uma análise nas
sociedades Ocidental e Oriental. As mulheres, ao redor do Mundo, estão assumindo
vários papéis de destaque, tomando iniciativas, participando ativamente da
sociedade, da política e da economia. Esse estudo verifica brevemente os direitos
fundamentais que norteiam suas vidas hoje, qual a forma de serem exercidos e
como a mulher brasileira, tipicamente Ocidental e a mulher muçulmana, pertencente
à sociedade Oriental e Teocrática relacionam-se com esse direito. Neste estudo
analisa-se partes de um processo histórico, cultural, religioso, político, moral e
econômico.
Palavras-chave: Direitos Fundamentais - Mulheres muçulmanas – Mulheres
brasileiras
Abstract: This communication has the objective of discussing, briefly, a parallel
between the main fundamental rights of Brazilian women and Muslim women
nowadays, this way making an analysis on Eastern and Western societies. Women,
around the World, are taking several prominent roles, taking initiatives, participating
actively in society, politics and economy. This study examines briefly the fundamental
rights that guide their lives today, what way they are exercised and as the Brazilian
woman, typically Western and Muslim woman, in Eastern and Theocratic society they
relate this right. This study analyses the parts of a historical, cultural, religious,
political, moral and economic process.
Key words: Fundamental Rights – Muslim women – Brazilian women
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Observa-se que na atualidade as mulheres acessam importantes
cargos no Brasil e no Mundo, antes ocupados apenas por homens. O Brasil conta
com uma mulher na Presidência da República, temos executivas nas transnacionais,
diplomatas na Organização das Nações Unidas, funcionárias públicas em cargos de
alto escalão e muitas, verdadeiramente muitas mulheres chefes de família,
guerreiras, as quais deixam seus lares logo pela manhã, geralmente com a refeição
pronta e voltam no início da noite após um dia de trabalho, quando dão conta de sua
casa, dos filhos, da lição de casa dos filhos e geralmente não têm companheiro e
sozinhas os educam.
Segundo Renée Coté, que publicou, em 1984, no Canadá, pesquisa
em busca dos elos perdidos da história do Dia Internacional das Mulheres, as
mulheres estão todos os anos, como suas antecessoras, comemorando iniciativas e
conquistas, fazendo um balanço de suas lutas, atualizando a agenda de lutas pela
igualdade entre homens e mulheres e por um mundo onde todos e todas possam
viver com dignidade e plenamente.
O cenário mundial, segundo os autores da bibliografia estudada,
também nos mostra mulheres nos demais países do Ocidente como alguns do
Oriente, em destaque por terem um cargo na política, na diplomacia, em empresas,
por trabalharem na reivindicação dos direitos humanos, enfim, há manifestação
feminina em evidência em todo o Planeta, mesmo nos países de regime absolutista.
Em se tratando de regimes absolutistas, interessante o estudo do Islã
em relação às mulheres e qual a relação que guarda com os direitos fundamentais,
tais como os conhecemos.
Segundo Hajjami, autora de “A condição das mulheres no Islã: a
questão da igualdade”, no Ocidente, o tema da condição das mulheres no Islã está
ligado à representação que geralmente se faz do Islã e dos muçulmanos. É uma
representação constituída por estereótipos, esquematizações reducionistas e por
confusões conceituais. A realidade do Islã e das sociedades muçulmanas possui
muito mais nuances e frequentemente não corresponde às idéias estabelecidas. A
condição de inferioridade e precariedade a que está confinada a maior parte das
mulheres muçulmanas, revela principalmente a hegemonia de uma mentalidade e de
um sistema patriarcal que instrumentaliza sua leitura da religião para legitimar as
situações de dominação, de violência e de exclusão em relação às mulheres.
Estudando o Islamismo, conforme a obra de Pace (2005), o Islã não faz
distinção entre religião e política e, por conseguinte, estudar o fenômeno religioso no
Islã significa necessariamente manter também sob controle a dimensão política. O
poder espiritual confunde-se na mesma pessoa do governante. O representante
espiritual é o mesmo representante do Estado, da nação. Pode até haver um
Presidente, mas o representante espiritual é quem toma as decisões de cunho
estatal, ou mesmo referenda-as com a última palavra. A busca espiritual é uma
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jornada interior, um drama espiritual mais que um drama político, portanto, observa-
se que os líderes de todas as religiões brigam entre si, parecendo que desafiam o
monopólio da verdade absoluta, o qual julgam possuir. Isso ocorre em vários países
do mundo, sobretudo, no mundo árabe, onde muçulmanos, cristãos e judeus estão
em constante conflito, pois o poder espiritual confunde-se com o político.
No Ocidente Moderno fez-se questão de separar a religião da política e
essa secularização foi originalmente vista pelos filósofos do Iluminismo, tais como o
alemão Immanuel Kant (1724 – 1804), como um modo de liberar a religião da
corrupção dos negócios do Estado e de permitir que ela se tornasse mais fiel a si
mesma.
Nessa linha de pensamento, temos que o Islã surgiu através do Profeta
Maomé, Muhammad ibn Abdallah. Ele recebeu a revelação de um Anjo, o qual lhe
recitou a palavra de Allah por meio de versos formando um poema, o qual chamou
Corão (Alcorão ou Quran), considerado obra prima da literatura no mundo árabe.
Segundo o Alcorão, conforme dispõe a Sura 26, 29, chamada, “Em nome de Allah,
O Misericordioso, O Misericordiador”, consta que Muhammad é considerado o
Mensageiro de Allah. Assim, as revelações recebidas por Maomé, foram calcadas
na justiça social, contudo, por justiça social, não se tem o mesmo entendimento no
Mundo Ocidental. Islã significa submissão à vontade de Deus e a justiça social era,
portanto, a virtude crucial do Islã. Os muçulmanos tinham como primeiro dever a
construção de uma comunidade chamada Ummah, caracterizada por uma
compaixão prática, na qual haveria distribuição justa de riqueza.
No Islã, os muçulmanos procuram Deus na história. O primeiro dever
do Islã foi o de criar uma comunidade justa na qual todos os membros, mesmo os
mais fracos e vulneráveis, fossem tratados com um respeito absoluto e assim,
vivendo em uma sociedade eles estariam praticando a vontade de Allah.
O muçulmano tinha que resgatar a história, o que significava que os
negócios do Estado não eram um desvio da espiritualidade, mas a própria essência
da religião. O bem estar político da comunidade muçulmana era uma questão
suprema. Segundo Armstrong (2001), os muçulmanos
criaram seus próprios rituais, seu misticismo, sua filosofia, suas doutrinas, seus
textos sagrados, suas leis e seus santuários como todos os outros povos, contudo,
todas essas buscas religiosas se originaram de forma freqüentemente angustiada,
da contemplação dos muçulmanos sobre a situação política em curso na sociedade
islâmica naquela época.
A justiça social era, portanto, a virtude crucial do Islã. Os muçulmanos
tinham como primeiro dever a construção de uma comunidade (Ummah),
caracterizada por uma compaixão prática, na qual haveria distribuição justa de
riqueza. Segundo, ainda Armstrong (2001), esse ponto era muito mais importante do
que qualquer ensinamento doutrinário a respeito de Deus.
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Segundo o Islã, a função da mulher é também uma especificidade. Sua
função é determinada pela natureza, ou seja, ser mãe, do lar, responsável por
passar os ensinamentos do Corão às crianças e agradar aos maridos. A poligamia é
permitida aos homens, limitando o número de esposas a quatro, devendo o marido
ter posses para cuidá-las e dispensar-lhes tratamento igualitário. As mulheres
devem ficar castas caso sejam viúvas e virgens até o casamento. A Sura das
Mulheres (Süratu Na- Nissã) é a mais extensa do Corão na análise de assuntos
atinentes às mulheres, quanto à infância, ao casamento, à maternidade, englobando
outros assuntos sociais. (Hourani, 2006, p. 427)
A sexualidade antes do casamento é considerada corrupção ao Islã,
assim como o adultério. Quanto mais desfeminilizada a mulher no Islã, mais aceita
publicamente pelos homens e para isso usa-se o véu nos cabelos e roupas
compridas.
Quanto ao uso do véu islâmico pelas mulheres, segundo Kamel, “é o
uso compulsório do véu que nos choca” (2007, p. 146). Para o Islã, usar o véu é
mais uma prescrição religiosa inquestionavelmente estabelecida. Cobrir a cabeça
depende do grau de religiosidade de cada família. A situação se complica em países
como o Irã, de origem xiita radical, onde o uso do véu é obrigatório, conhecido
também como xador. Na Arábia Saudita e países do Golfo, onde vivem os sunitas
radicais, também é obrigatório o uso do véu. Nesses países, os homens são livres
para vestir o que quiserem, mas as mulheres são obrigadas, por lei, a cobrirem-se
parcial ou totalmente, dependendo do país, contudo, a modernidade cria inúmeras
situações de convivência inevitáveis entre homem e mulher onde antes os contatos
eram reduzidos. O cotidiano coloca em contato direto sexos opostos nos transportes
públicos, colégios, universidades, fábricas, escritórios, ruas, etc. Há oposição dos
fundamentalistas quanto a esse contato, como também em relação à entrada de
mulheres na vida pública.
O papel da mulher muçulmana é bastante questionado com o desafio
da modernização na visão Ocidental, visão esta rejeitada em parte no Mundo
Muçulmano, mas que é absorvida também em parte. Há a quebra do envoltório,
simultaneamente, opressor e protetor da sociedade patriarcal. Essa sociedade conta
com reivindicações a uma nova liberdade de dispor do próprio corpo, de aprender a
ler e escrever, trabalhar fora de casa, namorar e casar com quem quiser. Significa
socializar com maior liberdade, ter direitos reprodutivos e possuir participação
política.
Kamel (2007) acredita ser essa questão complexa, pois mesmo no
século XX a situação das mulheres no Islã não melhorou do dia para a noite. Sobre
essa questão acrescenta que as sociedades dos países muçulmanos viveram nos
últimos anos esquecidas no atraso, submetidas a regimes despóticos que usaram a
religião para justificar o despotismo e se manter no poder.
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Pace (2005), em sua obra, no capítulo “O carisma do profeta – a
exclusão das mulheres dos papéis políticos”, discorre que a grande discórdia, assim
como a criação da primeira comunidade dos crentes, a Ummah, viu protagonistas
somente homens. As mulheres não aparecem, a não ser no passado, nos bastidores
da vida de Maomé ou episódios sucessivos.
Pensadores turcos, árabes liberais, árabes nacionalistas e muçulmanos
modernistas, desde o final do século XIX, pedem a igualdade da posição da mulher,
argumentando que sua opressão priva a nação de metade dos recursos. Segundo
Demant (2004), escreve que alguns muçulmanos defendem a proibição da
poligamia, interpretando que o versículo do Corão a respeito do tratamento
igualitário que o marido deve dar às suas esposas aponta para uma afeição
sentimental tanto quanto para direitos materiais, sendo portanto, quase impossível
de ser realizado. A Turquia é um exemplo de mudança de costumes. Com Atartuk, a
Turquia deixou de ser um país teocrático e passou a viver a secularização. Kamel
(2007) acredita que não há uma resposta definitiva para uma questão tão complexa.
Pace (2005) lança a pergunta quanto ao Islã conseguir enfrentar criativamente os
desafios da secularização e da globalização sem perder a identidade nem trair os
ideais pregados no Corão.
Ainda em relação ao uso do véu islâmico, para estar em público, deve-
se usar o véu para cobrir os cabelos, hijab, em árabe. Não deve ter qualquer
aparência em público que possa chamar a atenção, quais sejam, mostrar os
cabelos, usar maquiagens, roupas que mostrem ou acentuem sua feminilidade.
Quanto à questão das mulheres apresentarem-se no espaço público,
Demant (2004), refere que o espaço público é restrito ao homem. Se a mulher
freqüentá-lo, deverá fazer uso do véu. A concepção é que o véu poderá protegê-la
de olhares indiscretos, mas este é justamente o símbolo da condição de pessoas
protegidas, no caso, sob a tutela do poder masculino.
Há um provérbio árabe que diz: “Quando um homem encontra uma
mulher, entre eles encontra-se Satanás” (Demant, 2004). Com isso, tende-se a levar
a interpretação de que a mulher é considerada sedutora, dona de características
irresistíveis aos homens, demoníaca, podendo fazê-lo perder o juízo, levando ambos
à corrupção.
No Corão, parte 5, na Sura das Mulheres, versículo 15, dispõe:
E aquelas de vossas mulheres que cometerem obscenidade
(equivale ao adultério), então, fazei testemunhar contra elas
quatro de vós. E se o testemunharem, retende-as nas casas,
até que a morte lhes leve a alma, ou que Allah lhes trace um
caminho. (Corão, 2007, p.128)
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Kamel (2007) relata quanto às penas sofridas pelas mulheres
consideradas adúlteras, a pena de apedrejamento, a qual junto com o uso
compulsório do véu têm contribuído para as notícias de que o Islã é violento e
opressor, parecendo uma religião atrasada e violenta, lembrando ser a exceção vista
como regra.
Quanto ao apedrejamento de mulheres, Kamel (2007) discorre que a
origem da morte por apedrejamento não é do Islamismo, sendo remota, pois a
prática já existia há milhares de anos em muitos lugares, contudo,
documentalmente, em especial, no Oriente Médio. Com sua origem exata
desconhecida, a condenação de adúlteros (homens ou mulheres) à morte por
apedrejamento está no Pentateuco, no livro de Deuteronômio, 22, 22-24 da Bíblia,
livro sagrado dos seguidores do Cristianismo:
Se um homem for pego em flagrante deitado com uma mulher
casada, ambos serão mortos, o homem que se deitou com a
mulher e a mulher. Deste modo extirparás o mal de Israel. Se
houve uma jovem virgem prometida a um homem, e um
homem a encontra na cidade e se deita com ela, trareis ambos
à porta da cidade e os apedrejareis até que morram: a jovem
por não ter gritado por socorro na cidade e o homem por ter
abusado da mulher de seu próximo. Deste modo extirparás o
mal do teu meio. (Kamel, 2007, p.134).
Kamel lembra que não consta no Alcorão menção sobre o
apedrejamento, porque o versículo sobre isto foi suprimido por ordem de Deus, mas
consta recomendação na Sharia, considerada a palavra do Profeta.
Atualmente, na maioria dos países muçulmanos onde a Sharia serve
como inspiração, não se ouve falar em morte de adúlteros por apedrejamento, seja
porque é difícil provar o adultério e ou os casais preferem o divórcio.
Ainda, tal Sura, na parte 5, versículo 34, diz:
(...) Então, as íntegras são devotas, custódias de honra, na
ausência dos maridos, pelo que Allah as custodiou. E àquela
de quem temeis a desobediência, exortai-a, pois, e abandonai-
a no leito, e batei-lhe (...). (Corão, 2007, p. 133)
Quanto a “batei-lhe”, a explicação do Corão diz para cuidar de não
atingir a face nem as partes sensíveis. Essa sura demonstra também que a
sexualidade antes do casamento é considerada corrupção ao Islã, assim como o
adultério. No tratamento às mulheres, com relação a
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uma atitude de proteção, Kamel (2007) discorre que o Alcorão diz em sua Sura
33,53:
Ó crentes, não entreis na casa do Profeta, salvo se tiverdes
sido convidados a uma refeição, mas chegai na hora exata
para não aguardardes até a mesma ser servida. Se fordes
convidados, entrai. E quando tiverdes sido servidos, retirai-vos
sem fazer colóquio familiar, porque isso molestaria o Profeta e
este se envergonharia de vós. Porém, Deus não Se
envergonha da verdade. E se desejardes perguntar algo a suas
mulheres, fazei-o através de cortinas. Isso será mais puro para
os vossos corações e para os delas. Não vos é dado burlar a
confiança do Apóstolo de Deus nem jamais desposar suas
mulheres, depois de sua morte, porque isso seria grave ante
Deus. (Kamel, 2007, p. 150)
Para Kamel, a vida das mulheres, com a recitação desta Sura, estaria
para sempre marcada, pois o véu nasceu da necessidade de proteger as
muçulmanas. O véu, em árabe, hijab, significa cortina. A palavra vem do verbo
hajaba que significa “esconder com uma cortina”.
No Egito, em 1930, o movimento dos “Irmãos Muçulmanos” dizia que
se devia permitir às mulheres educarem-se e trabalharem, contudo, devia-se manter
algum tipo de distância social entre elas e os homens, baseando-se a educação na
religião. (Hourani, 2006, p. 427)
Ainda quanto à poligamia, vale explicar que é autorizada aos homens
desde que eles tenham condições financeiras de observar tratamento igual a todas
as esposas, por isso, ou seja, pela falta de recursos financeiros, os casamentos em
sua maioria são monogâmicos e sem laços românticos. Conforme assinala a obra de
Demant (2004), a sharia, mantém a poligamia, mas limita a quatro esposas
simultaneamente.
A poligamia existe devido a dois pontos. O primeiro é explicado pela
quantidade de homens que morriam nas guerras antigamente, permitindo que um
homem se casasse com mais de uma mulher. Isso significaria dizer que esta mulher
poderia dar à luz a crianças que se transformariam em homens e que aumentariam
exército do país. Assim, deste modo o Corão estaria protegendo o Estado. O
segundo ponto é explicado pelo fato de que muitos homens morrendo na guerra e
deixando as mulheres viúvas, estas estariam sem qualquer apoio financeiro. Note-se
que as mulheres naquele tempo não eram independentes e isso não as levaria à
prostituição para sobreviverem.
Pace (2005) cita em sua obra o romance, “Lontano da Medina” da
escritora argelina Assia Djebar. Ela narra que as mulheres no Islã já
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desempenharam papéis importantes, tendo em vista o apoio à vida profética de
Maomé. Uma das mulheres do Profeta, A' isha foi uma influente personalidade
política depois da morte do mesmo.
Quanto à religiosidade da mulher, geralmente é vivida no recinto
doméstico, onde faz as orações e celebra todas as festas canônicas ou ritos de
passagem, conservando a memória dos gestos rituais prescritos e da preparação
dos alimentos apropriados para esta ou aquela festa canônica.
Kamel (2007) cita outro exemplo de tratamento às mulheres na cultura
judaica. A mulher na lei judaica milenar chamada Halachah, deve limitar-se a orar.
Isso deixa a mulher sempre numa situação de inferioridade em relação aos homens.
No tocante ao Estado de Israel, a Halachah guarda seu peso apenas e tão somente
em questões de casamento, divórcio e conversão, referindo-se o autor neste ponto à
obra de Ruth Halperin Kaddari, “Women in Israel, a State of Their Own”.
Com essas considerações sobre o modo de vida das mulheres
muçulmanas, ditado pelo Corão, o qual serve como um código de conduta para os
seguidores do Islã, analisamos a legislação brasileira quanto aos direitos
fundamentais.
A Constituição Federal Brasileira vigente no Título II, Capítulo I, Artigo
5º e incisos trata dos Direitos e Garantias Fundamentais – Dos Direitos e Deveres
Individuais e Coletivos.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos
termos desta Constituição;
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma
coisa senão em virtude de lei;
III - ninguém será submetido à tortura nem a tratamento
desumano ou degradante;
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato; (...)
No que pese o que dispõe a Carta Magna de 1988 com suas emendas,
o recente livro da pesquisadora Maria Amélia de Almeida Teles, lançado em
novembro de 2006, mostra a distância entre homens e mulheres, quando se trata de
garantia de direitos. Ter os direitos garantidos por lei basta para que as mulheres
sejam respeitadas? Situações comuns do cotidiano como violência doméstica,
assédio sexual, discriminação e remuneração desigual no mercado de trabalho
mostram que colocar essas conquistas em prática é outra história.
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Dessa maneira, começa-se a entender que os muçulmanos seguem o
Corão como código de conduta moral, social e jurídica, sendo que fazem parte de
uma sociedade Oriental, ao que pese estarem hoje vivendo em países do Ocidente,
onde o uso compulsório do véu pode ser considerado chocante para a sociedade
brasileira e Ocidental, mas o Brasil também tem os seus percalços quanto à
legislação e eficácia dessa legislação em relação à proteção aos direitos
fundamentais das mulheres e essa falta de proteção pode ser considerada estranha
aos muçulmanos, os quais dentro de seu código de conduta, acreditam que Allah e o
Profeta Maomé protegeram suas mulheres no tocante aos versos do Alcorão.
Ao mesmo tempo em que a agressão não só à mulher no Brasil é
vedada e a infração à lei pode acarretar penalidades ao agressor, no Islã, é
permitido caso a mulher esteja em adultério.
Para os casos de agressão às mulheres no Brasil, a Lei nº 11340,
também conhecida como Lei Maria da Penha, foi decretada pelo Congresso
Nacional e sancionada pelo ex-presidente do Brasil, Sr. Luiz Inácio Lula da Silva em
7 de agosto de 2006. Dentro das várias mudanças promovidas por essa lei quanto à
agressão física e moral às mulheres, está o aumento no rigor das punições dessas
agressões contra a mulher quando ocorridas no âmbito doméstico ou familiar. Na
verdade essa lei protege o direito fundamental à vida e a integridade física, não
importando se a mulher cometeu adultério ou qualquer ato contra o casamento.
A introdução da lei diz:
Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar
contra a mulher, nos termos do Art. 226 da CF/88, da
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra as Mulheres e da Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência
contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código
de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal
e dá outras providências.
Há de se entender que quanto ao Islã e o Brasil falamos em culturas
diferentes e por isso, há maneiras diversas de se analisar o mesmo fato tanto quanto
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ao resultado, como quanto às sanções ao ocorrido e a sua punibilidade239 e
culpabilidade240.
Analisando um país europeu que teve colônias em países de
cultura islâmica, tais como a Argélia na África, e que recebeu grande fluxo de
imigrantes dessa cultura, por exemplo, a França, há no mínimo três maneiras
diferentes de se conceber a nação, a qual tem influenciado profundamente as
políticas de nacionalidade e imigração. A primeira, a qual exerce hegemonia desde o
fim da Segunda Guerra Mundial é o republicanismo, o qual define a nação por um
critério exclusivamente político, o contrato social, que considera que os homens são
fundamentalmente iguais. A segunda maneira chama-se tradicionalismo. Essa
corrente defende a existência de uma ligação estreita entre nacionalidade e cultura,
determinada pelo sangue do indivíduo, como também que os homens são
fundamentalmente diferentes. A mais recente é multiculturalista, que pretende
afirmar a diferença entre os homens, mas acredita que a nacionalidade não deve ser
fundada nessas diferenças, reivindicando direitos culturais específicos para
diferentes grupos sociais dentro da nação.
Nesse ínterim, a França, apesar de não se reconhecer como um
país de tradição na área é um país de imigração há mais de um século, ao longo do
qual produziu extensa legislação a respeito do assunto.
As duas Constituições posteriores à Revolução Francesa, as de
1791 e 1793, estabeleceram a nacionalidade de acordo com a adesão voluntária aos
princípios da República e representaram a aplicação pura da ideologia republicana
na atribuição da nacionalidade.
A Constituição de 1791 atribui à cidadania francesa a todos que
são nascidos na França de um pai francês, aos que são nascidos na França de um
pai estrangeiro e aos descendentes de um francês ou francesa expatriados por
motivos religiosos que desejarem se estabelecer na França e prestar o juramento
cívico. A Constituição de 1793, mais ampla, concede a cidadania a praticamente
todos que são fiéis às ideias revolucionárias, independente de qualquer
consideração étnica.
As disposições a respeito da nacionalidade são reunidas, em
1973, no Código Civil Francês, o qual estabelece que é francês por filiação, o filho
de um ou dois pais franceses, assim sendo, por nascer na França o filho de pais
239 Segundo o Professor René Ariel Dotti, punibilidade é uma das condições para o exercício da ação penal e
pode ser definida como a possibilidade jurídica de o Estado aplicar a sanção penal ao autor do ilícito.
(http://www.cjf.jus.br/revista/numero7/artigo4.htm)
240 Segundo texto da UFSM, a autora Fernanda Schimitt conclui que a culpabilidade é o fundamento da pena e
do próprio jus puniendi, pois compete ao Estado intervir somente nos casos em que há a reprovação social da
conduta. (http://www.ufsm.br/direito/artigos/penal/bem-juridico.htm)
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desconhecidos ou de pais apátridas (segundo o Direito, pais sem Pátria), ainda, o
filho de estrangeiros, ao qual não é atribuída pelas leis estrangeiras a nacionalidade
de nenhum dos progenitores e o filho de pais estrangeiros que tenham eles mesmos
nascido na França.
Na explanação sobre quem é francês, percebe-se que os filhos
de imigrantes das colônias muçulmanas, também é francês, contudo, os
muçulmanos possuem um jeito particular de convívio em sociedade e estranho à
sociedade francesa. Seguem ao Alcorão e vivem dentro de uma nação laica. Então,
o que dizer da mulher muçulmana francesa que deseja ver seu direito fundamental
do uso do véu islâmico integral respeitado?
A França sendo um país laico proíbe tal intento e essa mulher
que se identifica com essa maneira de vestir e cultuar Deus, muitas vezes não
concilia sua rotina fundada nas leis de sua religião e as do país em que é nata. Esse
não conciliar causa um conflito de identidade dessa mulher com sua cultura e com a
cultura do país em que nasceu.
Compilando os assuntos no campo dos Direitos Humanos,
segundo artigo publicado na Revista Sequência da UFSC, o autor Lucas (2009)
aduz que a tarefa dos direitos humanos é estabelecer os exatos limites da igualdade
e da diferença entre os indivíduos e entre suas culturas, sem negar o que os
identifica. Ainda refere-se que em uma sociedade multicultural essa limitação é um
desafio, tendo em vista as múltiplas identidades culturais existentes.
Quanto aos direitos humanos, Lucas (2009) faz menção de que devem
tutelar apenas as diferenças visando a garantia a todos os homens como homens e
não como integrantes de suas culturas, os direitos necessários ao exercício de sua
liberdade e autonomia.
Quanto ao adultério no Brasil já não é mais punido como crime, a partir
de 29 de março de 2005 com a entrada em vigor da Lei 11106/05, mas pode trazer
consequências cíveis como a reparação de dano moral, contudo, não há a
permissão para a agressão, o que é punido mais severamente que o adultério era.
Em relação ao uso do véu islâmico ser obrigatório às mulheres
seguidoras do islamismo, tendo em vista o multiculturalismo no Brasil, essa
prescrição é vista com naturalidade, mesmo porque a CF/88 tutela o direito à
liberdade religiosa, contudo, já em outros países, como a República Democrática
Francesa, a qual tem por princípio da República, a laicidade, o uso do véu integral
não é aceitável.
A decisão da França foi reforçada pelo Conselho da União Européia
através da Resolução nº 1743/2010, a qual proibiu o uso do véu integral. Ressalte-
se que em nenhum momento esses textos referem-se diretamente aos muçulmanos,
mas a proibição do uso do véu integral, com certeza aplica-se a essa prática usual
das muçulmanas.
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A Declaração Universal dos Direitos Humanos prescreve em seus
artigos desde 1948 a igualdade entre os seres, o dever de agir uns com os outros
em fraternidade, contudo, países não membros da Organização das Nações Unidas
não reconhecem essa Declaração.
Assim, entende-se que dependendo o país do mundo onde a pessoa
se encontre, há uma variação no tratamento com os direitos fundamentais. O Brasil,
que tutela a vida, a liberdade e a igualdade desde o texto constitucional e ratifica
tratados internacionais nesse sentido, tem os direitos fundamentais protegidos. Sua
eficácia ainda sofre pelos próprios costumes brasileiros, mas a tutela já existe. Já
não se pode dizer o mesmo em países absolutistas, inclusive os de religião
muçulmana, pois seguidores do Alcorão, o seguem como código de conduta moral,
social, religioso e jurídico. Caso estejam fora de seu país de origem ou sejam filhos
de imigrantes dentro de um determinado país que lhe deu a nacionalidade, com
certeza, o Alcorão é seguido em primeiro lugar antes do ordenamento jurídico do
país onde se é nato.
Hajjami em seu artigo ratifica essa posição quando refere-se que a
condição de inferioridade e de precariedade nas quais estão confinadas a maior
parte das mulheres nas sociedades árabe-muçulmanas são oriundas principalmente
da hegemonia de um sistema patriarcal, o qual usa a religião para legitimar as
situações de dominação, de violência e de
exclusão em relação às mulheres.
Nem todos os países do Mundo fazem parte da Organização das
Nações Unidas, não temos um Tribunal Internacional que tutele todos os direitos
fundamentais, não possuímos uma legislação supranacional e politicamente as
fronteiras não são porosas ou flexíveis para deixarem uma legislação supranacional
abocanharem boa parte de sua soberania. Contamos com Declarações, Resoluções
que são afetas aos países membros dessas organizações internacionais que se
ratificadas, passam a ter eficácia dentro de seus países, até por uma questão de
soberania.
Assim, contamos com soluções regionalizadas para o respeito aos
direitos fundamentais das mulheres. No Brasil, como foi citado, contamos com a
tutela e garantia desses direitos desde a Constituição Federal vigente, mas em
relação às mulheres muçulmanas, o Alcorão também é usado como código jurídico.
A esse respeito, o que esse livro sagrado prescreve, por uma questão cultural, é
aceito e considerado tanto por homens como mulheres adeptos do islamismo.
Considerações Finais:
A tutela dos direitos fundamentais em relação às mulheres, no Mundo
Ocidental, no que diz respeito à vida pública é garantida. O direito positivo reforçou a
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tutela dos direitos à vida, à integridade física, aos direitos sociais e eleitorais para a
classe feminina, entre outros, deixando a mulher em pé de igualdade com os
homens, entretanto, mesmo havendo a tutela desses mesmos direitos na esfera da
vida privada, a mera positivação não garante que as mulheres não sejam agredidas,
mortas e discriminadas.
As diferenças culturais com seus particulares modos de enxergar o
outro e viver no Mundo para as sociedades em geral, enseja discriminações
gritantes à mulher. A história da humanidade nos mostra que a mulher sempre foi
relegada aos planos de cuidar dos afazeres domésticos e da prole, enquanto o
homem foi o responsável pelo sustento. Esse paradigma foi sendo substituído
paulatinamente, tendo em vista os fatos históricos irem mudando as necessidades
sociais, do qual podemos citar as guerras mundiais onde os homens lutavam e o
mercado de trabalho foi necessitando cada vez mais da inserção da mão-de-obra
feminina.
A sociedade mundial por mais que exija a normatização de seus
direitos, não é capaz de solucionar os seus conflitos. É factível considerar que
poderemos beber na fonte de um direito humano universal e que as sociedades
assim viveriam uníssonas. É possível a determinação de um jusnaturalismo,
observando as necessidades básicas do ser humano, como o beber água, comer,
excretar e dormir, contudo, há de se observar que o vestir já não é uma necessidade
de todos os povos existentes no planeta.
Dessa maneira, os direitos fundamentais das mulheres brasileiras e
muçulmanas tocam-se na medida em que são jusnaturais, no encontro com as
necessidades no decorrer da história em cuidar da casa e dos filhos e na medida
que essas diferentes sociedades abrem-se para as suas próprias necessidades de
existência e sustentação e a mulher vai sendo solicitada a assumir papéis sociais
antes somente cabíveis aos homens.
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EXTRAFISCALIDADE TRIBUTÁRIA NA PROTEÇÃO AMBIENTAL
Andréa Madureira Gomes de Oliveira241
RESUMO
Na atualidade, o desenvolvimento das empresas e indústrias tem agredido o meio
ambiente além do razoável e do permitido a um custo ambiental de alta magnitude.
Partindo disto, para que a tributação seja utilizada como mecanismo de tutela
ambiental, não pode ser tida unicamente em sua finalidade fiscal, ou seja,
meramente arrecadadora de recursos. A tributação tem que visar a prática ou a
inibição de comportamentos, pelo que se configura a finalidade extrafiscal.Tal
mecanismo de tributação proporciona uma aproximação do sistema tributário com as
perspectivas ambientais da sustentabilidade, voltado principalmente para a proteção
ambiental. A utilização da tributação extrafiscal socioambiental representa a nova
manifestação contemporânea da política extrafiscal, influenciada pela crescente
conscientização e proteção do meio ambiente, sempre remetidas aos discursos de
sustentabilidade sistêmica.
Palavras-Chave: Tributação Ambiental; Extrafiscalidade; Proteção Ambiental.
1 INTRODUÇÃO
As empresas e indústrias nacionais devem ter por objetivo atender a
demanda mercadológica produzindo bens de consumo de melhor qualidade, com a
melhor tecnologia possível, com menor custo econômico e, também, ambiental. Para
isso, devem investir em equipamentos cada vez mais modernos, com tecnologia de
ponta.
Observa-se, contudo, que muitas vezes tais equipamentos agridem o meio
ambiente além do razoável e do permitido a um custo ambiental de alta magnitude
com danos ambientais que serão reparados, muitas vezes, pelo Estado.
Para que a tributação seja utilizada como mecanismo de tutela ambiental,
não pode ser tida unicamente em sua finalidade fiscal, ou seja, meramente
arrecadadora de recursos. A tributação tem que visar a prática ou a inibição de
comportamentos, pelo que se configura a finalidade extrafiscal.
241
Advogada e Pós-graduanda em Direito do Estado – área de concentração: Direito Administrativo – da Universidade Estadual de Londrina (2011-2012). Email: [email protected]
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Tal mecanismo de tributação proporciona uma aproximação do sistema
tributário com as perspectivas ambientais da sustentabilidade, voltado
principalmente para a proteção ambiental.
Além disso, a utilização da tributação extrafiscal socioambiental representa a
nova manifestação contemporânea da política extrafiscal, influenciada pela
crescente conscientização e proteção do meio ambiente, sempre remetidas aos
discursos de sustentabilidade sistêmica.
Resta claro, então, que a extrafiscalidade socioambiental é a utilização de
mecanismos tributários voltados para a obtenção de resultados sociais e ecológicos
sistemicamente sustentáveis. Ou seja, é o instrumento de natureza tributária de
intervenção do Estado na ordem econômica, com o objetivo de induzir melhores
condutas sociais e ambientais e inibir comportamentos econômicos geradores de
externalidades negativas, tutelando o meio ambiente, direito garantido
constitucionalmente, que deve ser respeitado.
O presente trabalho busca verificar se a tributação ambiental pode
ou não ser utilizada como uma alternativa na busca pela preservação do meio
ambiente, trabalhadas as temáticas da área tributária em interface com as bases
teóricas da expressão, desenvolvimento sustentável bem como da proteção
ambiental, para finalmente entender a condição da extrafiscalidade e sua aplicação
no Brasil, juntamente com alguns esclarecimentos sobre políticas públicas voltadas
ao meio ambiente.
2 EXTRAFISCALIDADE DOS TRIBUTOS AMBIENTAIS
Essencial a ser colocado é que para cada tributo criado e cobrado há uma
finalidade específica. No Brasil, os tributos podem ser classificados como fiscais ou
de finalidades fiscais, parafiscais ou de finalidade parafiscais ou então extrafiscais
ou de finalidades extrafiscais.
2.1 Tributação Fiscal
Os tributos fiscais são aqueles que visam apenas à obtenção de receitas
públicas para fazer face às despesas do Estado. Tais tributos possuem função
exclusivamente financeira, qual seja, a de gerar riquezas para o atendimento dos
fins do Estado que, como já dito, é a finalidade normal, natural, de todo tributo
genericamente considerado.
Ademais, estão fundamentados nos princípios de uma economia clássica
onde se busca evitar uma maior ingerência do Estado na atividade econômica do
particular, servindo apenas de instrumento financeiro para carrear receitas públicas
necessárias às despesas estatais (OLIVEIRA; PÉRILLIER, 2006, p. 105).
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2.2 Tributos Parafiscais
A parafiscalidade na tributação diz respeito ao custeio das atividades
exercidas por entidades que auxiliam a administração direta do Estado (GUSMÃO,
2006, p. 1319)
Essa finalidade parafiscal de tributo diz respeito a uma técnica que, em
regime de intervencionalismo econômico e social, visa a desenvolver e empregar
receitas de aplicação especial, fora do orçamento, arrecadadas compulsoriamente,
por conta de organismos de economia dirigida, organização profissional ou
previdência social, seja diretamente pelos entes beneficiários, seja pelas estações
arrecadadoras do Estado (MERIGOT apud ROCHA, 1999).
Há, nos tributos parafiscais, a transferência da capacidade tributária, pois
que outra pessoa jurídica (normalmente de direito público) assume a função de
arrecadar o tributo, que é criado pela entidade federativa.
A jurisprudência coaduna com este entendimento como se verifica pela
seguinte ementa (destacado):
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO
SOCIAL PARA O SALÁRIO EDUCAÇÃO. LEGITIMIDADE DO
INSS. TITULARIDADE DE CAPACIDADE TRIBUTÁRIA ATIVA
POR FORÇA DE DELEGAÇÃO. CTN, ART. 7º, § 1º. LEI
9.424/96. IRRELEVÂNCIA, NA AÇÃO DECLARATÓRIA, DO
DESTINO DO PRODUTO DA ARRECADAÇÃO. CTN, ART. 4º.
RECURSO CABÍVEL NO CASO DE EXCLUSÃO APENAS DE
UMA DAS PESSOAS QUE FIGURAM COMO PARTE
PASSIVA NA AÇÃO: AGRAVO.
I - O agravo é o instrumento adequado para decisão que,
excluindo uma das pessoas que compõem o pólo passivo da
relação processual, não põe termo ao feito, determinando o
seu prosseguimento em relação aos demais integrantes da
ação.
II- A capacidade tributária, na parafiscalidade, é delegada
nos termos do caput do art. 7º do CTN, importando na
transmissão dos poderes para arrecadar, fiscalizar e
executar leis, serviços, atos ou decisão em matéria
tributária.
III- Sendo, por força de norma legal, o INSS titular da
capacidade para exigir a Contribuição para o Salário Educação,
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deve compor o pólo passivo das ações onde o sujeito passivo
busca o reconhecimento da inexigibilidade do tributo.
IV- No âmbito de lide respeitante à intributabilidade de exação,
o destino do produto da arrecadação é juridicamente
irrelevante.
V- Agravo provido (BRASIL, 2000).
Pode-se exemplificar tal finalidade tributária como o caso da contribuição
para entidades de classe (exceto a contribuição para a OAB), das contribuições
previdenciárias (destinada ao INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, que é
autarquia federal) e da contribuição sindical (destinada aos sindicatos, nos termos
do art. 579 da Consolidação das Leis do Trabalho, que não se confunde com a
contribuição confederativa, do art. 8º, IV, da Constituição Federal, que não é tributo);
tais tributos são criados pela União Federal, mas outras entidades detêm a
capacidade para arrecadá-los (MUZZI, 2009, p.17).
Para Geraldo Ataliba (apud Muzzi, 2009, p.17) a noção de parafiscalidade é
inútil, só se prestando para tentar excluir do rol dos tributos diversas exigências que
são tributárias.
2.3 Tributos Extrafiscais
Diferentemente dos tributos fiscais e dos parafiscais, os extrafiscais
possuem objetivos distintos à geração de receitas para cobrir as despesas
extraordinárias do Estado. Notadamente se refere a funções político-sociais e
econômicas.
Por intermédio desses tributos é que o Estado exerce seu poder de
intervenção no controle da economia e do meio social, passando o tributo a agregar
ao lado da função meramente arrecadatória, a servir como instrumento de
intervenção ou regulação pública, de dirigismo estatal (OLIVEIRA; PÉRILLIER,
2006, p. 105).
A tributação sob o viés da extrafiscalidade é a moldura que se vem
desenhando na contemporaneidade. O tributo não tem mais somente a função de
financiar o Estado em seu finalismo clássico ou tradicional, mas a de um instrumento
de intervenção estatal no meio social e na economia privada (GUSMÃO, 2006, p.
1319).
Tal forma de utilização dos tributos é entendida como passível de gerar
maiores benefícios à coletividade do que a simples arrecadação tributária. Parte-se
do pressuposto de que a atividade fiscal estaria sendo orientada no sentido de
influir, direta e intencionalmente, sobre determinada conjuntura econômica, de modo
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a amoldá-la de acordo com o interesse coletivo (OLIVEIRA; PÉRILLIER, 2006, p.
111.).
Dessa forma, abre-se o campo de atuação do Direito Tributário enquanto
interventor na ordem econômica, com a função de conduzir a uma ação ou omissão
do particular no sentido de preservação de um meio ambiente não poluído. Um
exemplo de ação seria no caso de ao impor uma carga tributária mais benéfica para
o empreendedor que demonstrar a observância das regras ambientais ou que venha
a criar um programa de reflorestamento de uma determinada área devastada. Com
relação a omissão, ou seja, um não fazer, trata-se de inibir a prática de determinada
atividade nociva ao meio ambiente por meio da imposição de uma carga tributária
mais elevada ou da impossibilidade de consideração de algumas despesas no
cômputo do lucro tributável, de forma que o empreendedor venha buscar outras
alternativas em relação àquela atividade.
Deve-se analisar que a extrafiscalidade se mostra com duas faces enquanto
forma de intervenção pública na esfera do particular. A primeira delas é a
extrafiscalidade atuando em conjunto com a fiscalidade, constituindo uma dimensão
finalística do tributo. Já a segunda é a da extrafiscalidade pura, enquanto categoria
autônoma de ingressos públicos, gerando prestações não tributárias (OLIVEIRA;
PÉRILLIER, 2006, p. 112).
É bastante claro que existe uma linha tênue que separa a extrafiscalidade da
fiscalidade. E separar as duas, de maneira incisiva e absoluta é impossível, haja
vista que sempre, em maior ou menor grau, o tributo apresentará um grau de
fiscalidade e um grau de extrafiscalidade (MARINS; TEODOROVICZ, 2010 p. 1248).
Se a extrafiscalidade e a fiscalidade não se separam, mas caminham lado a
lado, muitas vezes misturadas de tal forma que seja quase impossível dissociá-las,
ou identificá-las, é preciso entender que a visão de extrafiscalidade muda conforme
o contexto em que vivemos e conforme os objetivos almejados em cada sociedade
(MARINS; TEODOROVICZ, 2010, p. 1249).
A extrafiscalidade coloca em destaque a produção de efeitos
intervencionistas da atividade financeira, ou seja, efeitos tidos como consequência
da atuação estatal, por intermédio das finanças públicas, na esfera privada. E tal
intervenção pode se justificar também como forma mais adequada na busca do fim
almejado, tendo em vista que em determinadas situações é muito mais eficaz a
extrafiscalidade como indutor de certas atividades do que a arrecadação de tributos
para custear a fiscalização exercida pelos órgãos públicos (OLIVEIRA; PÉRILLIER,
2006, p. 112-113).
2.4 A Extrafiscalidade, o desenvolvimento sustentável e a proteção ao meio
ambiente
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O conceito de desenvolvimento sustentável está integralmente atrelado à
ideia de suprir as necessidades da geração presente sem afetar a habilidade das
gerações futuras de suprir as suas.
O desenvolvimento consciente busca alcançar o aprimoramento das
relações econômicas, mas deve levar consigo a proteção ao meio ambiente e o
combate à pobreza, enquanto freios e contrapesos que serviriam para afastar a
busca descontrolada e inconsequente do desenvolvimento econômico (MARINS;
TEODOROVICZ, 2010, p. 1251).
Deve-se então, buscar o maior desenvolvimento possível, desde que,
também se busque a preservação da biodiversidade ou dos ecossistemas naturais,
incluso também a preservação do ser humano, uma vez que a proteção ambiental
mantém relação intrínseca entre o equilíbrio ecológico e o antropológico. Os direitos
do homem, o direito da sobrevivência perante um meio ambiente ecologicamente
equilibrado, é pressuposto para alcançar a chamada sustentabilidade sistêmica, da
qual nem o homem e nem mesmo o meio ambiente devem se afastar, sob pena de
promoção de inevitável polarização entre o progresso a qualquer custo e a proteção
ecológica sem considerar as necessidades humanas (MARINS; TEODOROVICZ,
2010, p. 1252-1253).
A partir disto, se a sustentabilidade apresenta aspectos políticos,
econômicos, sociais, ambientais, etc. é evidente que a sua reflexão também recai
sobre o fenômeno financeiro e, por extensão, sobre a atividade tributária.
A tributação sempre foi instrumento útil para a implementação de políticas
predeterminadas, seja através da fiscalidade ou da extrafiscalidade, ocupando
posição primordial para o desenvolvimento de determinados objetivos, refletindo-se
nos ordenamentos jurídicos nacionais.
No aspecto da tributação fiscal utiliza-se a mesma para arrecadar receitas e
direcionar esses fundos aos objetivos previamente estipulados, como por exemplo, a
sustentabilidade ou desenvolvimento sustentável, aplicando-se políticas de
favorecimento a esses ideais pré-estabelecidos. Outrossim, nesse aspecto a
tributação não teria tantas modificações, permanecendo com seus moldes
conceituais, apenas após a arrecadação é que se daria atendimento a
sustentabilidade (MARINS; TEODOROVICZ, 2010, p. 1253-1254).
Já a extrafiscalidade socioambiental é a utilização de mecanismos tributários
voltados para a obtenção de resultados sociais e ecológicos sistemicamente
sustentáveis. Logo, a extrafiscalidade é instrumento de natureza tributária de
intervenção do Estado na ordem econômica, com o objetivo de promover (induzir)
melhores condutas sociais e ambientais e inibir comportamentos econômicos
geradores de externalidades negativas (MARINS; TEODOROVICZ, 2010, p. 1262).
É nessa seara que se percebe que o caráter extrafiscal prevalece na
tributação ambiental, pois seu escopo é estimular condutas não poluidoras e coibir
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as agressoras ao meio ambiente, ficando a natureza arrecadatória em um plano
secundário. No primeiro momento, ter-se-ia, então, uma atuação estatal voltada para
direcionar os comportamentos dos contribuintes a perseguirem novas e adequadas
tecnologias que previnem, neutralizem ou minimizem o impacto negativo de suas
atividades econômicas ao meio ambiente (AMARAL, 2007, p.65).
Na tributação extrafiscal o que menos importa é o tributo, mas sim o
especifico reflexo econômico e social que se quer alcançar. A função extrafiscal do
tributo tão bem utilizada como instrumento de intervenção econômica quando se
quer equilibrar a balança comercial, é mecanismo adequado a auxiliar na
concretização do valor do meio ambiente, estimulando condutas positivas ou
desestimulando condutas nocivas à proteção e à preservação ambiental.
É claro, portanto, que o uso do instrumento tributário de tutela do ambiente
se referirá às atividades, produtos ou substâncias, que mais do que outras possam
causar danos ao ambiente. Isso leva a individualizar quais são as atividades,
produtos e substancias, bem como quais as figuras tributárias que possam realizar
os objetivos extrafiscais para a defesa do ambiente (AMARAL, 2007, p.69).
2.5 A Extrafiscalidade Tributária Ambiental no Brasil
No ordenamento jurídico brasileiro, o art. 170 da Constituição Federal de
1988, veicula dentro do rol dos princípios gerais que orientam a atividade
econômica, a proteção ao meio ambiente, em seu inciso VI.
Outro artigo extremante importante é o 225, também da Carta Magna de 88,
relativo ao meio ambiente. Este dispositivo expõe a necessidade de se garantir o
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo-se ao Poder Público
e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para que as gerações futuras
possam desfrutar do meio ambiente protegido, ideia esta atrelada diretamente à
noção de sustentabilidade (MARINS; TEODOROVICZ, 2010, p. 1266).
Portanto, são dois dispositivos constitucionais que se reputam essenciais no
estudo jurídico desses instrumentos tributários no ordenamento jurídico brasileiro,
uma vez que a Constituição Federal não previu, expressamente, a possibilidade de
utilizar os tributos na defesa do meio ambiente. No entanto, isso não quer dizer que
a tributação ambiental esteja afastada ou proibida em nosso país.
A Carta Magna consagra o princípio da solidariedade (art. 3º, I), princípio do
poluidor pagador (art. 225, §3º), atribui a proteção ambiental à qualidade de princípio
da ordem econômica (art. 170, VI), além de colocar a tutela do meio ambiente como
um dos pilares da ordem social (art. 225). Logo, interpretando sistemicamente a
Constituição brasileira, percebe-se que a tributação desempenhará excelente papel
na realização de seus objetivos constitucionais, como a proteção do meio ambiente
(AMARAL, 2007, p.65).
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O Estado brasileiro procura atingir suas finalidades institucionais impondo
diretrizes à sociedade, com repercussões no setor privado, objetivando a orientação
ou referência para o emprego das estratégias públicas para atingir determinado
objetivo.
As Políticas Ambientais devem estar orientadas para a proteção ambiental
sopesadas com o direito ao desenvolvimento humano, numa busca de equilíbrio e
harmonia entre o dever de preservar e o direito de desenvolver. Tem também como
instrumento grandioso a tributação (extrafiscalidade), com o objetivo primordial de
incentivar a observância e a aplicação dos princípios tributários ambientais, na
preservação de um ambiente sadio e de qualidade para a sobrevivência humana
(MAGANHINI, 2007, p. 83).
Para a formação de uma política ambiental correta são necessários alguns
aspectos tais como:
- considerar que o Estado é um participante necessário na resolução dos
problemas em virtude de que os particulares não podem consensar as alternativas
de solução;
- avaliar se a gama de instrumentos econômicos aos quais se pode recorrer,
não podem tornar inoperável a atividade, pelo que deve ser feita uma profunda
análise das consequências que podem produzir quando da sua implementação;
- incentivar mais do que penalizar, enaltecer os aspectos distributivos, bem
como projetar sua eficácia e sua eficiência (ALTAMIRANO apud MAGANHINI, 2007,
p. 83-84).
A intervenção do Estado na economia como agente regulador, normativo da
atividade econômica enfatizada pelos arts. 170, 173 e 174 da Constituição Federal
preconizam a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa, para assegurar a
todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social.
Para alcançar o objetivo da defesa do meio ambiente deverá encontrar na
tributação ambiental um instrumento eficaz para alcançar os objetivos propostos,
através da extrafiscalidade ambiental, que concederá incentivos, isenções e
graduação das alíquotas dos tributos para orientar o comportamento do contribuinte
a uma conduta ambientalmente correta.
Em face disto, o Estado fica dispensado do emprego de multas e sanções
punitivas para corrigir o poluidor, conscientizando o cidadão a encontrar um ponto de
equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e o meio ambiente, isto é, a atuação
estatal na proteção ao meio ambiente se mostra mais eficaz na forma preventiva e
não na repressiva ou reparatória (MAGANHINI, 2007, p. 84).
Cabível esclarecer, que a extrafiscalidade não visa a impedir certa atividade
(para isso existem as multas e as proibições), mas tem por fim condicionar a
liberdade de escolha do agente econômico, através da graduação da carga
tributária, ou então, como no caso, em função de critérios ambientais. Dessa forma,
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a extrafiscalidade intenta influir na opção do contribuinte por esta ou aquela
atividade lícita, em outras palavras, na decisão da prática de um ato que a lei
permite (OLIVEIRA, 2007, p.107).
Partindo do exposto, o escopo essencial da tributação ambiental é,
principalmente, mudar comportamentos se comparado ao seu efeito gerador de
receitas. Ao se tributar atividades nocivas ao meio ambiente, porém necessárias ao
desenvolvimento ou à própria existência da vida em sociedade, não pode haver essa
tributação com o intuito de proibi-las. Todavia, tem o objetivo de estimular que os
agentes econômicos adotem ou desenvolvam constantemente tecnologias cada vez
mais limpas e eficientes. Se o objetivo fosse proibi-las, utilizar-se-ia outro
expediente.
Logo, a utilização dos tributos como forma de atender aos fins
constitucionais assume excelente papel na proteção ambiental, tanto por seu caráter
fiscal quanto pelo extrafiscal, captando recursos para financiar projetos ambientais
ou estimulando condutas não poluidoras, respectivamente (AMARAL, 2007, p.68-
69).
Marins e Teodorovicz (2010, p.1271) acreditam que a extrafiscalidade
socioambiental estará inevitavelmente inserida com maior força no sistema tributário
nacional, porque ela é uma realidade que não escapa mais a política legislativa.
Sendo assim, a atividade tributária extrafiscal contemporânea vive nova
remodelação em face dos ideais contemporâneos de sustentabilidade sistêmica.
Nesse diapasão, a extrafiscalidade se caracterizará pelo emprego de
fórmulas jurídico-tributárias para alcançar a proteção ambiental que prevalecerá
sobre a finalidade puramente arrecadatória para abastecimento dos cofres públicos.
Consequentemente, o legislador, ao desenvolver suas pretensões ambientais, por
meio dos tributos, deverá se ater aos limites da competência tributária. Dessa forma,
a proteção ambiental não possui força para instituir regime tributário excepcional,
visto que os instrumentos jurídicos utilizados são os mesmos, modificando-se
apenas o andamento do seu exercício, qual seja a proteção ambiental (AMARAL,
2007, p.70).
3 CONCLUSÃO
A tributação ambiental em seu caráter extrafiscal assume papel importante
na economia brasileira, uma vez que além de arrecadar fundos para os cofres
públicos, tem como primordial objetivo induzir condutas de preservação ambiental.
Pode-se dizer que a natureza essencial da tributação ambiental é estimular o
desenvolvimento de atividades de proteção ambiental.
Necessário salientar que a estipulação de tributos extrafiscais não altera a
competência tributária das pessoas políticas; poderão apenas utilizar tributos de
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suas respectivas competências para incentivar atividades de proteção ambiental,
sem invadir a competência tributária de outro, respeitando principalmente o
estipulado na Constituição Federal de 1988.
Utiliza-se essa finalidade como forma de incentivar a redução da
poluição/degradação àqueles que utilizam o meio ambiente de maneira excessiva,
acarretando prejuízos para toda a coletividade.
No entanto, o instituto da tributação ambiental no Brasil não é forte
argumento que impeça a poluição ambiental ou então que incentive a preservação,
posto que a própria tributação não é objeto de fiscalização pelos órgãos públicos,
como se verifica pelas inúmeras denuncias de sonegação de impostos que
aparecem cotidianamente.
Dessa forma, não basta ter uma legislação que conste em seu texto a
previsão de tributos incentivadores de conduta se não houver fiscalização constante
das empresas que receberem incentivos.
Ainda, é importante que se trabalhe mais as políticas ambientais, inserindo
gradativamente na mentalidade das empresas e dos particulares que se deve
preservar o meio ambiente, atingindo assim o previsto no texto constitucional.
Em contrapartida, sabe-se que as políticas públicas ambientais são antigas,
de legislação bastante teórica e extremamente burocráticas, pelo que acarreta
dificuldades para por em prática tais determinações. A economia, a cultura, o
desenvolvimento, o mercado evoluíram e alcançaram novas formas com o passar
dos anos. Dessa forma, as políticas ambientais existentes são inócuas, pelo que um
processo de reforma das mesmas adequando-as as necessidades atuais e visando
a sua fácil aplicação seria imprescindível.
Sendo assim, a tributação ambiental com finalidade extrafiscal não pode ser
a única alternativa a ser usada pelo governo para a prevenção ambiental. Tal
medida deve ser atrelada a outros mecanismos tais como a fiscalização das ações
e/ou omissões da empresa, assim como devem ser atualizadas e postas em prática
e de maneira efetiva às políticas ambientais já existentes, de forma a conscientizar a
coletividade para que aos poucos ajam de maneira preventiva e consigam alcançar
o desenvolvimento necessário e almejado de maneira sustentável.
REFERÊNCIAS
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Tribunais, 2007.
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Agravo de Instrumento. AG
4785. DF 1997.01.00.004785-8, Relator: JUIZ HILTON QUEIROZ, Data de
Julgamento: 30/06/2000, QUARTA TURMA, Data de Publicação: 22/09/2000 DJ
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A ISONOMIA TRIBUTÁRIA NO CONTEXTO DOS ARTIGOS 5º, CAPUT E ARTIGO
150, INCISO II DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Yuri John Forselini242
RESUMO: O presente artigo tem por escopo, trazer à lume, algumas ponderações
críticas a cerca do princípio da isonomia tributária consubstanciado no caput do
artigo 5º, do texto constitucional e do princípio da isonomia alicerçado no artigo 150,
II da Constituição Federal de 1988. Pretende também abordar relevantes aspectos
da isonomia tributária, focando-se a cláusula pecúnia non olet, o que segundo a
doutrina, o tributo deve incidir sobre as atividades lícitas e de igual modo, sobre
aquelas tidas por ilícitas ou imorais; a cláusula pecúnia non olet e a intributabilidade
dos atos ilícitos, linha de argumentação oposta, demonstrando que a incidência
tributária não poderá ocorrer perante os atos ilícitos; e a cláusula pecúnia non olet e
a plena capacidade tributária passiva, demonstrando que esta capacidade, é plena,
não comportando restrições, à luz do disposto no artigo 126 do Código Tributário
Nacional.
Palavras-Chave: Igualdade; Tributação; Atos Lícitos e Ilícitos.
ABSTRACT: This article is scope to bring to light some critical considerations about
the principle of equality embodied in the tax caput of Article 5 of the Constitution and
the principle of equality grounded in Article 150, II of the Constitution of 1988. It also
aims at addressing relevant aspects of equality of taxation, focusing on the clause
pecunia non Olet, which according to the doctrine, the tax must focus on the legal
activities and likewise, those taken over by illegal or immoral; clause pecunia non
Olet and intributabilidade of illegal acts, the opposite line of argument, showing that
the tax incidence will not occur before the tort, and the clause pecunia non Olet and
full capacity to tax passive, demonstrating this, the capacity to tax passive, is full, do
not involve restrictions by the light of Article 126 of the tax code.
242
Mestrando em Direito Processual Civil pela UNIPAR – PR. Pós-Graduado em Direito Empresarial pela
Faculdade Direito de Curitiba.Pós-graduado em Direito Público pela Faculdade Mater Dei – Pato Branco –
Paraná. Advogado.
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Keywords: Equality – Taxation – Acts lawful and unlawful.
1. INTRODUÇÃO
A relativização da igualdade visa um tratamento de desigualização daqueles
considerados ‘iguais’, ou, ainda, que se premie um tratamento isonômico “aqueles
tidos como ‘dessemelhantes’, posto que se trataria de se permitir uma condenável
desigualdade à luz da possibilidade de uma aconselhável isonomia” (SABBAG,
2009, p. 91).
No Brasil, o princípio da isonomia foi definido, de forma genérica no artigo 5º
da Constituição Federal de 1988, nos termos abaixo expostos:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade (...)
Por oportuno, destaca-se a importância do princípio da igualdade ora
abordado em virtude da sua destacada posição no artigo 5º, dispositivo o qual
enumera os direitos e garantias individuais, fato que leva a conclusão, de que tal
princípio regulará todos os outros direitos que a ele sucedam.
É imperioso destacar, que na igualdade perante a lei, o que se observa, é se
a lei está sendo cumprida no seu aspecto formal, de modo uniforme a todos os
cidadãos a que ela se dirige.
Preconiza Sabbag, (2009, p. 93) que esta dimensão da igualdade:
Mostra-se como cláusula geral de proibição do arbítrio,
obstaculizando ao legislador a adoção de critérios casuísticos e
opções políticas no tratamento normativo das situações
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equivalentes que o levem a promover discriminações gratuitas
e artificiais.
Para (BETTI, 1949, p. 208) os princípios gerais da igualdade e da
capacidade contributiva orientam a legislação, mas são de dificílima concreção
prática. E. Becker indaga: “O que é justo, o que é igual, o que é desigual?
Segundo DERZI (1982, pp. 56 e 61) com rigor, intenta a resposta:
“É altamente controvertido separar o que seja igual do
desigual, pois sujeitos e conceitos a variações histórico-culturais.
Não obstante, o preceito da igualdade, disposto na Constituição,
já é dotado de substância e conteúdo jurídico: é vedado
distinguir os homens segundo o sexo, a raça, etc... que sob tal
aspecto são juridicamente iguais. E os iguais devem ser
igualmente tratados, pois diz a norma que os homens, mesmo
diferindo em sexo, ou credo religioso, são iguais. Esse é o
enfoque do princípio da igualdade mais corrente: uma proibição
de distinguir. Alguns autores analisam-na exclusivamente sob o
aspecto negativo. É aliás, o enfoque corrente. Celso Bandeira de
Mello, não obstante o brilhantismo do tratamento que dispensou
à matéria, também deu-lhe a seguinte abordagem: “é vedado ao
legislador distinguir”. Mas a isonomia, com relação ao Direito
Tributário, deve ser formulada também, necessariamente, de
maneira positiva. Em matéria fiscal, interessa menos saber o
que o legislador está proibido de distinguir e mais o que ele deve
discriminar. Só há tratamento igual aos desiguais, como dizia o
grande mestre e príncipe do Direito brasileiro, que é Rui
Barbosa, em matéria tributária, “se cada qual tiver de contribuir
com imposto, de acordo com sua capacidade contributiva”
(Geraldo Ataliba, “Do Sistema Constitucional Tributário, in Curso
sobre Teoria do Direito Tributário, São Paulo, Tribunal de
Impostos e Taxas, 1975, p. 251).
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Segundo (NAVARRO COELHO, 2005, p. 273), o principio da igualdade da
tributação impõe ao legislador:
“a) discriminar adequadamente os desiguais, na medida de suas
desigualdades;
b) não discriminar entre os iguais, que devem ser tratados
igualmente.”
Cabe ainda trazer à luz, os ensinamentos de (AMARO, 2005, p. 134-135), in
verbis:
“A igualdade de todos perante a lei abre, pleonasticamente, o
capítulo dos direitos e deveres individuais e coletivos da
Constituição (o art. 5º, caput, assegura que todos são iguais e
garante a todos o direito à igualdade, insistindo o inciso I em
reafirmar que os homens e mulheres são iguais), escoando o
mesmo princípio no inciso III do art. 19, que veda a
discriminação entre brasileiros. O principio é particularizado no
campo dos tributos, pelo artigo 150, II, ao proscrever a
instituição de “tratamento desigual entre contribuintes que se
encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção
em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida,
independentemente da denominação jurídica dos rendimentos,
títulos ou direitos.”
Passado a análise introdutória dos aspectos reputados relevantes a cerca do
princípio da isonomia tributária, no decorrer deste artigo, serão abordados aspectos
da isonomia tributária e a possibilidade da tributação de atos ilícitos, à luz do
disposto no artigo 26, da Lei n. 4.506/64, conhecida como Lei do Imposto de Renda,
a qual dispõe que os rendimentos derivados de atividades ou transações ilícitas, ou
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percebidas com infração à lei, são sujeitos à tributação sem prejuízo das sanções
que couberem.
Além desta importante cláusula que registra a possibilidade de tributação
dos atos ilícitos, será realizado uma incursão à cláusula pecúnia non olet e a não
possibilidade de tributação dos atos ilícitos em virtude de uma antinomia com o
artigo 3º do Código Tributário Nacional, segundo o qual “tributo é toda prestação
pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir; que não
constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade
administrativa plenamente vinculada”.
E por fim, à luz do artigo 126 do Código Tributário Nacional, que dispõe que
a capacidade tributária passiva independe da capacidade civil das pessoas naturais,
será analisada a cláusula pecúnia non olet e a plena capacidade tributária passiva.
Feita esta breve introdução, passa-se a analisar mais detidamente o
princípio da isonomia tributária e seu balizamento jurídico, matéria que reserva
grandes desafios para os operadores do direito, conforme se demonstrará no
decorrer deste artigo.
2 A ISONOMIA TRIBUTÁRIA E SEU BALIZAMENTO JURIDICO
A isonomia tributária tem seu balizamento expresso no artigo 150, inciso II
da Constituição Federal de 1988, a saber:
É vedado (...) instituir tratamento desigual entre contribuintes que
se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer
distinção em razão da ocupação profissional ou função por ela
exercida, independentemente da denominação jurídica dos
rendimentos, títulos ou direitos.
Trata-se de princípio constitucional que impede o tratamento tributário
desigual a contribuintes que se encontrem em situação de equivalência. Aqui é
importante registrar, a temática da igualdade, em que a isonomia do artigo 5º. é
erigida a princípio genérico, enquanto a isonomia do artigo 150, II, CF, é jungida a
matéria tributária.
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Canotilho, (1999) quando se refere ao princípio da isonomia, explora-o à luz
da proibição geral do arbítrio:
[...] no sentido de que existe observância da igualdade quando
indivíduos ou situações iguais não são arbitrariamente tratados
como desiguais [...] O princípio da proibição do arbítrio,
costuma ser sintetizado na forma seguinte: existe uma violação
arbitrária da igualdade jurídica quando a disciplina jurídica não
se basear num: (i) fundamento sério; (ii) não tiver sentido
legítimo; (iii) estabelecer diferença jurídica sem fundamento
razoável (CANOTILHO, 1999, p. 398).
Enquanto no art. 5º, da Constituição Federal de 1988, busca-se afirmar, no
plano positivo, uma realidade, dispondo-se que “todos são iguais perante a lei (...)”,
no comando específico, afeto à isonomia tributária (art. 150, II), almeja-se
negativamente inibir uma dada conduta, por meio do mandamento:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao
contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios:
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se
encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção
em razão de ocupação profissional ou função por eles
exercida, independentemente da denominação jurídica dos
rendimentos, títulos ou direitos (CONSTITUIÇÃO FEDERAL,
1988).
Forçoso concluir, que se o postulado da isonomia tributária dispõe, que é
proibido instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em
situação de eqüipolência, mostra-se, nessa dimensão negativa, como aduzido por
Sabbag (2009, p. 94) “como cláusula de defesa do cidadão contra o arbítrio do
Estado, aproximando-se da concepção da “isonomia na lei (ou através da lei)”.
Registra-se, que o princípio da igualdade tributária, é também denominado
de “princípio da proibição dos privilégios odiosos”, pois se preocupa em inibir
condutas discriminatórias, favorecimentos por meio da tributação.
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Em termos de ordem política, o princípio da igualdade tributária no Brasil
aparece como princípio de inegável relevância, pois somente em tempo de
democracia é possível reduzir, restringir as desigualdades tributárias, os
favorecimentos sem razões justificáveis, como v.g., a concessão de isenção de
imposto de renda para deputados, militares e magistrados, como ocorreu no período
de vigência do regime ditatorial.
Verifica-se, que após o período ditatorial aquelas odiosidades no tratamento
tributário cederam espaço a aplicação de critérios de razoabilidade na concessão de
benefícios aos contribuintes, de modo, que o princípio da igualdade tributária,
tornou-se escudo de proteção aos atos discriminatórios em razão da condição social
e das classes dos contribuintes.
É cediço, que a faculdade de discriminar é da própria essência do poder
tributante. O princípio da isonomia tributária em determinados momentos pode se
revelar de difícil aplicação em virtude de interesses antagônicos. De um lado, o
Estado como ente tributante; de outro lado, o particular, como pessoa tributada; e
por fim, a influência dos setores econômicos prestigiados por uma política de
desoneração tributária através de isenções e benefícios fiscais.
Em expressão cunhada pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso
Extraordinário n. 423.768, “diz que o princípio da isonomia tributária é postulado
vazio, recebendo o conteúdo axiológico de outros valores, como a liberdade e a
justiça, ou, “justiça tributária”.
Neste sentido, conforme ressalta Sabbag (2009, p. 95) “cumpre ao intérprete
da lei, no afã de interpretar o postulado da isonomia tributária, indagar sobre a
legitimidade dos critérios distintivos adotados na atividade de desigualização, além
da simples valoração, em si, dos critérios adotados”.
Moraes (1995, p. 116) enuncia algumas regras que devem nortear a
aplicação do princípio da isonomia tributária::
a) a igualdade jurídica tributária consiste numa igualdade
relativa, com seu pressuposto lógico da igualdade de situações
ou condições (...); b) não se admitem exceções ou privilégios,
tais que excluam a favor de um aquilo que é exigido de outros
em idênticas circunstâncias (...); c) a existência de
desigualdades naturais justifica a criação de categorias ou
classes de contribuintes, desde que as distinções sejam
razoáveis e não arbitrárias.
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Considerando este contexto, é preciso destacar, que as regras que norteiam
a aplicação do princípio da isonomia tributária, preservarão sempre a noção de
incompatibilidade perante o ordenamento jurídico nacional, de exceções ou
privilégios que desigualem os iguais e da criação de categorias ou classes de
contribuintes, que recebam tratamento desigual e arbitrário por parte do poder
tributante.
2.1 A Isonomia tributária e a cláusula pecúnia Non Olet
O tributo tem por característica intrínseca, incidir sobre as atividades
consideradas lícitas e também sobre as que não são consideradas lícitas.
É princípio consagrado em Direito Tributário que o tributo deve
incidir sobre as atividades lícitas e, da mesma forma, sobre
aquelas consideradas ilícitas ou imorais. Isso ocorre de acordo
com o princípio pecunia non olet, segundo o qual, para o
Estado, o dinheiro não tem cheiro que se traduz na conhecida
expressão pecunia non olet (ROESLER, 2010, p. 01).
Neste sentido, preocupa-se o Direito Tributário, sobre a relação econômica
de um determinado negócio jurídico, conforme se infere no artigo 118, inciso I do
Código Tributário Nacional:
Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada
abstraindo-se:
I. da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos
contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da
natureza do seu objeto ou dos seus efeitos;
BALEEIRO (2007, p. 714) comenta o dispositivo, esclarecendo que:
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A validade, invalidade, nulidade, anulabilidade ou mesmo a
anulação já decretada do ato jurídico são irrelevantes para o
Direito Tributário. Praticado o ato jurídico ou celebrado o negócio
que a lei tributária erigiu em fato gerador, está nascida a
obrigação para com o fisco. E essa obrigação subsiste
independentemente da validade ou invalidade do ato. Se nulo ou
anulável, não desaparece a obrigação fiscal que dela decorre,
nem surge para o contribuinte o direito de pedir repetição do
tributo acaso pago sob invocação de que o ato era nulo ou foi
anulado. O fato gerador ocorre e não desaparece, do ponto de
vista fiscal, pela nulidade ou anulação.
Na esteira do princípio da generalidade da tributação, independentemente
da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos, todos os contribuintes
que realizarem o fato gerador comporão o polo passivo da relação jurídico-tributária.
Na Itália, recentemente, ocorreu um episódio que merece ser trazido à baila:
Uma prostituta, no exercício de sua profissão, ao movimentar
vultosas cifras em sua conta bancária (cerca de um milhão de
reais), entre 2005 e 2008, foi autuada pela Guarda de Finanças
italiana, sendo chamada a pagar o imposto de renda devido. A
polícia fiscal aplicou à mulher uma norma de 2006 que
estabelece que a prostituição é “um ato ilícito cujos lucros são
taxados como rendas diferentes derivadas de faturamentos
ilícitos” (SABBAG, 1999, p. 98).
No mesmo sentido que a lei brasileira, a legislação italiana preconiza, que os
atos jurídicos celebrados eivados de nulidade, anulabilidade ou inexistentes, seu
objeto foi impossível, ilegal ou imoral, serão de igual sorte tributados, como se pode
depreender do disposto no artigo 11 da Lei Italiana do Registro.
A lei francesa “segue o mesmo entendimento, segundo a qual a tributação
dos proventos de prostituição, por exemplo, ocorre, embora adote o fisco uma via
indireta para atingi-los” (FALCÃO, 2002, p. 43).
Na Alemanha, por sua vez, deve haver prevalência da realidade econômica
sobre a forma jurídica, no caso de distorção ou emprego anormal ou abusivo desta.
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Em 1934, com a “Lei de Adaptação Tributária, prescrevia-se a interpretação
econômica do fato gerador das atividades ilícitas ou imorais e dos negócios jurídicos
ineficazes, o que correspondia ao consenso da doutrina germânica” (TORRES,
2000, p. 60).
Diante do exposto acima, vislumbra-se a noção da necessidade da
universalização dos tributos, como forma de inibição da segregação social, a qual
manifesta em sua essência atos arbitrários e exercício odioso do poder.
Neste sentido, a legislação brasileira, confirma o teor do princípio do non
olet: o artigo 26 da Lei n. 4.506/64 (Lei do Imposto sobre a Renda) a qual dispõe: “os
rendimentos derivados de atividades ou transações ilícitas, ou percebidas com
infração à lei, são sujeitos à tributação sem prejuízo de sanções que couberem”.
Ao que parece o que interessa ao Direito Tributário são os fatos econômicos
e não a forma jurídica, razão pela qual a atividade ilícita, se rendosa, deve ser
tributada.
Nessa esteira, Torres (2005, p. 372)
Se o cidadão pratica atividades ilícitas com consistência
econômica, deve pagar o tributo sobre o lucro obtido, para não
ser agraciado com tratamento desigual frente às pessoas que
sofrem a incidência tributária sobre os ganhos provenientes do
trabalho honesto ou da propriedade legítima.
Desse modo, irrelevante será se a atividade è contrária ou não ao
ordenamento jurídico, devendo o tributo gravar o resultado econômico de todas as
circunstâncias fáticas, lícitas ou ilícitas.
É necessário registrar, face o exposto nos tópicos supra referidos, que em
nenhum momento pretende-se, legitimar condutas ilícitas, justificado pela
necessidade de tributação por parte do Estado.
Note-se, que o aspecto que interessa ser abordado no momento é a
possibilidade da restituição do tributo, em virtude da incidência tributária, diante de
um ato considerado nulo ou anulável perante o ordenamento jurídico brasileiro,
razão pela qual, justifica-se a digressão a cerca tópico sob comento, senão vejamos:
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Caso o Poder Judiciário venha declarar nulo o negócio jurídico e este não
tenha produzido os seus efeitos (v.g., não houve o efetivo auferimento de renda para
fins de incidência de Imposto de Renda), não haverá direito à restituição do imposto
eventualmente recolhido aos cofres públicos e caso o Poder Judiciário venha
declarar nulo o negócio jurídico e este já tiver produzido os seus efeitos (v.g., houve
o efetivo auferimento de renda para fins de incidência do Imposto de Renda), a
União estará compelida a restituir o tributo auferido indevidamente.
2.2 A cláusula pecúnia non olet e a não tributação dos atos ilícitos
Em sentido oposto a possibilidade de tributação dos atos que malferem a
ordem jurídica tributária, se apresenta forte linha argumentativa, defendendo sua
impossibilidade fundada no artigo 3º do Código Tributário Nacional. Considerando
uma das características peculiares do tributo insculpida no artigo 3º do Código
Tributário Nacional, qual seja, “que não constitua sanção de ato ilícito”, erigiram-se
fortes argumentos contrários a possibilidade de tributação de atos eivados de
ilegalidade.
Depreende-se do dispositivo legal citado, que o tributo não constitui sanção
por ato ilícito, de modo, que na prática somente os atos tidos por lícitos estão
sujeitos à incidência tributária. Neste sentido, cabe aqui a indagação: a possibilidade
de tributação de atos considerados contrários à ordem jurídica não estaria
justificando a negação do próprio conceito de tributo? Parece-nos, que a resposta a
esta indagação diante das inúmeras indagações e reflexões sobre a matéria, não se
apresenta de fácil leitura.
Sabbag (2009, p. 101) argumenta, a título de exemplificação,
Que os rendimentos oriundos de atividades ilícitas, por estarem
divorciados de qualquer fator clássico de produção, não se
traduziriam em verdadeira riqueza tributável, o que os tornaria,
por isso mesmo, insuscetíveis de tributação [...]
Na obra compendiada por Moraes (1995, p. 352), argui-se que a tributação
fundamentada em ato ilícito:
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Provocaria uma colisão entre os diversos ramos do Direito,
estiolando a unidade do sistema jurídico. A esse propósito, não
seria admissível que uma norma jurídica, de um lado, viesse a
reprovar um determinado fato, considerando-o crime, e, de
outro, o Estado se valesse desse mesmo fato para dele
perceber o tributo.
Note-se, que a matéria contempla questões controvertidas, necessariamente
quando se passa a interpretar situações limítrofes, como v.g., a tributação do
Imposto de Renda auferido, fruto de apropriação indébita e ainda, a tributação deste
mesmo tributo, originário de uma atividade empresarial ilícita como a exercida pelas
sociedades irregulares.
Os exemplos acima são típicos de situações que a lei repulsa e de
intensidade tal, que atitudes são tomadas pelo legislador, no sentido, de penalizar o
ofensor da lei, criando-se mecanismos legais, constantes no Código Penal e de
Processo Penal, cujos estatutos prevêem para as aludidas hipóteses o “perdimento
de bens e recursos, fruto da infração” (BALEEIRO, 2007, p. 716), ou o seqüestro de
bens imóveis ou móveis adquiridos pelo indiciado como proventos do crime.
Sobre esta questão, Machado (2004, p. 317) leciona que as autoridades da
Administração Tributária, não cobram impostos de contrabando:
Os impostos que seriam devidos pela importação de
mercadorias nos casos de contrabando ou descaminho.
Decretam o perdimento das mercadorias e os impostos
somente serão cobrados se e quando essas mercadorias são
arrematadas em leilão promovido pela Fazenda.
Em relação à hipótese da atividade empresarial ilícita, anteriormente
abordada, esta não pode ser beneficiada pela justa razão da sua equiparação com
as empresas de atividade lícita e pela incidência do princípio da isonomia tributária.
2.3 A cláusula pecúnia non olet e a plena capacidade tributária passiva
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Neste espaço, pretende-se abordar o disposto no artigo 126 e incisos do
Código Tributário Nacional (CTN), que textualmente dispõe que a incapacidade civil,
seja ela absoluta ou relativa, é irrelevante para fins tributários.
A título de exemplo, citam-se, os atos realizados por menores de 16 anos,
ébrios habituais, toxicômanos, pródigos e excepcionais, os quais são passíveis de
tributação, inobstante tais circunstâncias de natureza pessoal.
Relativamente ao inciso II do artigo 126 do CTN, a pessoa natural sujeita a
medidas que importem privação ou limitação do exercício de atividades civis,
comerciais ou profissionais, ou da administração direta de seus bens ou negócio
está sujeita a tributação por atos por eles praticados. A teor do disposto no artigo
126 do CTN, considera-se contribuintes: o réu preso, o inabilitado para o exercício
de certa profissão, o falido e o interditado.
No que pertine ao inciso III do artigo 126 do CTN, a capacidade tributária
passiva independe de estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando
que configure uma unidade econômica ou profissional. Com efeito, exemplificando a
hipótese do inciso III do artigo 126 do CTN, afigura-se possível a tributação de
empresa comercial “de fato”, ou seja, aquela que não obteve o registro dos seus
atos constitutivos no órgão competente, posto que, a simples comercialização de
mercadorias importa na constituição do fato gerador da obrigação tributária.
Há que se ressaltar, aqui, por oportuno, o disposto no artigo 135 do mesmo
estatuto, o qual a propósito dispõe, “que são pessoalmente responsáveis pelos
créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com
excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatuto: as pessoas
referidas no artigo 134 do CTN, os mandatários, prepostos e empregados e os
diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Cabe registrar ainda, que para se evitar burla à tributação, prestigiando-se o
princípio universal da isonomia tributária, é preciso criar-se mecanismos de proteção
legal contra empresários ou particulares, que poderiam deixar de registrar seus
imóveis perante os órgãos competentes, a fim de beneficiar seus herdeiros e
sucessores.
Enfim, a matéria em comento, desperta a necessidade da aplicação do
princípio da isonomia tributária, diante do fenômeno da tributação, àquelas situações
que se traduzam em atos eivados de ilegalidade e que atinjam igualmente os
interesses do erário público.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
O princípio da isonomia tributária, como instrumento de garantia do indivíduo
e não do Estado, veio à lume, com o propósito ímpar, de consolidar no seio das
relações jurídico-tributárias, a igualdade entre os contribuintes, vedando-se a
desigualdade de tratamento tributário em situações fático-jurídicas equivalentes.
Verifica-se, que o princípio da isonomia tributária vem perdendo aplicação
prática à luz de inúmeros casos concretos, onde resta patente a ampliação das
isenções tributárias para determinados segmentos econômicos e do capital
especulativo.
Cumpre registrar, que o objetivo do legislador ao veicular o artigo 118 do
Código Nacional Tributário, foi o de conferir tratamento igualitário aos contribuintes
detentores de capacidade contributiva, bem como o de desestimular as atividades
ilícitas diante de uma expectativa de isenção tributária.
Tratou-se neste dispositivo da possibilidade de antinomia com o artigo 3º do
CTN, e neste momento, é possível reconhecer, que a luz do tecnicismo jurídico,
impossível a incidência tributária sobre atos ilícitos.
Assim, a lei que cria um determinado tributo no sistema jurídico brasileiro
não poderá prever como hipótese de incidência um ato não previsto no ordenamento
jurídico e ilícito, seja de que natureza for. É preciso destacar, que os tributos nascem
de fontes lícitas, do que decorre a incidência tributária. Contudo, como para toda
regra existe exceção, a guisa de decisões judiciais, a incidência do tributo sobre as
atividades ilícitas não contraria tampouco desvirtua o conceito legal de tributo. A
bem da verdade, o que se pretende com a regra, é o desincentivo à prática de
ilícitos mediante a tributação dos atos eivados de ilegalidade.
Além disso, é possível reconhecer, que o Estado ao buscar tributar os atos
ilícitos não o faz visando enriquecimento sem causa, nem mesmo promovendo a
tutela aos praticantes de atividades criminosas. Objetiva o Estado, tributando os atos
ilícitos, reduzir o lucro ilegal obtido por empresas, empresários e particulares,
demonstrando igualmente, que está penalizando aqueles que fraudam o sistema
legal e ao mesmo tempo, prestigiando o princípio da isonomia tributária.
No Brasil, muitos são aqueles que lucram com os delitos e lamentavelmente
acabam por não contribuir aos cofres públicos com parcela destes lucros e quem
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perde é toda a sociedade com a redução inegável de tributos que estariam gerando
riquezas ao país.
Sem sombra de dúvida, permitir a intributabilidade dos atos ilícitos seria para
o sistema tributário nacional, uma verdadeira catástrofe nacional, na medida em que
premiaria a vocação criminosa e a desoneração tributária, e mais uma vez, como
aludido acima, inegável prejuízo financeiro ao erário público e a toda sociedade
brasileira.
À guisa de conclusão, é fato, em nosso ordenamento jurídico, a
possibilidade da livre incidência tributária, prestigiando-se o princípio da isonomia
tributária, que entre nós, constitui-se cânone constitucional insculpido nos artigos 5º
e 150, inciso II do texto constitucional de 1988.
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MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 25. ed. São Paulo:
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Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2288, 6 out. 2009. Disponível em:
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tributário. 3. ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar, 2000.
TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional, financeiro e
tributário. 2005
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O PREJUÍZO DA SOCIEDADE PELA FALTA DA TUTELA PENAL DIANTE DAS
CONDUTAS ATENTATÓRIAS AO DIREITO À IMAGEM DO INDIVÍDUO
Geala Geslaine Ferrari243
Prof. Pedro Faraco Neto244
Resumo:Os direitos da personalidade, são tutelados pelas mais diversas áreas do
Direito, mas no campo penal, existe uma lacuna que precisa ser preenchida,
principalmente no que tange ao direito à imagem. O crescente e assustador
desenvolvimento das áreas tecnológicas e da informação, tem proporcionado
inúmeros problemas no que tange a violação da imagem, como recentemente no
caso da atriz Carolina Dieckman. Faz-se necessário que os operadores do Direito,
discutam tal problema, pois a falta, da tutela penal ao direito à imagem, tem trazido e
deverá trazer à nossa sociedade, e as futuras gerações prejuízos sociais e
individuais de grande monta.
Palavras-chaves: direitos da personalidade, imagem, tutela penal.
1 INTRODUÇÃO
A sociedade se mostra cada vez mais distante dos direitos ínsitos ao
homem. Prova disso são os facilmente observáveis ataques às pessoas
humanas. Os direitos inerentes à pessoa, pela simples condição de serem
humanos, são chamados de direitos da personalidade.
Os direitos da personalidade por serem a mais pura representação da
dignidade da pessoa humana devem ser o objeto principal de tutela jurisdicional
nas suas mais variadas esferas.
243
Aluna do curso de Direito da Faculdade Catuaí[email protected] 244
Mestrando em Ciências Jurídicas pelo Centro Universitário de Maringá – CESUMAR. Especialista em Direito
Penal e Processo Penal pela Universidade Estadual de Londrina – UEL, onde também se graduou. Professor de
Direito Penal da Universidade Norte do Paraná – UNOPAR e da Faculdade
Catuaí[email protected].
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Ocorre que um determinado direito da personalidade humana, o direito à
imagem, foi esquecido pelo legislador no âmbito penal, que não prevê ataques à
imagem como crime, muito embora tipifique um grande número de crimes contra
o patrimônio, além de prever como ilícitas outras condutas que não chegam a
ofender bem jurídico algum. E será que a falta de previsão legal que tipifique uma
conduta lesiva a imagem como crime muitas vezes acarreta em um prejuízo para
a sociedade e para eventuais lesados?
Para responder tal questionamento será procedida a uma pesquisa
bibliográfica que discorra sobre a dignidade da pessoa humana e sobre sua
ligação com os direitos da personalidade; mencionar-se-á o que a doutrina de
escol estabelece como objetivo da existência do direito penal; buscar-se-á ainda
nos compêndios o conceito de imagem, citando alguns exemplos atuais de
ataques à imagem.
Ao fim, espera-se emitir um pronunciamento sobre o prejuízo causado
pela falta de previsão legal de uma conduta atentatória à imagem humana, bem
como estimar, se necessário for, uma conduta criminosa que poderia ser tipificada
como crime.
2 DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE
Os direitos da personalidade são um conjunto de direitos absolutos
pertencentes à pessoa humana, que se apóiam sobre o terreno de um princípio
que os acolhe e defende, a dignidade humana.
Elimar Szaniawski, apregoa que os direitos da personalidade são
desdobramentos do princípio da dignidade humana e ambos integram a teoria
geral da personalidade (1996, p.56). E Luiz Henrique Vieira, ensina dizendo que
os direitos da personalidade repousam no seio sereno do princípio da dignidade
humana.(2010, p.02). Com efeito, toda agressão a qualquer direito da
personalidade na verdade lesa a dignidade da pessoa humana.
Os direitos da personalidade, para Carlos Alberto Bittar, são aqueles
reconhecidos ao homem, tomados em si mesmo, e em sua projeção na
sociedade, e que visam à defesa de valores inatos, como a vida, a intimidade, a
honra e a higidez física, jamais podendo ser um rol taxativo de direitos.(BITTAR,
2003, p.01)
São direitos supralegais, inatos ao ser humano. No que tange à origem e
evolução desses direitos, pode-se entender que há uma divergência entre a
doutrina jusnaturalista e a positivista. Para os primeiros, os direitos que se
referem à personalidade sempre existiram, são anteriores à sociedade e o papel
do Estado não é criá-los, e sim reconhecê-los. Fundamenta-se na idéia de que o
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direito sempre existiu e não passou a existir no momento que o Estado o exprime
em forma de lei constitucional ou ordinária, conforme defende Carlos Alberto
Bittar.(2003, p.07)
Já os positivistas só admitem a existência dos direitos da personalidade,
no momento que o Estado os expressam em norma jurídica, sendo que os
mesmos não existiriam se não fossem tutelados expressamente por normas
públicas. Discípulos de Hans Kelsen, os positivistas buscam vincular todo o direito
a uma lei, buscando com isto a libertação da ciência jurídica de todos os
elementos estranhos a ela, sendo assim pode-se afirmar que conforme doutrina
positiva, para existir ou poder se falar em direitos da personalidade e sua
violação, primeiro tal conceito deve estar positivado em norma jurídica, e também
assegurado sua sanção quando violado.
Com a vênia dos positivistas, o fato de tais direitos serem positivados em
normas jurídicas, não retira deles o seu caráter absoluto, e nem questionam sua
existência, pois esta se dá pelo simples fato do homem existir. E “O Estado [e o
Direito] existe para o indivíduo e não o oposto: omne jus hominum causa
introductum est.” [destaque nosso].(PRADO, 2011, p.95) Até na obra de Kelsen
encontramos palavras nesse sentido: “Acima do imperfeito Direito positivo existe
um perfeito - porque absolutamente justo – Direito natural; e o Direito positivo é
justificado apenas na medida em que corresponda ao Direito natural”(KELSEN,
2005, p.17).
Porém, certamente, no âmbito penal (que interessa ao presente trabalho), o
que vai promover a conseqüência jurídica do delito, ou seja, a sanção, quando estes
forem violados é a lei anteriormente definida e sua sanção previamente
estabelecida, em respeito ao princípio da legalidade ou reserva legal. Mas qual é a
finalidade precípua do direito penal? É a busca “a preservação da dignidade da
pessoa humana, por meio do respeito a lei penal, contexto no qual se deve proteger
os mais relevantes bens jurídicos”(NUCCI, 2010, p.167).
E o Estado, mais precisamente a figura do legislador, não cria bens
jurídicos. Ele apenas proclama os valores já evidenciados na sociedade como
relevantes para o desenvolvimento da pessoa humana. E quais os bens jurídicos
mais valiosos? Os direitos da personalidade. Então, tem-se uma perfeita
identificação entre os Direitos da Personalidade e os Bens Jurídicos protegidos
pela legislação penal. Não se trata de mera coincidência, pois ambos têm por fim
a dignidade humana. Veja o posicionamento da clássica doutrina processual
penal brasileira:
O direito à vida, à honra, à integridade física são exemplos.
Tais bens e muitos outros são tutelados pelas normas penais, e
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sua violação é o que se chama de ilícito penal ou infração
penal. O ilícito penal atenta, pois, contra os bens mais caros e
importantes de quantos possua o homem, e, por isso mesmo,
os mais importantes da vida social.( TOURINHO FILHO, 2010,
p.27)
A doutrina busca sistematizar os direitos da personalidade, reunindo-os
em categorias, mesmo entendendo que tais direitos são unos, tal classificação se
dá para melhor compreensão de cada um deles. Para César Fiúza, embora
questionável tal divisão, a mesma se dá em duas classes, a primeira diz respeito
aos direitos à integridade física, como por exemplo, a vida, o direito ao próprio
corpo e o direito ao cadáver, já a segunda tutela o direito à integridade moral ou
intelectual, por exemplo, o direito à honra, o direito à liberdade, o direito ao recato,
o direito à imagem, o direito moral do autor.(FIUZA, 2003, p.137)
Dos direitos da personalidade, ou seja, dos bens jurídicos acima
enunciados, a vida possuiu tutela penal no crime de homicídio, a integridade física
é protegida no crime de lesão corporal, o cadáver possui um capítulo inteiro do
código penal para protege-lo, a honra é punida pelos crimes de calúnia, injúria e
difamação, o direito moral do autor encontra proteção nos crimes contra a
propriedade intelectual... Mas e a imagem? Esta não possui tutela penal. O
penalista Regis Prado leciona que no centro de toda atividade estatal está a
personalidade do homem, sendo que cabe ao Estado garanti-la e protegê-la
(PRADO, 2011, p.95). É inevitável, portanto, não adentrar nos Direitos da
Personalidade. Sendo a imagem um direito da personalidade, será que esta
ausência pode acarretar em prejuízo para a vida em sociedade? Será que a
reprimenda penal dos ataques à imagem teria relevância? Antes de responder
estes questionamentos, cumpre conceituar o direito à imagem.
3 DO DIREITO À IMAGEM
A imagem que trata o presente artigo tem relacionamento com os atributos
físicos do homem, aptos a serem reproduzidos “por fotografia, escultura, pintura,
filmagem ou por outros meios alcançados por técnicas cada vez mais sofisticadas”
(FACHIN, 1999, p.47). Nas palavras de Carlos Alberto Bittar:
Incide, pois, sobre a conformatação física da pessoa,
compreendendo este direito um conjunto de caracteres que a
identifica no meio social. Por outras palavras, é o vinculo que
une a pessoa à sua expressão externa, tomada no conjunto, ou
em partes significativas (como a boca, os olhos, as pernas,
enquanto individualizadoras da pessoa) (BITTAR, 2008, p.94)
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A imagem física de uma pessoa é como se fosse “selo, marca, timbre,
reflexo indelével da nossa personalidade, com que nos chancelou a natureza, a
revelar olhos prescrutadores, tendências, qualidades, delicadeza de sentimentos,
nobreza de espírito ou, ao contrário, defeitos, cupidez, egoísmo,
grosseria”(CHAVES, 1970, p.26). A imagem é como se fosse o espelho da alma de
um indivíduo, ou seja, muitas vezes externiza todo seu conteúdo.
O prof. Zulmar Fachin define a imagem “como sendo algo que o
acompanha na aventura da vida, sendo manifestação de sua própria
personalidade, do seu ser, aquilo que ele apresenta na vida social, em todos os
momentos onde quer que ele esteja”.(1999, p.50)
Portanto, é inegável que tal direito tem caráter personalíssimo. Mas por
muito tempo, o direito à imagem teve sua existência negada, pois entendiam que o
mesmo não era merecedor de proteção jurídica, por não ser considerado bem
jurídico autônomo, mas tal negativa foi sendo superada. No início passou-se a ser
tutelada através do desdobramento de outros direitos, mas hoje entende-se tratar de
um direito independente.
Pode-se observar, que para se chegar a este entendimento, a doutrina foi
se fundamentando em algumas teorias, estas surgiam para trazer solidez à tutela
jurídica do direito à imagem, como por exemplo, a teoria do direito de
propriedade, onde este recebia proteção jurídica por se tratar de propriedade do
indivíduo, sendo ele proprietário de seu corpo, o seria também de sua imagem. A
teoria do direito à intimidade, na qual estaria ligado o direito à imagem, onde
proteger-lo significava proteger a vida íntima das pessoas.
A teoria do direito de autor, por decorrência da semelhança entre eles,
passou-se a estendê-lo à imagem, mas esta teoria foi ultrapassada pois
compreenderam que a imagem do indivíduo não podia ser protegida pelo direito
autoral, uma vez que este se preocupa com as criações autorais, enquanto
aquela é uma expressão da personalidade humana, sendo portanto a criação, o
elemento que as distinguiam.
A teoria do direito à honra, através dela passou-se a proteger à imagem
como sua derivação, e esta serviu de fundamento para muitas indenizações
quando o dano era relativo ao direito à imagem, pois ao ferir a imagem do
indivíduo estava ferindo a sua honra.
Pela teoria do direito à identidade, chegaram a compreensão de que a
imagem da pessoa não servia só para identificar, mas também para individualizar,
pois se tratava de um elemento identificador do indivíduo, sendo assim, uma
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publicação indevida da imagem da pessoa resultaria uma indenização, ou o dever
de indenizar, pois se estaria violando o direito à identificação pessoal.
Foram muitas as teorias, mas por fim chegou-se a conclusão que o direito
à imagem é figura autônoma nos direitos da personalidade, que existe por si só,
independentes daqueles, e por isto detentora de tutela jurídica. Zulmar Fachin
explica que:
o direito à imagem tem sua autonomia consagrada na própria
constituição, e que este está assegurado independentemente
de violação a outro direito da personalidade, em razão disso
não é necessário que a pessoa, cuja imagem foi captada ou
publicada, sofra dano em sua honra, por exemplo, pois o dever
de indenizar impõe-se pelo simples fato de ter sido violado o
direito à imagem. (FACHIN, 1999, p.67)
A lição de Arnaldo Siqueira de Lima vai ao encontro do posicionamento
do Prof. Fachin:
a partir da inclusão da imagem na Constituição Federal, não há
mais dúvida de sua autonomia, por tratar-se de um bem
relevante para o direito, capaz de determinar por si, conduta
que implique a disciplina de uma norma jurídica, e então há
consistência na faculdade de agir em razão desse bem.( 2003,
p.25)
Com a Constituição da República de 1988, o direito à imagem passou a
fazer parte do rol de direitos e garantias fundamentais constitucionais onde no art.
5º, inciso X, está determinado a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da
honra e da imagem das pessoas, como também o direito de indenização pelo dano
material e moral decorrente de sua violação. Mais uma vez Zulmar Fachin nos
esclarece:
A preocupação do legislador constituinte com os direitos
fundamentais é inquestionável, além de prevê-los em rol
extenso, sem pretender ser exaustivo, conforme art 5º, § 2º Cf,
determinou ao legislador ordinário que estabelecesse punição
para qualquer discriminação perpetada contra eles. É a regra
estatuída no art. 5º XLI, onde a lei deve punir qualquer
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discriminação atentatória dos direitos e liberdades
fundamentais.(FACHIN, 1999, p.82)
Ao direito de imagem, por se tratar de direito fundamental, também se aplica
em outros dispositivos constitucionais, como o art. 5º, inciso XXXV, onde está
previsto que o Poder Judiciário não pode excluir de sua apreciação qualquer lesão
ou ameaça a direitos. Luis Henrique Vieira diz que:
A imagem retrato, decorre da expressão física do indivíduo, e o
direito a tutela deste é uma prerrogativa atribuída ao indivíduo
visando proteger a captura e divulgação de sua imagem, da
reprodução da sua figura externa ou parte dela sem o seu
consentimento.(VIEIRA, 2010, p.20)
Carlos Alberto Bittar assegura que por conseqüência do progresso das
comunicações o direito à imagem passou a ocupar lugar destacado no cenário dos
direitos da personalidade, e aponta uma característica peculiar de tal direito, a
disponibilidade:
o direito que a pessoa tem sobre a sua forma plástica e
respectivos componentes distintos, rosto, olhos, perfil, busto,
que a individualizam no seio da coletividade. Incidindo sobre a
forma física da pessoa, compreendendo seus caracteres que a
identifica no meio social. Estas se revestem de todas as
características comuns aos direitos da personalidade,
destacando-se dos demais por sua disponibilidade, sendo
usada em função da prática de uso da imagem humana em
publicidade, divulgando entidades, produtos ou serviços postos
a disposição do público consumidor.(BITTAR, 2003, p.94)
Sobre o consentimento e a disponibilização da imagem vale a pena
discorrer-se em tópico específico.
3.1 Características do Direito à imagem e sua disponibilização
No campo dos direitos da personalidade, sendo o direito à imagem espécie
deste, o mesmo possui características semelhantes à deles, como a essencialidade,
originalidade, exclusividade, indisponibilidade, intransmissibilidade e
imprescritibilidade, a diferenciação encontra-se no fato de que sendo este um direito
indisponível, o mesmo pode sofrer uma relativização, ou seja, o indivíduo poderá
dispor parcialmente de sua imagem, permitindo que ela seja usada por terceiro.
Sobre esta disponibilidade parcial do direito à imagem diz que:
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a mesma é admitida pela doutrina e pela jurisprudência
brasileira, sendo mesmo uma prática comum na atualidade,
especialmente em relação as pessoas famosas. O uso
consentido da própria imagem em favor de terceiro pode se
dar de maneira gratuita ou mediante pagamento, o que não
pode é disponibiliza-lo totalmente.(FACHIN, 1992, p.72)
Carlos Bittar em sua obra sobre a tutela dos direitos da personalidade e
autorais, define que esta disponibilidade presente no direito à imagem seria:
o direito à escolha que cabe à pessoa, dos modos pelos quais
lhe convém aparecer em público, retirando quando fim
comercial o uso, os proveitos econômicos próprios, mediante
remuneração ajustada no contrato de licença, elegendo a
forma, o veículo, a empresa, o produto e demais elementos
próprios, daí se dá a absoluta necessidade do consentimento
expresso que possibilitará eleger o mais conveniente,
interessante ou lucrativo, dentre de seus limites próprios
estabelecidos.(BITTAR, 2002, p.63)
Mas para se obter a permissão da utilização da imagem da pessoa, faz-se
necessário à autorização expressa do titular do direito, e esta deve se dar por via
contratual. Para direitos da personalidade, são compatíveis somente contratos
com prazos determinados ou de uso temporário, pois tais direitos são
intransmissíveis, são contratos de concessão ou licença, e nestes devem conter a
finalidade, as condições de uso e o prazo, dentro de uma interpretação restritiva
de suas cláusulas. Quando se celebra um contrato relativo a concessão do uso da
imagem, o que se permite é a utilização da mesma, e o que será disponibilizado
então, é a exploração ou uso desta imagem, e não o próprio direito a ela.
O uso da imagem de uma pessoa dá-se de várias formas, podendo ser
gratuito mediante consentimento tácito, neste a pessoa sem manifestação
expressa, consente que sua imagem seja usada por outrem e sem objetivar
retorno financeiro. Pode ser também de forma gratuita mediante consentimento
expresso, pois a detentora do direito à imagem, pode mesmo sem objetivar fins
econômicos ceder o uso de sua imagem, se houver fim determinado, não sendo
usado além das limitações expressas.
Eis o problema: E quando sem o consentimento utiliza-se da imagem
alheia? Quais são as tutelas jurisdicionais que o ofendido poderia recorrer?
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Além da carta constitucional, outros ramos do direito preocupam-se com a
tutela dos direitos da personalidade como um todo, e o direito à imagem, como já
visto, encontra-se inserido neles. A Lei 8096/90, Estatuto da Criança e do
Adolescente, o legislador ao tratar do direito à liberdade, ao respeito e à dignidade
da criança e do adolescente, buscou proteger o direito à imagem destes no seu
art.17, proibindo que as mesmas sejam utilizadas por outras pessoas através de
qualquer meio de divulgação e publicidade, como também a publicação das
infrações cometidas pelos mesmos, exceção ao princípio constitucional da
publicidade dos atos processuais, ocorre então uma flexibilização de tal princípio,
em detrimento da exposição da imagem, objetivando a proteção da dignidade da
criança e do adolescente, possuindo sanção penal para quem violar tal normativa
(art.227 ECA). O direito civil também pode ser acionado conforme preceitua o art. 12
parágrafo único do Código Civil de 2002, in verbis: “Pode-se exigir que cesse a
ameaça ou lesão, a direito da personalidade, e declamar perdas e danos, sem
prejuízo de outras sanções previstas em lei”. Mas e o direito penal?
O Direito Penal que deve proteger os valores de importância acentuada,
assegurando através da ameaça penal interesses fundamentais, individuais e
coletivos, para o exercício de um convívio social harmônico entre os homens não
protege a imagem.
4 DOS CRIMES ATUALMENTE PREVISTOS QUE ATENTAM CONTRA OS
DIREITOS DA PERSONALIDADE
O código penal brasileiro cuidou de proteger os direitos da
personalidade em vários artigos, por exemplo, o direito à vida, nos casos de
homicídio art. 121, induzimento e instigação ao suicídio art. 122, infanticídio art. 123,
aborto nas suas variadas formas, art. 124 ss., também tutela o direito à integridade
física, emocional e moral, conceituado como lesões corporais nos seus variados
tipos art. 129, como o direito de manter intacto o próprio corpo, punindo aqueles que
o violarem, também no que se refere aos transplantes, a Lei 10211/2001 dispõe
sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano, prevendo no art. 14
a pena de dois a seis anos de reclusão àqueles que removerem algo da pessoa ou
do cadáver, podendo a mesma chegar até 20 anos de reclusão conforme § 3º e 4º
da referida lei.
Quanto aos direitos referentes à moral, o código penal brasileiro é
lacunoso, deixando o legislador pátrio, sem tutela jurídica vários delitos que atingem
à moral da pessoa humana, sujeito desses direitos, como por exemplo, o direito que
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versa este trabalho, digo, o direito à imagem. Mas há a previsão penal aos delitos
relativos à honra, objetiva e subjetiva da pessoa humana, nos tipos penais de
calúnia, difamação e injúria art.138 a 140 CP.
E sobre honra Magalhães Noronha conceitua-a como sendo o
conjunto de atributos que dão reputação social e auto-estima ao
homem.(NORONHA, 2003, p.118)
O código penal cuida dos crimes da honra somente quando estes
são praticados por pessoas, e não pela imprensa, pois este será tratado como crime
conceituado em legislação especial, são os chamados delitos de imprensa.
Sidney César da Silva Guerra diz que a honra “representa o direito
que a pessoa tem de não ser molestado, injuriado, ultrajado ou lesado na sua
dignidade ou consideração”.(GUERRA, 2004, p.49)
Sobre tal direito à mesma pode constituir-se de duas formas, a honra subjetiva e a
honra objetiva, Carlos Alberto Bittar, define honra objetiva como sendo, “aquela
que compreende ao bom nome e a fama de que desfruta no seio da coletividade,
enfim, a estima que o cerca nos seus ambientes, familiar, profissional, comercial
ou outros.”(BITTAR, 2003, p.133)
Já sobre a honra subjetiva o mesmo esclarece, que trata-se “do sentimento
pessoal de estima, ou consciência própria de dignidade”(BITTAR, 2003, p.133).
O código também tutela direitos do homem à liberdade, privacidade e intimidade
nos tipos penais referentes a violações de domicílio, correspondência, telegráfica
ou telefônica, hoje também violações de correspondências digitais, msn, sms etc.,
pois o delito é o mesmo só mudando o meio de concretiza-lo.
5 DA AUSÊNCIA DE TUTELA PENAL AO DIREITO DE IMAGEM
Zulmar Fachin, em sua obra sobre a proteção jurídica da imagem,
esclarece que o legislador penal pátrio tipificou algumas condutas lesivas aos
direitos personalíssimos, mas que “não foi estabelecido norma penal para
incriminar conduta violadora do direito à imagem”.(FACHIN, 1999, p.98)
A reforma penal de 1984 também não o fez, criando-se então uma lacuna
no que refere à norma penal incriminadora da conduta lesiva à imagem, que, por
consequência do princípio da legalidade e anterioridade da lei, faz-se impossível
dizer que existe uma forma de coibir a lesão desse direito (nullum crimen, nulla
poena, sine lege), através da aplicação de uma norma penal, por isso sua criação
pelo Estado, é necessária e urgente, pelas consequências que a falta de tal direito
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tem causado à dignidade da pessoa humana, e pelos problemas de ordem
individual e coletivo que o mundo moderno com seus avançados nos meios de
informação, tecnologia e comunicação tem causado.
Sobre isto pode-se ver quando o assunto é a imagem de pessoas
famosas, como por exemplo, as imagens captadas no momento do parto da atriz
Luana Piovani, que teve sua imagem, a do seu filho neonato, a sua intimidade e
privacidade, ofendidas, formando-se um conjunto de agressões absurdas nos
direitos de sua personalidade, que hoje poderá render uma boa indenização por
danos morais, mas que não terá repercussão na esfera penal pela falta de
normativa própria.
A famosa Carolina Dieckmann em fato recentíssimo teve fotos suas nuas
divulgadas sem o seu consentimento na internet, num atentado monstruoso a sua
dignidade pois houve a divulgação dos seus atributos físicos sem a atriz tê-los
disponibilizado. Por se tratar de pessoa cuja beleza física é conhecida, as
imagens tiveram uma rápida propagação. E a atraente mulher que recusara vários
convites de revista masculina para posar nua, acabou tendo seus dotes físicos
mostrados ao mundo inteiro gratuitamente.
Como o direito penal não protege o direito à imagem, a resposta
jurisdicional a este atentado, (e a todos os demais voltados à imagem alheia) se
restringirá a uma indenização civil. E se o divulgador da imagem for econômica e
patrimonialmente pobre, a atriz não terá acesso a ordem jurídica justa. Por isto
defende-se a tipificação de uma conduta que proteja a imagem da pessoa
humana.
Paulo José da Costa Junior na célebre obra O Direito de Estar Só já
alertava: “O legislador caminha sempre com o passo trôpego. Avança com vagar.
Mais lentamente que os fatos sociais, que evoluem vertiginosamente,
reivindicando normas e providências”(COSTA JR., 2007, p.9)
E a falta desta definição legislativa culmina em prejuízo à sociedade, pois
o direito penal para de cumprir a sua função: proteger o homem. Além disso, o
caráter preventivo da pena que ocasiona o temor pela intimidação não se aplica,
proporcionando uma total liberdade para o ataque ao indivíduo.
Poder-se-ia até indagar que a criação de uma conduta protetora da
imagem chocar-se-ia com um dos princípios que compõe o eixo do direito penal: o
princípio da Intervenção Mínima, também conhecido como ultima ratio. Este
princípio estipula que o direito penal somente atuará em casos que outros ramos
do direito não forem suficientes para a solução do conflito, uma forma de limitação
do poder estatal, como defende Cézar Roberto Bittencourt:
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O direito penal, também conhecido como ultima ratio, orienta e
limita o poder incriminador do Estado, preconizando que a
criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio
necessário para a proteção de determinado bem jurídico. Se
outras formas de sanção ou outros meios de controle social
revelarem-se suficientes para a tutela desse bem, a sua
criminalização é inadequada e não
recomendável.(BITTENCOURT, 2006, p.03)
Contudo a criação legislativa de um tipo penal protetor da imagem visa
que o Estado, através de seu caráter intervencionista, assegure um direito de
personalidade autônomo que é a imagem, também sustentáculo da dignidade
humana. Assim, o direito penal, que anda se preocupando demais com o
patrimônio, poderia se lembrar do homem e dos seus mais ínsitos direitos. Desta
forma, o direito penal tutelaria um braço da dignidade das pessoas, em vez de
propor a punição de quem culposamente danifica plantas de enfeite.
Art. 49. Destruir, danificar, lesar ou maltratar, por qualquer
modo ou meio, plantas de ornamentação de logradouros
públicos ou em propriedade privada alheia:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa, ou ambas
as penas cumulativamente.
Parágrafo único. No crime culposo, a pena é de um a seis
meses, ou multa.
E se preocupar com a dignidade da pessoa humana é o escopo do direito
penal. Assim a proposta do Prof. Zulmar Fachin deveria ser utilizada pelo
legislativo nacional:
Art. Fotografar, filmar, divulgar, utilizar ou captar por qualquer
outro modo a imagem de alguém, sem seu consentimento:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Se o uso indevido da imagem não tiver
finalidade lucrativa, a pena poderá ser diminuída de 1/6 a
1/3.(1999, p.134)
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Em razão do direito à imagem ser disponível a ação penal poderia ser
pública, mas sujeita à representação do ofendido, certamente limitando o poder
de atuação do Estado apenas aos fatos em que o mesmo é chamado a proceder
à persecução penal. Deste modo acredita-se que os ataques inidôneos à imagem
alheia teriam uma proteção mais efetiva por parte da legislação, o que coibiria as
condutas e reestabeleceria o objetivo do direito penal.
6 DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dos estudos e pesquisas efetuadas e acima expostas, considerando que a
dignidade da pessoa humana é o centro de todo ordenamento jurídico,
considerando que a confluência de todos os direitos da personalidade se
direciona para a dignidade da pessoa humana e considerando que a imagem é
um direito da personalidade autônomo acredita-se que o mesmo deve ser tutelado
pelo direito penal.
Tal afirmativa se justifica porque os outros diversos direitos da personalidade
possuem a guarida penal, bem como porque o direito penal atual vem protegendo
outros bens jurídicos de menor relevância para o homem do que seu direito à
imagem.
Com a tipificação de uma conduta que atente à imagem estar-se-ia se
consagrando os fins de prevenção geral e especial do direito penal quanto à
possíveis ataques ao indivíduo e o mesmo voltaria, neste caso específico, a
cumprir a sua finalidade: proteger o homem e a sua inviolável dignidade.
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Disponível em: <http://www.luizhenriqueprofessor.blogspot.com.br/>.Acesso em: 10
Fev.2012.
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PSICOPATIA: VITIMIZAÇÃO E PUNIÇÃO
Soraya Rosa
Francielle Callegari
Resumo:
Este artigo abordará de forma sucinta, já que um assunto muito vasto, a psicopatia
enquanto nociva a sociedade por tratar-se de anomalia presente em alto índice de
nossa população carcerária, cerca de 20%, procurando identifica-la sob o aspecto
de anomalia e também sob como essa anomalia afeta a sociedade e em detrimento
de seus prejuízos sociais evita-las através de uma política de prevenção da vítima
em potencial. Não sendo possível esta última alternativa, determinar uma punição
viável e justa, perante os meios humanísticos e perante a eficiência punitiva que
deve proporcionar o Estado referente a segurança da população. Revelando
também os meios abordados juridicamente para este tipo de agente com
características tão peculiares e as diferentes praticas criminais que podem ser
realizadas pelos psicopatas.
Palavras-chaves
Psicopatia – vítima – prevenção – Estado – punição
1) Introdução:
Este trabalho tem por objetivo explorar um tema recente nos estudos do
campo do direito, a vítima, parte esta a qual não damos a devida importância, mas
na qual já se mostra efetiva preocupação por parte dos cientistas em tratar do
assunto.
Muitos são os aspectos a aprofundar nestes estudos, afinal para estudarmos
a vítima precisamos também estudar os delitos, suas causas, os programas de
compensação à vítima, a função do Estado nisso tudo e também as formas de
prevenção do crime. Como os estudos são extensos faz-se necessário mencionar
que este é um trabalho que abordará poucos dos aspectos mencionados acima,
será colocado em relevância somente os aspectos que interessam para a
compreensão e ligação da psicopatia ao crime e a vítima.
Primeiramente será explorado o termo vitimologia, em seguida serão citadas
algumas formas de prevenção do crime, em seguida o termo psicopata será o auge
do trabalho juntamente com o dever punitivo do Estado em acordo com a obrigação
social a que se destina.
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2 – Vitimologia:
Vitimologia é o estudo do papel da vítima no fenômeno delitivo, dando à ela
a posição de protagonista concreto, que necessita de proteção integral.
Para oferecer esse atendimento às necessidades reais da vítima é primordial
que se realize “... uma intervenção restaurativa, pacificadora, que incida nas raízes
do próprio conflito delitivo” (MOLINA, GOMES, 2008).
É justamente no cerne do processo de vitimização que o Estado deve agir
para que cada vez menos a população sofra com a violência por serem “vítimas
potenciais”, o cerne aqui entendido como o procedimento de prevenção às possíveis
vítimas, e veremos mais adiante que em alguns casos esta ainda é a única solução
possível para que o crime não ocorra.
Quando colocamos em pauta o assunto acreditamos que a melhor maneira
para que o delito não aconteça é retirarmos de circulação o delinquente, contudo
outros delinquentes irão surgir, mostrando assim que esta é uma solução que não
acaba com a criminalidade, só pune o infrator do delito, o que também é
fundamental, mas não resolve o problema.
Se o foco do crime fosse o delinquente o problema estaria em grande parte
resolvido, mas o que leva um criminoso a agir?
Com certeza as vítimas são escolhidas, selecionadas pelos delinquentes, o
lugar e a ocasião também são partes constitutivas do delito. Nos focaremos, então,
na vítima. Ela é escolhida por diferentes motivos que dependem do crime que será
cometido, se for um estuprador a probabilidade de ser uma mulher, jovem e solitária
é maior do que a de ser um homem, por exemplo. Então variáveis como: idade,
sexo, estado emocional, classe social e às vezes até o tipo de trabalho levam o
infrator a considerá-las vítimas em potencial.
Sendo assim, uma forma de reduzir o número de vítimas seria a prevenção
de grupos humanos mais propícios a determinados processos de vitimização.
Através de políticas e programas sociais bem elaborados envolveríamos a
população a cuidar melhor de si mesma, o que impunha mais responsabilidade
social do que estatal, afinal o Estado diminuiria dessa forma a reprimenda e punição
dos infratores, reduzindo seus custos e investindo mais nas pessoas.
Antes, porém, dos investimentos, é necessário uma pesquisa de campo para
determinar em quem o Estado deveria investir na prevenção, quais são as principais
vítimas?
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De acordo com pesquisas realizadas na Espanha a vitimização ocorre mais
em pessoas com idade entre vinte e seis e trinta e cinco anos, por serem mais
expostas aos delitos e por seu poder aquisitivo ser maior nessa idade esse tipo de
vítima geralmente é escolhida para roubos ou estupros.
Com respeito a variante “sexo” os dois possuem igual taxa de risco, pois
hoje em dia os estupros também estão ocorrendo em homens, porém nesse caso a
idade irá influir.
No cenário mundial os crimes são comuns, contudo como bem observa a
Universidade de Leiden, da Holanda, as taxas são menores quanto maior a política
social e o nível educacional dos países, por isso é tão importante que nos
confrontemos com a ideia de aumentarmos nossa política de prevenção.
Vários são os grupos de delito que assolam as cidades, porém os mais
chocantes, geralmente, são cometidos por psicopatas, para entender melhor como
esses crimes acontecem e como delinear uma proposta de prevenção a esses
delitos fazendo diminuir o número de vítimas é necessário aprofundarmo-nos nesse
caso.
3 - Psicopatia – detecção e prevenção
É uma anomalia presente em alguns seres humanos que se caracteriza pela
ausência de sentimentos. Assim, esses seres humanos tendem a agir como
parasitas ou predadores, e por isso interessam à área do direito, pois causam
vítimas na sociedade por sua patologia.
Para entender melhor essa enfermidade os cientistas – que tem por objeto
de estudo o cérebro humano – já descobriram que os psicopatas não conseguem
ativar uma parte do cérebro chamada de empatia, parte esta que provoca a
sensação de bem-estar quando fazemos algo bom à alguém e a capacidade de se
colocar no lugar do outro, também não se pôde chegar a um tratamento para essa
anomalia, mas sabe-se que algumas pessoas que sofreram lesões cerebrais
deixaram de cometer crimes de natureza psicopata.
O psicopata parece uma pessoa normal, por isso suas vítimas são
enredadas por ele com facilidade; tem uma boa conversa e seu ego é inflado, mente
descaradamente e às vezes chega a acreditar na própria mentira; gosta de
adrenalina e por este motivo vive quebrando regras; reage muito mal a insultos, mas
essa reação é rápida e logo está conversando como se nada tivesse acontecido;
não se sente culpado, pois a culpa é mais um mecanismo de manipular as pessoas;
é irresponsável e sempre diz que vai mudar; seus problemas aparecem cedo (na
infância).
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Como dito acima, há casos em que os psicopatas são parasitas, é como
mostrou uma personagem da novela “Caminho das Índias”, Ivone, ela encontrava
sua vítima, estudava seus pontos fracos e os usava em seu benefício, tirava-lhe todo
o dinheiro possível e depois sumia, não pensava nos outros, passava por cima de
quem quer que fosse para ter êxito em suas armações.
“... a Justiça tem dificuldade para avaliar o estrago que
esses psicopatas causam na vida das pessoas. Como seu
crime não envolve violência física direta, eles geralmente se
livram da prisão por falta de provas. Mesmo quando são
condenados, recebem uma pena leve e logo saem em
liberdade – para recomeçar do ponto onde pararam”.
(SUPERINTERESSANTE, 2009)
Outro caso é o psicopata predador, ele sente prazer na dor do outro, seus
crimes tem requintes de crueldade e não se importa com a pena que pode receber
por seus atos. Esses dois casos de acordo com dados estatísticos apontados pela
revista Superinteressante de 2010, constituem cerca de 20% da população
carcerária e responsáveis por 50% dos crimes graves. Entorno de 1% da população
mundial é psicopata, mas nem todos os psicopatas são assassinos, assim como,
nem todos os assassinos são psicopatas.
Os presos psicopatas não se reabilitam e em 70% dos casos voltam a
cometer os mesmos crimes, só que procuram não repetir os mesmos erros que os
levaram a prisão. Dentro da cadeia, o delinquente com psicopatia prejudica a
reabilitação dos presos comuns e devido a isso alguns especialistas acreditam que
eles deveriam ficar separados.
Sem reabilitação social, sem cura psiquiátrica, o meio de evitarmos a
vitimização pelo psicopata é a prevenção, divulgando a forma como agem para que
possamos nos defender. As esferas sociais em que eles atacam podem ser
separadas da seguinte forma: amizade, amor e trabalho.
Na esfera da amizade o psicopata, no início, parece ser o nosso melhor
amigo, depois ele se aproveita dessa amizade para levar-lhe tudo: o dinheiro, a
cerveja da geladeira, roupas emprestadas, etc... sempre com uma história
comovente, deixa suas vítimas sem vínculos sociais, como amigos, namorado(a), e
por fim mesmo com várias negativas suas ele não vai embora. Para manter esse
sujeito fora da sua vida é necessário que esteja atento ao seu diálogo, se 90% de
sua fala parecer mentira, se todos os seus amigos concordarem que ele é um
parasita, ele tem grandes chances de ser um psicopata, como se prevenir: não conte
que tem dinheiro sobrando, imponha regras e veja como ele reage, e por fim se
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desconfiar que ele seja mesmo um psicopata acabe com a amizade e não possua
vínculos com ele.
No âmbito amoroso o psicopata tenta descobrir os pontos fracos de sua
vítima, então se a pessoa é feia, ele diz que é bonita, se a pessoa é desprovida de
inteligência, ele diz que é inteligente, se a vítima busca o sucesso ele é o meio pelo
qual ela conseguirá atingi-lo. Para evitá-lo é importante que: desconfie do seu
excesso de gentileza, converse com as pessoas da família que o conhecem bem e
tente tirar informações úteis, saiba que ele sempre tem uma desculpa para seus
delitos, tente evitar contas bancárias conjuntas ou fazer investimentos em comum,
compre um cachorro e veja como ele reage ao cão (os psicopatas treinam suas
maldades nos cães, se descobrir que ele é um psicopata, não dê o fora nele sem
antes se assegurar que ele não tem acesso à você, troque as fechaduras e os
números de telefones e procure rotas alternativas do caminho habitual.
No trabalho eles se aproximam das pessoas que podem usar para sua
promoção, mas assim que alcançam o sucesso almejado, pisam em cima das
pessoas, fazem fofocas de todos que possam prejudicá-los ou ameacem seus
objetivos, nesse caso o melhor é ter um relacionamento estritamente profissional.
Evite fofocas e até mesmo ambientes em que isso esteja acontecendo, não declare
suas ideias inovadoras para que elas não sejam usadas com outras finalidades.
Essas foram algumas formas de prevenção contra crimes de natureza
sociopática. É muito difícil perceber a diferença entre um psicopata e um amigo
mentiroso ou invejoso, porém a máscara desses amigos sempre cai se forçarmos
um pouquinho a “barra”, mas com o psicopata é diferente, ele sempre tem uma
desculpa e não se arrepende do que faz. Os critérios acima nos ajudam a identificá-
los, mas é necessário não agirmos só pelos sentimentos, necessitamos do auxílio da
razão, pois os sociopatas são carismáticos e envolventes e encontram nossos
pontos fracos rapidamente, eles são astutos e inteligentes, devemos então ser
precavidos.
O Estado também tem sua função definida com respeito a esses elementos,
é obrigação estatal nos alertar, informar de quem são, como agem e como nos
defender desses delinquentes.
4 – Punição do psicopata pelo Estado:
A prevenção com certeza é a mais importante das formas de se minimizar as
consequências que podem causar o psicopata à sociedade, contudo faz-se
necessário também a punição adequada àqueles que já produziram o mal e devem
repará-los perante a coletividade.
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Para identifica-los como portadores de psicopatia a listagem abaixo
oferecida por Nathalia Cristina Soto em seu artigo “A resposta do Estado em crimes
cometidos por psicopatas” pode ser de grande utilidade, vejamos:
“ausência de empatia;
Utilização de mentiras, despudoradamente;
Inteligência(QI) acima da média;
Habilidade para manipular pessoas e liderar grupos;
Desconsideração pelos sentimentos alheios;
Egoísmo exacerbado;
Banalização do indivíduo;
Problemas na auto-estima;
Ausência de medo de ser pego;
Responsabilização de terceiros por seus atos;
Ausência de medo de ser pego;
Impulsividade;
Incapacidade para aprender com punição ou com experiências.”
(BANHA,. In: Âmbito Jurídico, 2008.)
Desta forma, identificados como psicopatas cabe ao estado exercer o seu
“ius puniendi” de forma diferente, pois como vimos são pessoas que exigem
tratamento diferencial tanto com respeito aos deficientes mentais como quanto aos
réus comuns. O “ius puniendi” estatal não surti o mesmo efeito nos criminosos com
essa patologia, pois eles não entendem o período de reclusão como uma punição e
por isso voltam a cometer os mesmos delitos quando fora da prisão.
“Por fim, o ponto mais importante para o presente trabalho
no que se refere às características é o fato dos psicopatas
não aprenderem com a experiência de seus erros, mesmo
que tenham recebido uma punição e nesse sentido Piedade
Junior (1982, p. 134) afirma que “a experiência de muitos
fracassos não forma uma base quando ele inicia uma nova
ação”. E pior, quando chegam a ser punidos, não absorvem
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esta punição, para eles o período de punição não passa na
verdade de uma neutralização de suas atitudes.”
(BANHA, In: Âmbito Jurídico, 2008.)
Para a maioria dos doutrinadores os psicopatas são tidos como semi-
imputáveis, porém esse fato reduz sua pena em 1/3, se o psicopata não consegue
atingir a função da pena que é a ressocialização, então, esta pena não é a mais
favorável para ser aplicada.
Se tratado como um preso comum, a convivência com os outros presos ser-
lhes-á mais maléfica e, portanto, inviável. Pois eles podem se tornar chefes de
rebeliões e submeter os outros presos aos seus interesses já que possuem alto grau
de persuasão, assim prejudicando a ressocialização dos presos sob seu comando e
causando tumulto no sistema carcerário.
O livramento condicional já foi tratado como impossível pelo STF por não
estarem aptos ao convívio social, os diagnosticados com tal enfermidade, porém
após cumprida a pena alguns voltam ao convívio social.
Também a medida de segurança não é instituto capaz de realizar sua função
de ressocialização quando se trata de psicopatas, já que verificou-se a
impossibilidade de arrependimento desses enfermos e, ainda são capazes de
ludibriar os agentes da saúde que os atendem demonstrando bom comportamento e
capacidade de convívio.
Outra medida que vem sendo aplicada aos casos de psicopatia é a
interdição civil, em que depois de responder penalmente pelo ilícito cumprindo pena
integral, o psicopata seria interditado e ficaria sob responsabilidade da família ou na
ausência desta em hospital mantido pelo Estado, desta forma podendo ser vigiado
pelo Poder Público através dos entes familiares que estariam observando o
comportamento do ex-detento.
Com toda a razão, os psicopatas não podem ser tratados como criminosos
comuns, pela ausência de ressocialização deles, por sua incapacidade de sentir
culpa pelas condutas criminosas que realizaram que estão comprovadas do ponto
de vista científico e são tratadas pela psicologia e psiquiatria como uma anomalia
provinda do mal funcionamento do cérebro humano.
Assim a melhor conduta a ser tomada no tratamento punitivo deste agente é
a medida de segurança com o cuidado de mantê-los isolados – do contrário seriam
eles péssima influência aos outros inimputáveis e semi-imputáveis - , juntamente
com esta medida deve ser realizada a interdição civil do psicopata. Assegurando
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desta forma que o agente não volte à criminalidade e também não sofra com penas
de caráter desumano. O que desde o Pacto da Costa Rica, é vedado no
ordenamento brasileiro, e reafirmado pelo art. 5º, XLVII, “a” e “b” c/c Art. 5º XLI da
Constituição Federal, que tratam respectivamente da proibição de pena de morte e
perpétua e a discriminação dos direitos e liberdades fundamentais de qualquer
cidadão, ou seja, inclui-se o criminoso.
Através da punição acima teremos observado também o disposto no Art. 5º,
XLVI da CF/88 sobre a individualização da pena, pois tratando-se da pessoa que
responde pelos crimes, esta possui característica exclusiva, qual seja, a de
psicopata. E não podemos deixa-los “a solta”, pois devido aos estudos realizados
sabemos que cometeram o crime novamente.
Não podemos nos esquecer que são os assassinos em série – com maior
grau de reprovabilidade pela sociedade, distintos por seus requintes de crueldade,
por sentir prazer em ver a dor do outro – potencialmente sociopatas, e estes, devem
receber a punição adequada.
Já que não podemos nos servir da pena de morte utilizada em outros países
em crimes desta natureza, devemos nos assegurar de que estes criminosos não
voltaram a agir, tumultuando o convívio social, aterrorizando e chocando a
sociedade com suas barbáries e sua frieza.
5 - Conclusão
A partir dos estudos realizados foi possível chegar a conclusão que estamos
diretamente envolvidos no processo de vitimização, qualquer um pode ser vítima de
um assalto, ou de um outro crime mais grave. A melhor forma de nos defender é
com a informação: como os crimes ocorrem, por que acontecem, quais são as
características das vítimas e também dos delinquentes.
Nesse aspecto pode-se dizer que a mídia vem ajudando muito a divulgar
esses dados, através de novelas, entrevistas, reportagens, dando dicas no noticiário,
contudo, isso ainda é pouco, a política governamental no sentido da prevenção é
muito recente e poucos são os programas exclusivos para esse atendimento. Diante
desses fatos reafirmamos que financeiramente seria muito mais viável para o
governo, em longo prazo, investir nesses programas, todavia a visão imediatista
impossibilita que esses recursos sejam levados a sério por nossos políticos e
também por grande parte da população, afinal é muito mais volumoso aos olhos do
povo dizer que vamos prender mais bandidos, contratar policiais, ter mais
segurança, do que dizer que vamos fazer programas de prevenção a vitimização.
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Sobre a psicopatia os estudos mostraram o quão importante é a
compreensão dessa anomalia, por nós futuros advogados ou juízes e também pelas
vítimas, pois 20% dos presos se encaixam nesse perfil e pode-se dizer que é um
número muito alto, ou seja, precisamos saber com quem estamos lidando antes de
oferecer-lhes o que temos de melhor enquanto seres humanos e dar-lhes uma pena
mínima enquanto juízes. Enquanto pessoas instrumentalizadoras do direito, temos
ainda mais responsabilidade, já que nossos esforços farão esses psicopatas
permanecerem mais ou menos tempo na prisão, se causarão mais ou menos vítimas
em seu espaço vital.
6 – Bibliografia:
GARCÍA-PABLOS, Antonio de Molina. GOMES, Luiz Flávio. Criminologia: introdução
a seus fundamentos teóricos: Introdução às Bases criminológicas da Lei
9.099/95 – Lei dos Juizados Especiais Criminais. 6ª Ed., São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2008.
SZKLALZ, Eduardo. Os falsários. Cotidiano. Revista Superinteressante, 267a, jul.,
2009.
BANHA, Nathalia Cristina Soto. A resposta do Estado aos crimes cometidos por
psicopatas. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XI, n. 59, nov 2008. Disponível em:
<http://www.ambito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5321>.
Acesso em maio 2012.
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A UTILIZAÇÃO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL PARA A DEFESA DO
MEIO AMBIENTE
Renata Calheiros Zarelli245
Vânya Senegalia Morete246
Resumo
A intenção deste artigo é explicitar de forma clara e sucinta a utilização do sistema
tributário nacional para a defesa do meio ambiente. A adoção dos tributos e a defesa
do meio ambiente são importantes princípios que devem nortear a ordem econômica
pátria. O objetivo é trazer à discussão que pode ser utilizado o tributo em proveito da
proteção do meio ambiente, a fim de desestimular a poluição ambiental e valorizar
aqueles que se utilizam de mecanismos limpos para a produção de seus produtos.
PALAVRAS- CHAVE: Sistema Tributário Nacional. Tributos. Meio Ambiente.
1. Introdução
No preâmbulo da Constituição de 1988 observa-se que as intenções e os
interesses do Estado Democrático de Direito brasileiro visam assegurar o exercício
dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade
fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida,
na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.
Outro dado relevante para o entendimento deste artigo é o conceito de
desenvolvimento sustentável, que nasceu durante a Conferência das Nações Unidas
sobre Direitos Humanos e Meio Ambiente ocorrido em Estocolmo, em 1972.
Desenvolvimento sustentável é aquele que assegura as necessidades da presente
geração sem comprometer a capacidade das gerações futuras de resolver suas
próprias necessidades.
245
Bacharel em Direito, Especialista em Direito e Processo do Trabalho. Rua Eng. Omar Rupp, 399.
CEP Londrina/PR. (43) 9619-5960 ou 9941-5822. E-mail: [email protected] 246
Advogada, Mestre em Direito Econômico, Especialista em Direito Civil e Processo Civil, Professora e Bacharel em Direito. E-mail: [email protected]
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O objetivo é esclarecer os mecanismos que a lei tributária possui e os
princípios que o direito ambiental dispõe, para que sejam utilizados conjuntamente
para a defesa do meio ambiente.
Com tais explanações, a intenção deste artigo é demonstrar como a
utilização do sistema tributário nacional para a defesa do meio ambiente pode ser
colocada em prática com as disposições legais existentes na legislação pátria.
O presente artigo está dividido em três capítulos: um que tratará sobre o
sistema tributário nacional; no segundo momento sobre a tributação ambiental; e por
fim, a utilização das espécies tributárias na defesa do meio ambiente.
2. Sistema Tributário Nacional
Vale anotar que, sistema é considerado um todo formado de parcelas que se
vinculam e se submetem a um princípio comum ou, ainda, a composição de partes
orientadas por um vetor único247.
Com isso, nas palavras de Paulo de Barros Carvalho, o sistema tributário nacional
empreende, na trama normativa, uma construção harmoniosa e
conciliadora, que visa atingir o valor supremo da certeza, pela
segurança das relações jurídicas entre Administração e
Administrados. E, ao fazê-lo, enuncia normas que são
verdadeiros princípios, tal o poder aglutinante de que são
portadoras, permeando, penetrando e influenciando um
número inominável de outras regras que lhe são subordinadas.
(CARVALHO, 2007, p. 140).
Ainda neste sentido, Aliomar Baleeiro dispõe que
o sistema tributário movimenta-se sob complexa aparelhagem
de freios e amortecedores, que limitam os excessos acaso
detrimentosos à economia e à preservação do regime e dos
direitos individuais. [...] A defesa do sistema tributário e do
próprio regime político do país processa-se por um conjunto de
limitações ao poder ativo de tributar. (BALEEIRO, 1999, p. 53).
247
SPAGOLLA, Vanya Senegalia Morete. Tributação ambiental: proposta para instituição de um imposto ambiental no direito brasileiro. Tese de Mestrado em Direito – UNIMAR, Marília. 2008.p 113.
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Assim, o sistema tributário nacional está estabelecido na Constituição
Federal, que é a lei tributária fundamental, que contêm as diretrizes básicas
aplicáveis a todos os tributos248. (CARRAZZA, 2010, p. 512).
Na Carta Fundamental estão descritas as normas de competência tributária,
que tem o condão de criar os tributos - impostos, taxas e contribuição de melhoria –
e estabelecer qual será o ente da federação que ficará responsável pela sua
implantação e gerenciamento.
Nas palavras de Roque Carrazza, competência tributária é
(...) a possibilidade de criar, in abstrato,
tributos, descrevendo, legislativamente, suas hipóteses de
incidência, seus sujeitos ativos, seus sujeitos passivos, suas
bases de cálculo e suas alíquotas (CARRAZZA, 2010, p. 513).
A Constituição Federal ao atribuir a competência para a criação de tributos
aos entes da federação, também definiu normas que limitam este poder de tributar,
com a finalidade de
delimitar o campo de atuação e as situações
fáticas que podem servir de suporte à cobrança, vedando que
se estabeleçam figuras tributárias arbitrárias e em desrespeito
aos princípios constitucionais e aos direitos e garantias
fundamentais do cidadão. (AMARAL, 2007, p. 64).
A previsão constitucional que determina os objetivos fundamentais do
Estado - construir uma sociedade livre, justa e solidária e garantir o desenvolvimento
nacional, etc. - e ainda, pela disposição dos fundamentos do Estado Democrático de
Direito - a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, e a valorização
do trabalho e da livre iniciativa, etc. - são as diretrizes para o sistema tributário
nacional.
É evidenciado nos dispositivos da constituição brasileira que, a dignidade da
pessoa humana deve ser o escopo do sistema tributário nacional para que o Estado
cumpra com sua função social e que dê melhores condições de vida à coletividade.
Nas palavras de Paulo Henrique do Amaral, quando trata sobre a função dos
tributos
(..) têm dupla função que é fundamentalmente
diferenciada pelo fim que perseguem. Por um lado, a natureza
arrecadatória dos tributos é seu fim fundamental para o Estado
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poder custear as necessidades públicas, caracterizando,
assim, a função primária do tributo. Em contrapartida, o tributo
pode ser adotado como instrumento de política social,
econômica e, é claro, ambiental, com a finalidade de levar a
cabo os fins constitucionais. (AMARAL, 2007, p. 64).
O sistema tributário nacional deve se preocupar com o meio ambiente
ecologicamente equilibrado, haja vista que é considerado direito fundamental do
indivíduo e é um dos princípios que devem nortear a atividade econômica do país,
além de ser um “requisito indispensável para a obtenção de uma melhor qualidade
de vida para a população” (SPAGOLLA, 2008, p. 118).
3. Tributação Ambiental
Antes de tratar o que é tributação ambiental, pretende-se expor brevemente
sobre os princípios que norteiam o direito ambiental e tributário, não esgotando o
assunto, tendo em vista a existência de outros princípios tão importantes quanto
estes aqui elencados.
3.1 Princípios Ambientais
3.1.1 Princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado
Para alguns doutrinadores, além dos direitos fundamentais dispostos no art.
5º da Constituição Federal, há também o direito fundamental preceituado no art. 225
do mesmo texto, que condiciona a pessoa humana a possuir um “ambiente
ecologicamente equilibrado”, considerado por tais como cláusula pétrea.
O princípio evidencia a importância de se ter um ambiente ecologicamente
equilibrado, igualando-o ao direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, que são direitos fundamentais inerentes ao nascimento do homem,
modificando assim a visão antropocêntrica, observando a importância do meio
ambiente para a sobrevivência humana, colocando a sua preservação como o dever
de cada um e a sua qualidade como forma digna de vida.
3.1.2 Princípio do desenvolvimento sustentável
O princípio do desenvolvimento sustentável está intimamente ligado às
raízes humanas, uma vez que o homem possui o direito de desenvolver-se e ao
mesmo tempo o direito de assegurar às gerações futuras as mesmas condições.
Este princípio possui grande importância, haja vista a necessidade de se
buscar um ponto de “equilíbrio” entre o desenvolvimento social e o crescimento
econômico. Os dois “devem coexistir, de modo que aquela não acarrete a anulação
desta”. (FIORILLO, 2008, p. 86).
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A intenção deste princípio não é impedir o desenvolvimento, pelo contrário,
tenta garantir o desenvolvimento hoje e para o futuro. O que se procura é que as
atividades das empresas sejam desenvolvidas com instrumentos adequados que
minimizem a degradação do meio ambiente e que tomem consciência que sem
cuidado não haverá recursos naturais em um futuro próximo.
3.1.3 Princípio do poluidor-pagador
Este princípio, também conhecido como o princípio da responsabilidade, visa
estabelecer ao poluidor a efetivação da compensação financeira pelo dano gerado
ao meio ambiente, tentando, de uma forma coercitiva, responsabilizar o poluidor por
degradar o meio ambiente e minimizar o dano ecológico causado.
A tributação ambiental, associada a este princípio, “terá o papel de
incorporar o custo da poluição ambiental ou do uso dos recursos ambientais ao
preço do produto poluidor ou daqueles que utilizem os recursos ambientais”
(AMARAL, 2007, p. 124).
3.1.4 Princípio da prevenção
O princípio da prevenção baseia-se na tomada de medidas que evitem,
reduzam ou eliminem as causas de danos ao meio ambiente. Tal princípio é o
fundamento de todo o Direito Ambiental, uma vez que com o alicerce da prevenção,
a atenção é
“voltada para o momento anterior à da
consumação do dano – o mero risco, ou seja, diante da pouca
valida da simples reparação, sempre incerta e, quando
possível, excessivamente onerosa, a prevenção é a melhor,
quando não a única, solução” (MILARE, 2001, p. 118).
Objetiva-se com a prevenção evitar danos ao meio ambiente, pois
normalmente os danos são compensáveis, mas tecnicamente e sob a ótica da
ciência, irreparáveis, por exemplo, a contaminação de um lençol freático por
agrotóxicos; ou ainda, trazer de volta uma floresta de séculos que sucumbiu sob a
violência do corte raso. (MILARE, 2001, p. 119).
Inserido no contexto tributário, “conclui-se que será o poluidor quem deve
assumir o custo com a prevenção, ao adotar mecanismos de controle e eliminação
da poluição que foram produzidas em razão de sua atividade” (AMARAL, 2007, p.
153).
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3.2 Princípios Tributários
3.2.1 Princípio da legalidade
Este princípio estabelece que os tributos só poderão ser instituídos ou
aumentados por lei, é o princípio da reserva legal em matéria tributária.
Neste caminho, o autor Paulo Henrique do Amaral cita Sacha Calmon
Navarro Coêlho que ensina:
nas sociedades livres se exigem regras perenes que
assegurem, em matéria tributária, a prevalência dos dois
pilares que sustentam o direito como ordem normativa: os
princípios da justiça e da segurança. Assim, da mesma forma
que hoje se consagrou a máxima da nullum poena sine lege no
direito penal, também a que se fazer referência à máxima
nullum tributum sine lege no direito tributário. Portanto, onde
houver Estado de Direito haverá respeito ao princípio da
reserva de lei em matéria tributária. Onde prevalecer o arbítrio
tributário, certamente inexistirá Estado de Direito. (AMARAL,
2007, p. 72)
Trazendo tal princípio para a tributação ambiental, “necessita-se da
realização de políticas ambientais visando à instituição de sistemas de precaução,
prevenção e reparação dos danos ambientais que poderão ser custeados pela
tributação ambiental” (AMARAL, 2007, p. 73).
3.2.2 Princípio da tipicidade
Este princípio está intimamente ligado ao da legalidade, pois, a
criação de um tributo não se dá somente pelo fato de sua inserção no mundo
jurídico através da lei, ele deve ocorrer pela adequação do fato à norma legal. Tal
subsunção do fato à norma tributária é que caracteriza o princípio da tipicidade.
O autor Paulo Henrique do Amaral cita a explicação de Yone
Dolacio de Oliveira que sustenta:
Os dois princípios (legalidade e tipicidade)
devem ser vistos em complementaridade, não se dando
preeminência a qualquer deles. Assim, se o princípio da
legalidade exige lei formal, o princípio da tipicidade impõe a
conduta dos titulares, da competência impositiva para criação e
aumento do tributo – a definição do fato gerador, da base de
cálculo, alíquota e sujeito passivo (art. 97 do CTN,
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complementando o princípio da legalidade e informando o
princípio da tipicidade). (AMARAL, 2007, p. 75).
Devido às características dinâmicas do direito ambiental e sua
necessária proteção, a tipicidade do tributo, ou seja, a subsunção do fato à norma
deverá ser extremamente flexível, admitindo assim, soluções distintas para situações
novas.
3.2.3 Princípio da progressividade
O princípio da progressividade, nas palavras de Misabel Derzi e Sacha
Calmon, é o
“fenômeno pelo qual as alíquotas de um imposto crescem à
medida que aumentam as dimensões ou intensidades da
circunstância considerada pela norma como condição de sua
aplicabilidade. Já assentamos que a base de cálculo continua
permanecendo inalterada, variando apenas a circunstância
normativamente eleita, como condição de aplicação da
alíquota”. (AMARAL, 2007, p. 103).
Assim, caso a progressividade venha a ser utilizada nos tributos ambientais,
estará implícito também o princípio da igualdade, haja vista que “quanto maior for a
base de cálculo dos tributos ambientais, maior será a intensidade da poluição
ambiental ou da utilização dos recursos naturais (...), dando a cada um o que lhe é
devido”. (AMARAL, 2007, p. 107).
3.3 Conceito de Tributação Ambiental e suas experiências em outros
países
Tem-se que a tributação ambiental é um instrumento constitucionalmente
garantido ao Estado para auxiliar na efetiva proteção do meio ambiente
ecologicamente equilibrado, conforme determina o art. 225, da CF. No Brasil, este
mecanismo ainda não é muito utilizado, tendo em vista a quantidade de tributos
existentes no país.
Assim, a tributação ambiental é tida “como o emprego dos instrumentos
tributários existentes para gerar recursos necessários à prestação de serviços
públicos ambientais, bem como para direcionar a postura dos contribuintes à
preservação do ambiente que se mostra essencial à qualidade de vida”.
(SPAGNOLLA, 2008, p. 90).
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A conseqüente intervenção do estado no domínio econômico, com o intuito
de garantir uma harmonia entre a economia e o desenvolvimento sustentável, foi
concretizada nos artigos 149 e 170 da Constituição Federal.
Há a inserção do meio ambiente nos princípios da ordem econômica e
financeira brasileira, bem como no art. 225 da Carta Magna que estabelece que o
meio ambiente é um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida, impondo ao Poder Público e a todos a obrigação de estabelecerem políticas
públicas e privadas na preservação ambiental.
A tributação ambiental foi implantada em alguns países do continente
europeu, como instrumentos fiscais de política ambiental, aplicadas a poluição
ambiental. Citam-se:
a) Alemanha: se prevêem taxas ou impostos sobre vasilhames
e embalagens em algumas comunidades;
b) Bélgica: tem-se optado pela via da fiscalidade. Reformas
ocorridas em 1993 estabelecem distintos tipos de tributos e
outras prestações coativas em consideração aos objetivos
ecológicos;
c) Grã-Bretanha: exige-se imposto sobre resíduos que tributa o
uso dos desaguadouros e que se pretende afetar um fundo
social.
d) Itália: instituiu-se imposto sobre resíduos depositados em
aterros, cujo objetivo é financiar serviço de eliminação de
dejetos por meio de imposto municipal. (AMARAL, 2007, p. 55).
A intenção da tributação ambiental ou green taxes (conceito norte-
americano) é precisamente a de “internalizar” os custos ambientais, isto é, trazer
para o custo de cada bem ou mercadoria o custo que seu consumo representa em
termos ambientais”. (AMARAL, 2007, p. 54).
4. Utilização das espécies tributárias para a defesa do meio ambiente
Vale lembrar os tipos de tributos existentes no ordenamento jurídico
brasileiro, suas principais características e a forma que podem ser utilizados para a
efetivação da preservação ambiental.
4.1 Impostos
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O artigo 16 do Código Tributário Nacional define imposto como “o tributo
cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer
atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.
A Constituição Federal em seu artigo 145, I, II e III, define as competências
para a criação de impostos aos entes federados – União, Estados e Municípios,
respectivamente.
Na lição de Paulo de Barros Carvalho,
com efeito, debalde procuraremos na hipótese de incidência
dos impostos uma participação do Estado dirigida ao
contribuinte. São fatos quaisquer – uma pessoa física auferir
renda; industrializar produtos; praticar operações financeiras;
ser proprietária de bem imóvel; realizar operações relativas à
circulação de mercadorias; prestar serviços etc. A formulação
lingüística o denuncia e a base de cálculo o comprova. É da
índole do imposto, no nosso direito positivo, a inexistência de
participação do Estado, desenvolvendo autuosidade atinente
ao administrado. (CARVALHO, 2007, p. 36).
O autor Paulo Henrique do Amaral clarificou sobre a utilização dos impostos
como instrumento tributário de proteção ambiental que
poderá se dar por meio direto ou indireto. Quanto ao meio
direto, poderá ocorrer pela instituição de imposto ambiental que
possui como hipótese de incidência tributária a poluição
ambiental ou a utilização de recursos ambientais. Já o meio
indireto se dará mediante o uso de incentivos fiscais com a
finalidade de desenvolver no contribuinte um comportamento
não-poluidor. (AMARAL, 2007, p. 160).
Após tais considerações, a Constituição Federal não previu impostos de
natureza ambiental, desta forma, eles seriam aplicados de forma indireta, através de
incentivos fiscais, para que o contribuinte tenha atitudes não poluidoras contra o
meio ambiente.
A título exemplificativo há em nosso ordenamento jurídico os seguintes
impostos que têm características de incentivos fiscais: a) ITR (Imposto sobre
Propriedade Rural), que busca a desestimulação da manutenção de propriedades
improdutivas, graduando progressivamente as alíquotas do imposto; b) IPTU
(Imposto Predial e Territorial Urbano), o qual institui alíquota progressiva nos casos
em que a propriedade urbana não esteja cumprindo sua função social; etc.
(MAGANHINI, 2007, p. 69).
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4.2 Taxas
O artigo 77 do Código Tributário Nacional determina que as taxas são
cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no
âmbito de suas respectivas atribuições. Têm como fato gerador o exercício regular
do poder de políciai, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público
específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.
Além disso, conforme disposto no art. 77, consideram-se serviços públicos:
a) utilizados pelo contribuinte efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer
título; e potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à
sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento; b)
específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de
intervenção, de utilidade ou de necessidades públicas; c) divisíveis, quando
suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários.
Assevera o autor José Marcos Domingues de Oliveira que
No direito brasileiro, à luz do artigo 77 do CTN, parecem
admissíveis como fatos geradores o licenciamento, a
fiscalização e a limpeza ou recuperação ambiental, guardando
uma razoável equivalência com o curso dos serviços públicos
de licenciamento e fiscalização, e da limpeza ou recuperação
ambiental correlacionáveis, exemplificativamente, à situações
individuais dos contribuintes (tipo de estabelecimento/
instalações/ atividades, área fiscalização, etc.) e aos volumes
de emissões despejos ou produção de resíduos
poluidores.(OLIVEIRA, 1999. p. 57-58)
Nos sistema pátrio, tem-se que a Lei 10.165/2000 que alterou a Política
Nacional do Meio Ambiente – Lei 6938/81, instituiu em seu artigo 17-B a Taxa de
Controle de Fiscalização Ambiental – TCFA, cujo fato gerador é o exercício regular
do poder de polícia, para controle e fiscalização das atividades potencialmente
poluidoras e utilizadoras de recursos naturais.
Quanto à constitucionalidade deste dispositivo trazido pela Lei 10.165/2000,
foi abordado perante o STF no RE 416.601, bem como em diversos outros julgados
desta Corte, que entendeu ser legítima a cobrança da TCFA pelo Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais – IBAMA, não havendo
inconstitucionalidade na cobrança de tal tributo.
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4.3 Contribuição de Melhoria
A contribuição de melhoria se caracteriza por estar vinculada à realização de
obra pública que valorize a propriedade imobiliária, ou seja, este tributo será
instituído para se fazer jus ao custo de obras públicas de que decorra valorização
imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e, como limite individual o
acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado. (AMARAL,
207, p. 177).
Neste sentido, Paulo Henrique do Amaral esclarece sobre a aplicação da
contribuição de melhoria no direito ambiental
O Estado, conseqüentemente, poderá desenvolver projetos
voltados para a proteção ambiental com a construção de obras
públicas de natureza ambiental, sem a necessidade de onerar
os cofres públicos. Os proprietários de imóveis valorizados por
essas obras são obrigados a pagar essa contribuição, pois o
dinheiro público foi utilizado essencialmente em seu benefício,
ocorrendo, assim, um benefício individual em detrimento da
coletividade, cabendo à contribuição de melhoria corrigir essa
injustiça. (AMARAL, 2007, p. 180).
Em contrapartida, diversos autores discordam de tal disposiçãoii, tendo em
vista que os contribuintes não têm capacidade contributiva para suportar o ônus de
custear a reparação de determinado dano ambiental, muitas vezes, realizado por
pessoas físicas e/ou jurídicas.
5. Conclusão
O objetivo deste artigo foi o de analisar de forma sucinta a
possibilidade de utilização do sistema tributário nacional na defesa do meio
ambiente, haja vista que os tributos e os incentivos fiscais são instrumentos eficazes
na proteção do meio ambiental ecologicamente equilibrado.
Nas palavras de Paulo Henrique do Amaral, que trata com grande
veemência sobre o contexto da utilização do sistema tributário nacional na defesa do
meio ambiente
Assinala-se que, dentre vários instrumentos
para concretização dessas políticas estatais, pode-se revelar
eficiente a utilização dos tributos, com o intuito de obrigar os
agentes econômicos a suportar as externalidades negativas
geradas em razão da sua atividade econômica poluidora ou,
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por outro lado, estimular por meio de incentivos fiscais que eles
desenvolvam comportamentos não agressores ao meio
ambiente. (AMARAL, 2007, p. 44).
O autor complementa sobre o incentivo estatal para as atividades
econômicas não-poluidoras que
deverão ser incentivadas por meio de
instrumentos tributários e econômicos em detrimento das
poluidoras como forma de reorientar as condutas dos agentes
poluidores a adotarem novas e adequadas tecnologias limpas
para reduzirem custos em seus processos de produção.
(AMARAL, 2007, p. 51).
Diante o exposto, verifica-se que a taxa poderá ser utilizada de
forma excelente no papel da proteção ambiental, “financiando o sistema de
fiscalização de determinadas atividades poluidoras ou na adoção de serviços
públicos de natureza ambiental”. (AMARAL, 2007, p. 172).
Além disso, já foi discutida a sua constitucionalidade no STF (RE
416.601), quando da análise da TCFA - Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental.
Ainda neste sentido, a lei que instituiu a TCFA admitiu a
possibilidade de que 60% (sessenta por cento) do valor desta taxa seja direcionado
ao órgão ambiental estadual, e os 40% (quarenta por cento) restantes
encaminhados ao IBAMA (órgão ambiental federal). Alguns Estados já aderiram a tal
procedimento, por meio de lei estadual, tais como Bahia, Pernambuco e Rio Grande
do Norte. No Paraná, o projeto de lei está em trâmite perante a Assembléia
Legislativa do Estado.
Em relação a utilização dos impostos na proteção ambiental,
estes devem ser instituídos de forma indireta, ou seja, através de incentivos fiscais.
Com isso, estimularia o contribuinte a realizarem condutas voltadas à proteção
ambiental ou a não praticarem condutas poluidoras; para tanto, a pessoa política
competente poderá diminuir, retirar ou aumentar a carga tributária do sujeito passivo
como forma de atender seu escopo. Pode-se citar o ITR (Imposto de Territorial
Rural), que isenta o seu pagamento, àqueles que possuem áreas com florestas sob
o regime de preservação ambiental em sua propriedade. (AMARAL, 2007, p. 193-
196).
Quando o Estado ao incentivar a construção de obras de caráter
ambiental, por exemplo: praças, academias ao ar livre, etc., estará atendendo ao
interesse coletivo, pois propiciará a elevação do bem-estar coletivo. Com tal atitude,
haverá uma valorização dos imóveis próximos a estas obras, e assim, o Estado
poderá efetuar a cobrança da contribuição de melhoria para custear tais obras.
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Nas palavras de Paulo Henrique do Amaral “(...) ocorrendo,
assim, um benefício individual em detrimento da coletividade, cabendo à
contribuição de melhoria corrigir esta injustiça”. (AMARAL, 2007, p. 180).
Em decorrência da experiência vivida na Europa com a instituição
de tributos ambientais e o resultado de seu custo-benefício em custo prazoiii,
verifica-se que o tributo ambiental pode ser utilizado de forma a prestar um
inestimável serviço à proteção ambiental.
Com isso, salientasse que este artigo trouxe as explicações sobre
o tema, de forma sucinta, não tendo o intuito de exaurir o tema proposto, e sim de
provocar novas discussões sobre o assunto.
6. Referências Bibliográficas
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2000 e retificado em 09 jan. 2001.
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O NOVO ENFOQUE DO ACESSO À JUSTIÇA: UMA ANÁLISE À ADOÇÃO DE
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO ESPECIAL
Rodolfo Carvalho Neves dos Santos
Acadêmico de Direito na UEL
Ivan Martins Tristão
Mestre (UEL). Advogado. Docente do Curso de Direito na UEL.
RESUMO
O artigo parte da análise histórica do princípio da inafastabilidade do judiciário,
também conhecido como o princípio do acesso à justiça, onde abarca a evolução do
Estado liberal burguês em sua postura passiva diante da tutela jurisdicional, para
uma nova concepção de acesso à justiça, ligada a um conceito mais amplo que
abrange uma postura ativa do Estado que pensará métodos que tornem mais fácil o
acesso à justiça daqueles que tiverem seus direitos lesados. Trata-se do novo
enfoque do acesso à justiça. Atualmente, observa-se que desde a promulgação da
Constituição de 1988 o Estado tem pensado em reformas que tornem, basicamente,
a jurisdição mais rápida e eficiente. Como exemplo, toma-se a criação dos tribunais
superiores, que surgiram a partir da necessidade de desafogar a instância suprema.
Hoje, este tribunal superior, o STJ, também necessita de reformas que tornem sua
jurisdição mais eficaz. Diante disso, discute-se a nova reforma que está sendo
pensada a ser aplicada nos Recursos Especiais dirigidos a este tribunal, qual seja, a
adoção da repercussão geral, assim como no STF. Sobre este tema existem dois
posicionamentos contrários, um dele diz que a adoção da repercussão geral seria
um obstáculo ao acesso à justiça, uma vez que limitaria o prejudicado a ter a devida
tutela jurisdicional que merece a partir do recurso; já a outra entende que tal método
irá trazer mais eficácia aos processos, uma vez que estes terão julgamentos mais
céleres e de maior segurança jurídica, pois restará reforçada a decisão proferida em
segundo grau, não dando hipótese do STJ servir de mero revisor de terceira
instância. Acredita-se que esta última seja a concepção mais pertinente ao novo
enfoque do acesso à justiça, e é a defendida neste artigo.
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Palavras-chaves: Acesso à justiça. Novo enfoque do acesso à justiça. Reformas no
Judiciário. Repercussão Geral. Recurso Especial.
1. INTRODUÇÃO
Diante da nova proposta que surge no Poder Judiciário quanto à adoção de
repercussão geral nos Recursos Especiais dirigidos ao Superior Tribunal de Justiça,
e tendo em vista a polêmica discussão que surgira em torno desta proposta, cujo
objeto incide na limitação ou não do acesso à justiça, buscou-se, através deste
trabalho, entender as razões que motivaram o advento desta proposta, além de
investigar, a partir de um resgate histórico-conceitual, os fundamentos do princípio
da inafastabilidade jurisdicional que legitimam a reforma proposta.
Parte-se desta análise temporal para se entender a maneira que o Estado se
posicionou em relação à preocupação do acesso à justiça nos diferentes momentos
da história, compreendendo, então, a atual fase em que estamos, conceituada como
o novo enfoque do acesso à justiça.
2. O DIREITO FUNDAMENTAL DO ACESSO À JUSTIÇA
O princípio processual do acesso à justiça, conhecido como o princípio da
inafastabilidade do Poder Judiciário, encontra-se positivado na Constituição Federal
em seu Título II - “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, especificamente no
artigo 5º, inciso XXXV, que menciona:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito; (CF, 1988, art. 5º).
Este princípio começa a tomar grande proporção no cenário das discussões da
Ciência Jurídica do século XVIII, quando o Estado liberal burguês, carregado da
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influente filosofia individualista da época, decide reconhecer um direito formal do
indivíduo a propor e contestar uma ação.
Desta maneira, o Estado toma uma postura passiva diante da efetiva tutela
jurisdicional, dando, apenas, a oportunidade de que aqueles cujos direitos tenham
sofrido algum tipo de lesão pudessem propor demandas e as contestarem em um
cenário jurídico.
Tratava-se de um acesso formal, mas não efetivo à justiça, que também
correspondia a uma igualdade também formal, porém não efetiva. (CAPPELLETTI,
GARTH, 1988, p.9).
Com o passar do tempo e crescimento deste Estado iniciou-se uma nova concepção
acerca dos direitos humanos, como CAPPELLETTI menciona:
[...] a partir do momento em que as ações e relacionamentos
assumiram, cada vez mais, caráter mais coletivo do que
individual, as sociedades modernas necessariamente deixaram
para trás a visão individualista dos direitos. (CAPPELLETTI,
GARTH, 1988, p. 10).
Neste estágio o Estado passa a adotar uma atuação mais positiva em face da
passividade de outrora, pois percebe a necessidade de criação de mecanismos que
garantam a efetividade de gozo e reivindicação dos direitos cujos cidadãos são
titulares.
Uma vez reconhecida a concepção histórica do pensamento de garantia ao direito
de acesso à justiça, é possível de se entender a conceituação doutrinária
contemporânea a respeito do assunto, isto porque o posicionamento adotado pelos
operantes do direito de hoje se relacionam diretamente à postura adotada pelo
Estado em meados do século XIX, ou seja, uma postura mais ativa e aberta a
enxergar os obstáculos existentes ao efetivo acesso à justiça, criando formas de
superá-los.
Cândido Rangel Dinamarco, por exemplo, conceitua o princípio da inafastabilidade
do controle jurisdicional da seguinte maneira:
O Princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional manda
que as pretensões sejam aceitas em juízo, sejam processadas
e julgadas, que a tutela seja oferecida por ato do juiz àquele
que tiver direito a ela – e, sobretudo, que ela seja efetiva como
resultado prático do processo. (DINAMARCO, 2004, p. 199).
A definição do autor se enquadra em uma postura um tanto quanto formal do
princípio, uma vez que relaciona o direito de acesso à justiça a uma capacidade
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postulatória de demandas e que estas seja processadas e julgadas segundo os
devidos procedimentos legais.
Diferentemente de Cassio Scarpinella Bueno, cuja conceituação do direito
fundamental do acesso à justiça abrange uma postura integralmente material.
O inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal é expresso
quanto a qualquer ameaça ou lesão a direito [...] Não pode se
limitar a dar, como se verificou na evolução de seu estudo
científico, com situações de lesão já consumadas [...] é aqui
que repousa a grandeza do princípio constitucional em exame,
novidade trazida para o ordenamento jurídico brasileiro com a
Constituição de 1988, também a mera situação de ameaça a
direito, um direito ainda não lesionado, [...] deve receber
adequada e eficaz tutela jurisdicional. (BUENO, 2011, p. 138).
Este autor menciona que pelo contexto ao qual a Constituição Federal do Brasil foi
promulgada em 1988, foi adotado em seu texto uma posição que dava grande
importância aos direitos difusos e coletivos, eis o porquê do texto constitucional ter
garantido o acesso à justiça não só aos bens jurídicos lesados, mas também
àqueles que estejam em ameaça de lesão.
Surge então a possibilidade de proteção aos direitos difusos e coletivos como, por
exemplo, direito ambientais, trabalhistas, etc.
Tem-se, então, uma conceituação do princípio da inafastabilidade do judiciário
amplamente proporcional à sua abrangência, considerando que o princípio do
acesso à justiça deve ser visto como um direito fundamental do cidadão em propor
uma demanda perante a Justiça cujo objeto seja a tutela de um bem jurídico de sua
titularidade, ou de seu interesse – no caso dos direitos difusos - que tenha sido
lesado ou esteja na iminência de lesão, e que esta demanda seja processada e
julgada, originando um resultado efetivo, com observância a princípios básicos como
celeridade e isonomia.
3. O NOVO ENFOQUE DO ACESSO À JUSTIÇA
Conforme demonstrado, uma vez que o Estado toma uma postura ativa diante da
preocupação com o efetivo acesso à justiça, ele passa a enxergar circunstâncias
que distanciem os cidadãos do exercício jurisdicional, adotando, assim, medidas que
viabilizem a tutela dos direitos destes.
Mauro Cappelletti expõe em sua obra “Acesso à Justiça” que tal postura do Estado
progrediu em três grandes momentos, denominados ondas de acesso à Justiça.
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Em um primeiro momento preocupou-se em realizar reformas ligadas à assistência
judiciária, proporcionando uma oferta de serviços jurídicos àqueles que não
poderiam arcar o custeio dos serviços de advogados.
A segunda onda de acesso à justiça se destinava à criação de mecanismos de
representação aos direitos difusos dos cidadãos, como os relacionados aos
consumidores, meio ambiente, etc., o que gerou uma considerável reforma nos
conceitos tradicionais do processo civil, como em questões de procedimentos e
legitimidade postulatória.
A terceira onda, a que presenciamos atualmente, foi denominada de novo enfoque
do acesso à justiça, e constituiu um alcance muito mais amplo em relação às prévias
reformas já realizadas.
Este novo enfoque do acesso à justiça “centra sua atenção no conjunto geral de
instituições e mecanismos, pessoas e procedimentos utilizados para processar e
mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas” (CAPPELLETTI, GARTH,
1988, p. 67 e 68).
Assim, devido sua abrangência, esta terceira onda não se concentra em apenas
uma área de atuação como, por exemplo, na primeira onda cujo objeto era a
assistência judiciária, ele vai além, pensa na instituição do Judiciário como um todo,
em todos os meios, instrumentos e procedimentos que façam parte dele.
Como exemplo destas reformas tem-se: a criação dos Juizados Especiais Cíveis
(CF, artigo 98), a criação da Defensoria Pública e sua elevação à instituição
essencial à função jurisdicional (CF, art. 134); a restruturação do Ministério Público
atribuindo-lhe a defesa da ordem jurídica (CF, arts. 127 e 129). (MOTTA, 2007).
Conclui-se que, neste novo enfoque do acesso à justiça, o Estado, na figura do
legislador e dos operantes do Direito, terá que destinar suas atenções a diversos
problemas existentes na ordem jurídica e no acesso à justiça, devendo realizar uma
“ampla variedade de reformas, incluindo alterações nas formas de procedimentos,
mudanças na estrutura dos tribunais ou a criação de novos tribunais”.
(CAPPELLETTI, GARTH, 1988, p. 71).
4. A FUNÇÃO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES SOB A ÉGIDE DO NOVO
ENFOQUE DE ACESSO À JUSTIÇA
O debate acerca do acesso à justiça, como visto, abrange as diversas entidades que
fazem parte do sistema jurisdicional do país, especialmente seus tribunais e
câmaras julgadoras.
Em análise a atual situação do Poder Judiciário brasileiro é possível inferir que
reformas nestas instituições também são necessárias para que haja a efetiva
instrumentalização do princípio do acesso à justiça.
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Neste ensejo, cita-se artigo 92 da Constituição Federal que descreve a estrutura do
Poder Judiciário, demonstrando quais órgãos julgadores fazem parte dele. Em
especial, em seu inciso II, o dispositivo institui o Superior Tribunal de Justiça, que
junto ao Tribunal Superior do Trabalho e Tribunal Superior Eleitoral, constituem a
gleba dos Tribunais Superiores brasileiros.
Em breve resgate histórico, ressalta-se que o Superior Tribunal de Justiça surgiu
diante de um cenário de crise da corte suprema brasileira que vivia um verdadeiro
inchaço devido à apreciação crescente de excessivos litígios que eram postos a
cargo do tribunal sobre matérias de ordem infraconstitucional.
Isto porque a estrutura do Judiciário brasileiro contribuía em grande parte para o
afunilamento das demandas na instituição suprema tendo em vista a má distribuição
de competências vigente à época.
Podia se indagar àquela época se acaso os processos julgados poderiam ser
considerados efetivamente justos. Nas lições de Luiz Guilherme Marinoni é
ressaltado que “seguramente, pois, não está diante de um processo justo, do devido
processo legal processual brasileiro, se o formalismo processual não se configurar
como um ponto de encontro dos direitos fundamentais”. (MARINONI, 2008, p.11).
Assim, pode se perceber uma verdadeira ineficácia da jurisdição na época uma vez
que os inchaços das cortes causavam um claro afrontamento do direito ao processo
com duração razoável (art. 5º, LXXVIII, da CF) que implicitamente se correlaciona ao
princípio do acesso à justiça.
Neste sentido, com profunda influência da terceira onda processualística do acesso
à justiça já mencionada, o Poder Constituinte Originário de 1988 reforma a estrutura
do judiciário criando o Superior Tribunal de Justiça e outros cinco Tribunais
Regionais Federais.
Como comemora Ailton Gusmão Carneiro:
Em boa hora, a instituição do Superior Tribunal de Justiça veio
a liberar o Supremo Tribunal Federal para um menos atribulado
exercício de sua missão maior, de custódia da Constituição
Federal e órgão tutelar dos direitos e garantias individuais.
(CARNEIRO, 2009, p.10).
À criação do STJ guardou-se processo similar de análise e instituição de
competências do utilizado no Supremo, guardando competências originárias,
competências de recurso ordinário e de recurso especial, semelhante ao
extraordinário.
Tais atribuições estão dispostas no artigo 105 da Constituição Federal, sendo
importante para o presente estudo o que está disposto no inciso III do referido artigo,
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que define a possibilidade de admissão do recurso especial para julgamento do
Tribunal Superior.
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
[...]
III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única
ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou
pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios,
quando a decisão recorrida:
a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;
b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei
federal;
c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja
atribuído outro tribunal
(CF, 1988, art. 105).
José Afonso da Silva, em suas lições constitucionais, menciona que é na força deste
inciso terceiro que se constitui a característica própria do STJ com suas atribuições
de controle de inteireza positiva e autoridade e uniformidade de interpretação da lei
federal. (SILVA, 2009, p. 559).
Assim, o recurso especial surge como instrumento que garantiria a unificação do
direito federal, diante da possibilidade de divergentes julgamentos pelos tribunais
federais, além de servir como última instância para discussão de matéria
infraconstitucional, desafogando o Supremo de discussões que não se relacionavam
diretamente a divergência de aplicação da norma constitucional.
Em estrita relação ao que a onda de novo enfoque do acesso à justiça promove, o
legislador pôde, diante de uma série de possibilidades entre criação de instituições,
mecanismos e agentes, resguardar o direito do cidadão a um processo célere – não
existia mais a demora causada pelo inchaço do STF -, eficaz e seguro.
O recurso especial foi concebido com a intenção de garantir a boa aplicação da lei
federal e unificar-lhe a intepretação no Brasil (CARNEIRO, 2009, p. 14 e 15) – e,
garantidor da defesa e do duplo grau de jurisdição – instaura a possibilidade de
impugnação de tribunal que esteja diversa a aplicação da lei federal, trata-se de
possibilidade de defesa.
Ou seja, a criação do STJ tratou-se de um exemplo concreto da nova onde
processualística referente ao acesso à justiça, onde pôde, a partir da averiguação de
diversos obstáculos a tutela jurisdicional, criar alternativa eficaz para solução de tais
problemas e estreitamento da relação entre individuo e justiça.
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5. A ADOÇÃO DE REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO ESPECIAL
No dia 05 de março deste ano o pleno do STJ aprovou uma nova iniciativa que visa
melhorar seu exercício jurisdicional. Trata-se de Proposta de Emenda Constitucional
que transforma o parágrafo único do artigo 105 da CF, em parágrafo 2º e introduz o
parágrafo 1º com a seguinte redação:
No recurso especial o recorrente deverá demonstrar a
relevância das questões de direito federal infraconstitucional
discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal
examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo
pela manifestação de dois terços dos membros do órgão
competente para o julgamento.
Tal proposta surge diante do presente cenário em que o Superior Tribunal de Justiça
vive, onde necessita criar meios que o desafogue de excessivos julgamentos de
recursos. Menciona-se que este é um cenário muito semelhante àquele passado
pelo STF quando da criação do STJ.
Desta forma, com a alteração pretendida pela EC, os recursos especiais estariam
resguardados pelo mesmo instituto da repercussão geral adotado pelo STF,
necessitando que, para que a causa seja julgada no STJ, seja reconhecida a
relevância da discussão em âmbito geral quanto à infração a determinada lei federal
infraconstitucional.
O STJ levanta tal discussão sobre a bandeira de que se necessita privilegiar o
princípio da duração razoável do processo uma vez que se está impossível de
valorizá-la em um tribunal que se encontra inchado por um excesso de demandas a
serem julgadas por seus ministros.
As palavras do ministro Teori Zavascki explanam bem a problemática:
Claro que a carga de trabalho é enorme. Para dar vazão ao
volume de processos, necessariamente tem que se sacrificar a
qualidade do julgamento. Ou se busca vencer a quantidade ou
se prioriza a qualidade. Não tem milagre.” (STJ, 2012).
Ocorre que, diante de tal notícia se iniciou um intenso debate quanto à efetividade e
necessidade de tal emenda constitucional. A Ordem dos Advogados do Brasil, por
exemplo, na pessoa de seu presidente, entende que a verdadeira solução para o
problema levantado pelo ministro não é a adoção de filtro de demandas, mas sim de
um aumento no número de ministros.
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Não há qualquer impedimento legal para o aumento do número de ministros do STJ,
muito pelo contrário, a Constituição Federal apenas indica um número mínimo de 33
ministros em sua composição: “Art. 104. O Superior Tribunal de Justiça compõe-se
de, no mínimo, trinta e três Ministros”.
Além do mais, percebe-se o quanto reduzido é o número de ministros do STJ uma
vez que o comparamos a outros tribunais de diferentes países que exercem a
mesma função, como, por exemplo, a Corte de Cassação italiana, composta em
2010 por 360 juízes, e a Corte de Cassação Francesa, composta por
120 “Conseillers” e 70 “conseillers référendaires” (MEDINA, 2012).
Percebe-se que estamos diante de uma discussão cujo principal objeto é garantir a
efetividade do acesso à justiça, em seu conceito ampliado já supramencionado, que
abrange não apenas o acesso formal.
Entretanto, as presentes divergências se encontram na medida a ser tomada para
se garantir a efetividade pretendida.
Vale lembrar que o grande receio por parte daqueles que se posicionam contra a
adoção da medida é que ao se adotar a repercussão geral pretendida se limitará o
acesso à justiça em sua forma recursal para muitas pessoas, fazendo que decisões
de tribunais estaduais convertam-se em trânsito em julgado sem uma devida
reanalise.
Ocorre que, é exatamente neste ponto que se encontra o cerne da discussão. A
adoção da repercussão geral para o Recurso Especial irá evitar que a corte funcione
como uma câmara revisadora em terceira instância, impedindo a impetração de
recurso especial em casos que não necessitariam ser analisados pelo STJ,
revestindo as decisões judiciais dos Tribunais Regionais com maior poder.
Além de que impediria a chegada de casos esdrúxulos ao STJ, como caso dos cães
que mataram um papagaio (APn 187); furto de uma fotocópia de cédula de
identidade, uma moeda de R$ 0,10 e outra de R$ 0,05 (HC 23.904); uma mãe que,
em discussão com educadora, mordeu o seu nariz (HC 35.896), etc. (MIGALHAS,
2011).
Portanto, verifica-se que a adoção da repercussão geral no Recurso Especial ao
STJ está em perfeita consonância ao que preceitua a terceira onda do novo enfoque
do acesso à justiça, uma vez que, através da reforma de mecanismos e
procedimentos, o Estado irá garantir maior efetividade à tutela pretendida pelo titular
de direito, tendo este um processo mais célere e de maior segurança jurídica.
Vale lembrar que por mais que se entenda viável a adoção de tal procedimento, não
se exclui os pontos levantados em contrapartida, como, o aumento considerável no
número de ministros do órgão julgador.
Roga-se, pois, pela contínua preocupação do Estado em analisar e pensar medidas
que diminuam a distância entre o Judiciário e o povo.
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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se que a Proposta de Emenda Constitucional que visa a adoção de
repercussão geral nos Recursos Especiais é fruto da onda de acesso à justiça em
que vivemos, qual seja a do novo enfoque do acesso à justiça. No bojo desta
concepção reside a necessidade de reformar todo o aparelho do Judiciário,
inclusive, os requisitos e técnicas de julgamento.
Portanto, entende-se que é legítima a proposta e que esta trará efetividade a tutela
jurisdicional, e não será tomada como limitação ao princípio do acesso à justiça,
uma vez que a própria competência do STJ reside no julgamento de causas que
representem infringência às normas federais, de maneira que aquelas causas –
como as citadas no desenvolvimento – em que há, apenas, interesse entre
particulares mascarados sob normas federais, permanecerão com a decisão do
Tribunal de Justiça, justamente por não possuírem o requisito de repercussão geral.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil:
teoria geral do direito civil. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2011. vol. 1.
CARNEIRO, Athos Gusmão. Recurso Especial, Agravos e Agravo Interno:
exposição didática: área do processo civil, com inovação à jurisprudência do
Superior Tribunal de Justiça. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
CAPPELLETTI, Mauro. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988.
DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 4. ed.
São Paulo: Malheiros, 2004.
MARINONI, Luiz Guilherme. Repercussão Geral no Recurso
Extraordinário. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
MEDINA, José Miguel Garcia. STJ precisa aumentar número de ministros. 2012.
Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-mar-14/stj-aumentar-numero-
ministros-vez-reduzir-recursos>. Acessado em: 14 mar. 2012.
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MIGALHAS. Casos curiosos julgados pelo STJ. 2011. Disponível em
<http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI146237,71043-Casos+curiosos+
julgados+pelo+STJ> Acessado em: 14 abr. 2012.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 21. ed. São
Paulo, Malheiros, 2002.
STJ. Abarrotado de processos, STJ busca filtros para reduzir a demanda e
priorizar a qualidade. 2012. Disponível
em:<http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=
105006>. Acessado em: 11 mar. 2012.
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INDENIZAÇÃO ESTATAL PELA PERDA DE UMA CHANCE DEVIDO A
PRECARIEDADE DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
Daniela Braga Paiano249
Lara Caxico Martins250
Larissa Moya Nascimento251
RESUMO: O presente estudo tem como objetivo maior analisar a postura do Estado,
como titular de uma responsabilidade administrativa objetiva, frente ao cidadão,
dadas as deficiências do Sistema Único de Saúde. A Constituição Federal de 1988
estabelece no artigo 196 que é dever do Estado disponibilizar o acesso à saúde de
maneira universal e igualitária. Depreende-se deste princípio que a saúde pública
deve atender, e com qualidade, os diferentes níveis de complexidade dos casos
encontrados no território nacional. Nesta perspectiva e com base no artigo 37,
parágrafo 6o da Magna Carta, sendo dever do Estado à prestação de serviços
públicos eficientes de saúde, o dano causado ao cidadão pela falta destes, pela
atuação de qualquer dos seus agentes ou pelo mal funcionamento do serviço
público, impõe ao Estado o dever de reparação.
Palavras-Chave: 1. Estado ; 2. Responsabilidade Administrativa; 3. Sistema único
de Saúde; 4. Serviços Públicos; 5. Dano
249
Docente na graduação e pós da Universidade Estadual de Londrina (UEL), na Universidade Norte do Paraná (UNOPAR), Faculdades Catuaí, na Pós-Graduação da Fundação Escola do Ministério Público – FEMPAR. E-mail: [email protected] 250
Graduanda do 3º ano de Direito na Universidade Estadual de Londrina. E-mail: [email protected] 251
Graduanda do 3º ano de Direito na Universidade Estadual de Londrina. E-mail: [email protected]
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1. INTRODUÇÃO
O significado da palavra “responsabilidade”, com origem latina no verbo
respondere, traz consigo a ideia da obrigação de assumir as consequências
advindas da prática de atos. Tema de grande importância no ordenamento, a
responsabilidade civil é um dever jurídico originário de um fato jurídico.
O termo responsabilidade está vinculado à concepção de que não se
deve lesar a ninguém, estabelecendo-se limites da liberdade individual dentro
de uma sociedade civilizada. O Código Civil atual, por exemplo, regulamenta
no artigo 186 os atos ilícitos, cabendo ao titular da prática do ato a obrigação
de reparar o dano, de forma espontânea ou coercitiva, causado a outrem.
Dessa forma, o direito determina em que condições uma pessoa se
torna responsável por um dano, à integridade física, à honra ou aos bens,
causado a outra pessoa e em que medida terá de repará-lo. Assim, é possível
compreender que a responsabilidade civil tem por objetivo reparar o dano,
retornando as coisas ao status quo ante ou impondo o pagamento de um
quantum indenizatório. Perfaz-se, então, a busca pelo equilíbrio e segurança
almejados por uma sociedade.
Dada a importância do tema, o presente estudo tem como fulcro analisar
a responsabilidade administrativa do Estado, frente ao cidadão, nos casos da
teoria da perda de uma chance, aplicado ao caso concreto da precariedade do
Sistema Único de Saúde. Conforme a Constituição Federal de 1988 (art. 196) é
dever do Estado disponibilizar o acesso à saúde igualmente em todas as
regiões brasileiras. Na esteira desse princípio tem-se que não é facultado ao
Estado, mas sim obrigação deste órgão atender, e com qualidade, todos
diferentes níveis de complexidade dos casos encontrados no território nacional.
Sendo constitucionalmente previsto o dever do Estado à prestação de serviços
públicos, quaisquer danos causados por agentes da sua Administração Direta
ou Indireta, dentro das suas funções públicas, ou pelo mal funcionamento do
serviço público, impõe ao Estado o dever de reparação.
2. DA PERDA DE UMA CHANCE
O sentido jurídico de chance ou oportunidade é a probabilidade de
alguém obter um lucro ou evitar um prejuízo. A teoria da perda de uma chance
como geradora de uma responsabilidade civil surgiu na França, em meados de
1965.
Por essa teoria, é possível a indenização de um sujeito que se veja
privado da oportunidade de conseguir um lucro ou evitar um prejuízo. Trata-se
de uma evolução, do reconhecimento de uma nova categoria de dano passível
de indenização. Torna-se possível a interpretação de que, havendo uma
oportunidade perdida, ela integrará o patrimônio da vítima, possuindo valor
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econômico, e, assim, podendo ser indenizada. Sérgio Savi, referindo-se a
evolução da teoria da perda de uma chance relata que:
O óbice à indenização nestes casos se dava pela indevida
qualificação desta espécie de dano. Normalmente, a
própria vítima do dano formulava inadequadamente a sua
pretensão. Ao invés de buscar a indenização da perda da
oportunidade de obter uma vantagem,requeria
indenização em razão da perda da própria vantagem. Ao
assim proceder, a vítima esbarrava no requisito de certeza
dos danos, tendo em vista que a realização da vantagem
esperada será sempre considerada hipotética, em razão
da incerteza que envolve os seus elementos constitutivos.
(SAVI, p. 3, 2006)
Ocorria uma dificuldade de visualizar o prejuízo da vítima, tornando
dificultosa a possibilidade de ressarcimento dessa violação de interesse
juridicamente protegido. Hoje, salienta-se que o direito lesado não é subjetivo,
mas sim um direito em expansão, uma expectativa. O que se deve buscar não
é o ressarcimento pela vantagem perdida, mas pela perda da oportunidade de
se conquistar a vantagem ou evitar um prejuízo, de maneira desvinculada do
resultado final. Nesse sentido Glenda Gonçalves Gondim afirma:
Assim, a reparação não é do dano, mas sim da chance.
Não se admitem as expectativas incertas ou pouco
prováveis, que são repudiadas pelo nosso direito. Com
efeito, a chance a ser indenizada deve ser algo que
certamente iria ocorrer, mas cuja concretização restou
frustrada em virtude do fato danoso (GODIM, p. 23, 2010).
Por não haver dispositivos legais acerca da matéria, a perda de uma
chance será arbitrada pelo juiz que levará em conta os fatos e suas
convicções, bem como as reais probabilidades de se ter atingido o resultado
esperado. Considerando o tema, o Informativo Nº495 do STJ, do período de 9
a 20 de abril de 2012 trouxe à baila o tema:
DANOS MATERIAIS. PROMOÇÃO PUBLICITÁRIA DE
SUPERMERCADO. SORTEIO DE CASA. TEORIA DA
PERDA DE UMA CHANCE. (...) pagamento de danos
materiais à recorrente (consumidora), em razão da perda
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de uma chance, uma vez que não lhe foi oportunizada a
participação em um segundo sorteio de uma promoção
publicitária veiculada pelo estabelecimento comercial no
qual concorreria ao recebimento de uma casa.
(...).Conclui-se, assim, que a reparação deste dano
material deve corresponder ao pagamento do valor de
1/30 do prêmio, ou seja, 1/30 de R$ 40.000,00, corrigidos
à época do segundo sorteio. EDcl no AgRg no Ag
1.196.957-DF, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgados em
10/4/2012.
Diante de todo o exposto, é possível conceber a responsabilidade civil
pela perda de uma chance como tema relevante, pois amplia a área de atuação
da responsabilidade civil, uma vez que possibilita a indenização da vítima por
uma nova espécie de dano.
3. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
A responsabilidade do Estado é uma consequência do
Estado Democrático de Direito que por longos anos foi pleiteado pelo povo.
Segundo Pablo Gagliano e Rodolfo Filho a noção jurídica de responsabilidade:
[…] pressupõe a atividade danosa de alguém que,
atuando a priori ilicitamente, viola uma norma jurídica
preexistente (legal ou contratual), subordinando-se, dessa
forma, às conseqüências do seu ato (obrigação de
reparar). (...) a responsabilidade civil deriva da agressão
de um interesse eminentemente particular, sujeitando,
assim, o infrator, ao pagamento de uma compensação
pecuniária à vítima, caso não possa repor in natura o
estado anterior de coisas.(GAGLIANO; FILHO, p. 9,
2009).
Maria Helena Diniz entende que:
[…] Responsabilidade é a aplicação a aplicação de
medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral
ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por
ela mesmo praticado, por pessoa por quem ela responde,
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por coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal
(DINIZ, p. 36, 1999)
Na doutrina e na legislação a responsabilidade civil é
dividida em subjetiva e objetiva. A primeira é aquela que se refere ao dano
causado em função de ato culposo ou doloso, de forma que cada qual
responde por sua própria culpa ou dolo, cabendo ao autor o ônus da prova.
Nessa hipótese há necessidade de caracterizar a culpa. Já as teorias
objetivistas encaram essa responsabilidade como uma mera reparação de
danos fundada no risco da atividade exercida pelo agente ou pelo abuso de
direito e, ainda, na responsabilidade em que não se indaga o dolo ou a culpa
do agente, quando expressamente previstos em lei.
Cumpre destacar que o Código Civil atual acolhe a teoria dual da
responsabilidade civil, qual seja, a subjetiva e a objetiva, sendo a primeira a
regra no ordenamento jurídico.
A Constituição Federal brasileira estabelece no artigo 37,
parágrafo 6o, a responsabilidade objetiva do Estado quando seus agentes
causarem danos a terceiros. A consagração dessa matéria na Magna Carta de
1988 é uma evidência de que os direitos dos cidadãos, em face da atuação da
máquina administrativa pública, estão devidamente protegidos. O
reconhecimento desse princípio, garantindo o direito do povo obter
ressarcimento pelos danos causados pelo Estado e seus agentes, é um
imperativo básico no Estado de Direito.
Qualquer conduta pública que venha a transgredir a esfera de proteção
alheia cabe ao Estado a responsabilidade. Por se tratar de atos administrativos,
a teoria da responsabilidade civil do Estado é chamada também de teoria da
responsabilidade administrativa ou responsabilidade extracontratual.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves, a responsabilidade extracontratual
contém três pressupostos gerais básicos: a) a conduta humana (ação ou
omissão), b) a culpa ou dolo do agente, o nexo de causalidade e c) o dano
(GONÇALVES, p.04, 2005). Nesse sentido, um dano pode ser causado a
outrem por uma atitude ou pela ausência da prática de um ato por uma pessoa
(conduta omissiva). A culpa, como elemento, consiste na falta de zelo
causadora do dano que, por sua vez, poderia ter sido evitado. Já o dolo se
caracteriza pela violação intencional de dever jurídico de não lesar a ninguém.
O nexo ou relação de causalidade apresenta-se como um elo que permite
saber de quem é a autoria do dano. O dano, por fim, é o núcleo ou objeto da
responsabilidade sem o qual ninguém poderá ser submetido à obrigação de
reparação (GOLÇALVES, 2005, p. 25).
3.1 Linha evolutiva do princípio da responsabilidade extracontratual
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Segundo Thomas Hobbes a primeira lei natural do homem é a auto-
preservação, que induz a imposição física e moral sobre os demais,
caracterizando assim uma constante competição, desconfiança e o estado de
guerra. Devido ao afã de tudo possuir e ao medo da força dos demais, muitas
vezes homens causaram graves dados a seus semelhantes.
A necessidade de um poder comum que os ordenasse, pois não existe
um equilíbrio entre atritos e a estabilidade, fez com que os homens criassem o
Estado. Para tal criação, renunciam-se direitos em prol do direito coletivo que
seria assegurado pelo mesmo.
Nos regimes primitivos, o dano era suportado pelo prejudicado que não
possuía meios de reivindicar indenização do agente causador do prejuízo,
muito menos do soberano protegido pela lei do direito divino. As resoluções
para tais conflitos se tornaram cada vez mais complexas e a necessidades de
doutrinas que buscassem vertentes de soluções se tornou evidente.
A responsabilidade civil do Estado surgiu nesse cenário. A evolução da
obrigatoriedade do Estado em recompor o patrimônio reduzido em razão dos
seus atos embasou-se em diferentes teorias e devido a isso passou por
diversas fases. Por sim, a legislação brasileira estabeleceu no Código Civil de
2002 no artigo 43 as diretrizes do já legitimado princípio constitucional de
responsabilidade civil do Estado.
Entre os doutrinadores ainda não é unânime a posição quanto a
responsabilidade do Estado. Porém, adota-se majoritariamente a teoria do risco
integral, ou teoria da responsabilidade objetiva, com a excludente da culpa da
vítima. A atitude culposa do agente causador do dano não é considerada termo
essencial na teoria objetiva, mas basta que haja um único nexo entre a
atividade do Estado como causador do dano tido pelo particular para configurar
a responsabilidade do Estado (teoria da responsabilidade objetiva).
3.2 Assistência Social do Estado e a responsabilidade administrativa
A responsabilidade social é um tema amplamente abordado entre
grandes corporações, empresas e mesmo pessoas físicas. Entretanto é dever
do Estado garantir assistência social ao seu povo, suprindo suas necessidades
básicas sociais, individuais e coletivas. A assistência social é o dever de
solidariedade não contra prestativa; ou seja, o assistido não paga pela
assistência, recebe-a gratuitamente. A Constituição Federal brasileira de 1988
positiva nos art. 203 e 204 as diretrizes para a gestão de políticas públicas de
assistência social
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Para garantir a efetivação da Constituição brasileira quanto à assistência
social, o Estado brasileiro dispõe serviços públicos para todos os seus
cidadãos. A ideia de serviço público relaciona-se com a dos fins maiores do
Estado e as posturas intervencionistas que buscam, em última instância,
realizar o bem comum. A Constituição brasileira enumera no art. 23 as
competências das entidades federativas quanto à prestação se serviços
públicos. Destaca-se entre elas a obrigação de prestar serviços de saúde e
assistência pública.
Nessa perspectiva volta-se a tratar de responsabilidade social do
Estado. Ao propor-se a prestar serviços públicos, o Estado esta submetido à
constante risco com relação aos danos que pode causar ao seu povo. Vale
ressaltar, entretanto, que quando estabelecidos de forma responsável e
fiscalizados com zelo, os serviços públicos tendem melhorar e o risco do dano
se torna cada vez menor.
O SUS e o Estado como titular de uma responsabilidade civil
O Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado pela Constituição Federal de
1988 com o objetivo de dar acesso igualitário à toda população brasileira ao
atendimento público de saúde. Nesse novo sistema foram incorporados postos,
hospitais, laboratórios, hemocentros, centros de saúde, além de institutos de
pesquisa que visavam em primeira instância, atender a todos. Seus princípios
foram estabelecidos na Lei Orgânica de Saúde em 1990 com base no artigo
196 da Constituição Federal:
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que
visem à redução do risco de doença e de outros agravos
e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços
para sua promoção, proteção e recuperação.
O Sistema Único de Saúde, conforme a Lei n° 8.080 de 19 de setembro
de 1990, capítulo II, segue alguns princípios para que suas ações e serviços
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sejam efetivados de forma satisfatória. O princípio primeiro é a Universalidade;
por ser a Saúde um direito fundamental do ser humano, cabe ao Estado
garantir as condições indispensáveis ao seu pleno exercício e o acesso à
saúde em todos os níveis de complexidade. A Equidade, aqui tratada, é um
princípio de justiça social que tutela a diminuição das desigualdades, ou seja,
visa alcançar patamar adequado e igualitário no aspecto saúde para toda a
população, investindo mais onde a carência é maior. Todos devem ter igual
oportunidade ao usar o sistema de saúde; entretanto, são notórias as
disparidades sociais e regionais existentes no país e por isso as necessidades
de saúde variam. Devido isso, o Sistema tem coma meta a equidade no acesso
à saúde. Por fim, fala-se no princípio da Integralidade, ou seja, a garantia do
fornecimento de um grupo de ações e serviços preventivos e curativos,
exigidos em cada caso para todos os níveis de complexidade de assistência,
englobando ações de promoção, proteção e recuperação da saúde (Em:
http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/lei8080.pdf) .
Apesar da avançada legislação e de estar entre os maiores sistemas de
saúde do mundo, o SUS revela deficiências básicas. A falta de infra-estrutura
nos hospitais e os baixos salários, que obrigam os funcionários a trabalharem
em outros centros de saúde, são fatores que prejudicam a qualidade dos
serviços prestados a população. Em Janeiro de 2012, o jornal Estadão divulgou
uma drástica estatística: de setembro de 2008 a setembro de 2011, mais
planos de saúde foram vendidos (aumento de 13,5%), aumentando a
arrecadação de 41,4 milhões para 47 milhões. O número de leitos, entretanto,
nas redes pública e privada diminuiu 10,5%, de 511,6 mil para 458,1 mil (Em:
<http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,mais-pacientes-menos-leitos-
,822826,0.htm>. Acesso em: 10 de maio de 2012). Os brasileiros tem buscado
solução em questão de saúde na iniciativa privada, ou seja, pagando por um
serviço que é, constitucionalmente, garantido a toda a sociedade. Tal busca
entretanto, tem sido em vão, dado que nem mesmo esta tem investido em seus
sistemas de maneira proporcional a arrecadação.
Situado entre os direitos fundamentais sociais, o direito a saúde impõe
ao Estado um dever de agir, propiciando proteção e integridade da vida
humana.
A saúde está garantida na Constituição Federal como um
direito de todos, tutelando à cura e a prevenção através
de quaisquer medidas assecuratórias da integridade física
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e psíquica do indivíduo; corolário do fundamento da
dignidade da pessoa humana, sobretudo, as pessoas
políticas são responsáveis solidariamente pela eficácia do
Sistema Único de Saúde (SUS), de acordo com os artigos
196 a 200 da Carta. Notadamente, o art. 30, VII, firma a
co-responsabilidade da União e do Estado pelos serviços
de atendimento à saúde de competência dos Municípios,
que devem prestar, com a cooperação técnica e
financeira da daquelas pessoas, serviços de atendimento
à saúde da população. (GOMES, 2010, Disponível
em:<http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1734/A-
adequacao-dos-servicos-de-saude-as-necessidades-do-
cidadao-e-a-responsabilidade-solidaria-das-pessoas-
politicas >. Acesso em: 27 nov. 2010.)
Os serviços disponibilizados pelo Estado, em quaisquer medidas,
inclusive os que visam à saúde, devem ser realizados com adequação e
qualidade, buscando, como fim maior, o benefício do usuário. Sendo dever do
Estado a prestação de serviços públicos de saúde e levando em consideração
os princípios de responsabilidade extracontratual estabelecidos na Constituição
Federal, a oferta desqualificada e precária, que cause danos ao cidadão, impõe
ao Estado dever de reparação.
4. DA PERDA DE UMA CHANCE DEVIDO A PRECARIEDADE DO
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
A Constituição Federal em seu art. 196 assevera que a saúde é direito
de todos e dever do Estado, na esteira desse conhecimento a art. 198 traça
como diretriz do Sistema Único de Saúde o atendimento integral, com
prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços
assistenciais.
O Estado, enquanto responsável pelo provimento dos direitos sociais
constitucionais é também dotado de responsabilidade civil objetiva no que
concerne aos atos praticados pelas pessoas de direito público e de direito
privado prestadoras de serviços públicos. Tal responsabilidade está prevista no
artigo 37, §6º da Constituição Federal que assevera que as pessoas jurídicas
de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos
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responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causaram a
terceiros.
O SUS (Sistema Único de Saúde), enquanto conjunto de ações e
serviços de saúde prestados por órgãos e instituições públicas Federais,
Estaduais e Municipais, da Administração direta ou indireta (art. 4º da Lei
Federal 8.080/90), requer do Estado um comprometimento com a prestação de
um serviço de qualidade. Isso pressupõe que o corpo de trabalhadores seja
devidamente capacitado e selecionado, já que se trata da saúde de uma
nação. Os serviços do Estado que visam a saúde devem ser realizados com
adequação às necessidades do cidadão que os utiliza, posto que, tendo
destaque na Carta Constitucional a dignidade, e sendo dever do Estado a
prestação de serviços públicos eficientes, a oferta inoportuna da prestação
securitária impõe ao Estado o dever de reparação quanto a quaisquer danos
sofridos pelo cidadão.
O que se observa, entretanto, é o contrário disso. A gestão ineficaz de
recursos públicos não soluciona os problemas endêmicos à ordem social.
Apesar de ter como objetivo a integralidade do tratamento, por vezes o sistema
não possibilita sequer o atendimento de urgência. Nesse ponto, e como
agravante, há também a negligência e imperícia dos funcionários no
atendimento dos pacientes. Vistas como mais um entre os necessitados, as
pessoas são tratadas conforme a possibilidade, nada sendo feito para apressar
o atendimento, tendo em vista a melhora e o bem-estar do doente.
A profunda precariedade estrutural do SUS revela sua incapacidade
para atender às suas diretrizes básicas. O que se observa é que, como
consequência das deficiências quanto ao atendimento, fornecimento de
medicamentos, leitos, entre outros, pessoas tem perdido a chance de obter a
cura ou mesmo de garantir o direito à vida. Não é novidade a morte de pessoas
em filas à espera por atendimento, nem o agravo das enfermidades durante o
aguardo. O que se espera a partir disso é a responsabilização do Estado pelos
danos gerados pela ineficiência do SUS.
Entende-se nesse contexto, que há uma omissão do Estado na
prestação de assistência aos pacientes. Cabe destacar que situado dentre os
direitos fundamentais sociais, o direito à saúde impõe um dever de agir do
Estado, de modo a guardar de todas as formas possíveis a vida e integridade
humana. Este é obrigado a impedir a ocorrência do dano e, por isso, é legitima
a sua responsabilização. Para que a dignidade da pessoa humana seja
mantida é necessário que sejam garantidas pelo Estado condições materiais
mínimas de existência e proteção à vida, no qual se insere o direito à saúde.
O fato de serviço ser público e gratuito não isenta os hospitais do dever
indenizatório no caso da ocorrência de danos. Em face do artigo 37, § 6o da
Constituição Federal, o Estado e os prestadores de serviços públicos
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respondem objetivamente. Assim, cabe aos Tribunais impor condenações à
Administração Pública pela prestação de serviços inadequados sem
questionamento sobre a culpa; basta ao particular provar o nexo causal e o
evento danoso, de acordo com o texto constitucional e com os artigos 3º, 14 e
22 do Código de Defesa do Consumidor. Em se tratando de responsabilidade
objetiva do Estado, independente da existência de culpa, gravita presunção em
favor do cidadão pelo mau funcionamento do serviço público, sendo desta
forma, ônus do Estado (provido pelos cofres públicos) a prova de fato
excludente da sua responsabilidade: a culpa exclusiva do usuário do serviço
pelo evento danoso.
A partir dessa análise, tem-se que o Estado, enquanto protetor da
pessoa humana, deve cercar-se de todas as formas para que esta não seja
lesada. Sobretudo quando a lesão advém do próprio serviço por ele prestado
enquanto instituição de saúde.
4.1 Indenização estatal
Para configurar-se o dever de indenizar do Estado, basta ao lesado
comprovar a existência do dano e o nexo causal entre este dano e a atividade
estatal, visto que a responsabilidade aqui figurada é objetiva. Isso não implica,
porém, que a Administração Pública deva assumir o papel de sempre
indenizar, sendo responsável por qualquer fato ou ato, comissivo ou omissivo
no qual esteja envolvida, direta ou indiretamente, sendo o nexo causal
apresentado decisivo para tanto.
A ausência do serviço público em si também constitui obrigação de o
Estado indenizar. Não é o agente público culpado pela falta do serviço, mas o
Poder Público. Compete à vítima comprovar a inexistência do serviço, seu mau
funcionamento ou seu retardamento.
Para que haja o direito à indenização frente ao Estado, segundo a
doutrina da responsabilidade civil objetiva devem concorrer as seguintes
condições:
a) A efetividade do dano: para que ocorra indenização deve existir um
dano de natureza material ou moral ao qual foi submetida a vítima. A legislação
atual confere o direito à indenização por dano moral, prescrevendo a
inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem das pessoas (art. 5º, V
CF/88).
b) O nexo causal: além de um dano concreto, deve haver uma relação
de causa e efeito entre a conduta do agente e o dano que se pretende reparar.
Quando da inexistência desse nexo, não caberá pedido de indenização
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c) Oficialidade da atividade causal e lesiva imputável ao agente do Poder
Público: a responsabilidade civil objetiva do Estado se origina da conduta
comissiva ou omissiva de seu agente no desempenho de suas atribuições.
d) Ausência de causas excludentes: essas causas fazem com que o
Estado seja isento de responsabilidade pelo dano causado. Essa
responsabilidade cede na hipótese de força maior ou caso fortuito e por culpa
da vítima. Da mesma forma, não haverá responsabilidade do Estado em
havendo culpa exclusiva da vítima. No caso de culpa parcial da vítima impõe-
se a redução da indenização devida pelo Estado (GOLÇALVES, 2009, p. 34).
O Estado, após ressarcir a vítima, poderá promover ação regressiva
contra real agente causador do dano, se houver culpa ou dolo deste. A
possibilidade de uma ação regressiva do Estado se deve ao fato de que a
culpa não diz respeito a quem foi prejudicado pela atuação estatal, mas é
assunto que se refere ao relacionamento estabelecido entre o agente e a
entidade pública ou privada a que se acha vinculado. Constatado o dolo ou a
culpa, a fazenda pública poderá promover uma ação de regresso e recuperar
do causador do dano tudo que despendeu com a indenização da vítima.
Entende-se que nos casos de indenização devido à precariedade do
atendimento ou da estrutura mantida para tanto, cabe ao judiciário avaliar a
quem cabe a responsabilidade. A indenização por danos morais, no caso de
omissão estatal, deve ser imposta ao Estado com o fim de amenizar a dor e o
sofrimento dos parentes de quem falece sem atendimento médico adequado,
ou ainda daqueles que sofrem além do dano moral o dano psicológico.
É preciso se considerar, de modo amplo, a possibilidade de indenização
Estatal diante de caso concreto em que haja perda de uma chance relativa a
precariedade do Sistema Único de Saúde. Isso porque, dado que o Estado é
responsável pela manutenção e fiscalização deste sistema, caso este leve
alguém à sofrer dano, moral ou material, deve indenizar tais indivíduos.
Nos casos em que uma pessoa seja privada de atendimento em um dos
postos de atendimento do SUS e venha a falecer ou ter o seu estado de saúde
piorado, cabe ação indenizatória contra o Estado pela perda de uma chance.
Não é possível se confirmar que, em tendo o atendimento, tal indivíduo não
alcançaria os resultados citados, mas, de qualquer modo, perdeu a chance de
atingir resultado diverso/positivo.
Os danos sofridos pela precariedade do Sistema Único de Saúde são
responsabilidade do Estado e dos seus agentes e por isso devem ser
indenizados moral e patrimonialmente por estes. Não se fala apenas das
perdas concretas, mas, neste artigo, principalmente, das perdas das chances
de possuir um bem maior. Um indivíduo que possua uma enfermidade e não
seja atendido por um médico vinculado ao SUS pela precariedade deste órgão,
perde a chance de ter sua doença curada e deve ser indenizado. Aquele que
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morre na sala de espera do hospital público e que antes disso não é levado
para a UTI pela falta de leito, deve ser indenizado. O cidadão que, após sofrer
um acidente, adquire um grande corte no braço que deve receber pontos e que
por não ser atendido prontamente em um posto de saúde público, perde um
braço, deve ser indenizado. Em todas essas situações não foi identificada
certeza da resolução da enfermidade ou da salvação em caso de atendimento,
mas em todas, nota-se a perda da chance de possuir um bem maior. Vale
lembrar que em muitos casos cotidianos o bem maior citado anteriormente
trata-se da vida.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante muitos anos o acesso gratuito a saúde foi pleiteado pelo povo.
Foram precisos séculos de lutas, debates e dezenas de projetos de leis para
que o bem final fosse alcançado: a saúde como direito de todos e dever do
Estado. Nesta perspectiva a Constituição Federal de 1988 criou o Sistema
único de Saúde, que, a princípio, propunha-se a prevenir e curar enfermidades
igualitariamente em todas as regiões do Brasil. Por falta de verbas, má
administração e descaso das autoridades, hoje o SUS é reconhecido pela sua
precariedade: mais um grandioso projeto do governo que não vingou.
A falta de leitos, médicos, enfermeiros e mesmo da atenção e cuidado
dos funcionários leva milhares de brasileiros a viverem subordinados a um
sistema de saúde subumano. Os jornais não param de exibir pessoas que
morrem nas recepções dos hospitais pela falta de leito. Há aqueles que
passam meses, ou até anos, aguardando uma consulta e muitas vezes têm as
suas doenças agravadas pelo retardo do atendimento. Há ainda os que, ao
serem atendidos por médicos desqualificados, recebem diagnósticos errados,
prejudicando o tratamento e consequentemente a possibilidade de cura.
O presente artigo teve como objetivo maior evidenciar a realidade da
saúde pública brasileira e lembrar a todos que é responsabilidade do Estado os
danos causados a todos aqueles que usufruam dos serviços ofertados pelo
mesmo. Permitir o acesso gratuito a um sistema de saúde não significa apenas
implantá-lo, mas principalmente fiscalizar e cuidar para que ele seja legitimado
com qualidade e eficácia.
Nesta perspectiva ressalta-se que não é dever do Estado apenas
garantir a saúde, mas cuidar para que ela seja promovida com qualidade. Ao
mesmo cabe indenizar a todos que sofreram danos devido à precariedade do
Sistema Único de Saúde, sendo estes danos causados pela ação ou omissão
do Estado (perda de uma chance). Ressalta-se que cuidar da saúde pública é,
em última instância, proteger a própria vida e esta é um direito fundamental
vanguardeado pela Magna Carta a qualquer ser humano.
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6. BIBLIOGRAFIA
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novo código civil brasileiro. Brasília, DF, 2002.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil.
Vol. 7. 13. ed. São Paulo: Saraiva: 1999.
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito
civil: responsabilidade civil. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
GONDIM, Glenda Gonçalves. Responsabilidade civil: teoria da perda de uma
chance. In: Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, outubro
de 2005, ano 94, v. 840.
GOMES, Emerson Souza. A adequação dos serviços de saúde às
necessidades do cidadão e a responsabilidade solidária das pessoas políticas.
Disponível em:<http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1734/A-adequacao-
dos-servicos-de-saude-as-necessidades-do-cidadao-e-a-responsabilidade-
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GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 4. ed. São Paulo:
Saraiva, 2009.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 9 ed., revista de acordo
com o novo código civil ( Lei 10406/2002), São Paulo : Saraiva, 2005.
OLIVEIRA, Ruth Helena Pimentel de. Entidades prestadoras de serviços
públicos e responsabilidade extracontratual. Atlas: São Paulo, 2003.
SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito Civil: responsabilidade civil. 3.
ed. São Paulo: Atlas, 2003.
SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo:
Atlas, 2006.
http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/lei8080.pdf Lei 8080
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O ACESSO À JUSTIÇA E A NOVA HERMENÊUTICA JURÍDICA
Pamela de Moura Santos252
RESUMO: A evolução social é constante e o Direito nem sempre consegue
acompanhar e amparar as situações conflituosas surgidas no seio da
sociedade com bases nas normas existentes. Ao surgir um conflito, o sujeito se
vale do Poder Judiciário, através do exercício do direito de ação, para
satisfazer sua pretensão jurisdicional. Neste contexto surge a nova
hermenêutica jurídica como forma de garantir aplicabilidade prática ao acesso
à justiça, ou seja, é necessário que o Estado ao exercer tutela jurisdicional da
situação posta sob sua apreciação, na figura do Juiz de Direito, trace uma nova
visão pautada na Nova Hermenêutica, considerando os fatos sociais, a
condição humana de cada um e mais que isso, os princípios constitucionais e
norteadores do direito em geral, com vistas a conceder ampla efetividade ao
princípio do acesso à justiça.
PALAVRAS-CHAVE: 1. Acesso à justiça na Constituição. 2. Direito de ação. 3.
Nova Hermenêutica e acesso à justiça.
____________________________
INTRODUÇÃO
252
Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Advogada. Pós-graduanda em Direito do Estado pela Universidade Estadual de Londrina.(lato sensu). Membra da Comissão de Direitos
do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil, Subseção de Londrina. E-mail: [email protected]
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Muito se fala acerca do acesso à justiça e o direito de ação, não
sabendo ao certo a distinção entre os dois institutos e a relevância desta
diferenciação.
É certo que o objetivo não é a discussão plena sobre as diferenças
entre os dois institutos, mas tão somente delinear os contornos do princípio do
acesso à justiça face à Nova Hermenêutica.
Para tanto, explanar-se-á sobre a previsão constitucional do acesso à
justiça, passando brevemente pelo direito de ação, e ao final, adentrar no
campo da hermenêutica jurídica a fim de possibilitar a análise do instituto como
forma de garantir eficácia e aplicabilidade plena do acesso à justiça.
Neste contexto de interpretação das normas e dos princípios
jurídicos, pautando-se na Nova Hermenêutica é que se insere o acesso à
justiça como princípio amplo, que deve abordar não só o direito de ação, mas
também o direito de receber do Estado a tutela jurisdicional adequada, levando
em consideração princípios norteadores do direito em geral e da sociedade
adequados ao contexto fático, político e social de cada um.
1. ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DA JUSTIÇA
Primeiramente, a análise deverá partir da norma suprema que se
posiciona com supremacia face à demais, ou seja, a Constituição Federal.
Como é sabido, é função do Estado garantir o acesso à justiça a todos aqueles
que sofrerem lesão ou ameaça de lesão a direito, consoante preconiza o art.
5º, inciso XXXV, da Constituição Federal:
Art. 5º Todos são iguais perante a Lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos
seguintes termos:
[...]
XXXV- a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito.
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Nos termos da norma acima transcrita, o acesso à justiça se mostra
tão importante quanto os demais direitos fundamentais insculpidos no texto
constitucional, justamente porque ao Estado compete a proteção e efetivação
dos direitos individuais e coletivos do individuo, em especial quando tal direito
foi lesionado, haja vista que não é permitido exercer a autotutela.
Definir o conceito de acesso à justiça não é uma tarefa fácil, mas, o
significado etimológico da palavra leva a assimilar a uma resposta que se
busca do Poder Judiciário capaz de atender as expectativas sociais ao passo
que tal resposta deve ser adequar ao contexto real e as novas aspirações da
sociedade.
Para tentar explicar um dos conceitos que mais abrange o sentido
principiológicos do acesso à justiça, a análise deve ser feita com relação aos
meios e os resultados.
O acesso o acesso à justiça pode ser representado por duas
finalidades básicas do sistema jurídico, o qual, através da soberania estatal,
deverá resolver os litígios dos cidadãos proporcionando um sistema jurídico
igualitário e, portanto, acessível a todos, “ao passo que este mesmo sistema
deverá produzir resultados socialmente justo levando em conta a
individualidade de cada um” (CAPPELLETI; GARTH 1988, p. 8), haja vista que
não nos é permitido a utilização da autotutela como meio de solução de
conflitos, como no tempo da Lei de Talião253, em que não existia figura estatal
como assegurador da justiça.
No Estado moderno, a função jurisdicional é exercida pelo Estado por
meio de um de seus poderes, o Poder Judiciário, que busca distribuir a justiça
a todos a fim de manter a pacificação da sociedade. Assim sendo, o único meio
legítimo de obter prestação jurisdicional é requerendo-a por meio do Estado.
Desta forma, o acesso à justiça é garantia constitucional que deve
ser utilizado pelos titulares de direitos e assegurado pelo ordenamento jurídico.
253
Surgida por volta do ano 1780 a. C., no reino da Babilônia, através de indícios do princípio de Talião, segundo o qual é expressado pela máxima “olho por olho, dente por dente”, ou seja, as pessoas faziam justiça com as próprias mãos, de forma desarrazoada e desproporcional. O Código de Hamurabi foi o grande percursor Lei de Talião, pois dispunha em seu texto que, “Se alguém enganar a outrem, difamando esta pessoa, e este outrem não puder provar, então que aquele que enganou deve ser condenado à morte”, dentre inúmeros outros mandamentos. Disponível em: http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/codigo-de-hamurabi.html- acesso em 12/05/12.
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2. O DIREITO DE AÇÃO
Ultrapassada a questão suscitada acima importa tecer breves
considerações sobre o Direito de Ação.
A ação pode ser designada como “o poder ou a faculdade de agir em
juízo - poder faculdade latente em toda relação de direito, o que se traduz em
ato (ação no sentido objetivo) logo que se consuma ou está iminente qualquer
violação das relações de direito” (MONTEIRO, 1956, p. 73).
Acerca do acesso à justiça, é certa a dificuldade na definição do
instituto, podendo ser comparado como o meio, a resposta rápida dada pelo
Poder Judiciário aqueles que buscam a tutela jurisdicional. A medida deve ser
justa e adequada ás mudanças sociais e principiológicas da sociedade.
Embora não seja possível a definição taxativa da expressão ‘acesso
à justiça’, por oportuno, a lição de Cappelletti e Garth, que divide o instituto em
duas finalidades básicas se mostra razoável ao entendimento proposto, pois, a
finalidade básica do instituto é de “resolver os conflitos sociais por meio da
soberania do Estado ao passo que deve prezar pela igualdade e produzir
resultados que sejam individualmente justos” (CAPPELLETI; GARTH 1988, p.
8).
A fim de explanar melhor sobre a ação, algumas teorias sobre o
instituto prescindem de ser abordadas, ainda que brevemente: teoria
imanentista, concreta e abstrata do direito de ação.
A teoria civilista da ação, também chamada de imanentista utiliza-se
do próprio direito material depois de violado, ou seja, a ação era o mesmo
direito buscando uma defesa. Teve percursores no Brasil e na Alemanha,
dentre eles Clóvis Beviláqua e João Monteiro, bem como, Friedrich Karl Von
Savigny, respectivamente, teoria esta que declinou a partir da distinção
doutrinária entre direito material e o direito de ação.
Por outro lado, surgiu a teoria concreta advogando a idéia de que a
ação é um direito autônomo e concreto, que só existiria se o direito material
também estiver presentes, “a ação seria um direito público e concreto, ou seja,
direito nos casos concretos em que existisse direito subjetivo” (CINTRA;
GRINOVER; DINAMARCO, 2008, p. 251).
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No entanto, há casos em que a conclusão pela existência ou não de
um direito material só pode ser auferida ao final, quando dado o provimento
jurisdicional, razão pela qual a teoria concreta se mostra precária, eis que pela
ótica abordada, aquele que não demonstrasse o direito material estaria
excluído do direito de ação, o que não é possível, até mesmo em respeito ao
princípio do acesso à justiça que contempla o direito de receber a proteção do
Estado aos que necessitarem.
Por fim, a terceira teoria é aquela segundo a qual o fundamento do
direito de ação era a “própria personalidade do agente, em cujo conceito se
inclui a faculdade de aspirar à realização dos direitos individuais” (CALMON DE
PASSOS, 1961, p. 11-12).
Entretanto, no adiantar da história, Liebman254 veio distinguir o direito
subjetivo do direito de ação, fazendo claramente a distinção do poder de agir
em Juízo, acessível a todos, das condições da ação que subordina a ação à
presença de determinados requisitos de existência, os quais, se inexistentes,
levaria à denominada carência de ação.
As condições da ação, muito embora seja um tema de relevante
importância, não é o objeto do estudo do presente artigo, requerendo estudo
específico posterior.
O fato é que, não obstante as inúmeras insurgências doutrinárias a
respeito do direito de ação, é perceptível que ambas se limitam a discutir as
condições de procedimentabilidade, de início ao processo, justamente porque
tal direito é exercido logo no início da demanda, para dar impulso oficial ao
procedimento processual, enquanto o acesso à justiça compreende não só o
direito de ação, como também o direito à prestação jurisdicional de forma
adequada aos padrões sociais e legais, consoante restará demonstrado.
3. O ACESSO À JUSTIÇA E HERMENÊUTICA
254
Enrico Tullio Liebman foi um importante jurista italiano, nascido em 1903 na cidade de Leopoli. Graduou-se na Faculdade de Direito de Roma, tendo como mestre Giuseppe Chiovenda. Foi uma grande influência ao pensamento processualista brasileiro. A biografia completa de Liebman pode ser vista através da Academia Brasileira de Direito Processual Civil- Disponível em
(http://www.abdpc.org.br/abdpc/imortal.asp?id=10).
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Verifica-se acima que o acesso à justiça compreende não só o
direito de ação como também o direito à tutela jurisdicional prestada de forma
adequada.
Esta adequação diz respeito ao meio utilizado pelo Estado para
chegar ao resultado pretendido, ou seja, para proferir a decisão final, por meio
do juiz, considerando a individualidade do sujeito e a evolução social.
Desta forma, a prestação jurisdicional não pode ocorrer de
forma discrepante ao contexto social que vivemos, sob pena de não atender o
princípio do acesso à justiça de forma integral.
Ocorre que, quando a situação posta à apreciação pelo Poder
Judiciário não leva em conta os fatores de ordem moral, ético e social, é
tendencioso que a decisão final macule o princípio do acesso à justiça ao
menos em parte.
Antes de adentrar ao tema central da pesquisa, sobressai em
importância distinções pontuais entre a nova e a velha hermenêutica, com base
na teoria dos princípios.
Conforme preceitua Paulo Bonavides, “a juridicidade dos
princípios passou por três fases: jusnaturalismo, positivismo e pós-positivismo”
(BONAVIDES, 2002, p. 264). Por oportuno, traçar-se-á linhas gerais sobre as
duas primeiras e atentar-se-á em especial ao pós-positivismo que compreende
a nova hermenêutica.
Primeiramente, na técnica da Velha Hermenêutica, os princípios
não possuem normatividade, pois a Lei escrita é vista como expressão racional
da vontade do legislador, ou seja, a solução para o conflito estaria em alguma
lei pré-determinada.
Na velha hermenêutica “a regras são extremamente
importantes” (BARROSO, 2003 , p. 332)
O positivismo visualiza a neutralidade normativa, em que o juiz,
ao proferir a sentença, deduz a leitura legal e subsume o entendimento lá
transcrito. Para os positivistas, “o juiz é mero aplicador de leis que, ao
sentenciar, apenas deduz e subsume” (BARROSO, 2003 , p. 22).
No pós-positivismo há o progresso, o avanço da Nova
Hermenêutica, “em que os valores são considerados na fundamentação do
ordenamento jurídico, conjugando as bases axiológicas, a Lei com o Direito”
(BARROSO, 2003 , p. 266).
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Preceitua Barroso que, na nova Hermenêutica, “o sentido será
determinado pelos elementos do caso concreto, dos princípios a serem
preservados e dos fins a serem realizados, buscando a solução adequada para
o problema a ser resolvido” (BARROSO, 2003, p. 332).
Cumpre asseverar que atribuir nova interpretação não implica
abandono das regras, ou seja, do modelo clássico (fundado na aplicação das
regras), tampouco tradicionais da hermenêutica (gramatical, histórico,
sistemático e teleológico), eis que desempenham papel de elevada monta na
captura pelo sentido das normas e na solução dos casos concretos.
No entanto, o a metodologia clássica se mostra insuficiente,
requerendo, pois, a necessidade de se agregar novas idéias.
Importante menção sobre o instituto é que “na Nova
Hermenêutica, ao estabelecer a norma, o legislador: legisla entre as partes, e o
direito vivo, norteado em princípios, prevalece sobre a regra” (BONAVIDES,
2001,p. 22).
Partindo do pressuposto acima, é inegável a necessidade de
analisar o ordenamento jurídico sob a ótica principiológica, valendo-se o
intérprete legal da nova hermenêutica.
A aplicabilidade deste modelo de interpretação jurídica concede
efetividade ao princípio do acesso à justiça, em sentido amplo e em sentido
estrito, pois, o direito que o indivíduo tem não deve se limitar ao direito de ação,
e é justamente o acesso à justiça garantido constitucional que valida a
utilização da nova hermenêutica pelos julgadores, a partir de uma interpretação
principiológica em consonância com a norma e parâmetros ditados pela própria
sociedade.
Ademais, a utilização dos princípios foi consagrada inclusive no
Código Civil de 2002255, que contém mandamentos evidentemente
principiológicos, pelo que resta impossibilitado ou ao menos incompatível com
a utilização da Velha Hermenêutica.
Observa-se no ordenamento jurídico brasileiro que existem
normas ultrapassadas, que por certo não se adequam em sua totalidade a
realidade fática e social das pessoas, dos indivíduos, ou seja, daqueles que
255
Um dos exemplos claros de utilização dos princípios no Código Civil Brasileiro está expresso no art. 113 “Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”. Assim, é perceptível que os negócios jurídicos em geral devem ser interpretados à luz do princípio da boa-fé, sendo, pois, que se não for observado, cabe ao Judiciário apreciar a legalidade ou não do negócio entabulado pelas partes.
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são destinatários diretos do Direito e da tutela jurisdicional prestada pelo
Estado.
Assim, deve-se buscar uma forma de interpretação capaz de
atender as mudanças estruturais da legislação em consonância com as
alterações no próprio seio social.
A título de exemplo, não existe no Brasil norma própria que
discipline a união homoafetiva, a união entre pessoas do mesmo sexo, pois, a
legislação256 é clara ao estabelecer o casamento e a união estável entre o
homem e a mulher, sendo que a diversidade de gêneros é condição nuclear
para a caraterização de um ou outro instituto.
No entanto, o Supremo Tribunal Federal257 já firmou
entendimento sobre a aplicação analógica do instituto da união estável a união
homoafetiva, muito embora exista legislação taxativa expressando a
diversidade dos sexos como elemento central do instituto.
Ocorre que, desconsiderando o mérito acerca da opção sexual
de cada individuo, eis que irrelevante para finalidade da pesquisa, o que
merece atenção é evolução da sociedade e das relações afetivas que clamava
por proteção e amparo aos relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo.
Portanto, ao decidir, os ministros do Supremo Tribunal Federal
sopesaram normas e princípios constitucionais conflitantes entre si.
Não obstante a Carta Magna ser a norma suprema e
organizadora do ordenamento jurídico “sendo o logradouro para dirimir conflitos
e antinomias na legislação infraconstitucional, ela mesma não deve apresentar
nenhum tipo de incoerência” (VARGAS, 2011, p. 87). No entanto, não é o que
256
A Constituição Federal de 1988 é expressa ao dispor no Art. 226 § 3º, que “para efeito de efeito da
proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar,
devendo a lei facilitar sua conversão em casamento (grifo nosso). Nos termos da redação dada ao artigo,
somente a união entre o homem e a mulher poderia, em tese, receber proteção jurídica. Ainda, o Código
Civil no art. 1723 também expressa a mesma regra no que tange a diversidade de sexo como elemento
caracterizador da união estável “Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o
homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o
objetivo de constituição de família”. (grifo nosso).
257
O Supremo Tribunal Federal ao julgar a Arguição de descumprimento de Preceito Fundamental nº 132/08 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.277/2009 reconheceu a união estável para casais do mesmo sexo, através de uma interpretação analógica do instituto da união estável em relação à união entre pessoas do mesmo sexo, demonstrando claramente um posicionamento mais avançado valendo-se da Nova Hermenêutica para resolver o conflito, pautando-se em princípios constitucionais, como o da dignidade da pessoa com vistas a atender a necessidade emergida da própria sociedade. Íntegra das decisões disponíveis a partir de www.stf.jus.br.
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ocorre na prática normas e princípios constitucionais podem confrontar-se entre
si, assim como as normas infraconstitucionais em relação àquelas também.
Na própria Constituição Federal está insculpido o conceito de
família e de união estável, mantendo a diversidade dos sexos como elemento
central e necessário para a caracterização do instituto.
Por outro lado, a Carta Magna258 consigna em vários de seus
artigos a liberdade, a igualdade, a proibição de preconceitos ou qualquer outra
forma de discriminação, abrangido pelo princípio da dignidade da pessoa
humana e o da própria igualdade.
Outrossim, sendo o Estado brasileiro um Estado Democrático
de Direito, não há espaço para a imposição da norma legal diante da
supressão de princípios inerentes à própria condição da pessoa humana.
Neste sentido, pondera Vargas (2011, p. 89):
[...] Em se tratando de esmiuçar e objetivar o princípio da
dignidade, fundante do Estado Democrático de Direito,
impende reconhecer que a orientação sexual é atributo
inato e imutável da personalidade de um indíviduo, não
pode haver discriminação e vedação de direito fundada
nestas bases, sob pena de estar deferindo tratamento
injustificável à pessoa natural.
Portanto, imaginar que a decisão dos Ministros do Pretório
Excelso foi uma tarefa de fácil execução e conclusão, é fechar os olhos para o
sistema normativo brasileiro versus a realidade social, haja vista o conflito
existente entre a norma constitucional acerca do conceito sobre a definição da
união estável, para o qual a diversidade dos sexos é condicionante necessária,
face aos princípios constitucionais como o da dignidade da pessoa humana,
que inclusive é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil259.
258
No decorrer da Constituição Federal identificam-se vários artigos pautados em princípios, a começar pelos objetivos traçados no Art. 3º, inciso IV, de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, o direito a liberdade, dentre outros
expressos no magno texto. 259
“CF/88 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...] III- a dignidade da pessoa humana.”
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Nesta seara, “é certo que os dispositivos constitucionais devem
ser entendidos como mutuamente implicados, sujeitando-se a uma
interpretação cujos efeitos possam refletir-se no acatamento social, que, assim,
lhe emprestaria eficácia plena” (VARGAS, 201, p. 87).
Por oportuno, importa salientar que a Nova Hermenêutica não
desconsidera, e nem poderia, sob pena de causar insegurança jurídica, as
formas tradicionais de solução do conflito, com a utilização das normas como
base.
Não obstante, a aplicação da tradicional técnica de
interpretação, pautando-se tão somente nas normas, desconsideraria por
completo princípios constitucionais e mais que isso, a realidade social, a
situação fática que inúmeros indivíduos brasileiros vivem e escolheram viver,
que é de a se relacionar com alguém do mesmo sexo e mais que isso, com
esta mesma pessoa escolhida construir uma vida em comum.
Não mereciam, pois, proteção do Estado tais indivíduos?
As garantias constitucionais servem para todos, independentes
do sexo, raça, cor, religião e o acesso à justiça, que também é garantia
constitucional, deve ser entendido no sentido amplo, não se resumindo ao
direito de ingressar com uma ação ou apresentar defensa, abrangendo a mais
ampla prestação jurisdicional possível, equânime, razoável, com a efetiva
aplicação dos princípios que norteiam e respaldam o ordenamento jurídico.
Desta forma, conclui-se que a nova hermenêutica amplia o
horizonte daquilo que é conhecido como a aplicação da justiça, a partir do
momento que ela relativiza a necessidade de utilizar um meio único de solução
dos conflitos, que é a norma, devendo o julgador, ao prestar a tutela, pautar-se
em princípios norteadores do direito em geral, em especial aqueles traçados na
constituição, bem como, nas situações que regem a vida em sociedade,
considerando o aspecto político, sociológico e ideológico de cada tempo.
Por fim, tal preceito é de tamanha importância que inúmeros
concursos para ingresso na magistratura vem exigindo conhecimento de
disciplinas humanísticas, tais como, antropologia, sociologia, justamente
porque a prestação jurisdicional não deve ser aplicada isoladamente com base
nas normas, implicando dizer, mais uma vez, a necessidade de adequação das
decisões a partir da Nova Hermenêutica.
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CONCLUSÃO
“Ciência sem consciência é a ruína da alma”; este pensamento de
quatro séculos é cada vez mais atual (BARBAS, 2006, p. 47).
A ciência do direito reflete claramente a frase acima, devendo o
direito ser entendido na concepção legal e social e não puramente positiva,
limitando-se ao texto normativo positivado.
Conforme aludido inicialmente, o objetivo da pesquisa, até pela
brevidade de seu conteúdo, não foi esmiuçar as diferenças entre o acesso à
justiça e o direito de ação, mas tão somente esclarecer que o primeiro
compreende o segundo, mas não se limita a ele.
Desta forma, o princípio do acesso à justiça deve ser entendido em
sentido amplo, sendo inconcebível a limitação do pensamento de que o acesso
ao judiciário por meio de uma petição inicial já estaria efetivando tal princípio,
ou seja, o direito de ação, muito embora seja de notória importância, não
resume, tampouco subsumi o acesso à justiça, ao contrário, ter o direito de
ação exercido perante o Poder Judiciário é tão somente um dos
desdobramentos dentre os vários do acesso à justiça.
Assim, se o direito de ação é garantia constitucional para solução dos
conflitos por meio da tutela jurisdicional exercida pelo Estado, a este último
compete garantir a eficácia e aplicabilidade do acesso à justiça em sentido
amplo, através da Nova Hermenêutica.
Ressalta-se que a utilização e aplicação desta técnica interpretativa
não desconsidera os métodos tradicionais, como a utilização das normas para
solução do conflito, até porque, nos termos justificados ao decorrer do texto,
decisões sem o mínimo de previsão normativa causaria insegurança jurídica, e
o ordenamento, consequentemente, poderia estar condenado à instabilidade e
desordem.
No entanto, ao ignorar a Nova Hermenêutica, o julgador não ferindo,
e geralmente não o é sozinho, o princípio do acesso à justiça, ao passo que a
realidade social e concreta do indivíduo também poder estar sendo
desconsiderada.
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Posto isto, é necessário que o Estado, por meio do Poder Judiciário,
trace uma nova visão pautada na Nova Hermenêutica, modificando conceitos,
abdicando de decisões legalistas que desconsiderem fatos sociais, a condição
humana de cada um e mais que isso, os princípios constitucionais e
norteadores do direito em geral.
REFERÊNCIAS
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Coimbra: Edições Almedina, 2006.
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BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Constitucionalidade nº
4.277/2009. Requerente: Procurador Geral da República. Relator Ministro
Ayres Britto. Brasília, 14 de outubro de 2011. Disponível em:
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADI
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DO EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA PELAS SOCIEDADES DE
ECONOMIA MISTA: O CASO DA COMPANHIA MUNICIPAL DE TRÂNSITO
E URBANIZAÇÃO DE LONDRINA
Lucas Franco de Paula260
Naiara Deperon Cardoso261
Thaisa Rovina Martins262
RESUMO: O exercício do poder de polícia, atividade da administração pública
que, limitando ou disciplinando direito, interesse, ou liberdade, regula a prática
de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público, é considerado
como regularmente exercido quando desempenhado pelo órgão competente
nos limites da lei aplicável, com respeito ao processo legal. A respeito do tema,
tem-se observado atualmente nos tribunais brasileiros uma indefinição quanto
à legalidade e conformidade com o regime administrativo constitucional do seu
exercício por sociedades de economia mista, sendo o foco principal deste
trabalho, por meio de revisão bibliográfica e estudo das mais recentes decisões
judiciais do Superior Tribunal de Justiça e daqueles com competência no
Estado do Paraná, analisar o caso da Companhia Municipal de Trânsito e
Urbanização de Londrina – CMTU-LD, incluindo a ação civil pública movida em
face desta entidade.
PALAVRAS-CHAVE: Exercício do Poder de Polícia; Sociedade de Economia
Mista; Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização de Londrina.
RESUMEN: El ejercicio del poder de policía, actividad de la administración
pública que, limitando o disciplinando derecho, interés, o libertad, regula la
práctica de acto o la abstención de hecho jurídico, en razón de interés público,
es considerado como regularmente ejercido cuando desempeñado por el
órgano competente en los límites de la ley aplicable, con respecto al proceso
legal. Sobre el tema, observase que actualmente en los tribunales brasileños
existe una indefinición cuanto a la legalidad y conformidad con el régimen
administrativo constitucional de su ejercicio por sociedades de economía mixta,
siendo el foco principal de este trabajo, por medio de revisión bibliográfica y 260
Mestrando em Direito Negocial da Universidade Estadual de Londrina-UEL 261
Estudante de graduação da Universidade Estadual de Londrina –UEL. 262
Estudante de graduação da Universidade Estadual de Londrina –UEL.
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estudio de las más recientes decisiones judiciales del Superior Tribunal de
Justicia e de aquellos con competencia en el Estado del Paraná, analizar el
caso de la Compañía Municipal de Transito y Urbanización de Londrina –
CMTU-LD, incluyendo la acción civil pública movida contra esa entidad.
PALABRAS-LLAVE: Ejercicio del Poder de Policia; Sociedad de Economia
Mixta; Compañía Municipal de Transito y Urbanización de Londrina.
SUMÁRIO: 1.Introdução; 2.Do Poder de Polícia no Direito Brasileiro e seu
exercício pela Administração Pública; 2.1.Conceito de Poder de Polícia;
2.2.Atos do Poder de Polícia; 2.3.Da Delegação do Poder de Polícia;
2.4.Características do poder de polícia; 3.As Sociedades de Economia Mista;
3.1.A Composição e Natureza Jurídica da Companhia Municipal de Transito e
Urbanização de Londrina; 4.Da Indelegabilidade do Poder de Polícia às
Sociedades de Economia Mista: o caso da CMTU-LD; 5.Conclusões;
6.Bibliografia.
1. Introdução
O presente artigo propõe análise sobre a constituição e objetivos da
Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização de Londrina (CMTU), sob a
perspectiva de o referido órgão deter o poder de polícia e ser o responsável
pela autuação de multas de trânsito na cidade de Londrina-PR, sendo parte
integrante da Administração Pública Indireta da Prefeitura Municipal da cidade.
A discussão terá seu foco voltado principalmente para o fato de a
CMTU-LD constituir uma sociedade de economia mista, o que estaria em
desacordo com as normas gerais da Administração Pública, ainda que seu
capital seja quase em sua totalidade público. Isso porque, neste tipo de
empresa, pode haver interesses particulares subjugantes do interesse público,
o qual deve, sob qualquer hipótese, ter prevalência.
Ressalte-se, ainda, que a apreciação da matéria se pautará tanto no
campo doutrinário quanto em casos concretos, tendo em vista as ações
intentadas contra a dita Companhia.
2. Do Poder de Polícia no Direito Brasileiro e seu Exercício pela
Administração Pública
2.1. Conceito de Poder de Polícia
Existe na legislação pátria, preceito estabelecendo o que é o poder
de polícia e quando sua atividade pode ser considerada adequada, como se
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pode observar no art. 78, caput e parágrafo único (in verbis), do Código
Tributário Nacional:
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração
pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse, ou
liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão
de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem,
aos costumes, à tranqüilidade pública, ou ao respeito à propriedade
e aos direitos individuais ou coletivos.
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de
polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da
lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de
atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio
de poder.
Em consonância com a lei, a doutrina brasileira conceitua o poder de
polícia como instrumento pelo qual a Administração Pública, com fundamento
no princípio da supremacia do interesse público, condiciona, restringe o
exercício de atividade, o uso e gozo de bens e direitos pelos particulares,
através de ações restritivas dos excessos na fruição de liberdades privadas
que possam lesionar a coletividade.
Sob a mesma perspectiva, Marçal Justen Filho (2011, p.567) ensina
que:
O poder de polícia administrativa é a competência para disciplinar o
exercício da autonomia privada para a realização de direitos
fundamentais e da democracia, segundo os princípios da legalidade
e proporcionalidade.
Assim, conforme o exposto, conclui-se que quem detém a
legitimidade para o exercício deste meio de atuação é unicamente o Poder
Público, caracterizando a sua posição de hegemonia sobre os administrados,
sendo seu o dever de agir em prol do interesse de toda a sociedade, ainda que
para isso haja restrições à liberdade e a propriedade particular.
2.2. Atos do Poder de Polícia
O poder de polícia pode ser exercido por meio de atos preventivos,
repressivos ou fiscalizadores. Do primeiro constam os atos normativos, tais
como regulamentos e portarias. Já os atos repressivos apresentam-se em
razão da manutenção e obediência dos atos preventivos. Por fim, a função
fiscalizadora visa à prevenção de eventuais lesões e pode ser praticada, por
exemplo, na fiscalização de pesos e medidas.
2.3. Da Delegação dos Atos de Polícia
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Com relação à possibilidade de delegação do poder de polícia, o
entendimento doutrinário e jurisprudencial, em sua maioria, é pacífico no
sentido de que a ação da policia administrativa não pode ser delegada a
particulares. O que, caso ocorresse, poderia trazer risco ao equilíbrio social
como um todo.
Tal afirmação se pauta no fato de que a delegação a particulares
pode pôr em cheque o princípio da supremacia do interesse público, pois cria
uma situação conflitante. De forma que, por um lado, há o interesse em agir do
agente delegado, isto é, a obtenção de vantagens em seu próprio benefício. E,
em contrapartida, está o interesse público que deve ser o principio norteador do
Poder de Polícia.
Dessa forma, verifica-se que a atuação no âmbito da polícia
administrativa é função intrínseca do Poder Público, tornando-se controvertida
a possibilidade de sua delegação para as sociedades de economia mista, visto
que tais ‘empresas’ são compostas também por ações pertencentes a
particulares. Discussão que terá como referência a CMTU-LD e será analisada
em tópico apartado.
2.4. Características do Poder de Policia
Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, as principais
características do Poder de Polícia consistem na discricionariedade e
executoriedade. Por seu turno, Maria Sylvia di Pietro e Hely Lopes Meirelles
atribuem a esse poder a discricionariedade, a auto-executoriedade e a
coercibilidade, sendo esta a corrente majoritária na doutrina brasileira.
(MARINELA, 2007, p.170)
A discricionariedade aparece como atributo nos casos em que o
Poder de Policia é visto em sentido amplo e consiste na vontade do legislador
em especificar casos de restrição da liberdade ou propriedade particular.
A auto-executoriedade se refere à execução imediata das ações de
polícia administrativa pela Administração Pública, independentemente de
autorização ou exigibilidade, bem como sem análise preliminar do Poder
Judiciário.
E a coercibilidade torna o ato obrigatório sem levar em consideração
a vontade do administrado, sendo ainda um aspecto indissociável da auto-
executoriedade.
3. As Sociedades de Economia Mista (SEM)
De acordo com o Decreto Lei nº 200/1967, que dispõe sobre a
Administração Federal, sociedades de economia mista são entidades dotadas
de personalidade jurídica de direito privado, criadas por lei para a exploração
de atividade econômica, sob a forma de sociedade anônima, cujas ações com
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direito a voto pertençam em sua maioria à União ou a entidade da
Administração Indireta. Conceito através do qual se extrai uma das principais
características das SEM: a exploração de atividade econômica. Neste ponto,
impende salientar que as empresas públicas também se identificam por essa
finalidade, mas nelas o capital será exclusivamente público, enquanto nas SEM
existe a obrigatoriedade da participação do capital privado, ainda que em
menor proporção acionária com possibilidade de voto.
Diante dessa característica, surge a questão do limite da atuação de
tais sociedades levando em consideração a atuação do Estado como agente
econômico. Sabe-se que tal função é excepcional ao Poder Público e, portanto,
não é um fim em si mesmo. A Constituição Federal, em seu artigo 173, traça os
limites do Estado-empresário, cuja atuação é admissível apenas em casos
necessários aos imperativos da segurança nacional ou de relevante interesse
coletivo.
A criação das SEM deverá se restringir a essa fronteira e só ocorrerá
por meio de uma autorização do Chefe do Poder Executivo, dada através da
edição de uma lei ordinária que trate de matéria e na qual devem constar as
diretrizes gerais da entidade. As suas atividades poderão ser no âmbito da
exploração de atividades econômicas em sentido estrito (comerciais e
industriais), bem como no setor de prestação de serviços públicos.
Desta forma, são entidades de natureza híbrida, ou seja,
formalmente são pessoas jurídicas de direito privado e se submetem ao regime
jurídico publico e/ou privado de acordo com o seu objeto ou atividades-fim.
O seu patrimônio será misto com a congregação de capital tanto
público como de empresas particulares, visando alcançar a exploração de
atividade econômica. A única exigência estabelecida é que sejam sociedades
anônimas em que o Estado detenha mais da metade das ações com direito a
voto.
3.1. A Composição e Natureza Jurídica da Companhia Municipal de
Transito e Urbanização de Londrina
A Lei Municipal nº 5.496 de 27 de julho de 1993 autorizou a criação
da Companhia Municipal de Urbanização (COMURB), a qual assumiria as
atribuições da extinta Secretaria Municipal de Serviços Públicos. Em dezembro
do mesmo ano, a COMURB iniciou suas atividades como órgão da
Administração Indireta da Prefeitura do Municipal de Londrina, tendo como
principais finalidades o gerenciamento do transporte coletivo e de ações de
desenvolvimento urbano da cidade.
Com a municipalização da fiscalização de trânsito pelo Código de
Transito Brasileiro, a COMURB foi o órgão instituído de tal responsabilidade
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através da Lei Municipal nº 8191 de 19 de junho de 2000, denominando-se
assim Companhia Municipal de Transito e Urbanização263.
A Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização constitui-se
sociedade anônima de economia mista, de capital autorizado, com
personalidade jurídica de direito privado, tendo como principais finalidades,
segundo a Lei Municipal nº 5496/1993, devidamente ajustada a Lei Municipal
nº 8191264:
Art. 5º Compete à Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização -
CMTU-LD:
I- Administrar o Fundo de Urbanização de Londrina - FUL, podendo,
à conta desses recursos, promover a realização de investimentos
em projetos e programas de desenvolvimento urbano do Município
de Londrina e a comercialização de equipamentos urbanos;
II- Executar programas e obras de desenvolvimento de áreas
urbanas, bem como de planos de renovação das que se
apresentarem em processo de deterioração, elaborados pelos
órgãos próprios da Prefeitura do Município de Londrina;
III- Executar, mediante delegação específica do Prefeito, obras e
serviços do Plano de Desenvolvimento Urbano do Município de
Londrina;
IV- Explorar economicamente e administrar, mediante delegação
específica do Executivo, os mercados municipais, quiosques e todas
as demais atividades desenvolvidas em vias, logradouros e
equipamentos públicos, constituindo-se em permissionária desses
serviços e podendo, por meio de processo licitatório, delegá-los a
terceiros;
V- Executar serviços, gerenciar e fiscalizar o trânsito, no que lhe
couber, e proceder às vistorias veiculares e técnicas, no âmbito do
Município de Londrina, na forma do estabelecido pela Lei Federal nº
9.503/97;
VI- Gerenciar a coleta e o tratamento do lixo domiciliar e hospitalar,
manter e fiscalizar a limpeza pública do Município de Londrina;
VII- Operar, gerenciar, planejar e fiscalizar o sistema de transporte
coletivo de passageiros do Município de Londrina;
VIII- Delegar, como concessionária, a empresas privadas a
execução dos serviços de transporte coletivo de passageiros, sob
regime de concessão, mediante concorrência pública, atendidas as
formalidades legais; 263
Informações obtidas no site www.cmtuld.com.br 264
LEI MUNICIPAL Nº 5.496, DE 27/07/1993 - Pub. 17/08/1993. Disponível em:
http://www2.cml.pr.gov.br
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IX- Administrar e explorar economicamente todos os terminais
urbanos de transporte coletivo no Município de Londrina;
X- Administrar os serviços de táxis, moto-táxis, transporte de cargas
- caminhões, caminhonetas ou similares e transporte escolar no
Município de Londrina;
XI- Arrecadar e fiscalizar, executar leis, serviços, atos ou decisões
administrativas referentes à taxa de publicidade e licença para
ocupação de áreas em vias e logradouros públicos.
XII- Administrar e explorar diretamente os serviços de coleta seletiva
e de reciclagem de lixo.
XIII- Promover o gerenciamento e a operacionalização do trânsito
urbano no Município, inclusive emitindo pareceres a esse respeito e
em conformidade com as jurisdições estaduais e federais;
XIV- Gerenciar, promover e explorar economicamente o Condomínio
Terminal Rodoviário de Londrina;
XV- Gerenciar os serviços de saneamento, compreendendo água,
esgoto e resíduos sólidos, praticando todos os atos de
planejamento, controle e fiscalização dos serviços.
XVI- Implantar e gerenciar os equipamentos de sinalização do
sistema viário, seja no controle de tráfego, na viabilização da
fiscalização ou na circulação de veículos em geral;
XVII- Gerenciar a instalação de equipamentos e elementos de
publicidade em vias e logradouros públicos, bem como o disposto no
artigo 186 da Lei 4.607, de 17 de dezembro de 1990;
XVIII- Gerenciar a utilização de equipamentos ou sistemas
relacionados com as atividades de operação e fiscalização do
trânsito no sistema viário.
Quanto à obtenção de recursos, a CMTU conta com 6% (seis por
cento) do valor recolhido pelo Fundo de Urbanização de Londrina, exceto
quanto à tarifa de transporte coletivo, a qual conta apenas com 4% (quatro por
cento) de sua receita.
Conta ainda com os produtos de lançamento de títulos de sua
responsabilidade, de transações eventuais, de alienação de materiais inseríveis
e de outros bens que se tornarem desnecessários aos seus serviços, de
quaisquer tarifas, da alienação de bens imóveis, de taxas de expediente, da
renda do seu patrimônio ou capital, de multas, indenizações, restituições,
doações, legados e quaisquer outros recebimentos ou reversões a seu favor,
de depósitos para cauções ou garantias de execução contratual de qualquer
natureza que reverterem aos seus cofres em razão de inadimplemento
contratual, de quaisquer tarifas e da remuneração decorrentes da prestação de
serviços inerentes às suas finalidades, de dotações orçamentárias recebidas
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do Governo Federal e Estadual e da Prefeitura Municipal de Londrina, da
remuneração decorrente da prestação de serviços inerentes às suas
finalidades de e das receitas de suas operações, realizadas diretamente, com
recursos próprios ou de terceiros.
Quanto ao capital, vale ressaltar, que a CMTU é constituída por mais
de 99% de ações pertencentes ao Poder Público, sendo o restante, que gira
em torno de 1%, de propriedade da iniciativa privada.
Assim, descrita sua forma de obtenção de recursos e suas principais
finalidades, discorrer-se-á sobre a legitimidade consoante as funções de polícia
administrativa exercidas pela referida sociedade de economia mista.
4. Da Indelegabilidade do Poder de Polícia às Sociedades de Economia
Mista: o caso da CMTU-LD
Conforme já descrito, a Companhia Municipal de Transito e
Urbanização de Londrina compõe-se em Sociedade de Economia Mista cuja
tarefa é, entre outras, aplicação de multas de trânsito na circunscrição do
município de Londrina- PR.
De acordo com as considerações já expostas, o Poder de Policia,
que inclui a aplicação de multas de trânsito, constitui-se função restrita da
Administração Pública, em grande maioria dos casos.
Assim, a delegação pela Prefeitura Municipal de Londrina desta
função à Companhia Municipal de Transito e Urbanização de Londrina gera
contrariedade e polêmica tanto em âmbito jurisprudencial quanto no campo
doutrinário. Isto, pois tal competência pertencia inicialmente ao Município,
conforme dispõe o artigo 24 do Código de Transito Brasileiro. Mas foi delegada
a uma entidade de economia mista que, mesmo em pequena proporção, tem
interesses particulares.
Desde que a dita Companhia iniciou seus trabalhos com fulcro na
fiscalização do trânsito londrinense, diversas ações tanto individuais como de
forma coletivizada foram interpostas a fim de coibir sua atuação.
A principal ação discutindo a matéria é a Ação Civil Pública
nº2002.70.01.030279-6/PR, proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil –
Subseção de Londrina em face da CMTU-LD, cuja pretensão é a anulação de
todas as autuações lavradas pela Sociedade em face a não presunção de
legitimidade para atuar no âmbito do Poder de Polícia.
A requerente alega que, de acordo com o majoritário entendimento,
toda atividade decorrente do poder de polícia não admite delegação a
particulares. Ainda que o capital seja quase totalmente público, não se pode
negar que parte do que é arrecadado passa ao domínio de particulares,
recursos esses advindos de atividade legitimamente estatal.
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Assim, se constituiria abuso de legalidade o fato da CMTU lavrar
autos de infração referentes à fiscalização de trânsito, tendo em vista que lhe
compete, ainda, o julgamento dos mesmos em grau de recurso.
A OAB aludiu ao que se intitulou de “indústria das multas” pelo
desenfreado número de autuações lavradas, algumas com clara discrepância
em seu julgamento.
A sentença de primeiro grau julgou a ação totalmente improcedente
fundamentando que, se uma pessoa jurídica de direito privado pode exercer
função administrativa, também pode aplicar multas. O que só é possível por ser
a CMTU-LD uma SEM controlada pelo Município (ente público).
Conforme o Magistrado, o Código de Trânsito Brasileiro permite, em
seu artigo 256, que autoridades de trânsito, inclusive as municipais, se houver
integração ao Sistema Nacional de Trânsito, apliquem multas aos infratores, de
maneira que referidos agentes devem ser servidores públicos, que tenham
poder de decisão. Entende-se, assim, que empregados das sociedades de
economia mista podem aplicar multas de trânsito, por força de delegação.
Pensa-se assim porque embora constituída sob o pálio do direito
privado, a sociedade de economia mista, quando atua na prestação
de serviço público, se submete a "certas regras especiais
decorrentes desta sua natureza auxiliar da atuação governamental"
(MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 4
ed. São Paulo: Malheiros, 1993. p. 87). Está submetida a um regime
híbrido, influenciado sobremaneira pelas regras constitucionais que
disciplinam a prestação de serviços públicos: quanto à forma
obedece o direito privado e na essência - prestação do serviço -
observa as regras do direito público.
(...)
Daí, conclui Edmir Netto de Araújo: "Discute-se ainda a possibilidade
da atividade de polícia administrativa ser delegada a particulares,
legal ou contratualmente, para evitar o dano social, como no caso de
aplicação de multas por agentes não funcionários públicos, ou na
constância de concessões de serviços públicos. No entanto, o já
transcrito art. 78 do CTN (Código Tributário Nacional) que define o
Poder de Polícia como atividade da Administração Pública, no
parágrafo único considera regular seu exercício quando
desempenhado pelo órgão competente, nos limites da lei aplicável
(sem especificar sua natureza), o que parece indicar que a
expressão Administração Pública é utilizada em sentido genérico,
abrangendo também Administração descentralizada e
concessionárias, obviamente 'no limite da lei aplicável'" (Curso de
Direito Administrativo. Saraiva, 2005, p. 984).
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No Tribunal Regional Federal da Quarta Região265, a decisão do juiz
de primeiro grau foi mantida, remetendo-se o ministro relator exclusivamente
ao parecer do Ministério Público Federal abaixo transcrito:
"Ante a doutrina, inexiste impossibilidade de transferência pelo órgão
originário (município), a órgão delegado, de poder de polícia. "In
casu", a municipalidade de Londrina/PR (detentora do poder de
polícia fiscalizatório de trânsito originário) delegou à CMTU-LD o
poder de exercer a fiscalização ostensiva. Tal medida não se mostra
eivada de ilegalidade visto que os requisitos foram preenchidos, a
saber: (1) a CMTU-LD é sociedade de economia mista, de cujo
capital mais de 97% pertence ao município, sendo, portanto,
integrante da administração indireta; (2) foi criada com base na Lei
Municipal nº 5.496, de 27 de julho de 1993, de Londrina, PR (fls.
233/256); e (3) o poder delegado restringe-se à fiscalização de
trânsito e à autuação de quem cometeu infração à legislação
específica, nos termos do estatuto (fls. 233/256). O fato de haverem
sócios, cujo capital social é menor de 3%, não se entende como
motivo válido a anular toda a atuação estatal delegada em prol da
fiscalização do trânsito municipal, a manter a sentença hostilizada.
Ademais, quanto à regularidade dos aparelhos de medição
eletrônica, resta impossibilitada a verificação se cada um dos
instrumentos instalados na cidade estão, ou não, de acordo com as
normas regulamentares, diante do conjunto probatório juntado aos
autos."
Em sede de Recurso Especial n° 1.011.407 - RS (2007/0266624-
9)266 interposto contra as decisões que declararam a CMTU legitimada para
fiscalização e autuação no trânsito, tendo em vista ser esta Sociedade de
Economia Mista com mais de 97% do capital estatal e por ter sido criada como
órgão da Administração Indireta do Município, a OAB fundamentou e reiterou a
tese de que a Companhia já foi criada em flagrante desrespeito a diversas
exigências legais. Conforme declarou:
a) trata-se de sociedade anônima, regida pela Lei nº 6.404/76 e com
natureza jurídica de direito privado, o que representa contrariedade
ao roteiro de municipalização do trânsito formulado pelo
DENATRAN;
b) a parte adversa não possui uma coordenadoria educacional e/ou
uma escola pública de trânsito;
265
APELAÇÃO CÍVEL Nº 2002.70.01.030279-6/PR. Disponível em: www.trf4.jus.br 266
RECURSO ESPECIAL Nº 1.011.407 - RS (2007/0266624-9). Disponível em: www.stj.gov.br
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c) conforme julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal na
ADIn nº 1.717, seria inconstitucional a delegação de poder de polícia
a sociedade anônima, além da circunstância de que à data da
criação da parte adversa (1993) não havia previsão legal de
municipalização do trânsito;
d) à época de seu surgimento, a CMTU não possuía em seus
estatutos a função de fiscalizar o trânsito e, atualmente, conta com
débito previdenciário junto ao INSS em montante superior a R$
1.800.000,00 e não repassa os recursos de multas de trânsito ao
FUNSET, o que evidenciaria o desvio de finalidade da empresa e de
seus agentes;
e) os equipamentos denominados "vídeo-vigias" "não tem amparo
legal para autuarem motoristas, uma vez que não existe
regulamento (resolução) do CONTRAN (Conselho Nacional de
Trânsito, órgão máximo normativo de trânsito), que estabeleçam
requisitos técnicos de funcionamento dos referidos dispositivos
eletrônicos " ;
f) a implementação dos "vídeo-vigias" teria sido realizada à míngua
de prévios estudos, do fornecimento de declaração de eficiência
regulares e da emissão de selo do respectivo selo de eficiência – em
inobservância à Resolução nº 141/02 –,o que teria acarretado
diversas irregularidades.
O Recurso, contudo, não fora provido, já que o Superior Tribunal de
Justiça posicionou-se, da mesma forma que o Tribunal Regional Federal da 4ª
Região, ao dispor que não há conflito, tendo em vista que o capital estatal é
maior que 97% e assim pode o órgão ser participante da Administração
Indireta.
Contudo, apesar da posição final adotada pelo STJ neste caso
especifico, vê-se que novos precedentes surgem no referido tribunal, em casos
análogos, como ocorreu com a decisão do Recurso Especial nº 817.534 - MG
(2006/0025288-1)267, interposto pelo Ministério Público do Estado de Minas
Gerais contra a Empresa de Transporte e Trânsito – BHTRANS. A discussão
de mérito estava atrelada à controvérsia da possibilidade do exercício de Poder
de Polícia por particulares (no caso, aplicação de multas de trânsito por
sociedade de economia mista). Tendo o referido tribunal dado provimento ao
recurso, decidindo que a BHTRANS não detém legitimidade para exercer a
função de polícia administrativa.
267
REsp 817.534/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado
em 10/11/2009, DJe 10/12/2009). Disponivel em: www.stj.gov.br
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ADMINISTRATIVO. PODER DE POLÍCIA. TRÂNSITO. SANÇÃO
PECUNIÁRIA APLICADA POR SOCIEDADE DE ECONOMIA
MISTA. IMPOSSIBILIDADE.
1. Antes de adentrar o mérito da controvérsia, convém afastar a
preliminar de conhecimento levantada pela parte recorrida. Embora
o fundamento da origem tenha sido a lei local, não há dúvidas que a
tese sustentada pelo recorrente em sede de especial (delegação de
poder de polícia) é retirada, quando o assunto é trânsito, dos
dispositivos do Código de Trânsito Brasileiro arrolados pelo
recorrente (arts. 21 e 24), na medida em que estes artigos tratam da
competência dos órgãos de trânsito. O enfrentamento da tese pela
instância ordinária também tem por conseqüência o cumprimento do
requisito do prequestionamento.
2. No que tange ao mérito, convém assinalar que, em sentido amplo,
poder de polícia pode ser conceituado como o dever estatal de
limitar-se o exercício da propriedade e da liberdade em favor do
interesse público. A controvérsia em debate é a possibilidade de
exercício do poder de polícia por particulares (no caso, aplicação de
multas de trânsito por sociedade de economia mista).
3. As atividades que envolvem a consecução do poder de polícia
podem ser sumariamente divididas em quatro grupo, a saber: (i)
legislação, (ii) consentimento, (iii) fiscalização e (iv) sanção.
4. No âmbito da limitação do exercício da propriedade e da liberdade
no trânsito, esses grupos ficam bem definidos: o CTB estabelece
normas genéricas e abstratas para a obtenção da Carteira Nacional
de Habilitação (legislação); a emissão da carteira corporifica a
vontade o Poder Público (consentimento); a Administração instala
equipamentos eletrônicos para verificar se há respeito à velocidade
estabelecida em lei (fiscalização); e também a Administração
sanciona aquele que não guarda observância ao CTB (sanção).
5. Somente o atos relativos ao consentimento e à fiscalização são
delegáveis, pois aqueles referentes à legislação e à sanção derivam
do poder de coerção do Poder Público.
6. No que tange aos atos de sanção, o bom desenvolvimento por
particulares estaria, inclusive, comprometido pela busca do lucro -
aplicação de multas para aumentar a arrecadação.
7. Recurso especial provido.
Analisando-se referida decisão, vê-se no voto do Exmo. Sr. Ministro
Relator Mauro Campbell Marques que as Sociedades de Economia Mista
devem se limitar à prática de atos relativos ao consentimento e à fiscalização,
sendo os demais de competência exclusiva do Poder Público.
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No que tange ao mérito, convém assinalar que, em sentido amplo,
poder de polícia pode ser conceituado como o dever estatal de
limitar-se o exercício da propriedade e da liberdade em favor do
interesse público. A controvérsia em debate é a possibilidade de
exercício do poder de polícia por particulares (no caso, aplicação de
multas de trânsito por sociedade de economia mista). As atividades
que envolvem a consecução do poder de polícia podem ser
sumariamente divididas em quatro grupo, a saber: (i) legislação, (ii)
consentimento, (iii) fiscalização e (iv) sanção.
No âmbito da limitação do exercício da propriedade e da liberdade
no trânsito, esses grupos ficam bem definidos: o CTB estabelece
normas genéricas e abstratas para a obtenção da Carteira Nacional
de Habilitação (legislação); a emissão da carteira corporifica a
vontade o Poder Público (consentimento); a Administração instala
equipamentos eletrônicos para verificar se há respeito à velocidade
estabelecida em lei (fiscalização); e também a Administração
sanciona aquele que não guarda observância ao CTB (sanção).
Somente os atos relativos ao consentimento e à fiscalização são
delegáveis, pois aqueles referentes à legislação e à sanção derivam
do poder de coerção do Poder Público. No que tange aos atos de
sanção, o bom desenvolvimento por particulares estaria, inclusive,
comprometido pela busca do lucro - aplicação de multas para
aumentar a arrecadação.
Mais recentemente, outrossim, o Tribunal de Justiça do Estado do
Paraná firmou o entendimento semelhante268, de que a URBS, empresa com
as mesmas funções da CMTU na cidade de Curitiba-PR, por ser pessoa
jurídica de direito privado, não tem competência legal para fiscalizar o trânsito e
aplicar multas, já que a ela não pode ser delegado o Poder de Polícia.
Por conseguinte, conclui-se que os argumentos trazidos em
referidos julgamentos evidenciam a relevância da discussão sobre a delegação
do Poder de Polícia no caso da CMTU Londrina, abrindo margem para que,
enquanto não houver uma decisão final em nível nacional, se questione, ainda
que não seja por meio de uma ação coletiva (ação civil publica), a legitimidade
da entidade em desempenhar a função que deveria ser exercida em sua
totalidade pelo Poder Público.
5. Conclusão
O poder de polícia é o instrumento através do qual a Administração
Pública condiciona, restringe o exercício de atividade, o uso e gozo de bens e
268
Recurso Inominado nº 24-09.2010.8.16.0179. Disponivel em: www.tjpr.jus.br.
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direitos pelos particulares, através de ações restritivas dos excessos na fruição
de liberdades privadas que possam lesionar a coletividade. Tais ações se
concretizarão através da edição de normas gerais, emissão de decisões
particulares e com a coerção fática propriamente dita; e se exteriorizarão, em
sua grande maioria, por meio de atos administrativos unilaterais. Por ser uma
competência reservada exclusivamente ao Poder Público, a sua delegação
para as sociedades de economia mista constitui uma clara afronta ao princípio
do interesse público e demais princípios que regem a Administração Pública.
Isto, pois as Sociedades de Economia Mista são entidades dotadas
de personalidade jurídica de direito privado, em forma de sociedade anônima,
criadas por lei para a exploração de atividade econômica. Apesar da maioria de
suas ações pertencerem ao Poder Público, existe uma pequena parcela de
acionistas privados que obviamente participam de tais entidades com o intuito
de perceber lucros em troca da prestação de serviços. E é neste ponto que
reside o conflito.
Ao delegar o Poder de Polícia, o ente público está concedendo uma
competência que deveria ser exclusivamente sua para uma Sociedade de
Economia Mista, que estará propensa a exceder os limites traçados pela Carta
Magna e a subjugar os princípios da Administração Pública em prol de
benefícios financeiros que muito provavelmente acabarão sendo revertidos
para a parcela acionária privada.
A despeito da decisão proferida pelo STJ no Recurso Especial
interposto pela OAB contra a CMTU, os precedentes que foram citados
negando a legitimidade das SEM de Belo Horizonte e Curitiba para exercer o
Poder de Polícia, são uma grande e importante etapa vencida para a
consecução de uma Administração Pública justa que atue de maneira ética no
objetivo que sempre deverá prevalecer: o interesse público.
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6. Bibliografia
ALEXANDRINO, Marcelo, VICENTE, Paulo. – Direito administrativo
descomplicado – 19. ed. rev. e atual. – Editora Forense: São Paulo, 2011.
JUSTEN FILHO, Marçal – Curso de direito administrativo – 7. ed. ver e atual. –
Editora Fórum: Belo Horizonte, 2011.
MARINELA, Fernanda - Direito Administrativo - 3 ed. - Editora Podivm, Bahia,
2007.
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DIREITOS SOCIAIS E AS EMENDAS CONSTITUCIONAIS 26/00 E 64/10:
PERSPECTIVA A PARTIR DA REALIDADE BRASILEIRA
Marília Rodriges Mazzola269
Márcia Teshima 270
RESUMO
Com a criação do Estado de Direito houve a necessidade de proteção de
alguns direitos fundamentais, intrínsecos ao cidadão. Surgem assim os direitos
fundamentais, que em razão de desenvolvimentos históricos, foram criados e
classificados de acordo com dimensões. A inclusão dos direitos sociais na
Constituição Federal elevando-os à categoria de direitos fundamentais foi
positivamente argumentada por Robert Alexy, que os considera como direitos
prestacionais que devem ser sopesados em relação a outros princípios para
sua devida aplicação. Embora alguns desses direitos não sejam observados
pelo Estado, tais como a moradia e alimentação, somente com o advento das
emendas constitucionais 26 e 64 é que esses direitos recebem a chancela
constitucional. Entretanto, mesmo com a positivização desses direitos verifica-
se que o Estado ainda possui dificuldades para sua implementação, assim
como garantir moradia e alimentos e a possibilidade de uma vida digna e
saudável.
Palavras- chave: Direitos Sociais. Emenda Constitucional 26/2000. Emenda
Constitucional 64/2010. IBGE.
ABSTRACT
With the creation of the State of Right, there was the need to protect some
fundamental rights, intrinsic to the citizen. Arise, then, the fundamental rights,
that, because of historical developments, were created and classified according
to dimensions. The inclusion of social rights in the category of fundamental
rights was positively argued by Robert Alexy, who considers social rights as
installment rights that need to be pondered with other principles to its correct
application. Even though, the Brazilian Constitution left behind of some social
rights, like housing and alimentation, not putting them in the social rights. These
were only included by Constitutional Amendments 26 and 64 that have ensured
269
Acadêmica do 5º ano do curso de Direito (UEL). Pós graduanda em Direito Constitucional pelo Instituto de Direito Constitucional e Cidadania (IDCC). 270
Mestre em Direito. Professora Assistente (UEL). Aluna do Programa de Doutorado em Direito pela Universidade de Buenos Aires (UBA), Argentina.
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these rights to the citizens. However, even with the positivização of these rights
it is possible to verify that the Brazilian society still has many difficulties to
assure housing and alimentation and, thus, effectively provide a healthy and
dignified life.
Key-words: Rights dimensions. Social Rights. Constitutional Amendment
26/2000. Constitutional Amendment 64/2010.
Sumário: 1. Introdução; 2. Conceituação dos Direitos
Sociais; 2.1. Direitos sociais e a teoria dos direitos
fundamentais de Robert Alexy; 2.2. Direitos Sociais e a
realidade da sociedade brasileira; 3. Conclusão; 4.
Referências bibliográficas; 5. Anexos.
1 INTRODUÇÃO
O surgimento do Estado Moderno trouxe inúmeras consequências para
o Direito e, consequentemente, para o homem. Diante das inúmeras injustiças
acometidas em razão da petrificada divisão social, foi necessária a criação de
uma nova forma de Estado, que estabelecesse e protegesse certos direitos
inerentes ao ser humano, ditos fundamentais.
Apoiado nas ideias iluministas bem como em diversas fontes, tais como
o pensamento jusnaturalista e os costumes, criou-se um Estado Constitucional
de Direito, que tinha como base principal o cidadão e a noção de dignidade da
pessoa humana. Para a chegada nesse patamar, deve-se considerar a
evolução dos direitos fundamentais no tempo. Desta forma, desde a revolução
francesa, foram criadas várias Constituições em diversos países que traziam
em seu bojo a divisão de poderes e a positivização de alguns direitos políticos
e civis, hoje chamados de direitos de primeira dimensão. A partir daí, houve
grande evolução dos direitos fundamentais, chegando hoje a uma
classificação, por grande parte da doutrina, de cinco dimensões de direitos
fundamentais.
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Os direitos fundamentais de primeira dimensão são caracterizados por
liberdades públicas, tais como o direito de votar e outros direitos políticos
básicos. Incluem ainda outros direitos civis, tais como a propriedade. Verifica-
se que tais direitos visam proteger o cidadão de maneira individual. Suas
primeiras manifestações foram na Carta Magna da Inglaterra em 1215.
Também a Declaração Universal dos Direitos Humanos tratou primeiramente
dos direitos de primeira dimensão, que protegiam os direitos individuais (dentre
eles a dignidade da pessoa humana), que deviam ser respeitados pelos
Estados
Diante das políticas sociais dos Estados surgiu a necessidade da
positivização de direitos fundamentais os quais o Estado, mediante
intervenção, protegeria e garantiria ao homem. Surgem assim, os direitos de
segunda dimensão, dentre os quais, também, os direitos sociais. Os direitos de
segunda dimensão visam garantir ao homem certos elementos básicos a sua
dignidade. Diante da revolução industrial e suas consequências os Estados
viram-se obrigados a ampliarem a proteção fornecida aos cidadãos, de modo a
interferirem nas relações para garantir a dignidade da pessoa humana.
Os direitos de terceira dimensão visam tutelar interesses coletivos e
difusos, tais como o meio ambiente, de modo a buscar uma maior qualidade de
vida, tanto para as atuais gerações como para as futuras. A positivação destes
direitos foi necessária diante das ações humanas na natureza, que ocorriam de
forma livre e descontrolada sem a devida preocupação com o bioma.
Ainda com a evolução da ciência e as pesquisas genéticas realizadas
foi necessária a inclusão de uma quarta dimensão de direitos, que visa à
proteção do patrimônio genético humano, de modo a limitar a engenharia
genética e garantir, também o direito à democracia, informática e biociência a
todos (FIGUEIREDO, 2011, p. 615).
Por fim os direitos de quinta dimensão “significam o direito à paz
permanente entre os povos” (FIGUEIREDO, 2011, p. 615).
Atualmente, surge uma nova dimensão de direitos, a sexta, visando
proteger, garantir e efetivar o acesso livre à água potável a todos os seres
humanos, já que este elemento é essencial à vida biológica, e
consequentemente à dignidade humana.
2 CONCEITUAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS
Um dos fundamentos de qualquer Estado Democrático de Direito é
assegurar aos seus cidadãos, enquanto ser humano, o direito à dignidade.
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Garantir este direito implica muito mais que assegurar direitos básicos e
fundamentais ao homem para sua sobrevivência, deve, também, ser em
condições satisfatórias.
Conquanto a Constituição Federal do Brasil de 1988 tenha disposto
sobre direitos sociais em seu artigo 6º, referidos direitos, já eram previstos
desde 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Desde então,
inúmeros pactos, convenções e Constituições reconheceram esses direitos, e
esse reconhecimento e adesão contribuiu para a consolidação dos direitos
humanos sociais em grande parte da comunidade internacional.
José Afonso da Silva citado pelo ministro Carlos Mário da Silva Velloso,
assim conceitua direitos sociais como:
prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta
ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais,
que possibilitam melhores condições de vida aos mais
fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de
situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se
ligam ao direito de igualdade (VELLOSO, 2012).
Jörg Neuner, doutrinador alemão, debateu e fundamentou os
direitos humanos sociais, apresentando cinco aspectos teleológicos que os
caracterizavam. Primeiramente, tais direitos constituem uma condição
fundamental para o exercício e salvaguarda da liberdade individual. Assim, o
indivíduo possui liberdade para suas escolhas (autodeterminação individual),
devendo o Estado, porém, garantir os bens mínimos necessários à vida.
Secundariamente “os direitos humanos sociais não são apenas condição da
liberdade individual e garantes de sua defesa, mas igualmente condição e
garantes da participação no processo geral de produção legislativa do Direito”
(NEUNER, 2010, p. 149).
Defende ainda o doutrinador alemão que os direitos humanos
sociais velam pela paz da sociedade, já que levam à integração e à
estabilidade social, que geram por consequência a segurança jurídica. Ele
ensina ainda que os direitos humanos sociais são responsáveis pelo equilíbrio
e equiparação material dos cidadãos. Por fim, argumenta que tais direitos têm
por função a proteção da dignidade da pessoa humana, de forma que esta
“exige que os cidadãos sejam preservados diante dos perigos da exploração e
da opressão e que sejam criados os pressupostos que ponham a salvo a
integridade corporal e espiritual” (NEUNER, 2010, p. 153).
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Partindo-se do pressuposto que os direitos humanos sociais
são deduzidos do valor básico da dignidade da pessoa humana, é possível
estruturar e ordenar os direitos humanos sociais. O primeiro grupo,
caracterizado pela garantia das prestações materiais (assistência básica) foi
inicialmente apresentado no art. 25, § 1º da Declaração Universal dos Direitos
Humanos para o qual Jörg Neuner classifica e aborda em seu trabalho como
um direito social prestacional material:
Art. 25, § 1º: Todo ser humano tem direito a um padrão de
vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem
estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação,
cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e
direito à segurança em caso de desemprego, doença,
invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos
meios de subsistência fora de seu controle (FRANÇA,
1789).
2.1 Direitos Sociais e a teoria dos direitos fundamentais de Robert Alexy
Mesmo diante da divisão dos direitos fundamentais em dimensões é
importante observar a classificação criada por Robert Alexy em sua Teoria dos
Direitos Fundamentais, chamando-os de direitos prestacionais e direitos de
defesa.
Como explica Daniel Rosa Correia:
Os direitos de defesa, na acepção de Robert Alexy,
pressupõem a abstenção do Estado frente à liberdade dos
indivíduos; os direitos prestacionais, por outro lado,
requerem a prática de atos concretos por parte do Poder
Público.
Por meio dessa divisão é possível identificar a
predominância dos direitos fundamentais sociais como
“direitos prestacionais”, característicos do advento do
Estado Social, que em lugar de se satisfazerem mediante
uma abstenção estatal, como é o caso dos direitos de
defesa - típicos do Estado Liberal, requerem ação positiva
que se traduz naprestação de algum bem ou serviço
(CORREIA, 2012).
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Para Robert Alexy os direitos à prestação em sentido estrito “são
direitos do indivíduo, em face do Estado, a algo que o indivíduo, se dispusesse
de meios financeiros suficientes e se houvesse uma oferta suficiente no
mercado, poderia também obter de particulares”(ALEXY, 2008, p. 499).
Para ele, direitos sociais são direitos a prestação em sentido estrito,
divididas em oito classificações que determinam o grau de proteção e
efetivação conferido pelo Estado aos direitos sociais, de modo que “o problema
dos direitos fundamentais sociais não pode ser resumido a uma questão de
tudo-ou-nada”(ALEXY, 2008, p. 502).
Assim explica o constitucionalista alemão:
[...] Para o indivíduo é de importância vital não viver
abaixo do mínimo existencial, não estar condenado a um
desemprego de longo prazo e não estar excluído da vida
cultural de seu tempo. É certo que, para aquele que se
encontra em uma tal situação de necessidade, os direitos
fundamentais não são totalmente sem valor. É
exatamente aquele desprovido de meios que pode
valorizar especialmente aqueles direitos fundamentais
que, por exemplo, o protegem contra o trabalho forçado e
outras situações semelhantes e aqueles que lhe dão a
possibilidade de melhorar sua situação por meio do
processo político. Contudo, não é possível negar que,
para ele, a eliminação de sua situação de necessidade é
mais importante que as liberdades jurídicas que a ele de
nada servem, em razão dessa situação de necessidade e
que, por isso, são para ele uma ‘fórmula vazia’. Se a esse
cenário se adiciona o fato de que a razão de ser dos
direitos fundamentais é exatamente aquilo que é
especialmente importante para o indivíduo, e que pode
ser juridicamente protegido, deve ser juridicamente
garantido, então, o primeiro argumento para a proteção no
âmbito dos direitos fundamentais está completo (ALEXY,
2008, p. 505-506).
Para referido doutrinador, a garantia das liberdades individuais ao
cidadão per si não é suficiente, se não houver, também, a garantia dos
elementos básicos para uma vida digna e saudável.
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Mesmo que tenham sido apresentados argumentos desfavoráveis aos
direitos sociais, dado seu caráter abstrato e genérico que leva a uma
indefinição de conceitos que deve ser concretizada, é sabido, tanto pelo Poder
Judiciário quanto Legislativo, que a implementação desses direitos demanda
significativos gastos financeiros. Nesse sentido, Alexy argumenta que os
direitos sociais devem ser entendidos como princípios, de modo que deve ser
realizado o sopesamento destes para se chegar a um patamar ideal (ALEXY,
2008, p. 507-512).
Conclui o autor:
[...] O indivíduo tem um direito definitivo à prestação
quando o princípio da liberdade fática tem um peso maior
que os princípios formais e materiais colidentes,
considerados em conjunto. Esse é o caso dos direitos
mínimos. É possivelmente a esse tipo de direitos mínimos
que se deve fazer referência quando direitos subjetivos
públicos e judicialmente exigíveis a prestações são
contrapostos ao conteúdo objetivo excedente. Em face de
direitos definitivos que sejam o resultado de um
sopesamento, os direitos prima facie correspondentes aos
princípios – o direito ‘em si’ à admissão em um curso
superior é um exemplo- têm sempre algo de excedente. O
conceito de excedente não está, portanto, vinculado à
dicotomia subjetivo/objetivo.
Avançar do modelo em direção a um nível objetivo é
possível, porque a direitos prima facie correspondem
deveres prima facie. Esses deveres são deveres estatais
prima facie de zelar para que às liberdades jurídicas dos
titulares de direitos fundamentais correspondam
liberdades fáticas (ALEXY, 2008, p. 517-518).
Note-se que Alexy aceita a positivização de direitos fundamentais
necessários ao mínimo existencial do ser, de modo que tais direitos- princípios
devem ser devidamente sopesados com outros para sua correta e devida
aplicação.
2.2 Direitos Sociais e a realidade da sociedade brasileira
Baseado no art. 25 da Declaração dos Direitos do Homem, a
Constituição Federal de 1988, inicialmente, preconizou em seu art. 6º: São
direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a
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previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição (BRASIL, 1988).
Destaque-se que a Constituição Federal de 1988, Constituição
Democrática do Estado de Direito, preconizou e fixou os direitos fundamentais
dos brasileiros, garantindo, em primeiro lugar, o direito à saúde, trabalho, lazer,
segurança, dentre outros. Esqueceu-se o constituinte de certos direitos básicos
de todos: o direito à moradia e à alimentação.
Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística –
IBGE (Anexo 1), é possível verificar que muitos brasileiros ainda não possuem
qualidade nos serviços de água, esgoto, coleta de lixo, iluminação pública e
fornecimento de energia elétrica. Além disso, mais de 41% das famílias
brasileiras vivem em uma moradia com pouco espaço e também possuem
vários problemas em sua fundação e materiais de constituição, tais como
portas e janelas.
Assim, ante a necessidade de expansão dos direitos sociais, o
legislador, por intermédio da Emenda Constitucional 26, de 14 de fevereiro de
2000, editou novamente o art. 6º da Carta Magna, que ganhou a seguinte
disposição: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o
lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância,
a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (BRASIL, 2000).
Acrescentou o legislador a moradia como um direito social, mas
novamente pecou pela não inclusão dos alimentos no rol dos direitos sociais.
De acordo com dados estatísticos da Pesquisa de Orçamentos
Familiares-POF, relativos ao ano de 2008, do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística-IBGE (Anexo 2) quase 36% das famílias brasileiras possuem
alguma dificuldade para chegar ao fim do mês com o rendimento monetário
familiar. A dificuldade é desproporcionalmente mais elevada para pessoas que
auferem renda pouco maior que um salário mínimo. Também, verifica-se que
mais de 25% das famílias acreditam ser insuficiente a quantidade de alimento
consumido (Anexo 3).
Ainda de acordo com o POF do IBGE a despesa total de uma família
(Anexo 4) é maior que R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), caso exista na
família pelo menos um membro com formação em nível superior. Este valor
equivale a mais de 4 salários mínimos. Se os membros da família tiverem
estudado por menor período a despesa é menor (Anexo 4), mas deve-se levar
em consideração que essas pessoas auferem renda menor, em razão do
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menor nível de especialização, o que os leva a trabalhar em empregos de
menor qualificação profissional.
A realidade é que, infelizmente, grande parte de milhões de famílias
brasileiras não auferem renda superior a um salário mínimo, de modo que isso
representa prejuízo no sustento de seus membros, que são privados dos
elementos mais básicos e essenciais a uma vida digna e saudável.
Das tabelas do IBGE é possível verificar que as despesas dessas
famílias brasileiras não envolvem somente a alimentação per si, mas também
vestuário, moradia, transporte, educação, lazer e cultura, dentre outros. A
renda não é suficiente e, com isso, a família tem que selecionar onde investirá
o dinheiro de maneira a otimizar suas necessidades, embora já saiba de
antemão que não conseguirá suprir com todas as necessidades para uma vida
digna.
Tal omissão e descaso somente foram corrigidos em 2010, com a
Emenda Constitucional nº 64 que reformulou o art. 6º para sua atual
disposição:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o
trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta
Constituição (BRASIL, 2010).
Desta forma, o legislador, deixou de lado o enfoque econômico que até
então vinha seguindo e voltou-se à área social, com destaque para a
necessidade mais vital do ser humano, demonstrando sua preocupação com
sua população, garantindo-lhe mais direitos sociais.
3 CONCLUSÃO
Diante das mudanças históricas e culturais das sociedades verificou-se
a necessidade da criação de um novo Estado de Direito, que garantisse aos
seus cidadãos certos direitos inerentes às características humanas.
Assim, surgiram os direitos fundamentais, que através dos tempos
evoluíram em diferentes dimensões e ampliaram ainda mais o rol de garantias
a serem positivadas pelo Legislador.
Com a inclusão e aceitação dos direitos sociais como direitos
fundamentais, foi possível ao legislador incluir na Carta Magna brasileira
direitos inerentes a uma vida digna e saudável a todo cidadão. Entretanto,
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direitos sociais, como a moradia e alimentação, somente alçou status de direito
fundamental quase duas décadas depois da criação da Constituição de 1988.
Mesmo diante da positivização dos direitos sociais, é possível verificar,
através dos dados do IBGE, que a realidade brasileira ainda está muito longe
de uma concreta e aceitável efetivação destes direitos a todos os cidadãos,
posto que muitas famílias brasileiras ainda não moram em uma residência
digna e saudável e muitas vezes não conseguem garantir a alimentação
adequada a seus membros.
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
NEUNER, JÖRG. Traduzido por ALEIXO, Pedro Scherer de Mello. Os direitos
humanos sociais. Direito de Família no novo milênio: estudos em
homenagem ao professor Álvaro Villaça Azevedo.– São Paulo: Atlas: 2010.
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Traduzido por Virgílio
Afonso da Silva. São Paulo: Ed. Malheiros, 2008.
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<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>.
Acesso em 16.05.2012
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em
<http://www.dji.com.br/constituicao_federal/cf226a230.htm>. Acesso
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FRANÇA. Declaração Universal dos Direitos do Homem. Disponível em
<http://direitoamoradia.org/pt/conheca/direito-a-moradia/fundamentos-legais/>.
Acesso em 16.05.2012
FIGUEIREDO, Simone Diogo Carvalho (Org.). Teoria Unificada – São Paulo:
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IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em
<http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/orcfam/default.asp?t=4&z=t&o=23&u1=1&u2
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ROSA, Daniel Correia. A concretização judicial de direitos fundamentais
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<http://www.esmesc.com.br/upload/arquivos/8-1267643746.PDF>. Acesso em
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VELLOSO, Carlos. M. S. Dos direitos sociais na Constituição do Brasil.
Disponível em:
<http://www.ufrnet.br/~tl/otherauthorsworks/dpr0027/velloso_carlos_dos_direito
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Anexo 1: Avaliação da Condição de moradia segundo o IBGE
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Fonte:
<http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/orcfam/default.asp?t=3&z=t&o=23&u1=1&u2
=1&u3=1&u4=1&u5=1&u6=1http://www.portalbrasil.net/inpc.htm>
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Anexo 2: Condição de vida e avaliação da quantidade de alimento
segundo IBGE
Fonte:
<http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/orcfam/default.asp?t=4&z=t&o=23&u1=1&u2
=1&u3=1&u4=1&u5=1&u6=1http://www.portalbrasil.net/inpc.htm>
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Anexo 3: Despesas de acordo com grau de escolaridade segundo IBGE
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Fonte:
http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/orcfam/default.asp?t=4&z=t&o=23&u1=1&u2=
1&u3=1&u4=1&u5=1&u6=1http://www.portalbrasil.net/inpc.htm
Anexo 4: Despesas de acordo com anos de estudo segundo IBGE
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Fonte:
<http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/orcfam/default.asp?t=4&z=t&o=23&u1=1&u2
=1&u3=1&u4=1&u5=1&u6=1http://www.portalbrasil.net/inpc.htm>
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24.05.2012 | UEL | Londrina/PR ISSN 2237-5287
O EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO NOS CONTRATOS
ADMINISTRATIVOS DA LICITAÇÃO PÚBLICA
Lucas Francisco Padial Miliorini271
Pamela de Moura Santos272
RESUMO: A Administração pública está subordinada aos princípios
constitucionais, assim em razão deles, benefícios em face do particular lhe são
outorgados. A supremacia do interesse público sobre o privado, bem como, a
possibilidade de alteração contratual de forma unilateral pela Administração
pode gerar o contrato um ônus impossível de suporte executório se presentes
determinadas circunstâncias. Nesta seara, buscando a exequibilidade do
contrato pautado no equilíbrio contratual é que emerge a necessidade da
existência do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos,
recebendo, inclusive, amparo constitucional. Neste sentido, insta salientar que
não é todo e qualquer contrato que poderá ser beneficiado com tal princípio, já
que a regra geral é cumprimento do pactuado entre os contraentes, aplicando a
relativização apenas quando presentes e comprovados os requisitos previstos
em Lei.
PALAVRAS-CHAVE: 1. Equilíbrio econômico na Constituição. 2. Álea
econômica e equilíbrio. 3. Lei 8.066/1993. 4. Equilíbrio financeiro.
____________________________
271
. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Pós-graduanda em Direito
Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná E-mail: [email protected] 272
. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Pós-graduanda em Direito do
Estado pela Universidade Estadual de Londrina.(lato sensu). Membra da Comissão de Direitos do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil, Subseção de Londrina. E-mail: [email protected]
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INTRODUÇÃO
Celebrar contratos em âmbito privado presume o acordo conjunto
das vontades entre os pactuantes.
No entanto, quando o negócio a ser entabulado envolve como parte
adversa não mais o particular e sim a Administração Pública, a figura do
consenso entre os contratantes passa a ser um coadjuvante entre as partes,
haja vista determinadas prerrogativas que goza a Administração Pública.
Neste sentido, ao participar do procedimento licitatório, o particular
que se dispõe a contratar com a Administração Pública deve ter em mente a
possibilidade de cláusulas exorbitantes, que distinguem o contrato
administrativo dos demais. Neste ponto insere-se o equilíbrio econômico-
financeiro, como forma de relativização da supremacia da Administração face
ao particular quando surgirem fatos imprevisíveis, que podem comprometer a
execução do contrato, impedindo, pois a execução do pactuado inicialmente
quando da formulação da proposta licitatória.
4. EQUILÍBRIO ECONÔMICO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Primeiramente, necessário mencionar que o equilíbrio econômico
recebeu proteção constitucional, já que é o magno texto que contempla os
contratos celebrados entre Administração Pública e particular.
O preceito Constitucional, incerto no art. 37,XXI, da Lei Maior, obriga
inserção, nos contratos administrativos de cláusula que estabeleça obrigações
de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta. Tal preceito
consubstancia, sem qualquer dúvida, o princípio do equilíbrio econômico-
financeiro do contrato.
Art. 37. A administração pública direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência e, também, ao seguinte:
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XXI - ressalvados os casos especificados na legislação,
as obras, serviços, compras e alienações serão
contratados mediante processo de licitação pública que
assegure igualdade de condições a todos os
concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações
de pagamento, mantidas as condições efetivas da
proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as
exigências de qualificação técnica e econômica
indispensáveis à garantia do cumprimento das
obrigações.
Assim sendo, de acordo com Arnoldo Wald (2010, p. 316) pode-se
dizer que:
[...] a equação contratual será sempre assegurada através
da manutenção das condições constantes da proposta
licitatória vencedora. Se as propostas levaram em
consideração as garantias proporcionadas pelos contratos
iniciais, a quebra dessas garantias significará, à toda
evidencia, rompimento do equilíbrio econômico dos
contratos.
Desta forma, a garantia do equilíbrio econômico-financeiro é a
exteriorização do princípios de justiça social que devem presidir a organização
da ordem econômica.
Sobre o assunto, sobressai em importância o comentário de Luís
Rodolfo e Creuz (2010, p. 211).
[...] o equilíbrio econômico – financeiro do contrato deve
ser perseguido pelas partes, inclusive com o necessário
apoio e exame, em caso de divergência e litígio, do Poder
Judiciário, visando reforçar os princípios supra-alocados.
Nessa mesma seara, posiciona-se Miguel Reale (REALE, 1997, p.
211):
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[...] É na raiz mesma do direito constitucional pátrio que
devemos buscar a razão de ser de dois princípios
correlatos que, hoje em dia, são universalmente
reconhecidos como condições sine qua non, da vida
contratual: o da salvaguarda do equilíbrio econômico dos
contatos, e o do repúdio a toda espécie de onerosidade
excessiva que possa vir a atingir a obrigação de qualquer
das partes.
A questão do equilíbrio econômico foi objeto inclusive de
normatização através da lei 8.666 (Lei de Licitação). Não por outra razão, esta
Lei determina, em diversos pontos referente aos contratos, a necessidade de
que se mantenha o equilíbrio econômico financeiro.
É de se observar que em todo contrato administrativo existem
cláusulas econômicas que são inalteráveis unilateralmente, porque fixam a
remuneração e os direitos do contratado perante a Administração e
estabelecem a equação financeira a ser mantida durante toda a execução do
contrato.
Atualmente é muito comum encontrar na prática a inovação da
cláusula do princípio do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, como
forma de melhorar as condições do contrato, visando à obtenção de lucro
maior. Porém se o contratado apresentou proposta inviável ou inexeqüível do
ponto de vista econômico, para vencer a concorrência, não poderá invocar esta
cláusula para obter melhoria financeira.
Diante disso, é necessário comentar sobre a álea econômica que
corresponde a circunstâncias externas ao contrato, estranhas à vontade das
partes, imprevisíveis, excepcionais, inevitáveis, que causam desequilíbrio muito
grande no contrato, dando lugar à aplicação da teoria da imprevisão.
5. ÁLEA ECONÔMICA: TEORIA DA IMPREVISÃO
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No Direito Público, a consagração da teoria da imprevisão é
amplamente admitida pela doutrina, no que tange aos contratos
administrativos, com vistas à preservação do equilíbrio contratual (art. 65, II, d,
da Lei nº 8666/93).
Álea econômica, que dá lugar à aplicação da teoria da imprevisão, é
todo acontecimento externo ao contrato, estranho à vontade das partes,
imprevisível e inevitável, que causa um desequilíbrio muito grande, tornando a
execução do contrato excessivamente onerosa para o contratado.
Nesta sentido, insta colacionar o posicionamento de José dos Santos
Carvalho Filho (CARVALHO FILHO, 2001, p. 156):
[...] é o princípio da cláusula rebus sic stantibus, segundo
o qual o contrato deve ser cumprido desde que presentes
as mesmas condições existentes no cenário dentro do
qual foi o pacto ajustado. Mudadas profundamente tais
condições, rompe-se o equilíbrio econômico contratual, e
não se pode imputar qualquer culpa à parte inadimplente.
Ainda, sobre a imprevisão ilustra Celso Antonio Bandeira de Melo
(MELO, 2004, p. 604-605:
O imprevisível passou a se referir apenas ao imprevisto,
ao razoavelmente não previsto, e a indenização de
imprevisão transmudou-se de ajuda parcial temporária em
meio de garantia do equilíbrio econômico financeiro
estipulado por ocasião do contrato, nele incluído o lucro.
A condição de imprevisibilidade deve então suavizar-
se: o imprevisível será somente o que não foi
expressamente previsto nas estipulações do contrato.
(grifo nosso)
No entanto, cumpre esclarecer que para a aplicabilidade da teoria da
imprevisão e restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato,
alguns requisitos se revelam necessário, vez que o fato deve ser:
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a) imprevisível quanto à sua ocorrência ou quanto às suas
conseqüências;
b) estranho à vontade das partes;
c) inevitável;
d) causa de desequilíbrio muito grande no contrato;
Se for previsível o fato e de conseqüências calculáveis, ele será
suportado pelo contratado, constituindo álea econômica ordinária; a mesma
conclusão deve-se chegar se tratar de fato que o particular pudesse evitar, pois
não será justo que a Administração responda pela desídia do contratado.
Sobre o tema, importa esclarecer sobre a distinção entre a álea
econômica da força maior. Na álea econômica de força maior estão presentes
os mesmos elementos, quais sejam, o fato estranho à vontade das partes,
inevitável, imprevisível; “a diferença está em que na teoria da imprevisão,
ocorre apenas um desequilíbrio econômico, que não impede a execução do
contrato; e na força maior, verifica-se a impossibilidade absoluta de dar
prosseguimento ao contrato” (DI PIETRO, 2002, p.269).
Neste sentido a segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao
julgar o Recurso Especial nº 744.446 decidiu:
[...] Trata-se de recurso em que se discute a aplicação da
teoria da imprevisão de modo a propiciar o reequilíbrio
econômico-financeiro do contrato. Primeiramente, o Min.
Relator asseverou ser irrelevante o fato de o contrato ter
sido firmado antes da vigência do novo Código Civil para
a análise da mencionada teoria. Para o Min. Relator, não
se mostra razoável o entendimento de que a inflação
possa ser tomada, no Brasil, como álea extraordinária, de
modo a possibilitar algum desequilíbrio na equação
econômica do contrato, como há muito afirma a
jurisprudência deste Superior Tribunal. Não há como
imputar as aludidas perdas a fatores imprevisíveis, já que
decorrentes de má previsão das autoras, o que constitui
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álea ordinária, não suportável pela Administração e não
autorizadora da teoria da imprevisão. Caso fosse
permitida a revisão pretendida, estar-se-ia beneficiando
as apeladas em detrimento das demais licitantes que,
agindo com cautela, apresentaram proposta coerente com
os ditames do mercado e, talvez por terem incluído essa
margem de segurança em suas propostas, não
apresentaram valor mais atraente.
Portanto, só o desequilíbrio muito grande, que torne excessivamente
onerosa a execução para o contratado, justifica a aplicação da teoria da
imprevisão, pois pequenos prejuízos, decorrentes de má previsão, constituem
álea ordinária não suportável pela Administração.
Por gerar desequilíbrio no contrato, a imprevisão gera a necessidade
de análise do equilíbrio econômico financeiro que, nas palavras de Odete
Medauar (MEDAUAR, 2004, p. 254):
[...] significa a proporção entre os encargos do contratado
e a sua remuneração, proporção esta fixada no momento
da celebração do contrato; diz respeito às chamadas
cláusulas contratuais, terminologia redundante,
classicamente usada para designar as cláusulas
referentes sobretudo à remuneração do contratado.
Sendo assim, o efeito da teoria da imprevisão calca-se no fato de se
a parte prejudicada não puder cumprir, de nenhum modo, as obrigações
contratuais, dar-se-á a rescisão sem atribuição de culpa, já se o cumprimento
for passível, mas acarretar ônus para a parte terá esta direito à revisão do
preço para restaurar o equilíbrio econômico financeiro rompido.
6. O EQULÍBRIO ECONÔMICO
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Ao observar os efeitos da globalização e das ações dos
mercados, nota-se que a economia brasileira atravessou grande período
marcado por forte instabilidade e grande crises econômicas, que acabaram por
não somente abalar a economia, mas também lançaram reflexos nos mais
diversos universos regulados, entre eles, os contratos públicos.
O equilíbrio econômico e financeiro é uma garantia para o
contratado caso necessite adotar medidas para conseguir adimplir com o
contrato, diante dos ônus resultante de possível alteração unilateral por parte
da Administração Pública.
No mesmo entendimento, Alex Muniz Barreto (BARRETO, 2004,
p. 288) afirma que:
[...] O equilíbrio econômico financeiro surge como uma
garantia do contratado consistente em ter assegurado o
direito de exigir a adoção de medidas econômicas
capazes de fazer frente aos ônus que passará a suportar
diante da alteração unilateral levada a efeito pela
administração no exercício do jus variandi. Enquanto que
a esta assiste a prerrogativa de modificar as cláusulas
originais do contrato público, ao particular, em
contrapartida, resguarda-se a garantia de que dessa
alteração não lhe resultarão custos maiores que os
inicialmente avençados. Dessa forma, esse contrapeso
estabelecido pela norma impõe a definição de meios
financeiros compensatórios para fazer frente `nova
realidade contratual.
Esta formulação da necessária equivalência entre as
obrigações, fundada no princípio da equidade, é que se traduziu no princípio da
chamada equação financeira do contrato administrativo.
Maria Sylvia Zanella di Pietro (DI PIETRO, 2002, p. 283) expõe
que:
[...] De um lado, a circunstâncias excepcionais não libera
o particular da obrigação de dar cumprimento ao contrato,
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por outro lado não é justo que ele responda sozinho pelos
prejuízos sofridos. Para evitar a interrupção do contrato, a
Administração vem em seu auxílio, participando também
do acréscimo de encargos. Essa compensação o
particular só pode pleitear quando continuar a execução
do contrato; e nunca será integral, porque não cobre o
total do déficit financeiro do co-contratante, reparte-se o
prejuízo para restabelecer o equilíbrio econômico do
contrato.
Cumpre asseverar que o contratante tem direito à remuneração
inscrita em seu contrato. “Ele não consentiu seu concurso na esperança de um
certo lucro. Aceitou tomar a seu cargo trabalhos e áleas que, se houvesse
querido contratar, seriam suportados pela Administração” (MELLO, 2004, p.
635).
Posto isto, é normal que seja remunerado, até mesmo porque,
se diferente fosse não só afrontaria o princípio da boa-fé como também
qualquer segurança dos negócios, podendo ocasionar desequilíbrios inclusive
na ordem econômica e social, eis que o particular não teria segurança,
tampouco interesse em contratar com a Administração Pública
O Princípio do Equilíbrio econômico-financeiro é a “relação de
igualdade formada, de um lado, pelas obrigações assumidas pelo contratante
no momento do ajuste e, de outro lado, pela compensação econômica que lhe
correspondera” (MELLO, p. 635).
É de se afirmar que o equilíbrio econômico – financeiro pode
corresponder à alteração promovida pelo ordenador do contrato, ou seja, pode
haver alteração de regime de execução, aumento ou diminuição de
quantitativo, mudança de projeto, dentre outros.
Não obstante, pode também haver alterações por meios
externos, uma alteração danosa ao equilíbrio, como o impacto de aumento de
tributos federais, crise cambial, dentre outros.
No entanto, para haver o equilíbrio econômico financeiro do
contrato administrativo, observar-se-á, pela teoria da imprevisão que o fato
deve ser imprevisível quanto à sua ocorrência ou quanto às suas
consequências, estranho à vontade das partes e ainda, causar desequilíbrio
muito grande no contrato;
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Nesse sentido, a jurisprudência transcrita por Luís Rodolfo
Creuz (CRUZ, 2010 p. 211) demonstrando claramente a aplicação do
equilíbrio econômico financeiro:
O reequilíbrio econômico financeiro de um contrato
administrativo é necessário diante de prova de que
ocorreu alteração unilateral do contrato(art. 58 2º da lei de
Licitações), fato do príncipe, fato da Administração ou
situação que se enquadram na teoria da imprevisão (os
três últimos previstos no art. 65, II, d, da Lei de
Licitações), incluindo o caso fortuito e força maior (art.
65,II,d).
Neste mesmo Ivan Barbosa Rigolin (RIGOLIN, p. ) :
tanto a alteração unilateral quanto as situações de caso
fortuito/força maior desequilibram a equação econômica
financeira do contrato, na medida em que a empresa
precisou pagar os salários de seus empregados e
encargos sociais por um tempo muito maior do que o
originalmente foi previsto e cotado (custo) para licitação e
lançado como parte da prestação pecuniária devida em
favor do particular nos dois contratos.
Portanto, se não estiver presentes estes requisitos, deve
considerar que o fato ocorrido é suportável pelo contratado, não precisando
assim, de aplicar o equilíbrio econômico - financeiro no contrato, pois,
comprometer o equilíbrio do contrato é “impropriá-lo como instrumento hábil
para a circulação de riqueza, é abalar a circulação econômica ordinária,
significando, em uma palavra, frustrar a livre iniciativa, em clara oposição ao
mandamento constitucional” (REALE, p. 08).
Sendo assim, o equilíbrio econômico financeiro do contrato
pressupõe um conceito básico, qual seja, a manutenção do status quo, com a
situação de equilíbrio devendo ser mantida tanto na contratação quanto na
condução e execução do contrato. Deve ser acionado este de forma a se
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utilizar para ambas as partes, sempre nos estreitos termos da legislação
brasileira.
7. O EQUILÍBRIO ECONÔMICO NA LEI 8.666/1993
A Lei de Licitações e Contratos da Administração Pública, Lei nº
8.666/93, entrega à Administração Pública a faculdade, ou em alguns casos o
"dever" de modificar unilateralmente as condições dos contratos
administrativos, conforme se depreende do art. 57, § 1º:
Art. 57 - omissis
§ 1º - Os prazos de início de etapas de execução, de
conclusão e de entrega admitem prorrogação, mantidas
as demais cláusulas do contrato e assegurada a
manutenção de seu equilíbrio econômico-financeiro,
desde que ocorra algum dos seguintes motivos,
devidamente autuados em processo:
I - alteração do projeto ou especificações, pela
Administração;
II - superveniência de fato excepcional ou imprevisível,
estranho à vontade das partes, que altere
fundamentalmente as condições de execução do contrato;
III - interrupção da execução do contrato ou diminuição do
ritmo de trabalho por ordem e no interesse da
Administração;
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IV - aumento das quantidades inicialmente previstas no
contrato, nos limites permitidos por esta Lei;
V - impedimento de execução do contrato por fato ou ato
de terceiro reconhecido pela Administração em
documento contemporâneo à sua ocorrência;
VI - omissão ou atraso de providências a cargo da
Administração, inclusive quanto aos pagamentos
previstos de que resulte, diretamente, impedimento ou
retardamento na execução do contrato, sem prejuízo das
sanções legais aplicáveis aos responsáveis
Porém, ao proceder tais alterações, deve a Administração
Pública fazer diligências no sentido de alterar, também, as cláusulas referentes
às obrigações tanto da Administração, como do particular, conforme esclarece
o artigo 58, da Lei 8.666/93:
Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos
instituído por esta lei confere à Administração, em relação
a eles, a prerrogativa de:
I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação
às finalidades de interesse público, respeitados os direitos
do contratado;
II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados
no inciso I do art. 79 desta lei;
§ 2° Na hipótese do inciso I deste artigo, as cláusulas
econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas
para que se mantenha o equilíbrio contratual.
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Cabe ressaltar que no caso dos contratos administrativos a
teoria da imprevisão foi expressamente acolhida pela Constituição Federal, ao
garantir ao particular que as condições da propostas seriam mantidas durante a
sua execução, atendendo, assim a um princípio básico a que Administração
está sujeita, o da legalidade:
Art. 37. A administração pública direta, indireta ou
fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade [...]
Assim, dispõe a Lei nº 8.666/93, ao regular a matéria:
Art. 65. Os contratos regidos por esta lei poderão ser
alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes
casos:
II - por acordo das partes:
d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram
inicialmente entre os encargos do contratado e a
atribuição da Administração para a justa remuneração da
obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção
do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na
hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis
porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou
impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso
de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe,
configurando álea econômica extraordinária e
extracontratual.
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A referida alínea disciplina a alteração contratual orientada a
promover o reequilíbrio econômico-financeiro original. Para tanto, deve ser
observados os limites para estas alterações, previsto no §2º do art. 65 da Lei
8.066/93:
Art. 65.
§1º o contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas
condições contratuais, os acréscimos ou supressões que
se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte
e cinco porcento) do valor inicial atualizado do contrato, e,
no caso particular de reforma de edifício ou de
equipamento, até o limite de 50% (cinqüenta por cento)
para os seus acréscimos.
§ 2o Nenhum acréscimo ou supressão poderá exceder os
limites estabelecidos no parágrafo anterior, salvo:
II - as supressões resultantes de acordo celebrado entre
os contratantes.
Discorda Marçal Justen Filho (JUSTEN FILHO, 2006, p. 367)
quando salienta que “o § 2º do art. 65 determina que os acréscimo ou
supressão não podem superar ao limite de 25% (50% em caso de reforma) do
valor original da contratação. Há defensores da interpretação ampla do
dispositivo” . Isso significa que nenhuma modificação prevista no art. 65,
poderia ultrapassar o limite do §1º.
No entanto, a princípio parece assistir razão o texto normativo
para as situações em gerais, podendo, pois, aquele que se sentir lesionado
recorrer ao Poder Judiciário desde que comprove a ilegalidade, a ofensa
cometida.
8. O EQUILÍBRIO FINANCEIRO
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O Equilíbrio econômico-financeiro deve ser aplicado nos
contratos de forma à preservar o contrato resultante da licitação pública,
quando na sua elaboração não for levado em conta que aquele fato poderia
surgir.
Tal fato ocorre quando, por exemplo, determinada licitação que
previu a contratação de uma empresa de transporte terrestre, em que não foi
previsto a exigência de disponibilização de acentos gratuitos a pessoa idosa.
Para que sejam fornecidos acentos de forma gratuita aos
idosos, necessário se faz que as empresas diante do ente Público, reequilibrem
seus contratos para não haver uma disparidade, a ponto de causar prejuízo de
um lado nem mesmo aproveito do outro, pois não é justo que o empresário
arca com o prejuízo sozinho. Para isso que serve o equilíbrio dos contratos
firmados com a Administração, por meio de licitação.
CONCLUSÃO
Com base no exposto, conclui-se que para haver o equilíbrio
econômico é necessário que ocorra algumas das condições legais que
justificasse a readequação do contrato com vistas a preservar o equilíbrio
negocial. Para a Administração contratar algum serviço ou produto, é
necessário que interessados participem do certame licitatório publicado, na
modalidade escolhida nos termos da Lei.
Publicado o edital pela Administração, presume-se que os
interessados tomaram conhecimento sobre o certame licitatório a ser realizado.
No edital, serão estipulados as regras de participação e os requisitos, e, só
após, serão os classificados submetidos à fase de habilitação e, em seguida da
proposta, em que será escolhido um vencedor e finalmente a Administração
firmará o contrato.
O vencedor ao firmar o contrato com a administração deve prestar o
serviço da forma estipulada inicialmente no processo licitatório.
Não obstante, o contrato contempla privilégios para a Administração,
vez que é possível a alteração unilateral por ela; tais prerrogativas, como a de
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alteração unilateral é o que diferencia tais contratos daqueles celebrados entre
particulares.
Diante disso, surge a possibilidade e a importante aplicação do
equilíbrio econômico, o qual visa manter o equilíbrio conseguido no momento
da contratação, bem como garantir a Administração os seus objetivos públicos
pelo menor custo possível, ou pela melhor qualidade, sem pagar por riscos
poderão advir ao longo do contrato.
Por outro lado, o particular terá a segurança de que se ocorrer fato
imprevisto no decorrer do cumprimento do contrato firmado com a
Administração, sua contraprestação será revista para a manutenção do
equilíbrio inicialmente contratado.
Assim sendo, a Administração deve analisar todos os casos de forma
individual e sopesar as condições envolvidas, com vistas possibilitar o
adimplemento contratual e não causar enriquecimento sem causa a nenhuma
das partes.
REFERÊNCIAS
BARRETO, Alex Muniz. Direito Administrativo. São Paulo: Editora Edijur,
2006,
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 21 ed., São Paulo:
Saraiva, 2000.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 11 ed., São Paulo:
Malheiros Editores, 2001.
BRASIL. Recurso Especial nº 744.446-DF. Relator Ministro Herman Benjamin,
julgado em 17/4/2008.
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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do
Brasil. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
BRASIL. Lei 8.666/1993. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 7.
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AS AÇÕES AFIRMATIVAS E O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA
IGUALDADE
Luiz Henrique Santos da Cruz
Advogado Trabalhista, Cível, Consumidor e Empresarial
Mestrando em Direito Empresarial e Cidadania do Centro Universitário Curitiba
UNICURITIBA- CURITIBA- PR
Email- [email protected]
RESUMO
O tema ações afirmativas é de grande relevânica para o Brasil , uma vez que,
reflete diretamente sobre aquele que é seguramente o mais grave de todos os
nossos problemas sociais o qual, que, curiosamente, todos fingimos ignorar, o
que está na raiz das nossas mazelas, do nosso gritante e envergonhador
quadro social, ou seja, os diversos mecanismos pelos quais, ao longo da nossa
história, a sociedade brasileira logrou proceder, através das mais variadas
formas de discriminação, à exclusão dos negros do processo produtivo
consequente e da vida social digna. As ações afirmativas é sem dúvida um
tema nobre de Direito Constitucional Comparado e de Direito Internacional,
mas que é, em contra partida, curiosamente, negligenciado pelas letras
jurídicas nacionais, especialmente no âmbito de Direito Constitucional. Os
países onde foram primeiramente aplicadas as ações afirmativas foram
Estados Unidos, Inglaterra, Canadá, Índia, Alemanha, Austrália, Nova Zelândia
e Malásia, entre outros, elas visam oferecer aos grupos discriminados e
excluídos um tratamento diferenciado para compensar as desvantagens
devidas à sua situação de vítimas do racismo, preconceito e discriminação,
porém qualquer tentativa de de mudança em benefício dos excluídos jamais
receberia uma apoio unânime. Apesar das críticas contra as ações
afirmativas, a experiência nos países que implementaram não deixam dúvidas
sobre as mudanças alcançadas uma vez que, houve uma redução das
desiguades sociais, e consequentemente uma inserção maior das menorias,
especialmente os negros no mercado de trabalho e na educação.
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Palavras-chave: ação afirmativa, discriminação racial, princípio da igualdade,
exclusão social, desigualdade social.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo analisar o que significa ações
afirmativas e de que forma essas ações estão sendo implementadas no Brasil
bem como seus resultados e como a doutrina , a jurisprudência vem se
posicionando a respeito.
A politica de as ações afirmativas é uma questão de justiça ,
cidadania, e acima de tudo um dos instrumentos para bucar a igualdade, não
somente a igualdade formal mais também uma igualdade material.
Tem como intuito diminuir a desigualdade social e a inclusão da
chamadas minorias, especialmente da população negra com vistas ao
combate à discriminação racial, de gênero, bem como para corrigir os efeitos
presentes da discriminação até hoje presente no Brasil, e a concretização do
ideal de efetiva igualdade de acesso e bens fundamentais como a educação e
o emprego.
Com a aplicação das ações afirmativas, o Estado deixa de ser um
espectador dos embates que se travam no campo de convivência entre os
homens e passa a atuar de forma efetiva na busca da concretização da
igualdade positivada nos textos constitucionais.
Os Estados Unidos da América foi o País pioneiro na adoção das
políticas sociais denominadas ações afirmativas.
Ações afirmativas podem ser impostas ou sugeridas pelo Estado, por
seus entes vinculados e até mesmo por entidades puramente privadas, com
ituito de combater não somente as manifestações flagrantes de discriminação,
mas também a discriminação de fato, de fundo cultural, estrutural, enraizada na
sociedade. Têm como objetivo também, o engendramento de transformações
culturais e sociais relevantes, aptas a inculcar nos atores sociais a utilidade e a
necessidade de observância dos princípios de pluralismo e da diversidade nas
mais diversas esferas do convívio humano. Constituem, por assim dizer, a mais
eloquente manifestação da moderna ideia de Estado promovente, atuante, eis
que de sua concepção implantação e delimitação jurídica participam todos os
órgãos estatais essenciais, aí se incluindo o Poder Judiciário, que hora se
apresenta noseu tradicional papel de guardião da integridade do sistema
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jurídico como um todo e especialmente dos direitos fundamentais, ora como
instituição formuladora de políticas tendentes a corrigir as distorções
provocadas pela discriminação.
Trata-se, de um mecanismo sociojurídico destinado a viabilizar
primordialmente a harmonia e a paz social, que são seriamente perturbadas
quando um grupo social expressivo se vê à margem do processo produtivo e
dos benefícios do progresso, bem como o robustecer o próprio
desenvolvimento econômico do país, na medida em que a universa-lização do
acesso à educação e ao mercado de trabalho tem como consequência o
crescimento macroeconômico, a ampliação generalizada dos negócios, numa
palavra, o crescimento do país como um todo.
Nesse sentido, não se deve perder de vista o fato de que a história
universal não registra, na era contemporânea, nenhum exemplo de nação que
tenha se erguido de uma condição periférica à de potência econômica e
política, digna de respeito na cena política internacional, mantendo no plano
doméstico uma política de exclusão, aberta ou dissimulada, legal ou
meramente informal, em relação a uma parcela expressiva de seu povo.
As ações afirmativas constituem, pois, um instrumento de razoável
eficácia para esses males. E mais, é preciso uma ampla conscientização sobre
o fato de que a marginalização sócio-econômico a que são relegados as
minorias, especialmente as raciais.
As ações afirmativas são um mecanismo jurídico concebido com vistas a
quebrar essa dinâmica perversa, sofram o influxo dessas forças contrapostas e
atraiam considerável resistência, sobretudo da parte daqueles que
historicamente se beneficiaram da exclusão dos grupos socialmente
fragilizados.
O Brasil é o país com a mais longa história de escravidão das Américas e
com uma inabalável tradição patriarcal, mal começa a admitir, pelo menos um
nível acadêmico, a discussão do tema.
2. O QUE É AÇÃO AFIRMATIVA
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As ações afirmativas se definem como políticas públicas e privadas
voltadas á concretização do princípio constitucional da igualdade material e à
neutralização dos efeitos da discriminação racial, de gênero, de idade, de
origem nacional e de compleição física. Na sua compreensão, a igualdade
deixa de ser simplesmente um princípio jurídico a ser respeitado por todos, e
passa a ser um objetivo constitucional a ser alcançado pelo Estado e pela
sociedade.
Essas políticas sociais, que nada mais são do que tentativas de
concretização da igualdade substancial ou material, dá-se a denominação de
ação afirmativa ou, na terminologia do direito europeu, de discriminação
positiva ou ação positiva.
A consagração normativa dessas políticas sociais representa, pois, um
momento de ruptura na evolução do Estado moderno. Com efeito, como bem
assinala a Ministra do STF e Professora Carmen Lúcia Antunes Rocha:
Em nenhum Estado Democrático, até a década de 60, e
em quase nenhum até esta última década do século XX
se cuidou de promover a igualação e vencerem-se os
preconceitos por comportamentos estatais e particulares
obrigatórios pelos quais se superassem todas as formas
de desigualação injusta. Os negros, os pobres, os
marginalizados pela raça, pelo sexo, por opção religiosa,
por condições econômicas inferiores, por deficiências
físicas ou psíquicas, por idade etc. continuam em estado
de desalento jurídico em grande parte do mundo.
Inobstante a garantia constitucional da dignidade humana
igual para todos, da liberdade igual para todos, não são
poucos os homens e mulheres que continuam sem ter
acesso às iguais oportunidades mínimas de trabalho, de
participação política, de cidadania criativa e
comprometida, deixados que são à margem da
convivência social, da experiência democrática na
sociedade política». Assim, nessa nova postura o Estado
abandona a sua tradicional posição de neutralidade e de
mero espectador dos embates que se travam no campo
da convivência entre os homens e passa a atuar
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«ativamente na busca» da concretização da igualdade
positivada nos textos constitucionais .273
O Ilustre Ministro do STF Joaquim Benedito Barbosa Gomes define
as ações afirmativas como sendo:
As ações Afirmatias, podem ser impostas ou sugeridas
pelo Estado, por seus entes vinculados e até mesmo por
entidades puramente privadas, elas visam a combater não
somente as manifestações flagrantes de discriminação,
mas também a discriminação de fato, de fundo cultural,
estrutural, enraizada na sociedade. De cunho pedagógico
e não raramente impregnadas de um caráter de
exemplaridade, têm como meta, também, o
engendramento de transformações culturais e sociais
relevantes, aptas a inculcar nos atores sociais a utilidade
e a necessidade da observância dos princípios do
pluralismo e da diversidade nas mais diversas esferas do
convívio humano.274
Afirma ainda Joaquim Benedito Barbosa Gomes:
... as ações afirmativas se definiam como um mero
“encorajamento” por parte do Estado a que as pessoas
com poder decisório nas áreas pública e privada
levassem em consideração, nas suas decisões relativas a
temas sensíveis como o acesso á educação e ao
mercado de trabalho, fatores até então tidos como
irrelevantes pela grande maioria dos responsáveis
políticos e empresariais, quais sejam, a raça, a cor, o
sexo e a origem nacional das pessoas. Tal encorajamento
tinha por meta, tanto quanto possível, ver concretizado o
ideal de que tanto as escolas quanto as empresas
refletissem em sua composição a representação de cada
273 ROCHA, Carmen Lúcia Antunes Rocha. Ação Afirmativa – O Conteúdo Democrático do Princípio da Igualdade Jurídica. Revista
Trimestral de Direito Público nº 15/96.
274 GOMES, Joaquim Barbosa,SILVA, Fernanda Duate L. Silva, As Ações Afirmativas e os Processos de Promoção de
Igualdade Efetiva, http://w3.ufsm.br/afirme/ARTIGOS/variados/var02.pdf, p. 6, Acesso em 27/11/2011, às 16:26.
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grupo na sociedade ou no respectivo mercado de
trabalho.275
Por outro lado, constituem, por assim dizer, a mais eloqüente
manifestação da moderna idéia de Estado promovente, atuante, eis que de
sua concepção, implantação e delimitação jurídica participam todos os órgãos
estatais essenciais, aí se incluindo o Poder Judiciário, que ora se apresenta no
seu tradicional papel de guardião da integridade do sistema jurídico como um
todo e especialmente dos direitos fundamentais, ora como instituição
formuladora de políticas tendentes a corrigir as distorções provocadas pela
discriminação.
3. OBJETIVOS DAS AÇÕES AFIRMATIVAS
Numa palavra, ao invés de conceber políticas públicas de que todos
seriam beneficiários, independentemente da sua raça, cor ou sexo, o Estado
passa a levar em conta esses fatores na implementação das suas decisões,
não para prejudicar quem quer que seja, mas para evitar que a discriminação,
que inegavelmente tem um fundo histórico e cultural, e não raro se subtrai ao
enquadramento nas categorias jurídicas clássicas, finde por perpetuar as
iniqüidades sociais.
Entre os teóricos do Direito Público no Brasil, coube à ilustre
professora Carmen Lúcia Antunes Rocha o desafio de traduzir para a
comunidade jurídica brasileira, a mais completa noção acerca do
enquadramento jurídico-doutrinário das ações afirmativas. Classificando-as
corretamente como a mais avançada tentativa de concretização do princípio
jurídico da igualdade, ela afirma com propriedade que:
a definição jurídica objetiva e racional da desigualdade
dos desiguais, histórica e culturalmente discriminados, é
concebida como uma forma para se promover a igualdade
daqueles que foram e são marginalizados por
preconceitos encravados na cultura dominante na
sociedade. Por esta desigualação positiva promove-se a
igualação jurídica efetiva; por ela afirma-se uma fórmula
275Idem, p. 5, Acesso em 27/11/2011, às 17:14.
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jurídica para se provocar uma efetiva igualação social,
política, econômica no e segundo o Direito, tal como
assegurado formal e materialmente no sistema
constitucional democrático. A ação afirmativa é, então,
uma forma jurídica para se superar o isolamento ou a
diminuição social a que se acham sujeitas as minorias.276
A discriminação de ontem pode ainda tingir a pele que se vê de cor
diversa da que predomina entre os que detêm direitos e poderes hoje.
Figura também como meta das ações afirmativas a implantação de
uma certa diversidade e de uma maior «representatividade dos grupos
minoritários nos mais diversos domínios de atividade pública e privada.
Por fim, as ações afirmativas cumpririam o objetivo de criar as
chamadas personalidades emblemáticas. Noutras palavras, além das metas
acima mencionadas, elas constituiriam um mecanismo institucional de criação
de exemplos vivos de mobilidade social ascendente. Vale dizer, os
representantes de minorias que, por terem alcançado posições de prestígio e
poder, serviriam de exemplo às gerações mais jovens, que veriam em suas
carreiras e realizações pessoais a sinalização de que não haveria, chegada a
sua vez, obstáculos intransponíveis à realização de seus sonhos e à
concretização de seus projetos de vida.
Em suma, com esta conotação as ações afirmativas atuariam como
mecanismo de incentivo à educação e ao aprimoramento de jovens integrantes
de grupos minoritários, que invariavelmente assistem ao bloqueio de seu
potencial de inventividade, de criação e de motivação ao aprimoramento e ao
crescimento individual, vítimas das sutilezas de um sistema jurídico, político,
econômico e social concebido para mantê-los em situação de excluídos.
4. O POSICIONAMENTO DA DOUTRINA E DA JURISPRUDÊNCIA SOBRE
AS AÇÕES AFIRMATIVAS
Expressiva parcela da doutrina brasileira especializada no assunto se
inclina pela tese de constitucionalidade da adoção de ação afirmativa ou de
276
GOMES, Joaquim B. Barbosa,SILVA, Fernanda Duate L. Silva, As Ações Afirmativas e os Processos de Promoção de
Igualdade Efetiva, http://w3.ufsm.br/afirme/ARTIGOS/variados/var02.pdf, p. 4, Acesso em 27/11/2011, às 12:26.
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seus mecanismos no Brasil. O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Joaquim
B. Barbosa Gomes, enfrentando essa questão, e posicionando-se a favor da
constitucionalidade das ações afirmativas em nosso país, afirma:
No plano estritamente jurídico (que se subordina, a nosso
sentir, à tomada de consciência assinalada nas linhas
anteriores), o Direito Constitucional vigente no Brasil, é
perfeitamente compatível com o princípio da ação
afirmativa. Melhor dizendo, o Direito brasileiro já
contempla algumas modalidades de ação afirmativa,
inclusive em sede constitucional” (GOMES, 2000, p. 15).
E, conclui: “Assim, à luz desta respeitável doutrina, pode-
se concluir que o Direito Constitucional brasileiro abriga,
não somente o princípio e as modalidades, implícitas e
explícitas de ação afirmativa a que já fizemos alusão, mas
também as que emanam dos tratados internacionais de
direitos humanos assinados pelo nosso país.277
O Poder Judiciário ainda não se manifestou definitivamente sobre a
constitucionalidade ou a inconstitucionalidade dos programas de ação
afirmativa instituídos até o momento em nosso país, porquanto as diversas
ações ajuizadas nos tribunais que têm competência para exercer o controle
direto de inconstitucionalidade o Supremo Tribunal Federal e os Tribunais de
Justiça não foram julgadas no mérito. Apesar disso, já foram proferidas
sentenças por juízos de primeira instância, em sede de controle difuso de
constitucionalidade, que julgando o mérito dos pedidos formulados nos
processos, concluíram pela constitucionalidade das leis que instituíram cotas
em favor de afro-descendentes em estabelecimentos públicos de educação
superior.
Na lição da Dra. Flávia Piovesan, as ações afirmativas,
constituem medidas especiais e temporárias que,
buscando remediar um passado discriminatório, objetivam
acelerar o processo de igualdade, com o alcance de
igualdade substantiva por parte de grupos vulneráveis,
277 GOMES, Joaquim B. Barbosa. Instrumentos e métodos de mitigação da desigualdade em direito constitucional e
internacional. Rio de Janeiro, 2000.
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como as minorias étnicas e raciais, as mulheres, dentre
outros grupos.278
Afirma ainda a doutrinadora que:
As ações afirmativas, enquanto políticas compensatórias
adotadas para aliviar e remediar as condições resultantes
de um passado discriminatório, cumprem uma finalidade
pública decisiva ao projeto democrático, que é a de
assegurar a diversidade e a pluralidade social. Trata-se
de medidas concretas que viabilizam o direito à igualdade,
com a crença de que a igualdade deve se moldar no
respeito à diferença e à diversidade. Através delas
transita-se da igualdade formal para a igualdade material
e substantiva.279
De acordo com Joaquim Barbosa as ações afirmativas são:
um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter
compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com
vistas ao combate à discriminação racial, de gênero e de
origem nacional, bem como para corrigir os efeitos
presentes da discriminação praticada no passado, tendo
por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade
de acesso e bens fundamentais como a educação e o
emprego.280
Segundo José Antônio da Silva281, “consiste em superar as desigualdades
sociais e regionais e instaurar um regime que realize a justiça social”.
278
PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad, 2003. P. 199/200. 279
Idem. P. 199/200. 280 GOMES, Joaquim Babosa. Ação afirmativa: princípio constitucional da igualdade. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 40. 281
SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros. 2005. p.122.
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Assinala a ilustre Professora de Minas Gerais, Carmen Lucia Antunes
Rocha282, atuamente Ministra do Supremo Tribunal Federal “conclui-se,
então, que proibir a discriminação não era o bastante para se ter a efetividade
do princípio da igualdade jurídica”.
Em 11 de fevereiro de 2011, afirmou o ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF), Luiz Fux,283 no Senado Federal, "As ações afirmativas evitam a
institucionalização das desigualdades".
Afirmou ainda o Ministro Luiz Fux,284 "Não basta afirmar que todos são
iguais perante a lei", lembrando que essas políticas combatem a
"institucionalização das desigualdades".
5. O PRINCÍPIO DA IGUALDADE NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988:
Prescreve o caput do art. 5º da nossa Constituição Federal de 1988:
"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à igualdade, a segurança e a propriedade, (...)".
Veja-se, portanto que o princípio da igualdade tem sede explícita no texto
constitucional, sendo também mencionada inclusive no Preâmbulo da
Constituição. Destarte, é norma supraconstitucional; estamos diante de um
princípio, direito e garantia, para o qual todas as demais normas devem
obediência.
Tal preceito constitucional não é algo inédito, pois semelhantes preceitos
fizeram-se presentes em todas as constituições que orientam o ordenamento
282
GOMES, Joaquim B. Barbosa,SILVA, Fernanda Duate L. Silva, As Ações Afirmativas e os Processos de Promoção de
Igualdade Efetiva, http://w3.ufsm.br/afirme/ARTIGOS/variados/var02.pdf, p. 4, Acesso em 27/11/2011, às 12:26. 283 http://www.generoracaetnia.org.br/noticias/item/495-11/02/2011-novo-ministro-do-stf-luiz-fux-apoia-cotas-e-terras-
quilombolas.html acesso em 27/11/2011 äs 10:18. 284
Idem.
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jurídico dos Estados Modernos. O insigne José Afonso da Silva285, já dizia que
"porque existem desigualdades, é que se aspira à igualdade real ou material
que busque realizar a igualização das condições desiguais", portanto, o fim
igualitário, a muito já era buscado.
A igualdade de todos os seres humanos, proclamada na Constituição
Federal, deve ser encarada e compreendida, basicamente sob dois pontos de
vista distintos, quais sejam: o da igualdade material e o da igualdade formal.
5.1 Igualdade Material
O entendimento da igualdade material, deve ser o de tratamento
eqüânime e uniformizado de todos os seres humanos, bem como a sua
equiparação no que diz respeito à possibilidades de concessão de
oportunidades. Portanto, de acordo com o que se entende por igualdade
material, as oportunidades, as chances devem ser oferecidas de forma
igualitária para todos os cidadãos, na busca pela apropriação dos bens da
cultura.
A igualdade material teria por finalidade a busca pela equiparação dos
cidadãos sob todos os aspectos, inclusive o jurídico, podendo-se afirmar:
Todos os homens, no que diz respeito ao gozo e fruição de direitos, assim
como à sujeição a deveres.
Na nossa Constituição Federal de 1988, podemos encontrar vários textos
que estabelecem normas pragmáticas que visam nivelar e diminuir as
desigualdades reinantes.
De acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello,
[...] o reconhecimento das diferenciações que não podem
ser feitas sem quebra da isonomia se divide em três
questões:
285 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo.10ª. ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 54..
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a) a primeira diz com o elemento tomado como fator de
desigualação;
b) a segunda reporta-se à correlação
lógica abstrata existente entre o fator erigido em critério
de discrímen e a disparidade estabelecida no tratamento
jurídico diversificado;
c) a terceira atina à consonância desta
correlação lógica com os interesses absorvidos no
sistema constitucional e descarte juridicizados.286
Segundo o Walter Claudius Rothenburg:
nessa diferenciação entre igualdade formal (de direito) e
material (de fato), reproduz-se a distância entre o
esperado (no plano normativo) e o acontecido (no plano
da realidade), e a distinção correspondente a uma
suposta diferença entre teoria (igualdade formal) e prática
(igualdade material).287
Observamos, então, que a Constituição Federal vigente, em vários
enunciados, preconiza o nivelamento das desigualdades materiais, entretanto,
a observação das desigualdades sócio-econômicas no mundo fático, nos
mostram que o princípio constitucional e as normas que procuram diminuir as
desigualdades materiais, são impunemente desrespeitadas. Portanto, os
preceitos que visam estabelecer a igualdade material, primam pela
inefetividade ou ineficácia; e como exemplo podemos citar as leis que nos
últimos anos têm estipulado os salários mínimos.
5.2 Igualdade Formal
Dispõe o art. 5º da CF/88 que "igualdade de todos perante a lei. Esta é a
igualdade formal, que mais imediatamente interessa ao jurista. Essa igualdade
286 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 21-20. 287
ROTHENBURG, Walter Claudius. Igualdade Material e Discriminação Positiva: o Princípio da Isonomia. Disponível em:
http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/files/journals/2/articles/32745/public/32745-40386-1-PB.pdf acesso em: 22 nov. 2011.
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seria a pura identidade de direitos e deveres concedidos aos membros da
coletividade através dos textos legais.
A teoria constitucional tradional herdada do pensamento de Locke,
Rousseau e Montesquieu, é responsável pelo florescimento de uma concepção
meramente formal de igualdade, a chamada igualdade perante a lei.
A Constituição Federal de 1988 apresenta vários dispositivos que
demonstram o repúdio do constituinte pela igualdade meramente processual
peo contrário opta pela concepção de igualdade dita material.
A título de exemplo, os artigos 3º, 7º, XX; 37, VIII e 170 dispõem:
“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil:
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;
(...)
III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir
as desigualdades sociais e regionais.”
“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa, tem pro fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames
da justiça social, observados os seguintes princípios:
(...)
VII – redução das desigualdades regionais e sociais
(...)288
288 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
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Fica evidente , a maior preocupação do legislador constituinte originário
com os direitos e garantias fundamentais, bem como com a questão da
igualdade, especialmente a implementação da igualdade material.
Observa-ser portanto, que a Constituição Federal de Brasileira de 1988
não se imita a proibir a discriminação, afirmando a igualdade, mas permite,
também, a utilização de medidas que efetivamente implementem a igualdade
material.
De acordo com o professor Ingo Wolfgang Sarlet:
O princípio da igualdade encontra-se diretamente
ancorado na dignidade da pessoa humana, não
sendo por outro motivo que a Declaração Universal
da ONU consagrou que todos os seres humanos
são iguais em dignidade e direitos. Assim, constitui
pressuposto essencial para o respeito da dignidade
da pessoa humana a garantia da isonomia de todos
os seres humanos, que, portanto, não podem ser
submetidos a tratamento discriminatório e arbitrário,
razão pela qual não podem ser toleradas a
escravidão, a discriminação racial, perseguições por
motivo de religião, sexo, enfim, toda e qualquer
ofensa ao princípio isonômico na sua dupla
dimensão formal e material.289
A doutrina tradicional, sintetizando, preconizou que o conteúdo de tal
preceito seria o de dar tratamento diverso para pessoas desiguais; entretanto,
não precisou ou esclareceu em que circunstâncias e em que medida seria
constitucionalmente admissível que a lei desigualasse. A idéia de igualdade
serve também para determinar, razoavelmente e não arbitrariamente, que grau
de desigualdade jurídica de trato entre dois ou mais sujeitos é tolerável. A
igualdade é um critério que mede o grau de desigualdade juridicamente
admissível.
289SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2001, p. 35.
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O próprio STF preconiza exceções ao princípio da igualdade
afirmando de que "a igualdade perante a lei que a Constituição Federal
assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes no País, não compreende a
União e as demais pessoas de direito público, em cujo favor pode a lei
conceder privilégios impostos pelo interesse público sem lesão a garantia
constitucional".
O Ex Presidente do Supremo Tibunal Federal (STF), Ministro do Supremo
Tribunal Federal Gilmar Mendes afirma que:
“...se, por um lado, a clássica concepção liberal de
igualdade como valor meramente formal há muito foi
superada, em vista do seu potencial de ser um meio de
legitimação da manutenção de iniquidade, po outro lado o
objetivo de se garantir uma efetiva igualdade meterial
deve sempre levar em consideração a necessidade de se
respeitar os valores constitucionais”.290
Destarte, a doutrina vem reconhecendo que o princípio da isonomia traz a
autorização, mesmo que implícita, para que o Estado erija tratamento desigual
desde que o faça justificadamente.
O eminente Celso A. Bandeira de Mello, na sua obra Conteúdo Jurídico do
Princípio da Igualdade, na qual ele nos proporciona numerosos exemplos ao
leitor, que lhe permitem perceber em que casos é possível a discriminação e,
ao contrário quando é vedado discriminar.
Na lição deste ilustre autor:
o reconhecimento das diferenças que não podem ser
feitas sem quebra da isonomia se divide em três
questões:
a) a primeira diz com o elemento tomado como fator de
desigualação (fator de discrímen);
b) a segunda reporta-se a correlação lógica abstrata
existente entre o fator erigido em critério de discrímen e a
disparidade estabelecida no tratamento jurídico
diversificado;
290 MENDES, Gilmar, A Jurisdição constitucional no Brasil e seu significado para liberdade e igualdade http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaartigodiscurso/anexo/munster_port.pdf , pag 6, acessado em 27/11/2011, äs 10:54
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c) a terceira atina à consonância desta correlação lógica
com os interesses absorvidos no sistema constitucional e
destarte juridicizados.291
É importante destacar que a norma deve observar cumulativamente
esses três aspectos para ser inobjetável em face do princípio da igualdade, eis
que mesmo que o legislador ao disciplinar as relações por meio de critérios
discricionários o deve fazer sem contrariar valores constitucionais.
Para J. J. Gomes Canotilho haverá observância da igualdade:
quando indivíduos ou situações iguais não são
arbitrariamente (proibição do arbítrio) tratados como
desiguais. Por outras palavras: o princípio da
igualdade é violado quando a desigualdade de
tratamento surge como arbitrária". E segue o ilustre
autor, esclarecendo que "existe uma violação
arbitrária da igualdade jurídica quando a disciplina
jurídica não se basear num: (I) fundamento sério; (II)
não tiver um sentido legítimo; (III) estabelecer
diferenciação jurídica sem um fundamento
razoável.292
A igualdade perante a lei, contudo, pressupondo lei já elaborada, traduz
imposição destinada aos demais poderes estatais, que, na aplicação da norma
legal, não poderão subordiná-la a critérios que ensejem tratamento seletivo ou
discriminatório.
O Ex Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes,293
citando Robert Aley afirma que: “ não se deve esquecer neste ponto, o que
Aley trata como paradoxo da igualdade, no sentido de que toda igualdade de
direito tem por consequencia uma desigualde de fato de toda desigualdade de
fato, tem como pressuposto uma desigualdade de direito”.
291 MELLO, Celso Antônio Bandeira. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3ª.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. P. 21- 20. 292 GOMES, Canotilho e MOREIRA, Vital. Constituição da República Portuguesa Anotada. Coimbra. 2000, p. 61.
293 MEDES, Gilmar A Jurisdição constitucional no Brasil e seu significado para liberdade e igualdade
http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaartigodiscurso/anexo/munster_port.pdf , p. 6, acessado em 27/11/2011, äs 11:10
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Assim, podemos concluir que a caracterização da violação ao princípio da
igualdade deve de ser criteriosamente analisado à luz do caso concreto
apresentado. Sendo que os critérios apriorísticos listados apenas limitam-se a
tracejar os indícios de uma potencial agressão, a qual se evidenciará ou não
após uma efetiva avaliação do trato legal escolhidos e suas conseqüências
perante o ordenamento constitucional, sendo portanto de relevante importância
a atividade a ser desempenhada pelo intérprete e aplicador da lei questionada,
A eventual inobservância desse postulado pelo legislador imporá ao ato
estatal por ele elaborado e produzido a eiva de inconstitucionalidade. Essa lei,
contudo - de resto qualquer outra dentro do nosso ordenamento jurídico - é
presumida constitucional, até que, por decisão de órgão judiciário competente,
se lhe recuse validade, quer no plano formal, quer sob o aspecto material.
6. AÇÕES AFIRMATIVAS E OS DIREITOS HUMANOS
O fundamento do Direito Internacional dos Direitos Humanos está na
obrigação que todos os Estados possuem de respeitas os direitos humanos e
de protestar, caso estes estejam sendo violados. A competência para legislar e
decidir em matéria de direitos humanos não pode ser, exclusivamente, da
jurisdição interna de cada nação, até porque o interesse pela causa dos direitos
humanos é mundial.
De acordo com a doutrinadora Flávia Piovesan:
[...] fortalece-se a ideia de que a proteção dos direitos
humanos não se deve reduzir ao domínio reservado do
Estado, isto é, não deve se restringir à competência
nacional exclusiva ou à jurisdição doméstica exclusiva,
porque revela tema do legítimo interesse internacional.
Por sua vez, esta concepção inovadora aponta para duas
importantes consequências;
1) A revisão da noção tradicional de
soberania absoluta do Estado, que passa a sofrer um
processo de revitalização, na medida em que são
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admitidas intervenções no plano nacional, em prol da
proteção dos direitos humanos; isto é, permitem-se
formas de monitoramento e responsabilização
internacional, quando os direitos humanos forem violados;
2) A cristalização da ideia de que o
indivíduo deve ter direitos protegidos na esfera
internacional, na condição de sujeito de Direito.294
O Direito Internacional dos Direitos Humanos é um ramo do Direito
Internacional que, indubitavelmente, vem conquistando considerável espaço na
ordem jurídica global, principalmente, a pós a segunda metade do século XX,
momento da História em que a pessoa humana tem ganhado maior importância
como sujeito de direito internacional.
Com o tempo, contudo, viu-se que era preciso ir além do que já se havia
conquistado, ampliando a proteção dos sujeitos de direitos às suas reais
necessidades, abrangendo suas particularidades, suas características
singulares, para a promoção da igualdade, agora não mais apenas formal, e
sim, material. Nas palavras de Flávia Piovesan:
[...] vale dizer, na esfera internacional, se uma primeira
vertente de instrumentos internacionais nasce com a
vocação de proporcionar uma proteção geral, genérica e
abstrata, refletindo o próprio temor da diferença, percebe-
se, posteriormente, a necessidade de conferir a
determinados grupos uma proteção especial e
particularizada, em face de sua própria vulnerabilidade.
Isso significa que a diferença não mais seria utilizada para
a aniquilação de direitos, mas, ao revés, para a sua
promoção.295
294 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. 2. Ed. Atual. São Paulo: Max Limonad, 2003. p. 32.
295 PIOVESAN. Flávia. Ações Afirmativas da perspectiva dos direitos humanos, publicado em: Cadernos de Pesquisa, São Paulo,
v.35, n. 124, jan/abril.2005, pg. 46. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?scrit=s0100-15742005000100004 Acesso em:
14 out. 2009.
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Nesse contexto, importante mencionar o entendimento do Ministro do
Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello, em palestra proferida em 20
de novembro de 2001, no seminário “Discriminação e Sistema Brasileiro”:
Do artigo 3º vem-nos luz suficiente ao agasalho de uma
ação afirmativa, a percepção de que o único modo de se
corrigir igualdades é colocar o peso da lei, com a
imperatividade que ela deve ter em mercado
desequilibrado, a favor daquele que é discriminado, que é
tratado de forma desigual. Nesse preceito são
considerados como objetivos fundamentais da nossa
República: primeiro, construir – preste-se atenção a esse
verbo – uma sociedade livre, justa e solidária; segundo,
garantir o desenvolvimento nacional – novamente temos
aqui o verbo a conduzir, não a uma atitude simplesmente
estática, mas a uma posição ativa; erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e
regionais; e, por último, o que nos interessa, promover o
bem de todos, sem preconceitos de origem, raça e sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Pode-se afirmar, sem receio de equivico, que se passou
de uma igualização estática, meramente negativa, no que
se proíbe a discriminação, para uma igualização eficaz,
dinâmica, já que os verbos “construir, “garantir”, erradicar”
e “promover” implicam em si, mudanças de ótica, ao
denotar “ação”. Não basta não discriminar. É preciso
viabilizar e encontrar, na Carta da República, base para
fazê-lo – as mesmas oportunidades. Há de ter-se como
página virada o sistema simplesmente principiológico. A
postura deve ser, acima de tudo, afirmativa.296
A incorporação da normas internacionais que protegem os direitos
humanos no ordenandomento jurídico é assunto polêmico e que enseja
discussões desde a promulgação da Constituição Federal de 1988.
Dispõe o artigo 5º, e seus parágrafos 2º e 3º , dispõe que: 296 MELLO, Marco Aurélio. Ótica Constitucional: A Igualdade e as Ações Afirmativas. In: MARTINS, Ives Gandra Silva (Coord.). As
vertentes do Direito Constitucional Contemporâneo. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2002. P. 39.
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Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não
excluem outros decorrentes do regime e dos princípios
por ela adotados, ou dos tratados internacionais sobre
direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do
Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos
votos dos respectivos membros, serão equivalentes às
emendas constitucionais.
O Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes,297 citando
Kelsen afirma que, “devemos a Kelsen a associação sistemática da jurisdição
constitucional ao aspecto importante do conceito de democracia, que é
exatamente, a possibilidade de sobrevivência e de proteção das minorias. Para
o Mestre de Viena, não se legitima pela verdade, mas, sim, pelo bom senso”.
7. CONCLUSÃO
A título de considerações finais podemos afirmar que a isonomia ou
igualdade não é apenas um princípio de Estado de Direito, mas também um
princípio de Estado Social; é o mais vasto dos princípios constitucionais, sendo
impositivo em todos os recantos, constituindo-se num princípio jurídico
informador de toda a ordem constitucional. Está inserido na Constituição não
com função meramente estética, ou servindo como adorno dela, mas constitui-
se princípio que tem plena eficácia e deve ser respeitado, pois caso contrário,
estaremos diante de uma inconstitucionalidade e ao Poder Judiciário cabe o
dever de sufragar inconstitucionalidades para que não venhamos a chegar ao
nível da banalização dos princípios constitucionais. Sendo que a prática
preconceituosa de raça, de classe, de gênero ofendem não só a Constituição
(princípio), mas também ofendem a substantividade do ser humano e nega
radicalmente a democracia.
A interpretação desse princípio deve levar em consideração a existência
de desigualdades de um lado, e de outro, as injustiças causadas por tal
situação, para, assim, promover-se uma igualização. É dispositivo
constitucional que por um lado representa promessa legislativa de busca da
297 MEDES, Gilmar A Jurisdição constitucional no Brasil e seu significado para liberdade e igualdade
http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaartigodiscurso/anexo/munster_port.pdf , p. 8, acessado em 27/11/2011, äs 11:30.
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igualdade material e, por outro, mostra a necessidade da conscientização de
que promover a igualdade é, também, levar-se em consideração as
particularidades que desigualam os indivíduos.
Sua razão de existir certamente é a de propiciar condições para que se
busque realizar pelo menos certa igualização das condições desiguais.
Acreditamos também, que a efetiva igualdade entre os cidadãos não advirá de
medidas paliativas, mas sim de mudanças sociais profundas que, ainda que
necessitem de um longo prazo para a sua implementação, sejam revestidas de
solidez inabalável e representem o ideal do estado democrático de direito, que
provê aos cidadãos as mesmas oportunidades.
Nesse sentido, as ações afirmativas são importante instrumento de luta
pela conquista da igualdade material, para fazer a inserção das minoria no
mercado de trabalho e na educação sociedade especialmente a população
negra, que até hoje sofre com o reflexo da discriminação racial.
O referido princípio é norma voltada quer para o legislador, quer para o
aplicador da lei, pois não é só diante da norma posta que se devem nivelar os
indivíduos, mas também no momento de elaboração desta norma. Seu
conteúdo é de máxima amplitude, abrangendo todas as normas do
ordenamento jurídico, inclusive aquelas que dizem respeito a igualdade
material. Por fim, a igualdade deve dar-se não só perante a lei, mas também
perante o Direito, perante a justiça, perante os escopos sociais e políticos,
perante enfim às dimensões valorativas do Direito. Destarte, o princípio da
igualdade sob o ponto de vista jurídico-constitucional, assume relevo enquanto
princípio de igualdade de oportunidades e de condições reais de vida.
As ações afirmativas, enquanto políticas compensatórias adotadas para
aliviar e remediar as condições resultantes de um passado discriminatório,
cumprem uma finalidade pública decisiva ao projeto democrático, que é a de
assegurar a diversidade e a pluralidade social. Trata-se de medidas concretas
que viabilizam o direito à igualdade, com a crença de que a igualdade deve se
moldar no respeito à diferença e à diversidade. Através delas transita-se da
igualdade formal para a igualdade material e substantiva.
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1998.
_________. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. Vol. II.
Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1999.
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SANÇÕES ADMINISTRATIVAS NO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR
Luiz Henrique Santos da Cruz
Advogado Trabalhista, Cível, Consumidor e Empresarial
Mestrando em Direito Empresarial e Cidadania do Centro Universitário Curitiba
UNICURITIBA- CURITIBA- PR
Email- [email protected]
RESUMO
Diversos setores da econômia, como alimentação, saúde, prestação de
serviços, preços, abastecimento, defesa da concorrência entre outros, de
alguma forma possam ter o consumidora como sujeito tutelado, passaram a ter
normas que rugulamentavam suas atividades e atuação. Algumas dessas
normas delegavam a esses órgãos poder para fiscalizar e mesmo impor
eventuais sanções administrativas. A partir de então, diversos áreas e setores,
multiplicaram-se normas que viabilizaram a imposição de sanções
administrativas em defesa do consumidor. O código de Defesa do Consumidor
tratou especificadamente das sanções administrativas em seu Capítulo VII, que
compreende os artigos 55 a 60. A sanção portanto, poderá desenvolver na
sociedade funções repressivas, reparatórias ou mesmo educativas,
desestimulando o ofensor ou pontenciais ofensor de cometerem igual conduta
infrativa.
Palavras-chave: Sanção Administrativa, Defesa do Consumidor, Práticas
Infracionais.
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I- INTRODUÇÃO
O direito do consumidor enquanto direito fundamental de prestação
exige a realização do dever estatal de proteção ao cidadão-consumidor e a
conseqüente necessidade de realização de políticas públicas de defesa do
consumidor compatíveis com a realidade multidisciplinar do mercado de
consumo.
No Código de defesa do Consumidor, as sanções administrativas
são abrangentes e varia desde a aplicação de multa até a inutilização,
apreensão do produto, suspensão do fornecimento ou atividade (produtos ou
serviços), revogação ou cassação de registros, licenças e alvarás de
funcionamento, interdição parcial ou total de estabelecimento, obra ou
atividade, intervenção administrativa e até imposição de contrapropaganda.
Uma vez reconhecida à autoridade necessária para
aplicação da multa, estabelece-se os valores pecuniários. O CDC, em seu
artigo 57, destaca em único parágrafo que a multa será aplicada em montante
não inferior a 200 UFIRs e nunca superior a Três milhões de Unidade Fiscal de
Referência. O problema é que o legislador consumerista trata o assunto
genericamente, não personifica ou detalha caso a caso.
Este parâmetro de prudência nos desperta para a garantia
constitucional da individualização da pena, consagrada no artigo 5º (inc.XLVI,
letra c), levando-se em conta a gravidade do ato contra o consumidor. Portanto,
se para a gradação da multa a autoridade deve levar em conta a gravidade da
infração e outras situações decisivas, (tais como vantagem auferida, condição
econômica do fornecedor), também é necessário avaliar a capacidade que
determinado produto ou serviço terá em satisfazer o caráter sócio-educativo da
multa ou outras sanções que porventura possam ser aplicadas, com a garantia
de que tais atos lesivos não mais se repitam, sem prejuízo da continuação da
atividade produtiva, pois o CDF, em última análise, harmoniza as relações de
consumo e esse processo abrange consumidores e fornecedores.
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II- CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
As sanções administrativas na defesa do consumidor não são
contemporâneas ao sugimento do Código de Defesa do Consumidor (Lei n°
8.078/90). É antiga a preocupação da administrativas pública com a tutela dos
cidadãos consumidores, sobretudo no que diz respeito à qualidade e
segurança de produtos e serviços colocados no mercado de consumo.
Vitor de Morais Andrande, afirma que:
Uma das primeiras possibilidades de aplicação de
sanção administrativa em defesa do consumidor que
encontramos a partir da década de 60 está definida
pela Lei n° 4.137, de 10 de setembro de 1962., que
"regula a repressão ao abuso do poder econômico",
e pelo Decreto n° 52.025, de 20 de maio de 1963,
"que aprovao regulamento da Lei n°4.137", normas
que, ainda de forma mediata, estabelecem a
possibilidade de imposição de sanção administrativa
em defesa do consumidor.298
Conforme o artigo 56 do Código de Defesa do Consumidor, todas
essas sanções podem ser aplicadas cumulativamente.
O professor Daniel Ferreira conceitua sanção administrativa:
Mantem-se como conceito de sanção administrativa
o outrora proposto: “a direta e imediata
consequência jurídica, restritiva de direitos, de
caráter repressivo, a ser imposta no exercício da
função administrava, em virtude de um
comportamento juridicamente proibido, comissivo ou
omissivo”.299
298
ANDRADE, Vitor de Morais. Sancoes administrativas no codigo de defesa do consumidor. São Paulo :Atlas, 2008, p. 69 299
FERREIRA, Daniel. Sanções administrativas. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 34.
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Segundo o Professor Daniel Ferreira a finalidade da sação
Administrativa é 300 "desestimular condutas administrativamente reprováveis".
O CDC, em seu artigo 57, destaca em único parágrafo que a
multa será aplicada em montante não inferior a 200 UFIRs e nunca superior a
Três milhões de Unidade Fiscal de Referência. O problema é que o legislador
consumerista trata o assunto genericamente, não personifica ou detalha caso a
caso.
Este parâmetro de prudência nos desperta para a garantia
constitucional da individualização da pena, consagrada no artigo 5º (inc.XLVI,
letra c), levando-se em conta a gravidade do ato contra o consumidor. Portanto,
se para a gradação da multa a autoridade deve levar em conta a gravidade da
infração e outras situações decisivas, (tais como vantagem auferida, condição
econômica do fornecedor), também é necessário avaliar a capacidade que
determinado produto ou serviço terá em satisfazer o caráter sócio-educativo da
multa ou outras sanções que porventura possam ser aplicadas, com a garantia
de que tais atos lesivos não mais se repitam, sem prejuízo da continuação da
atividade produtiva, pois o CDF, em última análise, harmoniza as relações de
consumo e esse processo abrange consumidores e fornecedores.
III- SISTEMA NACIONAL DE INFORMAÇÕES DE DEFESA DO
CONSUMIDOR – SINDEC
O Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor -
SINDEC é um exemplo concreto e positivo do uso de novas tecnologias na
efetivação da Política Nacional das Relações de Consumo (arts. 4 e 5 do
Código Brasileiro de Proteção e Defesa do Consumidor - CDC) diante da
crescente complexidade do processo de globalização; visa integrar em rede as
ações e informações do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor - SNDC e
viabilizar uma atuação harmônica, estratégica e qualificada do SNDC. a
necessidade de efetivação do artigo 5º do CDC com a implantação de
instituições especializadas na peculiar e multidisciplinar defesa do consumidor
enquanto direito fundamental (CF, art. 5. XXXII) e a importância das novas
tecnologias para o alcance desta meta.
Apresenta-se a Política Nacional das Relações de Consumo –
300
Idem, ibidem, p. 44.
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PNRC e os principais órgãos constitutivos do SNDC, suas respectivas funções
e modo de atuação.
Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor
(SINDEC), que é um software que integra, em rede, as ações e informações da
defesa do consumidor. Ele representa o trabalho do Coordenador do SINDEC e
dos PROCONs integrados e forma um todo harmônico para proteção
estratégica e qualificada dos consumidores de nosso país.
Analisa-se o desafio de garantir que um Sistema formado por
órgãos plurais e autônomos, sem uma hierarquia e sem vinculações
formalmente estabelecidas, funcione como um sistema de fato e qual o papel
do SINDEC como ferramenta para que os órgãos integrantes do SNDC
disponibilizem meios eficazes de atendimentos, dando maior celeridade para
atender às demandas dos consumidores, além de publicar, de forma eficaz e
simultânea, os seus Cadastros de Reclamações Fundamentadas e
disponibilizá-los na rede mundial de computadores a todos os cidadãos
consumidores.
Verifica-se que a adesão de todos os Estados brasileiros à nova
tecnologia materializada no SINDEC potencializará a atuação fundamentada e
articulada indispensável à efetivação dos direitos consumeristas e determinada
pela PNRC. Observa-se, entretanto, que o cidadão ainda desconhece o
SINDEC e, por conseqüência, esta nova tecnologia disponível desde 2002
ainda é subutilizada.
Leonardo Roscoe Bessa ao tratar do SINDEC afirma que:
O SINDEC institui uma base de dados nacional e
estadual que disponibiliza informações e gráficos em
tempo real, cria novos mecanismos para a inclusão
dos órgãos municipais e ainda estabelece a base
tecnológica necessária para a elaboração de
Cadastros Estaduais e Nacional de Reclamações
Fundamentadas, previsto no Código de Defesa do
Consumidor.
O acesso às informações assegura aos
consumidores e fornecedores transparência do dia-
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adia das relações de consumo. É um grande
instrumento de controle social, que, mediante o
exercício do direito à escolha, pode incentivar o
respeito aos direito dos consumidores e, portanto, a
construção de um mercado de consumo mais
equilibrado.301
O Sistema Nacional de Defesa do Consumidor - SNDC, positivado
através dos artigos 105 e 106 do CDC e integrado pelos órgãos federais,
estaduais, do Distrito Federal e municipal e pelas entidades privadas de defesa
do consumidor, é a materialização do espírito sistêmico-agregador que norteia
todo o CDC a partir da ampla e audaciosa PNRC. É coordenado pelo
Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - DPDC, órgão vinculado
à Secretaria de Direito Econômico, do Ministério da Justiça do Brasil.
IV- O DECRETO Nº 2181/97 E AS SANÇÕES ADMINITRATIVAS
O Decreto nº 2181/97 tem uma função primordial no trato da
relação consumerista, pois dispõe sobre a organização do Sistema Nacional de
Defesa do Consumidor (SNDC), bem como estabelece normas gerais de
aplicação das Sanções Administrativas previstas na Lei nº 8078/90 de 11 de
setembro de 1990.
Nesse contexto, é salutar dizer que o SNDC se estrutura da
seguinte forma: uma Secretaria de Direito Econômico do Ministério (SDE) que
atua mediante o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) e
demais órgãos federais, estaduais, distritais e municipais, desde que criados
pelos seus entes federados e as entidades civis de defesa do consumidor.
Assim, cada ente federado criará, por lei, seus referidos órgãos e
entidades civis para executar sua política de proteção e defesa do consumidor,
fiscalizar as relações de consumo e processar reclamações de forma
fundamentada, funcionando como instância de instrução e julgamento no
301
BESSA, Leonardo Roscoe. Sistema Nacional de Defesa do Consumidor. In: BENJAMIM, Antônio Herman
V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do consumidor. São Paulo:
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âmbito de sua competência nos processos administrativos. Além disso,
devendo elaborar e divulgar, anualmente, no âmbito de sua competência, o
cadastro de reclamações contra fornecedores de produtos e serviços,
remetendo cópia ao DPDC (Departamento de Proteção e Defesa do
Consumidor) para que fiscalize a aplicação das Sanções Administrativas e
elaborar o cadastro nacional de reclamações contra fornecedores de produtos
e serviços.
V- PRÁTICAS INFRACIONAIS NO DECRETO N º 2181/97
Heraldo Garcia Vita em Dissertação de Mestrado - Sanções
Administrativas, PUC, São Paulo- 2002. Orientador- Celso Antônio Bandeira
de Mello, apresentado em 01/05/2002 afirma que:
Ilícito administrativo é o descumprimento de dever
pelo destinatário da norma jurídica, cuja sanção
pode ser imposta por autoridade administrativa, no
exercício da função administrativa, em virtude de o
ordenamento jurídico lhe conferir tal competência.
Para a configuração do ilícito administrativo, é
preciso que o infrator (pessoa física, inclusive
menor) tenha agido voluntariamente e com dolo ou
culpa. A pessoa jurídica pode sofrer penalidade
administrativa. Excluem o ilícito administrativo: o
caso fortuito e a força maior, os erros de direito e de
fato, as "causas de justificação do ilícito", a coação
irresistível, a ordem não manifestamente ilegal de
superior hierárquico e a insignificância da lesão. As
sanções existem para atemorizar os eventuais
infratores e têm, por fim específico, desestimular a
prática de condutas proibidas, sendo a punição mero
efeito da imposição da pena. Na supremacia
especial do Estado, pode haver casos em que ato
administrativo impõe conduta e penalidades.302
302
VITA, Heraldo Garcia- Dissertação de Mestrado, Sanções Administrativas.PUC, SP, 2002.
http://capesdw.capes.gov.br/capesdw/resumo.html?idtese=20021121 33005010019P5. Acesso em 10/05/2012.
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Pedro da Silva Krebs em Disertação de Mestrado apresentada,
no Mestrado em 01/12/2002- Direito da UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO
DOS SINOS- SINOS -UNISINOS, em Distinção entre a Sanção Penal e a
Sanção Administrativa: Uma Análise da Capacidade Sancionatória do Estado,
se pronuncia 303 “Sabe-se que as pessoas podem sofrer sanções sempre que
estas violarem normas de conduta, sendo que estas sanções podem se dar de
duas formas: administrativa ou penal”.
Desse modo, o fornecedor que, por ação ou omissão, tornar-se
infrator,
sujeitar-se-á às Sanções Administrativas previstas no CDC e no Decreto nº
2181/97. Valendo salientar que serão, no âmbito administrativo, os órgãos
oficiais integrantes do SNDC que aplicarão as penalidades supracitadas.
É importante descrever que as práticas infratoras são
consideradas, pelo Decreto, como sendo leves (aquelas em que forem
verificadas somente circunstâncias atenuantes) e graves (aquelas em que
forem verificadas circunstâncias agravantes). O que levam os órgãos
competentes a analisarem as circunstâncias atenuantes, agravantes e os
antecedentes do fornecedor infrator, tudo em busca da eficaz aplicação da lei e
justiça social.
304“... Teoria Geral da Infração Administrativa no sentido de que
somente a substancial violação da norma jurídica pode dar ensejo ao
reconhecimento de uma conduta como típica”.
Oscar Romara se posiciona no seguinte sentido:
El perjuicio resultante de lainfracción para el
consumidor o usuário, laposiciónenel mercado de
linfractor, lacuantiadel beneficio obtenido, el grado
de intencionalidade, lagravedad de losriescos, o
303
KREBES, Pedro da Silva- Dissertação de Mesterado, Distinção entre a Sanção Penal e a Sanção
Administrativa: Uma Análise da Capacidade Sancionatória do Estado. UNISINOS, RS 2002.
http://capesdw.capes.gov.br/capesdw/resumo.html?idtese=200211042007011005P9. Acesso em 10/05/2012.
304 FERREIRA, Daniel. Teoria Geral da Infração administrativa a partir da Constituição Federal de 1988. Belo
Horizonte: Fórum, 2009. p. 333.
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losperjuiciossociales derivados de lainfracción y
sugeneralización, lareincidencia y lasdemás
circunstancias relevantes delhecho.305
Como afirma Montoro Puerto:
la diferencia entre uni y otro ilícito vendrá
determinada por el ordenamiento infringido. [...]"
Llevada la cuestión, por tanto, al terreno del
ordenamiente jurídico, cabrá decir que existe un
ilícito penal cuando resulte infringido el
ordenamiente jurpidico general que el Derecho
Penal tutela: ilicito civil cuando sea infringido el
ordenamienteo jurpidico civil e ilicito administrativo
cuando la vulneración se referiera al ordenamiente
jurídico administrativo.306
Sobre as sanções administrativas assim se pronuncia 307Epstein
&Nickles: "In part because of the problems with private enforcement of
consumer rights, public agencies have assumed a major responsability for
consumer protection. A wide variety of Federal and state agencies have a wide
variety of responsabilities".
VI- SANÇÕES ADMINISTRATIVAS PREVISTAS NO CDC:
Uma das formas da atuação dos órgãos administrativos de
proteção e defesa do consumidor é a aplicação de sanções administrativas que
vem ganhando importância com um Sistema Nacional de Defesa do
Consumidor cada vez mais fortalecido e integrado.
305
ROAMARA, Oscar E. Y VázquezFerreyra, Roberto A. Protección y Defesa del Consumidor. Ed. Depalma, 1994,
Buenos Aires, p.134.
306 MONTORO Puerto, Miguel. Lá infracción administrativa. Barcelona: Nauta, 1965, p. 117-118.
307 Epstein, David &Nickles, Steven. Consumer Law.2° ed., Ed. West PublishingCo., 1990, p.11.
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Daniel Ferreira conceitua como sanção administrativa308 "a
efetiva consequência jurídica, restritiva de direitos, de caráter repressivo, a ser
imposta no exercício da função administrativa, em função de um
comportamento juridicamente proibido, comissivo ou omissivo".
Peres e Sanches definem sanção administativa:
mal juridico imposto ao administrativo que seja
responsável por uma conduta ilícita do ponto de
vista jurpidico ("un mal jurpidica que la
administración inflige a un administrado, responsable
de una conducta reprehensible antecedente. Son
penas en sentido técnico, impuestas por la
administración, utilizando sus prerrogativas y, por
ello, por medio de actos administrativos ejecutivos,
de modo que la realizacíon de las sanciones es
normal en todos los actos administrativos").309
João Batista de Almeida expõe o assunto:
“verificada a infração de norma contida em lei, abre
ensejo à incidência da aplicação, ao infrator, das
sanções administrativas, também previstas e
disciplinadas em diplomas legais. A legislação que
regulamenta o exercício do poder de polícia do
Estado, em geral, já enumera as normas de conduta,
as infrações e as sanções administrativas, de sorte
que o órgão fiscalizador correspondente está apto a
atuar concretamente.310
Ainda sobre o mesmo tema, Hélio Zaghetto Gama discorre:
308
FERREIRA, Daniel. Sanções administrativas. São Paulo: Malheiros, 2001, p.27. 309
PERES, Adolvo Carretero; SANCHES, Adolvo Carretero. Derecho administrativo sancionador. Madrid: Revista de
Derecho Provado, 1992. p. 151-152.
310 ALMEIDA, João Batista de. Manual de Direito do Consumidor. 2. ed., São Paulo: Saraiva, 2003, p. 146.
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As sanções administrativas são aplicáveis sem
prejuízo das demais de natureza civil, penal e outras
definidas em normas especiais segundo o mesmo
art. 56. São aplicadas pela autoridade administrativa,
no âmbito da sua atribuição legal, podendo ser
aplicadas cumulativamente, inclusive por medida
cautelar antecedente ou incidente de procedimento
administrativo. Tais sanções são impostas pela
Administração Pública aos fornecedores que se
comportam de forma contrária ao que está
disciplinado no CDC. Atendendo ao comando
constitucional de presença do Estado na defesa do
consumidor, o Código instituiu nos arts. 55 a 60 do
CDC, um sistema de sanções administrativas.311
312Enterria e Fernandez, afirmam que a sanção administrativa se
diferencia da penal "por um dado formal, la autoridad que las impone: aquéllas,
la Administración, éstos, los tribunales Penales".
O consumidor pode apresentar sua demanda perante o
PROCON e, ao mesmo tempo, ter em face do fornecedor uma ação judicial, já
que a atuação do PROCON não estará restrita à tentativa de composição entre
as partes com vistas à reparação de danos patrimoniais e morais. O PROCON
deverá examinar, principalmente, o reflexo coletivo do mau comportamento do
fornecedor o que, não necessariamente, estará sendo analisado na ação
judicial e há incomunicabilidade entre a responsabilidade civil, penal e
administrativa do fornecedor.
“A ordem jurídica se modificou e, hoje, nem sempre
estipula a sanção administrativa como a adequada e
necessária resposta jurídica ao ilícito administrativo,
a ponto mesmo de eventualmente autorizar o
trancamento de sua apuração em troca de algumas
obrigações, além da prévia recomposição do dano,
311
GAMA, Hélio Zaghetto. Curso de direito do consumidor. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 187. 312
ENTERRíA, Eduardo García de; FERNANDEZ, Tomáz-Ramón. Curso de derecho administrativo. 5. ed Madri:
Civitas, 1998. v. , p. 159.
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quando existente”. 313
314“O meio de que serve o Estado para obter comportamentos
conformes às condutas prescritas é o de ameaçar com uma sanção, que será
aplicada se houver desatendimento do facere ou do non facere estabelecidos”.
315Cassio M. C. Penteado Junior salienta que; “ Ocorre-nos, a
propósito, salientar de pronto, o sentido discricionário dessas sanções, sempre
que o CDC aao listá-las é indicativo de que cabe ao agente público, diante da
infraçõa, cominar a penalidade cabível, obervados os ditames de conveniência
e oportunidade”.
Sobre a aplicação das referidas penas, Vilaça Lopes leciona:
As sanções administrativas do Código de Defesa do
Consumidor vêm previstas no art. 56, cujo parágrafo
único estabelece que elas podem ser aplicadas
cumulativamente, inclusive por medida cautelar
antecedente e incidente de procedimento
administrativo. Em matéria de publicidade, a
cumulação seria somente da pena de multa com a
de contrapropaganda. As demais sanções seriam
inaplicáveis. (...) A pena de multa vem tratada no art.
57, que determina alguns parâmetros para a sua
graduação, tais sejam: a) vantagem auferida e b)
condição econômica do fornecedor.316
Como bem pontuou o Prof. Fábio Medina Osório:
O Direito Administrativo Sancionador pode incidir em
313
FERREIRA DANIEL , 2009, p. 332. 314
MELLO, Celso Antônio Bandeira. Grandes Temas de Direito Administrativo. São Paulo, Malheiros, 2009. p. 362. 315
CASSIO, M.C. Pentedado Juniro. Sanções Administrativas no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo, Justiliana- BDJur, p. 153. 316
VILAÇA LOPES, Maria Elizabete. O consumidor e a publicidade. REVISTA DE DIREITO DO CONSUMIDOR, nº
01. Janeiro de 1992. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: Instituto Brasileiro De Política E Direito Do
Consumidor, p. 178.
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campos distintos, v. g., ilpicitos fiscais, tributários,
econômicos, de polícia, de trânsito, atentatórios à
saúde pública, urbanismo, ordem pública, e qualquer
campo que comporteuma atuação fiscalizadora e
repressiva do Estado.317
Vitor Morais de Andrade em Dissertação de Mestrado, PUC, SP
– Sanções Administrativas no Código de Proteção e Defesa do Consumidor,
Orientador, Marcelo Gomes Sodré, apresentada em 01/12/2005 afirma que:
... Constatamos a total ausência de sistematização
por parte dos órgãos administrativos pertencentes
ao Sistema Nacional de Defesa do Consumidor que
aplicam sanções administrativas com base do
código do consumidor, gerando inúmeras dúvidas e
conflitos a exemplo da divergência de atribuições
entre agências reguladoras, órgãos setoriais (Ipem,
Inmetro, etc) e os órgãos administrativos de
proteção e defesa do consumidor (eminentemente
os Procons); a problemática da multiplicidade de
sanções aplicadas por órgãos de proteção e defesa
do consumidor de Municípios e Estados Diversos,
dentre outros temas.318
Vitor de Morais Andrande, citando o Professor Daniel Ferreira:
317
OSÓRIO, Fábio Medina. Direito administrativo sancionador, Revista dos Tribunais, 2000, p. 17.
318 ANDRADE, Vitor de Morais, Dissertação de Mestrado, 2005 PUC, SP. Sanções Administrativas no Código de
Proteção e Defesa do Consumidor.
http://capesdw.capes.gov.br/capesdw/resumo.html?idtese=2005230333005010019P5. Acesso em 10/05/2012.
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DANIEL FERREIRA classifica as sanções
administrativas em: "a) Sanções Reais - são as
pecuniárias (multas) e as que, por sua natureza
gravam coisas, possuindo natureza real (e. g. as de
perda de bens, interdição de estabelcimento, etc); b)
sanções pessoais - são todas as demais, ou seja, as
que atingem a 'pessoa' do sujeito passivo da sanção
(infrator ou responsável), nelas se incluindo, por
exemplo, as de prisão, de suspensão da atividade,
etc. (In: FERREIRA, Daniel. Sanções
administrativas. 1999. Dissertação (Mestrado) -
Pontíficia Universidade Católica de São Paulo, p.
41).319
O Código distingue, basicamente, três modalidades de sanções
administrativas: a) Sanções Pecuniárias; b) Sanções Objetivas; c) Sanções
Subjetivas
De modo geral, as normas do Estatuto do Consumidor são
autoaplicáveis, ou seja, incidem desde o momento de sua vigência, sem
necessidade de prévia regulamentação portanto. É o caso, por exemplo, dos
direitos dos consumidores, das normas relativas às tutelas especificas, dos
tipos penais etc.
320 “ Portanto, para que o ato administrativo sancionador seja
válido, mister estrita observância aos princípios da legalidade, da presunção de
nocência e da segurança jurídica”.
O Professor de Direito Daniel Ferreira ao discorrer sobre a
definição da sanção imponível, sua intensidade e o "excesso de punição",
destaca:
Não aceitamos a menor possibilidade de subjetiva
eleição entre impor esta ou aquela sanção diante de
um ilícito administrativo. Isso decorre da estrita
observância do binômio ilícito/sanção. Vale dizer:
319
ANDRADE, Vitor de Morais. Sancões administrativas no codigo de defesa do consumidor. São Paulo :Atlas, 2008, p.78. 320
FERREIRA, Daniel. Sanções administrativas. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 156.
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para cada ilícito há uma previamente reconhecida e
correspondente sanção.
Todavia, ainda assim se nos apresenta como
juridicamente viável a possibilidade de outorga
legislativa de certa parcela de discricionariedade,
mesmo que residual, na imposição das sanções
administrativas.
Não vislumbramos qualquer traço de
discricionariedade na definição da infração ou na
fixação da sanção, posto que somente a lei pode
criar uma infração e cominar-lhe a respectiva
sanção. Somente as infrações previstas como tais
pela lei e as sanções nela expressamente
cominadas é que podem ser aplicadas pelo
administrador321
VII -DA COMPETÊNCIA PARA APLICAÇÃO DA SANÇÃO
O artigo 55 do CDC cuida de definira competência dos entes
federaivos no que diz respeito à regulação, controle e fiscalização do mercado
de consumo.
O presente artigo, ao estabelecer que a "União, os Estaos e o
Distrito Federal, em caráter concorrente e nas suas respectivas áreas de
atuação administrativa, baixarão normas relativas à produção, industrialização,
distribuição e consumo de produtos e serviços", reconheceu a competência
destes três entes para legislar sobre o tema da produção e consumo,
ratificando os termos do artigo 24, incisos 1, 5 e 8, da Constituição Federal,
segundo o qual compete à União, aos Estaods e ao Distrito Federal Legislar
concorrentemente sobre: 1 - direito tributário, financeiro, penitenciário,
econômico e urbanístico [...]; 5 - produção e consumo; [...] 8 - reponsabilidade
por dano ao meio ambiente, ao consumidor , a bens e direitos de valor artítisco,
estético, histórico, turistico e paisagístico.
O § 1° artigo 55 dispõe que a União, os Estados, o Distrito Federal
321
Idem, ibidem, p. 161.
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e os Municípios fiscalizarão e controlarão a produção, industrialização,
distribuição, a publicidade de produtos e serviços e o mercado de consumo, no
interesse da preservação da vida, da saúde, da segurança, da informação e do
bem-estar do consumidor, baixando as normas que se fizerem necessárias.
Os dispositivos deixam clara a idéia de interdependência para
normatização, fiscalização e controle a ser exercida pelos entes da
administração pública no que diz respeito à proteção e defesa do consumidor.
Já §§ 3° e 4° do artigo 55 trata de temas diversos.
Conforme o § 3°, os entes deferais com atribuições para fiscalizar
e controlar o mercado de consumo deverão manter comissões permanentes
para elaboração, revisão e atualização das normas referidas no § 1°, sendo
obrigatória a participação de consumidores e fornecedores.
Os artigos 7, caput, 18, § 6°, 2, e 39, 8, são expressos ao afirmar
que as normas do Código de Defesa do Consumidor não excluem a aplicação
de normas de outros diplomas jurídicos, exigindo, muitas vezes, a análise
conjunta de disposições regulamentares para se aferir determinada prática
abusica ou mesmo identificar produto ou serviços com vício ou defeito (um
prodduto vendido em desacrodo com norma regulamentar expedida pelo
inmetro, por exemplo).
A necessidade de manter comissões permanentes para
elaboração, revisão e atualização das normas contidas no § 1° do artigo 55 tem
por escopo atualizar o sistema legislativo, juntamente com a evolução
tecnológica dos meios de produção e consumo, sobretudo a fim de se
resguardar a saúde e a segurança dos consumidores.
Como se contasta, há conflitos de competência entre órgãos
administrativos de defesa do consumidor no âmbito estadual e municipal.
Coflitos esses, verticais e horizontais.
Andrade afirma que:
Podem existir situações em que fatos que violem as
disposições do Código de Defesa do Consumidor
atinjam diversas unidades da Federação, podendo,
dai, surgir um eventual conflito ou dúvida acerca de
qual ou quais seriam os órgãos administrativos de
defesa do consumidor, competente(s) para aplicar
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eventual sanção.322
Victor de Morais Andrade citando, Bandeira de Mello:
Bandeira de Mello esclarece com habitual
praticidade que "como critério fundamental, prcede o
dizer-se que é competente para dada medida de
polícia administrativa quem for competente para
legislar sobre a matéria. Assim, A união exercerá um
caráter exclusivo polícia administrativa sobre o que
estiver arrolado no art. 22 da constituição e
concorrentemente com os Estados e Distrito Federal
sobre o que consta no art. 24. Estados irão exercita-
la em caráter exclusivo nas hipóteses abrigáveis bo
§ 1° art. 25 ou em concorrência com a União nas do
art. 24, precitado. Municípios têm seu campo
exclusivo de polícia administrativa no que disser
respeito ao seu peculiar interesse, notadamente
sobre as matérias previstas no art. 30. O Distrito
Federal, a quem competem, por força do art. 32, §
1°, atribuições correspondenciais às dos Municípios
e às dos Estados (salco no que converne ao § 1° do
art. 25), exercerá polícia administrativa em caráter
exclusivo no mesmo caso em que os Municípios a
exercem e concorrentemente nas hipóteses do art.
24" (grifos nossos).323
Como se pode observar chega-se a conclusão de que a
competência sancionatória é concorrente entre todos os órgãos de proteção e
defesa do consumidor do país, no âmbito municipal, estadual, nacional e do
Distrito Federal.
Em razão da competência concorrente pode-se se gerar algumas
dúvidas, esse inclusive é o entendimento de Andrade:
Mas a dúvida que persiste é se mais de um Procon, 322
Idem, ibidem, p. 136. 323
Idem, p.137.
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por exemplo, pode autuar um mesmo fornecedor
pelo mesmo fato cuja abrangência atinja mais de um
município ou Estado. Verificando que existem mais
de 500 Procons no Brasil, poderiam todos autuar um
mesmo fornecedor pelo mesmo fato, embora os
reflexos do dano sejam de abrangência nacional? As
multas aplicadas, se somadas, poderiam ultrapassar
o valor de 3.000.000 (três trilhões de UFIR), como
dispões o artigo 57 do Código de Defesa do
Consumidor?324
VIII- CONCLUSÃO
O desenvolvimento de uma teoria sobre o direito administrativo
sancionador está longe de ser alcançada.
Os Proncons encontram dificuldades para aplicar outras sanções
administrativas que não as multas, pois muitas vezes são imcopetentes para
aplicar algumas sanções expressas no artigo 56 do CDC, como por exemplo
cassação de licença do estabelecimento e a proibição de fabricação.
No caso de conflito de competência a prevalece as disposições da
Lei Federal de Processo Administrativo, quando o ato sancionador tramitar pelo
Departamento Nacional de Proteção e Defesa do Consumidor, ou a Lei
Estadual de Processo Administrativo, quando a sanção foi imposta por órgãos
estaduais da administração pública.
A nova tecnologia consistente no SINDEC implantada pelo
Ministério da Justiça através do DPDC é, sem duvida, um instrumento de
extrema importância para o alcance dos objetivos da Política Nacional das
Relações de Consumo: por, de um lado, possibilitar a organização de dados
indispensável ao eficiente planejamento de políticas públicas e, de outro,
contribuir diretamente para a aproximação entre os PROCONs.
Para enfrentar e superar a natural vulnerabilidade do consumidor
exige-se esta atuação articulada capaz de equiparar as forças na defesa do
pólo final da cadeia produtiva. Sem a visualização da realidade nacional
organizada sistemicamente reduz-se as possibilidades de suplantar-se a
deficiência do poder de negociação do consumidor através da força normativa
do CDC. Em outras palavras e usando um exemplo mais claro, a atuação
integrada permite um maior poder de articulação e, por conseqüência, maiores
324 Idem, ibidem, p.137.
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chances de solução mais célere do problema.
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RESPONSABILIDADE CIVIL NO PÓS-CONSUMO: POR UMA AMPLIAÇÃO
DA RESPONSABILIDADE COMPARTILHADA
Antônio Carlos Efing325
325 Doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP; Professor titular da Pontifícia Universidade Católica do Paraná-PUCPR, onde leciona na graduação, especializações, mestrado e doutorado; Professor do Estação Convention Center;
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Silvio Alexandre Fazolli326
RESUMO
Pelo presente ensaio, pretende-se demonstrar, a partir de uma experiência
empírica vivenciada na cidade de Maringá-PR, a necessária ampliação do
conceito de responsabilidade compartilhada, recentemente trazido a lume pela
Lei n.º 12.305/10, a qual instituiu a chamada Política Nacional de Resíduos
Sólidos. O objetivo seria ampliar a responsabilidade civil de empresa privada,
concessionária de serviço público de transporte ferroviário, pelos resíduos
sólidos urbanos oriundos do pós-consumo, depositados por populares às
margens da linha férrea. Embora tal empresa não integre a cadeia de
consumo, sua responsabilização se originaria da falta de fiscalização do
espaço concessionado e seu entorno, de forma a impedir o depósito irregular
de resíduos e suas respectivas conseqüências para a população local e para o
meio ambiente.
Palavras-chave: responsabilidade civil - concessionária – serviço público -
resíduos sólidos – pós-consumo
INTRODUÇÃO
Desde o início do processo de industrialização iniciado no século XVIII,
e como fator de garantia da continuidade deste (MOREIRA, 2011, p. 174), os
interesses hegemônicos do mercado capitalista vem lançando mão de políticas
de incentivo ao consumo. A ideia de perenidade que sempre recaiu sobre
certos bens que circundam nosso cotidiano (casas, carros, televisores, etc.), foi
Professor da Escola da Magistratura do Paraná; membro do Instituto dos Advogados do Paraná; Advogado militante em Curitiba/PR; e.mail: [email protected]
326 Mestre em Tutela dos Direitos Transindividuais pela Universidade Estadual de Maringá – UEM; Professor efetivo da mesma instituição e docente junto à Pontifícia Universidade Católica do Paraná/Campus Maringá; Advogado militante em Maringá/PR; e.mail: [email protected] .
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substituída pela falsa noção de contentamento, proporcionada pelo efêmero
prazer da aquisição de um novo produto.
Percebe-se, pois, o deslocamento de valores, na formulação do novo
paradigma utilitarista, implantado a partir da sociedade contemporânea, então
denominada “sociedade de consumo”, marcada pela perda da auto-suficiência
individual na obtenção de alimentos, moradia, e outros produtos e serviços
essenciais (EFING, 2011, p. 244-245, nota 374).
Assim, para que se abra espaço ao avassalador mercado de consumo,
novas necessidades são constantemente criadas e reinventadas sob outras
perspectivas. A “obsolescência programada” (EFING, 2011, p. 131) é a diretriz
ditada pelos fornecedores e prontamente acatada pela parte mais frágil da
relação comercial, os consumidores, cada vez mais suscetíveis a modismos e
outras manifestações de condutas de auto-afirmação que, em verdade, visam
assegurar a expansão mercadológica do sistema capitalista.
Diante da difícil - e quiçá irreversível – mudança nos padrões de
aquisição de bens (ROMEIRO, 2003, p. 5), o ordenamento jurídico se viu
obrigado a implementar posturas de contenção, almejando, principalmente, a
manutenção da higidez ambiental indispensável à sobrevivência humana digna,
“em uma concepção jurídico-política de solidariedade” (LEITE, 2000, p. 93).
Em uma das frentes de atuação do Estado, na regulamentação das
condutas humanas em prol da sustentabilidade, foi editada a Lei n.º 12.305/10,
que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Dentre os conceitos e
determinações advindos com a nova lei, destaca-se a menção feita ao sistema
de “responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos” (Art. 3.º,
inc. XVII), assim entendida a divisão do ônus, entre os integrantes da cadeia de
consumo, pelo passivo ambiental provocado pela destinação final dos
produtos, após o exaurimento do ciclo de consumo, com o descarte final, feito
pelo consumidor – processo, este, cada vez mais acentuado pelo advento de
“novas necessidades”, conforme já enfatizado.
Com a falta de políticas públicas voltadas para o problema do pós-
consumo, em especial para a educação ambiental, e a deficiência da atividade
fiscalizadora que deveria ser promovida pelos órgãos públicos encarregados da
gestão ambiental preventiva e reparatória (MOREIRA, 2011, p. 164), vem se
demonstrando comum e perigoso o depósito clandestino de resíduos sólidos
em áreas impróprias, feito pela população urbana.
Na cidade de Maringá-PR, constatou-se significativas quantidades de
lixo de diversas espécies (recicláveis e não recicláveis), sem qualquer tipo de
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separação, inclusive, descartadas às margens da linha férrea para transporte
de mercadorias, que cruza o perímetro urbano de Maringá, de utilização
concedida à empresa ALL - América Latina Logística do Brasil S/A.
Em que pese não estar englobada pela legislação atual, dentre os co-
responsáveis pelo ciclo de vida do produto, se procurará retratar a
responsabilidade civil da pessoa jurídica, concessionária do serviço público em
questão (transporte de mercadorias por linha férrea), com vistas à ampliação
do conceito de responsabilidade compartilhada, implementado pela Lei
12.305/10.
1. DESENVOLVIMENTO
1.1. LIMITAÇÕES DA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA E DA
REPONSABILIDADE COMPARTILHADA EM MATÉRIA DE PÓS-CONSUMO
O fenômeno da constitucionalização do Direito, calcado na integração
de disciplinas jurídicas para a obtenção das finalidades básicas, asseguradas
pela Constituição Federal, tem se mostrado responsável pela aproximação e
complementação de ideias de origens distintas, ocasionando a superação do
conhecido dogma separatista entre Direito Público e Privado.
Mais do que se preocupar com classificações e rótulos, a comunidade
jurídica atual tem por desafio promover a defesa dos “novos direitos”
(consumidor, meio ambiente, criança e adolescente, dentre outros), valendo-se,
para tanto, de conhecidos mecanismos jurídicos, cuja origem remonta à épocas
pretorianas. Dentre estes, vale destacar o significativo papel assumido pela
responsabilidade civil, na incansável (e quase sempre inatingível) busca pelo
restabelecimento do status quo ante, retirando-se o dano, moral ou patrimonial
(AZEVEDO, 2008, p. 244).
Sob este novo panorama, evidenciou-se os inconvenientes
ocasionados pela discussão da culpa do agente causador do dano, dadas as
peculiaridades que circundam as novas relações jurídicas que se afirmaram ao
longo da história recente. Positivou-se, então, para certos casos, o sistema da
responsabilidade civil objetiva, no intuito de melhor proteger a coletividade,
vulnerabilizada em diversos aspectos e manifestações (ambientais,
trabalhistas, consumeristas e etc.). Essa orientação restou albergada pelo texto
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constitucional (Arts. 37, § 6.º; 21, inc. XXIII, d) e replicada por leis esparsas,
organizadas em torno de microssistemas de proteção, valendo a pena
destacar: Lei 8.078/90 (especialmente nos Arts. 12, 14 e 18); Lei 6.938/81 (Art.
14, § 1.º327); e Lei 12.306/10 (Art. 51).
Até mesmo o Código Civil vigente, de tradição individualista e
subjetivista, aceita a dispensa da culpa (Art. 927, parágrafo único) ou mesmo
presume esta (Arts. 932, 936, 937, 938, dentre outros) em certas circunstâncias
em que sua prova se mostraria difícil ou inviável (probatio diabolica328), o que
acabaria por ensejar prejuízos ao bem jurídico tutelado.
Embora se mostre mais adequada – se comparada ao sistema anterior,
de responsabilidade subjetiva - à proteção de valores ambientais e,
consequentemente, da coletividade de consumidores, tem-se que a dispensa
da prova acerca do elemento culpa, repaginando os pressupostos da
responsabilidade civil para situações específicas, ou mesmo a inversão do
ônus da sua prova, ainda não se mostram plenamente capazes de ofertar a
proteção esperada do sistema normativo vigente.
Seguindo a vertente da responsabilidade civil objetiva, e como uma
evolução desta para assuntos relacionados ao pós-consumo, estabelece o art.
3.º, inc. XVII, da Lei 12.305/10, a “responsabilidade compartilhada pelo ciclo de
vida dos produtos”329, co-responsabilizando os integrantes da cadeia de
consumo, desde à fabricação até a final disposição/descarte do bem, pelo
consumidor.
Segundo se depreende do conceito legal, verifica-se que o atual
sistema de responsabilidade compartilhada, embora represente inegável
evolução legislativa em matéria de pós-consumo, não é capaz de alcançar
terceiros, estranhos ao ciclo de vida dos produtos, mas que oferecem
significativa contribuição para a poluição ocasionada.
327 Após comentar o art. 14, § 1.º, da Lei 6.938/81, afirma Carlos Roberto Gonçalves pela irrelevância da ilicitude da conduta praticada, bastando, para acarretar a responsabilização do agente, que tal atitude gere prejuízos ambientais (GONÇALVES, 2011, p. 119).
328 Prova difícil ou impossível de ser produzida.
329 Definida pela Lei 12.305, Art. 3.º, inc. XVII, como “conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos, nos termos desta Lei”;
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É o que se pretende demonstrar por meio do estudo de caso,
envolvendo a disposição de resíduos sólidos às margens da rede ferroviárias,
em perímetro urbano da cidade de Maringá-PR.
1.2. RESÍDUOS SÓLIDOS DEPOSITADOS ÀS MARGENS DA LINHA
FÉRREA: UMA REALIDADE MARINGAENSE
Em trecho de cerca de dois quilômetros, margeando linha férrea de
utilização concedida à empresa América Latina Logística do Brasil S/A,
constata-se a presença de toneladas de lixo urbano, depositado de forma
irresponsável por populares, desprovidos de senso de “controle crítico” (EFING,
2011, p. 125). Restos de construção civil, televisores, sofás, computadores e
outras variedades de produtos domésticos são encontrados, dispostos em
montes, situados no espaço de poucos metros, coberto por grama, e que
separa a linha férrea da pista de rolamento para veículos automotores.
A situação relatada foi devidamente comprovada por visitação ao local
indicado, mais especificamente no trecho situado na saída do túnel do trem
(sentido Município de Sarandi) que se desloca sob espaço urbano denominado
“novo centro”. Anotações e fotos documentaram a degradação ambiental a que
fora submetida à referida área, bem como os riscos de acidentes, ferroviários e
rodoviários, provocados pela possível obstrução de vias, pelo lixo depositado e
os correlatos riscos à saúde pública, visto que esse material assim
irregularmente disposto, configura-se local propício ao desenvolvimento de
insetos (como o mosquito da dengue, p.ex.). A matéria foi discutida em reunião
da Comissão do Meio Ambiente da Ordem dos Advogados do Brasil, Subseção
de Maringá e vem fomentando a implementação de projeto de extensão
acadêmica, voltado para o apoio à comunidade local.
Neste contexto, passa-se a indagar sobre a possível flexibilização do
conceito de responsabilidade compartilhada, trazido pela Lei da Política
Nacional de Resíduos Sólidos, com vistas a obter maior responsabilização da
empresa concessionária de serviços públicos.
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1.3. RESPONSABILIZAÇÃO LEGAL DAS PARTES ENVOLVIDAS
Antes de discorrer sobre as possibilidades jurídicas de aplicação dos
dispositivos da Lei 12.305/10 para, no problema apresentado, enquadrar todos
os envolvidos no processo produtivo que desencadeia o acúmulo indevido de
lixo (empresa concessionária e o Poder Público concedente, inclusive),
enquanto membros do ciclo de vida do produto, sucintamente, passa-se a
analisar o sistema de responsabilidade civil vigente, aplicável aos danos
ambientais - em especial oriundos do depósito inadequado de resíduos sólidos
-, ocasionados ou não em virtude de relação de consumo.
Pela superação dos pressupostos da responsabilidade civil clássica
(baseada na conjunção de três elementos básicos: dano, nexo causal e culpa
do agente), com vistas ao atendimento da realidade ambiental (CARVALHO,
2011, p. 15) e desprendimento das relações patrimoniais individuais, destaca a
autora argentina, Graciela Messina De Estrella Gutiérrez:
Persuadidos de la impoisibilidad de encontrar soluciones
en el sistema de responsabilidad civil, un grupo de juristas
con criterios o principios distintos justificaron una
disciplina propria. Sus sostenedores afirman y propugnan
su independencia en el entendimiento que el derecho
ecológico forma una ciencia distinta que no podría
encasillarse ni em derecho público ni em el privado, pues
este último rige relaciones particulares entre los
individuos. Como dice Pigretti, “el sistema de
responsabilidad civil no fue pensado para atender lãs
relaciones del hombre con la natureza”. La
responsabilidade civil es patrimonial, de hombre a
hombre. – Por tal razón es difícil concebir la existência de
los denominados interesses difusos, acciones de clases o
acciones ecológicas, que suponen uma interrelación del
hombre com el grupo social y que, en consecuencia,
superan la relación patrimonial individual” (GUTIÉRREZ,
2002, p. 10).
Tendo por escopo assegurar a internalização das externalidades
ambientais negativas, pelo próprio setor produtivo e/ou pelo Estado, o
ordenamento jurídico brasileiro optou pela adoção de uma responsabilidade
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civil objetiva (Lei 6.938/81, art. 14, § 1.º) dispensando a prova da culpa para a
sua configuração. A justificativa teórica para tanto encontra-se na adoção da
Teoria do Risco que, em suas diversas modalidades (risco proveito, criado,
excepcional, profissional, administrativo e integral), almejam compensar as
dificuldades probatórias que circundam a apuração da responsabilidade civil
ambiental, quer no que se refere a demonstração do elemento subjetivo (dolo
ou culpa) ou mesmo da configuração do nexo de causalidade entre a atitude do
agente e o dano, além de mitigarem a incidência das excludentes de ilicitude
(CAVALIERI FILHO, 2012, p. 155).
Diante da brevidade do tema e evitando-se divagações
desnecessárias, tecer-se-á comentários sobre as duas últimas evoluções da
Teoria do Risco que, atualmente, justificam a responsabilização do Estado
(Risco Administrativo) e de particulares (Risco Integral), cuja inclusão no
sistema de responsabilidade compartilhada se defenderá a seguir, como forma
de assegurar a função redistributiva do princípio do poluidor-pagador
(MOREIRA, p. 163).
Dentre aqueles que poderiam contribuir para a incorreta destinação dos
resíduos sólidos, encontra-se a figura do Estado; aliás, passível de
responsabilização objetiva pelos prejuízos causados por seus agentes, ou
particulares que lhes façam às vezes (no caso em estudo, a empresa
concessionária), conforme prescrição inserta no Art. 37, § 6.º da Constituição
Federal.
Através da disposição constitucional retro, o ordenamento interno
passa a acatar, em relação ao Estado, a Teoria do Risco Administrativo, de
vertente protecionista, segundo a qual, o dever estatal de cuidado, decorreria
do sacrifício feito pelo cidadão, ao abrir mão de seu estado de liberdade
absoluta para viver em uma sociedade de regras, gerida por um ser constituído
para fins de promoção do interesse público primário (da população).
Tal medida, em que pese a compatibilidade com o sistema do Welfare
State, do Estado garantista, acaba fazendo com que este suporte o passivo
ambiental gerado por atividade produtiva particular - medida que, em última
análise, onera a coletividade, constituinte e mantenedora econômica do ser
abstrato.
Como sucedâneo evolutivo da Teoria do Risco Administrativo, visando
facilitar a recomposição do meio ambiente degradado, em favor das presentes
e futuras gerações, o sistema normativo passa a acolher a Teoria do Risco
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Integral (Lei 6.938/81, art. 3.º, inc. IV330), que, em prol do atendimento aos
princípios da precaução e da prevenção, fragiliza a necessidade de
demonstração do nexo de causalidade entre o prejuízo ambiental e a atividade
desenvolvida pelo agente. Mais abrangente que as modalidades anteriores, o
risco integral compreenderia as atividades de empresa, administração, além de
outros perigos criados em razão da atividade humana, lucrativa ou não
(NORONHA, 1999, p. 37).
Elimina-se, portanto, qualquer discussão sobre a origem da conduta
(se perigosa, lucrativa, profissional, administrativa, etc.), bastando, para a
configuração a responsabilidade, “a mera existência do risco gerado pela
atividade, instrínseco ou não a ela” (STEINGLEDER, p. 201), dispensando-se,
por conseguinte, a prova acerca da causalidade adequada. Todos os fatores
que indiretamente facilitaram a ocorrência do evento danoso, antes
denominados “condições”, são erigidos à “causas”. Defende Annelise Monteiro
Steingleder, a existência de uma “conexão” presumida:
“extraída dos princípios da precaução e do poluidor-
pagador, com o que se redefine os objetivos da
responsabilidade civil, que migram de uma perspectiva
nitidamente privada e voltada para a proteção individual,
para uma perspectiva ampliada de garantia de
incolumidade dos bens de titularidade difusa, percebendo-
se aqui a funcionalização social da responsabilidade civil”.
(STEINGLEDER, p. 204).
Esta modalidade, prescindindo, até mesmo, da confirmação científica
acerca da identificação da causa, contenta-se com a mera probabilidade,
dando ensejo à inversão do ônus da prova, em desfavor do suposto poluidor.
Não obstante a eficiência das teorias do risco, para a responsabilização
dos envolvidos em danos ambientais, acredita-se que tais agentes (públicos e
privados), sempre que a poluição seja decorrente de resíduos sólidos de pós-
consumo, poderiam, complementarmente, ser enquadrados no sistema de
330 Dispositivo que também serve de fundamentação, ao lado do art. 942, última parte do Código Civil, para a configuração do vínculo de solidariedade entre os poluidores.
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responsabilidade compartilhada, conforme se discutirá a seguir.
1.4. DA POSSÍVEL AMPLIAÇÃO DA RESPONSABILIDADE
COMPARTILHADA
Consoante demonstrado no item 1, do presente estudo, o sistema de
responsabilidade compartilhada, interpretado de acordo com os elementos
fornecidos pelo inc. XVII, do Art. 3.º, da Lei 12.305/10, mostra-se incapaz de
alcançar empresa do setor privado, que falha no dever de conservação do
entorno da área explorada331 – responsabilidade civil por omissão.
Mesmo não mencionada pela Lei 12.305/10, acredita-se que a
empresa concessionária de serviço público em questão, assim como outras
pessoas (físicas e jurídicas) que, de alguma forma, colaborarem para a
destinação incorreta dos resíduos sólidos do pós-consumo, deveriam ser
consideradas participantes do “ciclo de vida dos produtos”.
A ideia da figura de um “fornecedor por equiparação” - além de
proposta de lege ferenda para alteração da Lei 12.305/10 - em uma
interpretação a favor consumidor e pro ambiente, seria concebível,
analogicamente, a partir do disposto pelo Art. 17, do Código de Defesa do
Consumidor, quando alberga, na categoria de consumidor, todas as vítimas de
acidente oriundo da relação de consumo.
Poderia se indagar sobre a utilidade da criação desta novel categoria
(“fornecedor por equiparação”), para fins de enquadramento do poluidor nos
termos da responsabilidade compartilhada, se, tais agentes, já se encontram
vinculados pela ideia do risco administrativo e do risco integral?
De fato, embora não represente significativa alteração para fins de
reparação do bem jurídico lesionado (meio ambiente ecologicamente
equilibrado), visto que os agentes externos ao ciclo de vida do produto podem
331 No que se refere à viabilidade de imposição de condutas às empresas concessionárias de serviço público, com vistas à asseguração de padrões ambientais, veja-se o precedente jurisprudencial: STF, RG no RE 627.189/SP, j. 22.09.2001.
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continuar, objetiva e solidariamente, responsáveis pelos danos332, na hipótese
examinada, acredita-se que a extensão do conceito de responsabilidade
compartilhada agregaria mecanismos à Política Nacional dos Resíduos
Sólidos, integrando terceiros ao microssistema analisado. A própria legislação
em comento, em seu art. 1.º, § 1.º, menciona estarem sujeitos às suas
disposições “as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado,
responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos”.
Ao assim proceder, estar-se-ia ampliando a função333 da
responsabilidade civil, para além da simples reparação do dano, na media em
que seria imposto ao poluidor, outros deveres, prescritos pela lei especial.
Se considerada pela legislação base de resíduos sólidos como
integrante do ciclo de vida do produto (Art. 3.º, inc. IV - ainda que por
equiparação), poderia se exigir da concessionária de serviço público, de acordo
com a responsabilidade compartilhada (Art. 3.º, inc. XVII), maior cooperação e
engajamento nas políticas de destinação dos resíduos sólidos depositados às
margens da ferrovia.
Para tais fins, estaria a concessionária sujeita a: a) celebrar acordos
setoriais com o Poder Público e outros agentes privados (Art. 3.º, inc. I); b)
permanecer vinculada ao exercício do controle social (inc. VI) por parte da
população, quando da renovação do contrato de concessão; c) ser compelida a
promover a disposição final ambientalmente correta (inc. VIII), dos rejeitos que,
por falha de fiscalização, acabou permitindo que se acumulem no entorno de
sua área de exploração; d) promover, ainda que coercitivamente, a gestão
integrada dos resíduos sólidos (inc. XI); e) ser incluída como co-responsável
pela logística reversa (inc. XII), promovendo a separação e o envio dos
resíduos encontrados às suas origens; f) auxiliar o Poder Público na
fiscalização dos fabricantes para que promovam o recolhimento dos restos dos
produtos consumidos (logística reversa); g) incentivar e financiar usinas de
reciclagem (inc. XIV); implementar pagamento de taxa municipal de coleta de
332 Sobre a irrelevância da ilicitude da conduta, caracterizando a responsabilidade civil solidária entre o Poder Público e a concessionária: STJ, 2.ª T., REsp 28.222/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Rel. p/ Acórdão Ministra Nancy Andrighi, julgado em 15/02/2000, DJ 15/10/2001, p. 253.
333 Sobre a ampliação da responsabilidade civil neste final de milênio, albergando, inclusive, a função sancionatória, anteriormente reservada ao Direito Penal, bem como uma função preventiva ao dano: NORONHA, 1999, p. 40-41.
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resíduos sólidos, mediante envio de guia de cobrança334; etc.
Logo, pelo extenso rol de atividades, passíveis de serem exigidas da
empresa concessionária, acredita-se na viabilidade da ideia proposta,
enquadrando-se o empreendedor privado no sistema de responsabilidade
compartilhada.
2. CONCLUSÃO
A ineficiência das políticas públicas municipais de gerenciamento dos
resíduos sólidos urbanos, de educação ambiental e do consumidor, aliada à
falta de fiscalização por parte da concessionária de transporte ferroviário,
acabou por ocasionar depósito irregular de lixo urbano – consequência do pós-
consumo – às margens da ferrovia.
O material ali acumulado, além de originar poluição (solo, recursos
hídricos, etc.), é potencial fonte causadora de acidentes335, ferroviários e
rodoviários, vez que o lixo depositado se acumula entre ambas linhas de
transporte e coloca em risco a saúde da comunidade local.
Os envolvidos na situação descrita (Poder Público municipal e empresa
concessionária do serviço público) são objetiva e solidariamente responsáveis,
sob a justificativa teórica da Teoria do Risco, nas modalidades de Risco
334 STJ, 2.ª T., AgRg no REsp 1127150/MG, Rel. Ministro Humberto Martins, julgado
em 17/12/2009, DJe 19/02/2010. Sobre a constitucionalidade da referida taxa: STF, 2.ª
T., RE 411251 AgR, Relator Min. Eros Grau, julgado em 04/09/2007, DJe-112 DIVULG
27-09-2007 PUBLIC 28-09-2007 DJ 28-09-2007 PP-00066 EMENT VOL-02291-04 PP-
00713.
335 Acerca a responsabilidade das estradas de ferro por danos causados em decorrência de sua atividade, vide art. 26, do Decreto n.º 2.681, de 7 de dezembro de 1912, que dispõe: As estradas de ferro responderão por todos os danos que a exploração de suas linhas causar aos proprietários marginais (in VENOSA, 2011, p. 179).
Sérgio Cavalieri Filho, em comentário à Lei das Estradas de Ferro, menciona a sua constante atualização por meio de decisões judiciais, que fazendo com que a utilidade da norma fosse assegurada aos problemas atuais (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 330).
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Administrativo e Risco Integral.
Verificou-se que a flexibilização do conceito de responsabilidade
compartilhada, trazido pela Lei 12.305/10, para englobar (ainda que por
equiparação) os agentes acima especificados, acabaria por ofertar diversos
benefícios aos interesses da coletividade, conforme sugestões feitas ao final do
item 1.4, contribuindo para o aperfeiçoamento e integração dos microssistemas
jurídicos ambiental e consumerista.
3. REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria Geral das Obrigações e Responsabilidade
Civil. 11. ed., São Paulo: Atlas, 2008.
CARVALHO, Daniela Marques de. À procura de uma teoria de causalidade
aplicável à responsabilidade civil ambienta. Revista de Direito Ambiental n.º 62,
São Paulo: RT, abr/jun., 2011, p. 11-54.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 10. ed. rev. e
ampl., São Paulo: Atlas, 2012.
EFING, Antônio Carlos. Fundamentos do Direito das Relações de Consumo:
consumo e sustentabilidade. 3. ed., Curitiba: Juruá, 2011
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 13. ed., São Paulo:
Saraiva, 2011.
LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo
extrapatrimonial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
MOREIRA, Danielle de Andrade. Responsabilidade ambiental pós-consumo.
Revista de Direito Ambiental n.º 63, São Paulo: RT, jul/ago., 2011, p. 157-179-
56.
NORONHA, Fernando. Desenvolvimentos contemporâneos da
responsabilidade civil. Revista dos Tribunais n.º 761, São Paulo: RT, mar.,
1999, p. 31-44.
ROMEIRO, Ademar Ribeiro et al. Economia do Meio Ambiente: teoria e prática.
Peter H. May, Maria Cecília Lustosa e Valéria da Vinha (Orgs.). Rio de Janeiro:
Campus, 2003.
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STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade Civil Ambiental: as
dimensões do dano ambiental no Direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2004.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil – vol. 4: Responsabilidade Civil. 11. ed.,
São Paulo: Atlas, 2011.
PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE: EVOLUÇÃO E CONTROVÉRSIAS ATUAIS
Caroline Gonzalez Castro
Acadêmica de Direito na UEL
Ivan Martins Tristão
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Mestre (UEL). Advogado. Docente do Curso de Direito na UEL.
RESUMO
O presente artigo tem o objetivo de demonstrar que apesar de o princípio
constitucional da publicidade parecer de fácil efetividade e identificação, devido
à sua expressa disposição na Constituição Federal, não é o que ocorre com as
questões atuais. Além de sua grande amplitude, sua aplicação muitas vezes é
ignorada irregularmente. Os dilemas atuais acerca do princípio da publicidade
dos atos processuais recaem principalmente sobre a deficiência de sua
efetividade em cartórios superlotados e a sua maximização extrema nos
julgamentos do STF ao vivo pela TV. Os cartórios dizem-se impossibilitados de
atender os cidadãos interessados em consultar os autos, o que se demonstra
insustentável, já que um princípio garantidor da democracia de uma nação não
pode ser negado por simples falta de praticidade. Em relação à TV Justiça suas
consequências são polêmicas, houve a chamada espetacularização dos
julgamentos do STF, que para muitos tem prejudicado a efetividade dos
princípios constitucionais nas decisões, já que a ânsia por aprovação pública
e/ou autopromoção por parte dos ministros podem superar o dever de justiça
dos referidos magistrados. Nesse contexto, pretende-se demonstrar com base
nos exemplos citados que o princípio da publicidade tem grande importância no
ordenamento jurídico e serve como um norte para solução das controvérsias
atuais.
Palavras chaves: Princípio; Publicidade; Eficácia.
1. Introdução
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Foi na Revolução Francesa que se reagiu contra o juízo secreto e de
caráter inquisitivo, marca dos períodos anteriores, tendo ficado famosas as
palavras proferidas pelo pensador iluminista Mirabeau perante a Assembleia
Nacional:
Deem-me o juiz que desejarem: parcial, corrupto, meu
inimigo mesmo, se quiserem; pouco me importa desde
que ele nada possa fazer senão em público. (MIRABEAU,
apud, BUENO, 2011, p 167)
Em 1948, na Assembléia Geral das Nações Unidas o princípio da
publicidade ganhou grande relevância ao ser incluso no art. 10 da Declaração
Universal dos Direitos do Homem, determinando que toda pessoa tinha direito
a uma audiência justa e pública.
No Brasil este princípio só se tornou uma garantia constitucional na
atual Constituição de 1988, que assegura expressamente a publicidade em seu
art. 5 inc. LX, como será destacado mais adiante.
Aclamada como “Constituição Cidadã”, a Constituição de 1988 foi a
responsável pelo surgimento do que hoje se reconhececomo Estado
Democrático de Direito. A efetividade proporcionada por esta Constituição,
segundo Luís Roberto Barroso (2006, p.76), foi o rito de passagem do velho
para o novo Direito Constitucional, fazendo com que a Constituição deixasse
de ser uma miragem, com as honras de uma falsa supremacia, que não se
traduzia em proveito para cidadania, para que pessoas sem voz se tornassem
cidadãs com direito a voto e fiscalização do que ocorre em sua nação.
Entre os princípios consagrados para assegurar a democracia e a
existência desse novo Estado, está o princípio da Publicidade dos atos
processuais, que se caracteriza como uma prestação de contas dada pelo
Estado às partes e à população dos processos judiciais sobre sua atuação na
solução dos conflitos. O processo passa a ter um escopo político e a sua
divulgação traz a tona a sua natureza de instrumento de exercício de cidadania
e democracia.
Parafraseando Cassio Scarpiella Bueno (2011, p. 167), o princípio da
publicidade é uma garantia política do exercício da função jurisdicional, forte na
concepção do exercício de controle sobre ela, típica, portanto, dos “direitos da
primeira geração”. Assim, pode-se dizer que a publicidade é garantida não
apenas a aqueles que atuam no processo, mas também a toda a população.
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Neste diapasão, o principio da publicidade, no que diz respeito a sua
função, pode ser visto, segundo o doutrinador supracitado, em duas
dimensões: a)interna: publicidade para as partes, bem ampla, em razão do
direito fundamental ao processo devido; b) externa: publicidade para terceiros,
que pode ser restringida em alguns casos como se verá.
Antes de adentrar mais profundamente nos liames do princípio da
publicidade na sua forma atual, é necessário ter o conhecimento da sua
disposição na legislação brasileira, para assim melhor visualizar sua
importância no sistema jurídico brasileiro.
2. Previsão Constitucional do Princípio da Publicidade
O art. 5 inc. LX, da Constituição Federal, é expresso ao determinar que
há apenas duas exceções à publicidade, uma no caso de defesa da intimidade
e outra no caso de exigência de interesse público, como se vê:
Art.5°. omissis.
LX - a lei só pode restringir a publicidade dos atos
processuais, quando a defesa da intimidade ou o
interesse social exigirem.
Além deste, mais dois artigos do texto da constituição preveem
expressamente a obrigatoriedade da publicidade, são eles:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência e, também, ao seguinte: [...]
Art. 93. omissis.
IX - Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal
Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura,
observados os seguintes princípios: ...IX todos os
julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão
públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena
de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em
determinados atos, às próprias partes e a seus
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advogados, ou somente a estes [...]
Daniel Francisco Mitidiera assevera que “a publicidade é uma das
características do devido processo legal brasileiro, constituindo um dos pilares
constitucionais do nosso formalismo jurídico.” (2005, p.72)
Segundo Mitidiera o inc. LIV do parágrafo 5° da Constituição “Ninguém
será privado da liberdade ou de seus bens, sem o devido processo legal”, é
também garantidor da publicidade, já que o devido processo legal só é
efetivado com a devida publicidade dos atos processuais.
O juiz americano Louis Brander, citado por DIEDIER (2010,
p.60),também é incisivo nesta questão, para o magistrado, processo devido é
processo público, como assim afirmou “A luz do sol é o melhor dos
detergentes; a luz elétrica é o melhor policial”.
3. Previsão infraconstitucional do Princípio da Publicidade.
No âmbito do Direito Processual Civil o princípio da publicidade está
disciplinado nos arts. 155 e 444 do CPC, que assim elucidam:
Art. 155: Os atos processuais são públicos. Correm,
todavia, em segredo de justiça os processos:
I – em que exigir o interesse público;
II – em que dizem respeito a casamento, filiação,
separação dos cônjuges, conversão desta em divórcio,
alimento e guarda de menores
Parágrafo único. O Direito de consultar os autos e de
pedir certidões de seus atos é restrito às partes e seus
procuradores. O terceiro que demonstrar interesse
jurídico, pode requerer ao juiz certidão do dispositivo da
sentença, bem como inventário e partilha resultante do
desquite.
Art. 444: A audiência será pública; nos casos que trata o
art. 155, realizar-se-á a portas fechadas.
Fácil constatar que a Lei Processual Civil seguiu as diretrizes
constitucionais, estabelecendo a publicidade como regra e sua restrição como
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exceção, o que deixa claro a necessidade da publicidade em todos os casos
que não houver as restrições dispostas acima.
Ainda no âmbito do princípio da publicidade nas leis, é possível citar
também o art. 7°, inc. XIII da Lei Federal n° 8.906/94 (Estatuto da OAB), art. 7°,
inc. XIII:
Art. 7° São Direitos dos advogados:XIII - examinar, em
qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou
da Administração Pública em geral, autos de processos
findos ou em andamento, mesmo sem procuração,
quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a
obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos.
(grifo nosso)
O princípio da publicidade surge aqui como uma prerrogativa
profissional de uma categoria, haja vista ser o advogado um cidadão de grande
conhecimento jurídico, tendo, assim, grande capacidade de fiscalização do
judiciário, cumprindo o principal objetivo do princípio da publicidade.
É frequente encontrar leis que constem expressamente a publicidade
na sua disciplina, por exemplo, no âmbito dos Juizados Especiais Civis,
disciplinados pela Lei nº 9.099/95, em seu art. 12 consta “os atos processuais
serão públicos e poderão realizar-se em horário noturno, conforme dispuserem
as normas de organização judiciária”.
Esta preocupação, também do legislativo, em exigir a publicidade em
atos processuais, se deve à natureza republicana de tal princípio, as razões
que levaram o Estado a decidir um determinado conflito é de interesse público
e garante a transparência da ação do Estado, representado pelo magistrado,
de modo a impossibilitar arbitrariedades e parcialidades na solução de
conflitos.
O que se preza com a publicidade é a igualdade de tratamento,
fundamental em um Estado Democrático de Direito, que será fiscalizada pela
própria população, daí a importância dada ao princípio em questão, ele é
basilar para a uma Democracia, ou seja, para um governo de todos.
4. Eficácia do Princípio da Publicidade: Dilema
Mesmo com amplo amparo legal, não raro são os casos de o Direito ao
acesso dos autos ser negado com a justificativa de os cartórios terem grande
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demanda de trabalho e não restar tempo para atender os interessados.
Vendo ter seu direito desrespeitado pela determinação da magistrada
da comarca de Cachoeirinha, ao não ser autorizado a extrair cópias dos autos
sem procuração, o advogado Dr. Cleber Demétrio Oliveira da Silva fez uma
reclamação por escrito ao 2° Cartório Criminal de Cachoeirinha, a qual foi
respondida pela Juiza da Corregedoria Dra. Denise Nenê de Souza, segue
parte do conteúdo do relatório da mesma:
A negativa da carga dos autos para fotocópias, pela
Magistrada da Segunda Vara Cível, amparada no fato de
tramitarem na serventia 9.000 processos, a meu juízo não
se justifica. Sabemos das dificuldades enfrentadas com
excessivo volume de feitos, em especial no que se refere
ao controle de fluxo do processo. Porém, estas devem ser
superadas sob pena de agirmos contra os dispositivos
legais ensejando demandas desnecessárias que causam
prejuízo a própria imagem do poder judiciário [...].
(Cachoeirinha, parecer: 562/2005 - dns)
Casos como o de Cachoeirinha são extremamente comuns no
cotidiano jurídico, é recorrente a lesão ao princípio da publicidade, porém,
assim como dito na decisão supracitada, não se pode embasar a restrição a
vista dos autos por motivo diferente no disposto na lei.
O juiz que fere o princípio da publicidade põe em cheque o seu próprio
trabalho, pois é seu dever, como funcionário público, prestar contas à
população.
Juarez Freitas define serviço como sendo o
[...] conjunto de atividades essenciais, assim consideradas
pelo ordenamento jurídico, prestadas diretamente pelo
Poder Público ou mediante delegação executória ‘lato
sensu’, tendo em vista atender ao interesse geral e sob
regência dos princípios constitucionais do Direito
Administrativo. (2004, p.85).
Verifica-se que a ideia central desta definição é a prestação estatal que
vise à satisfação de necessidades coletivas. Como todo o serviço Estatal o
judiciário não pode ser tratado diferente, a satisfação da prestação jurisdicional
só pode ocorrer de forma global, assim como tem que ser, a todos deve ser
dada a possibilidade de acesso ao conteúdo dos autos.
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Na decisão supracitada a magistrada deixou claro o que significa vista
aos autos, como se transcreve da decisão: “Por acesso aos autos entende-se
possibilitar ao causídico tomar apontamentos e fotocopiar peças que lhe
interessem e não simples exame do processo no balcão da serventia.”.
Tal entendimento parece ser de fácil compreensão e aplicação, porém,
mesmo assim, extremamente lesionado nos cartórios do Brasil.
Resta claro que um princípio constitucional de tal importância não pode
ser ignorado por argumento de celeridade processual, caso o cartório não
esteja conseguindo cumprir com eficiência o princípio da publicidade é de se
pensar a contratação de novos serventuários ou nova organização para
atender a todos os interessados, mas não em ferir um princípio fundamental à
democracia do país.
5. Princípio da Publicidade e sua relação com a motivação da
sentença
Há uma grande relação entre o princípio da publicidade com o da
motivação da sentença, já que este é garantido por aquele. A motivação da
sentença consiste na exigência constitucional que a sentença e demais atos
processuais sejam justificados, sob pena de nulidade (CF art. 93, IX).
Neste sentido, tornar a sentença pública é garantir que a
obrigatoriedade do juiz de expor o motivo de suas decisões, já que a mesma
será fiscalizada por todos os interessados, evitando, assim, arbitrariedades e a
corrupção do judiciário.
Michel Temer, estudioso do assunto, assevera: “Aquele que exerce
função política responde pelos seus atos. É responsável perante o povo,
porque agente público está cuidando da res publica. A responsabilidade é
corolário do regime republicano.” (1996, p.163)
Segundo Fredie Didier Jr. (2010, p.61) há uma relação íntima entre os
princípios da publicidade e a regra da motivação das decisões judiciais, na
medida em que a publicidade torna efetiva a participação no controle das
decisões judiciais; trata-se verdadeiro instrumento de eficácia da garantia da
motivação das decisões judiciais.
Além disso, a ausência de motivação e da devida publicidade afeta
pontualmente o princípio do duplo grau de jurisdição. Haja vista a
impossibilidade de se atacar decisão que não tem fundamentação ou que sua
existência sequer foi sabida, devido à falta de publicidade.
No recurso há a contra argumentação da decisão, se esta não estiver
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satisfatoriamente justificada e visível causará danos à sua discussão. Como um
pai que diz não a uma criança sem explicar os motivos, “não porque não”,
deixando o filho sem qualquer meio de persuadi-lo.
Verifica-se aqui a interdependência dos princípios, tendo em vista que
para um devido processo legal é necessário a motivação, que de nada valerá
se não for exposta, publicada, viabilizando, assim, o duplo grau de jurisdição.
Esta complementaridade dos princípios constitucionais é global, todos
estão interligados, e são indispensáveis para a consolidação da justiça.
6. A publicidade e a controvérsia sobre a TV Justiça
A TV Justiça foi criada pela Lei 10.461 de 17 de maio de 2002, com
sede no STF, em Brasília, entrou no ar pela primeira vez em 11 de agosto de
2002. A transmissão ao vivo, pela televisão, de julgamentos do Supremo
Tribunal Federal é uma experiência inédita no mundo, uma maneira de
concretização do direito fundamental à publicidade de surpreendente alcance.
Por ser considerado um verdadeiro avanço no direito brasileiro, o uso
de tecnologia em prol da efetivação do princípio da publicidade é considerado
fato irreversível, já que seria um retrocesso voltar às velhas decisões de difícil
acesso, como era comum nas décadas anteriores. Porém, o que muito se tem
discutido é o aprimoramento da maneira de como é feita esta exposição, para
seu melhor aproveitamento.
As críticas que costumam ser feitas a transmissão de julgamentos ao
vivo são basicamente duas, a espetacularização das sessões e o
enfraquecimento da colegialidade do julgamento.
Em análise à primeira crítica, espetacularização dos julgamentos,
pode-se aferir como consequência a mudança de paradigma da população em
relação aos ministros do STF, antes visto como um membro de elevado grau
do judiciário, digno de todo respeito, para agora ser visto como mais uma
personalidade da mídia, quando não, verdadeira celebridade.
Isto, talvez não tivesse tanta importância se restringisse apenas ao
pensamento da população, o problema é a possibilidade dos holofotes
interferirem na decisão do julgado. O Ministro Cezar Peluso chegou a afirmar
que: “Quando você se vê dentro da mídia, sendo o foco, tudo centralizado em
você, tudo pode passar pela cabeça” (PELUSO, 2012).
É possível perceber com facilidade que a atitude dos magistrados pode
ser alterada pelo deslumbramento que os holofotes podem causar, o maior
receio quanto a isto é uma mudança de foco, de modo que a promoção pessoal
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diante do público, a sede por aprovação diante da população, chamada
“populização judicial” se dê em detrimento da efetivação dos princípios
constitucionais em julgados.
Peluso, ao se manifestar sobre o tema não destoou do aqui tratado:
“Estar exposto à câmera de uma TV altera o modo de ser e comportar de
qualquer pessoa, não apenas a do juiz. O que é absolutamente humano e
natural. E isso nem sempre é bom para a imagem da Corte” (Peluso, 2012).
Porém, como bem assevera Fredie Didier Jr (2010, p.62), este aspecto
negativo da transmissão de julgamentos ao vivo pela televisão, se deve,
principalmente, pela falta de maturidade do uso da tecnologia, com o tempo a
tendência é o amadurecimento tanto da população para filtrar o que é
transmitido, quanto dos próprios ministros em se firmar diante da opinião
pública.
São inúmeros os aspectos positivos da transmissão ao vivo dos
julgamentos do STF, como o eficaz controle externo indireto realizado pela
sociedade dos atos do Poder Judiciário, sendo esta uma questão que se tornou
primordial para a democracia devido à transparência, às luzes que se colocam
sobre os atos judiciais mais importantes e o consequente alto grau de
legitimidade que incide sobre todas as decisões emanadas pelos membros da
mais alta corte do País.
A maior escolarização da população com certeza tem a ajudado a
entender melhor o papel que os ministros estão exercendo ao irem ao ar nas
sessões de julgamento. Em relação aos ministros, não é cabível o retrocesso
do direito a informação, devido ao fato que alguns deles não sabem lidar com a
pressão pública, o que se deve ter em mente é o papel que os mesmos tem
diante da sociedade que é, sim, de extrema repercussão, saber conviver com
ela é requisito para tal cargo de elevada importância.
A segunda crítica feita aos Julgamentos ao vivo do STF pela TV justiça,
como acima exposto é em relação ao enfraquecimento da colegialidade.
Por ser a decisão composta de votos individuais muitas vezes
destoantes entre si, fica difícil até para o cidadão que atua na área do Direito
identificar qual o entendimento do STF, e não de cada ministro, em relação à
questão suscitada. De modo que o julgamento acaba se tornando um
agrupamento de discursos ideológicos individuais.
Isso ocorre porque, embora a razão de decidir se forme por uma
maioria no que respeita ao desfecho da hipótese submetida à Corte, cada
ministro externa seu próprio entendimento, nem sempre convergente, sobre os
fundamentos que justificam tal desfecho, deixando o telespectador no mínimo
confuso.
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São necessárias certas reformas para o melhor aproveitamento desde
instrumento que é a televisão, já que a disseminação de julgamentos pelos
meios de comunicação é irreversível e, se bem usado, benéfico para a
transparência desejada em uma democracia.
Facilitar o entendimento do telespectador acerca do entendimento
definido colegiadamente é um dos desafios a ser vencido pelo Supremo
Tribunal Brasileiro, para que assim a publicidade seja plena e a informação
compreendida por inteiro, ou seja,as pessoas consigam ter conhecimento dos
argumentos que levou o colegiado à decisão sobre a questão, e não apenas a
decisão em si como o que vem acontecendo.
O advogado Luís Roberto Barroso e a doutora pela UERJ Patrícia
Perrone Campos Mello convidados pelo site Conjur (28/12/2010) apresentaram
algumas sugestões para a mudança do modelo decisório do STF, em relação à
dificuldade de identificação da decisão do órgão colegiado assim sugeriram:
Após os debates e a votação realizada em sessão
pública, e sem prejuízo da apresentação dos votos
individuais pelos ministros, o relator do caso
deverá: i) redigir uma ementa representativa dos
fundamentos e conclusões que obtiveram adesão da
maioria; ii) dela deverá constar a proposição ou tese
jurídica que serviu como premissa necessária à decisão
da Corte, à semelhança dos holdings do common law. Tal
ementa, que poderá ser elaborada na sessão de
julgamento ou posteriormente, deverá ser submetida à
aprovação dos Ministros que votaram com a posição
vencedora. (Disponível em:<
http://www.conjur.com.br/2010-dez-28/retrospectiva-2010-
prudencias-ousadias-mudancas-necessarias-stf>)
De grande valia a ideia dos juristas acima, pois com a uma ementa dos
fundamentos comuns entre os ministros é possível ter uma noção da posição
do órgão colegiado a respeito do tema e isto poderia ser feito sem prejudicar os
discursos individuais dos ministros, ou seja, eles teriam a oportunidade de
expressar suas idéias individuais livremente, porém, para a melhor prestação
jurídica colegiada estariam sujeitos a ter seus argumentos similares postos em
uma ementa, ementa esta que definiria com clareza os argumentos que
levaram à posição vencedora.
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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto ao longo deste estudo o princípio da publicidade está em
constante evolução desde o reconhecimento da sua importância na Revolução
Francesa até os dias de hoje com os novos meios de eficácia de tal princípio.
Pode-se observar que mesmo claramente explicitado tanto na
Constituição quanto no Código de Processo Civil, entre várias outras leis como
o citado Estatuto do Advogado, ainda assim, o princípio da publicidade é
muitas vezes ignorado por não ser conveniente aos cartórios.
O exemplo do advogado da Comarca de Cachoeirinha deve ser levado
por todos que atuam no Direito, pois o advogado se manifestou acerca da
negação de seu direito, de modo que participou na efetividade deste princípio
no cartório da comarca que atua. Cabe a todos os cidadãos ao ver este
princípio negado não se conformar e também buscar sua aplicabilidade, assim
todos estarão colaborando para um país mais transparente e, por
conseqüência, democrático.
Como manifestação atual do princípio da publicidade a TV Justiça pode
ser considerada um grande avanço para a democracia, haja vista a dimensão
da transparência dos julgados que ela proporciona. Porém, em muito ainda
pode melhorar para contribuir com a efetivação do direito á informação.
Pequenas mudanças poderiam ser implantadas nos julgamentos
colegiados do Supremo Tribunal Federal, a sugestão dos juristas Luís Roberto
Barroso e a doutora Patrícia Perrone Campos Mello de ser elaborada uma
ementa que contenha a tese jurídica que serviu como premissa para a decisão,
amenizaria muito este problema.
Após as exposições acima é possível perceber que mesmo que o
princípio da publicidade dos atos processuais pareça, a primeira vista, um
princípio simples de ser efetivado, ainda há alguns obstáculos que devem ser
vencidos para sua perfeita efetividade, um dos meios demonstrados de
colaboração para sua eficiência é a própria manifestação da população e
juristas com a luta por seus direitos e ideias que façam valer o direito
constitucional à informação.
8. Referências Bibliográficas
BARROSO, Luís Roberto. A doutrina brasileira da efetividade. In Temas: de
direito constitucional, v.3. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.
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______. PRUDÊNCIA, OUSADIAS E MUDANÇAS NECESSÁRIAS NO STF.
DISPONÍVEL EM: <HTTP://WWW.CONJUR.COM.BR/2010-DEZ-
28/RETROSPECTIVA-2010-PRUDENCIAS-OUSADIAS-MUDANCAS-
NECESSARIAS-STF> ACESSO EM: 18.04.2012.
BUENO, Cássio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual
Civil: teoria geral do direito processual civil, vol. 1. 5ª ed.São Paulo: Saraiva,
2011.
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 20ª ed. Rio
deJaneiro: Lumen Juris, 2010.
COSTA, Carlos. A Crise do Supremo, os Holofotes e a Catarse da Mídia.
Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-abr-17/crise-supremo-
holofotes-catarse-midia>. Acesso em: 18.04.2012.
DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol.1. 12. ed.
Bahia: JusPODIVM, 2010.
DONIZETI, Elpídio. Curso didático de Direito Processual Civil. 11° ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos. 3ª ed. rev., e ampl..
São Paulo: Malheiros, 2004.
MITIDIERA, Daniel Francisco. Comentário ao código de processo civil:
tomo II. São Paulo: Memória Jurídica, 2005.
NERY JÚNIOR, Nelson. Princípio do Processo na Constituição Federal. 10ª
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
ROSAS, Roberto. Direito Processual Constitucional. 2ª ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1997.
TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 12.ª ed. São Paulo:
Malheiros,1996.
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THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual – Teoria geral
do direito processual civil e processo de conhecimento. 52ª ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2011.
WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil, vol.1. 9ª ed.
Revista dos Tribunais, 2007.
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RESUMOS EXPANDIDOS
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BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA HERMENÊUTCA CONTRATUAL
Karina Alves Teixeira Santos
e-mail: [email protected]
Universidade Estadual de Londrina
Para tratar acerca de hermenêutica contratual é indispensável a traçada de um
paralelo entre esta e a principiologia do Direito Contratual, que açambarca os
princípios: da autonomia da vontade, da obrigatoriedade contratual e do
consensualismo, que em resumida epítome quer significar que a hermenêutica
dos contratos encontra-se obrigatoriamente vinculada a vontade e a forma de
pactuar existente entre as partes quando da celebração do acordo. A
hermenêutica corresponde ao ato de interpretar e, sobretudo, compreender e
aplicar um determinado dispositivo em condizência com a completude do
ordenamento jurídico, principalmente no campo principiológico. O Código Civil
é desprivilegiado de normas hermenêuticas, trazendo poucas regras, como a
do artigo 112, segundo a qual o intérprete deve-se ater mais à intenção das
partes do que ao sentido literal da linguagem. O Codex traz ainda algumas
normas hermenêuticas como as dos artigos 421 a 423, que se referem à
principiologia contratual dispondo respectivamente que a liberdade de contratar
encontrará limites na função social do contrato; que os contratantes devem se
pautar na probidade e na boa-fé; e que os contratos de adesão devem ser
interpretados sempre em prol do aderente. Em real, não compete mesmo ao
legislador a função interpretativa, incumbindo o papel ao intérprete com o
auxílio da doutrina e da jurisprudência ante cada caso concreto. Em término,
urge acrescentar que a hermenêutica contratual deve ter como norteador os
valores esculpidos na Constituição Federal. É com arrimo na dignidade da
pessoa humana e nos direitos fundamentais que o exegeta deve realizar a
hermenêutica contratual, em conformidade com cada caso concreto, devendo o
intérprete conjugar os princípios e regras, solidificando uma argumentação apta
a resguardar os valores da dignidade e da justiça.
Palavras-chave: Hermenêutica. Contratos. Interpretação.
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A CONCILIAÇÃO COMO FORMA DE PACIFICAÇÃO SOCIAL DOS
NEGÓCIOS JURÍDICOS PRIVADOS - ACESSO À ORDEM JURÍDICA JUSTA
Direito processual civil e meios alternativos de solução de conflitos
Mayna Marchiori de Moraes
, [email protected], Universidade Estadual de Londrina
Rozane da Rosa Cachapuz
, [email protected], Universidade Estadual de Londrina
O dever do Estado não se resume a uma mera resposta jurisdicional, mas
exige a prestação de uma tutela efetiva, que atenda ao princípio constitucional
da razoável duração do processo previsto na Carta Magna. Entretanto, a
demora na prestação da tutela jurisdicional continua a ser um dos males
contemporâneos do processo civil. Por isso, a doutrina processual hodierna
tem se preocupado com a questão da temporalidade do processo. Cediço que
não se trata de um problema inerente às leis tão-somente, mas sim, ao sistema
judiciário de forma ampla, sua estruturação e a política pública que o embasa.
Um dos métodos eficazes que corroboram a justeza na prestação da tutela é
exatamente a política pública conciliatória de resolução dos conflitos,
principalmente na esfera dos negócios jurídicos privados, que elege a
participação das partes, por meio da manifestação de vontade, como ponto
decisivo no resultado de seus interesses. Todavia, o principal problema para
implementação dessa técnica continua a ser a cultura retrógrada da
litigiosidade, pois muitos dos integrantes do Judiciário não confiam nas
alternativas à justiça processualizada convencional. Torna-se necessário,
portanto, educar o cidadão para uma nova mentalidade, voltada à paz social.
Assim, o dogma da utilização desenfreada da atividade substitutiva do Poder
Judiciário será amenizado, dando margem a uma nova cultura acerca da
promoção da solução de conflitos por meios autocompositivos, que são
instrumentos efetivos na pacificação social.
Palavras-chave: Estado Democrático de Direito; acesso à ordem jurídica justa;
vias conciliativas; efetividade.
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DIREITO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO DA EMPRESA
CONTEMPORÂNEA
Direito constitucional, administrativo e ambiental
Juliana Hinterlang dos Santos
Universidade Estadual de Londrina
Laeti Fermino Tudisco
Instituto de Direito Constitucional e Cidadania
Durante anos, as empresas estiveram preocupadas com o chamado lucro a
qualquer custo. Assim, as empresas não tinham outros interesses a não ser o
econômico. Tal pensamento iniciou-se, no Brasil, nas últimas duas décadas. As
empresas tendem a se preocupar com os recursos não renováveis, o impacto
ambiental de sua atividade, além de outras situações envolvendo o meio
ambiente. A preocupação ambiental passou a ser constante no momento em
que a atividade empresária começou a intervir na condição de vida humana.
Nesse sentido, estar em consonância com a legislação ambiental é primordial
para que qualquer atividade prospere nos dias atuais. O rol legislativo na esfera
ambiental é amplo e traz uma série de possibilidades para que a atividade
tenha o chamado lucro sustentável. Assim, cumpre destacar que tanto o
licenciamento ambiental como as demais medidas que almejam minimizar ou
mesmo compensar a degradação ambiental, surgem como instrumentos que
têm por objetivo o cumprimento das leis, a partir da regência da Constituição de
1988. Atualmente, as empresas devem buscar no Direito Ambiental o respaldo
necessário para uma gestão organizacional, a qual previna problemas que
possam vir a afetar o meio ambiente e a própria empresa, evitando, assim,
contendas que quando não originam perdas econômico-financeiras
significativas, como por exemplo, a paralização de suas atividades, implicam
em prejuízos à sua imagem. Diante disso, o Direito Ambiental visa colaborar
com a organização de um sistema de gestão que vislumbre o respeito ao
ambiente e a busca da sustentabilidade.
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A DESIGUALDADE SOCIOEDUCACIONAL NA RELAÇÃO NEGOCIAL E OS
OBSTÁCULOS AO ACESSO À JUSTIÇA PELA PARTE HIPOSSUFICIENTE
Área: Direito Constitucional
Gustavo Rossetto Mendes Batista – [email protected]
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO: Almeja o estudo analisar meticulosamente as implicações das
desigualdades socioeducacionais – tão gritantes no Brasil – na relação
negocial, considerando-se a dimensão da liberdade contratual para cada parte
e a disparidade de armas em eventual litígio. Examina as posições doutrinárias
acerca do acesso à justiça da parte preterida. Pondera sobre disposições
legais insculpidas no ordenamento jurídico nacional que visam à proteção do
sujeito hipossuficiente e a concretização do princípio da igualdade. Por fim,
questiona a igualdade processual no caso concreto e demonstra a necessidade
de um juiz mais ativo, de forma que, embora as diferenças entre as partes
jamais possam ser elididas, sejam eficientemente minimizadas.
PALAVRAS-CHAVE: Desigualdade socioeducacional; acesso à justiça;
relação negocial; Princípio da Igualdade
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MEDIDAS CAUTELARES NO PROCESSO CAUTELAR E NO
PROCEDIMENTO ARBITRAL
Direto Processual Civil
Maria Gabriela Staut
Faculdade Paranaense - FACCAR
Palavras Chave: processo civil; processo cautelar; arbitragem; cautelar
preparatória.
As medidas cautelares, quando concedidas na esfera judicial,
pressupõem a urgência e têm como escopo garantir o resultado útil do
processo principal, seja ele de conhecimento ou de execução.
Para tanto, o requerente deve preencher os requisitos previstos
em lei, demonstrando na petição inicial a existência do fumus boni iures e do
periculum in mora.
Por outro lado, no que se refere ao procedimento arbitral, o
árbitro tem competência para deferir ou não medidas cautelares ou coercitivas,
desde que presentes, como ocorre no processo judicial, os mesmos requisitos
supracitados.
Contudo, para efetivar tais medidas, necessário se faz a
presença do Estado, único detentor do poder de coerção e de execução, por
intermédio do Poder Judiciário.
Assim sendo, com a introdução da nova sistemática da
arbitragem (Lei nº 9.307 de 1996), ampliou-se o poder do árbitro, que poderá
conceder medidas cautelares ou coercitivas a pedido da parte ou de ofício,
desde que preenchidos os requisitos, mas cuja efetivação ocorrerá por
intermédio do Poder Judiciário.
De outro lado, no que se refere às medidas cautelares
preparatórias, que são concedidas antes de instituído o tribunal arbitral, é
possível que a parte recorra ao órgão jurisdicional que seria competente para
apreciar a questão originariamente, evitando lesão ou ameaça de lesão aos
seus direitos, desde que preenchidos os mesmos requisitos.
Posteriormente, instituído o tribunal arbitral, o juiz togado
deverá remeter o processo ao árbitro, que poderá ou não manter a decisão que
concedeu a medida, na medida em que entender ser a mesma necessária.
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50ª Semana Jurídica da Universidade Estadual de Londrina
Anais do I Encontro Científico da Semana Jurídica da UEL |
24.05.2012 | UEL | Londrina/PR ISSN 2237-5287
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A INFLUÊNCIA DAS “CLASS ACTIONS” NORTE-AMERICANAS NAS
AÇÕES QUE TUTELAM DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
Direto do Consumidor
Maria Gabriela Staut
Faculdade Paranaense - FACCAR
Palavras Chave: direitos individuais homogêneos; ação coletiva; liquidação de
sentença, execução; fluid recovery.
As sentenças prolatadas em ações coletivas para a defesa de
interesses individuais homogêneos são genéricas, nos termos do art. 95 do
CDC, ou seja, são ilíquidas quanto ao valor da pretensão devida e à
identificação dos exeqüentes da futura ação de execução.
Transitada em julgado e dada publicidade, proceder-se-á à
habilitação das vítimas e seus sucessores para dar início ao processo de
liquidação e execução, conforme dispõe o art. 97 do CDC, que poderá ser
individual ou coletiva.
Quando referida liquidação e execução for coletiva (genérica),
ela será realizada de forma residual pelos legitimados do art. 82 do CDC. Isso
somente é possível depois de decorrido o prazo de um ano da publicação da
sentença sem habilitação das vítimas e sucessores em número compatível com
a gravidade do dano.
A condenação do causador do dano a pagar o valor arbitrado
pelo juiz deverá atender à extensão do dano, à gravidade do dano considerado
coletivamente e ao número de ações individuais propostas após o decurso do
prazo de um ano (art. 99, CDC), haja vista o caráter residual do Fundo de
Defesa dos Interesses Difusos para o qual será revertido o valor da
condenação (art. 100, CDC). Trata-se do chamado fluid recovery, importado do
direito norte-americano, cuja finalidade é a reconstituição dos bens lesados em
benefício de interesses coletivos dos consumidores. O Código de Defesa do
Consumidor regulamentou o Fundo, que é gerido pelo Conselho Federal
Gestor do FDD, no âmbito da estrutura organizacional do Ministério da Justiça.
Portanto, as “class actions” norte-americanas influenciaram em
muito o direito brasileiro, especialmente as ações que tutelam os direitos
individuais homogêneos.
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A NECESSIDADE DE APLICAÇÃO CONJUNTA DOS PRINCÍPIOS DA
PREVENÇÃO E DA OBRIGATORIEDADE DA INTERVENÇÃO ESTATAL NA
PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE
Kamyla Maranho
–[email protected]–UEL
Ana Cláudia Duarte Pinheiro
–[email protected]–UEL
Diante da atual onda de escorregamentos enfatiza-se a necessidade da efetiva
aplicação do princípio da prevenção atrelado ao princípio da obrigatoriedade da
intervenção estatal. Apesar do vasto conhecimento sobre os mecanismos e
fatores que geram os escorregamentos, estes continuam a ceifar vidas, visto
que são raras as iniciativas governamentais de prevenção, sem falar na
precariedade de legislação que impeça a ocupação das áreas de risco. O
princípio da prevenção volta-se para o momento anterior ao da consumação do
dano, ou seja, diante das características das encostas e da pouca valia da
reparação, sempre incerta e, quando possível, excessivamente onerosa, a
prevenção é a melhor solução. Tal princípio visa impedir a ocorrência de danos
ao meio ambiente e às pessoas, através da imposição de medidas
acautelatórias, antes da construção de casas e empreendimentos considerados
potencialmente danosos e arriscados em virtude do grau de inclinação e de
outras características como condições do solo e plantas. É indispensável
também a aplicação do princípio da obrigatoriedade da intervenção estatal. O
Poder Público possui, diante do caso concreto em questão, um dever de
proteção. O caput do art.225 da Constituição impõe-lhe o dever de defender e
preservar o meio ambiente e, no §1º, elenca algumas incumbências para
concretizar o direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Não é facultado ao Estado se omitir diante das evidências de perigo concreto
de dano, devendo intervir imediatamente para proteger o meio ambiente,
sempre que as circunstâncias justificarem e comprovarem a necessidade
dessa intervenção.
Palavras-chave: prevenção, obrigatoriedade, intervenção, escorregamento
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FUNÇÃO SOCIAL E RESPONSABILIDADE SOCIAL: UM ESTUDO SOBRE
AS BASES DA ÉTICA EMPRESARIAL
FERNANDES, Jéssika Piovezan;
CENCI, Elve Miguel;
A atividade empresária é alvo de constantes desafios devido aos avanços
tecnológicos, a concorrência acentuada e demais transformações no mercado,
obrigando as empresas a buscar métodos mais eficientes e lucrativos,
suprimindo, muitas vezes, a ética. Neste aspecto, a Carta Magna, em seu art.
170 e incisos, traz o conceito relativizado da propriedade privada, em que esta
somente é legitimada na hipótese de cumprir sua função social. Nesse sentido
entende Zanotti, em sua obra Empresa na Ordem Econômica: Princípios e
Função Social, que, sendo inadmissível que o Estado proporcione ilimitada
proteção aos direitos sobre a propriedade que não atenda a sua função social,
“também não há como se admitir a existência de empresas que não possuam
uma sensibilidade social aguçada e efetiva”. Assim, entende-se que ao cumprir
sua função social a empresa meramente legitima sua atividade, enquanto a
sociedade dela espera compromissos sociais, sem prejuízo da obtenção de
lucros, mas que efetivamente a eleja como alvo fundamental de suas ações. É
necessária a compreensão de que a filantropia empresarial consiste apenas
em ações esparsas, descontínuas, de cunho assistencialista, sem
compromisso com um avanço social efetivo, enquanto a responsabilidade
social, cujo valor ético-empresarial vai muito além, na medida em que busca
auxiliar a sociedade de forma continua e perene, compromete-se a realizar
alguma transformação social positiva.
Palavras-chave: ética empresarial, responsabilidade social empresarial,
função social da empresa.
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O DIREITO E O CONTROLE DO MARKETING
VIANA, F. Andréia336
KEMPFER, Marlene
PALAVRAS CHAVE: Sociedade de Consumo - Direito - Marketing
Atualmente, vivemos em uma sociedade de consumo decorrente de um
processo de produção e comercialização. As práticas comerciais nada mais
são do que o núcleo do direito do consumidor. Entretanto, as mesmas não são
simples de se conceituar. Introduzidas na sociedade de consumo, em
conseqüência da massificação das relações econômicas, as práticas
comerciais ganham grande destaque, visto que, alimentam a sociedade,
tornando cada vez mais próxima a relação dos consumidores com os bens
colocados à sua disposição. Dentro das relações das práticas comerciais um
instrumento que possui aspecto relevante, é o marketing. Para tornar possível
a promoção um produto ou serviço, o marketing se utiliza de uma série de
mecanismos de incentivo às vendas, como descontos, concursos, prêmios,
vendas a prazo, por correspondência ou a domicílio, as liquidações e
promoções, a facilidade e preço do crédito, as ofertas combinadas, as loterias,
os cupons, entre outros. Para o direito do consumidor há uma maior relevância
nos mecanismos principais, quais sejam: a publicidade e as promoções de
vendas. O Código de Defesa do Consumidor traz ao lado de um regramento
próprio para a publicidade, normas que dizem respeito às promoções de
vendas, em suas diversas modalidades. O direito objetiva controlar o
marketing, impondo parâmetros mínimos de conduta, respeitando, conforme os
preceitos constitucionais, a livre iniciativa. Esse controle pode ocorrer tanto
diretamente, como indiretamente. Diretamente, mediante normas que venham
a garantir as patentes, as marcas, os direitos autorais ou impedir a
concorrência desleal. São normas que procuram assegurar a honestidade e a
transparência nas relações entre os ditos profissionais do marketing.
336
Participante do Projeto Diálogos Jurídicos e Filosóficos: Intervenção do Estado no Domínio
Econômico: Ética Empresarial à luz do Regime Econômico Constitucional.
2.GRINOVER, Ada Pelegrini; VASCONCELLOS E BENJAMIN, Antônio Herman; WATANABE,
Kazuo et alli. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, 4a.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995, p.170.
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Indiretamente, por meio da tutela do consumidor, impondo normas às relações
consumeristas, mantendo-a saudável e fortalecendo o papel do marketing na
sociedade de consumo. Em síntese, “o marketing é protegido na medida em
que o direito assegura a perfeição da relação de consumo, purificando, dessa
forma, o mercado, e, pela via transversa, também a atividade de marketing” 337.
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REINTEGRAÇÃO SOCIAL DO DETENTO: O TRABALHO PENITENCIÁRIO
EXTRAMUROS E AS ENTIDADES BRASILEIRAS DO SISTEMA “S”
PEZARINI, Mariana de Oliveira.
KEMPFER, Marlene.
A reintegração social dos detentos e ex-detentos é dever jurídico do Estado e
moral das empresas. Porém o sistema carcerário brasileiro não possibilita a
recuperação, pois, entre outros entraves, não proporciona a preparação
profissional. A dificuldade de reintegração do detento não é exclusividade
brasileira, conforme se pode concluir a partir da análise dos estudos de Rodrigo
Sanches Rios, em sua obra Prisão e Trabalho – uma análise comparativa do
sistema penitenciário italiano e do sistema brasileiro, na qual afirma, em
síntese, que só se poderá diminuir a segregação do egresso no meio social,
quando as medidas tomadas colocarem o preso “pra fora” da prisão, pois é
translúcido que, dentro da cadeia, se esgotaram quaisquer meios de
reintegração social. Portanto, é preciso unir forças para que tais exclusões
sejam discutidas e políticas públicas sejam implementadas, de modo a
preparar o detento. Defende-se que o Brasil tem uma importante estrutura
para preparar e reintegrar o egresso. São as entidades do denominado sistema
“S”, entre elas o SESI, SEBRAE, SENAC, em favor de quem é pago o tributo
Contribuições de Intervenção sobre o Domínio Econômico (CIDE), além dos
repasses de verbas públicas por meio de transferências voluntárias, fruto de
convênios, para facilitar o acesso gratuito a programas de educação
profissional e tecnológica. Desta forma, as empresas que possuem a cultura da
responsabilidade social poderão receber os detentos e com isto contribuir para
geração de empregos (Art. 170, VII CF/88), erradicar a pobreza e a
marginalização (Art. 3º, II CF/88) e promover o bem superando os preconceitos
(Art. III, CF/88).
Palavras-chave: Reintegração social do egresso; Trabalho penitenciário;
Sistema S; Ética Empresarial.
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DA FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA NA PRESERVAÇÃO DA SAÚDE DO
TRABALHADOR
SPITI, Christiane; OLIVEIRA, Lourival José de
Universidade de Marília
O trabalho a ser desenvolvido visa analisar as condutas empresariais,
enfocando a busca da função social dos contratos, frente à valorização do
trabalho humano e preservação da dignidade do trabalhador. A metodologia a
ser utilizada envolve doutrina e jurisprudência, material na área de direito
constitucional; direito do trabalho; direito civil e empresarial; tratados
internacionais; dados de diagnóstico de doenças do trabalho. O trabalho é
antes de tudo um direito humano, sendo indispensável para a efetividade da
dignidade e por isso deve ser valorizado para se traduzir em existência humana
digna. A dignidade humana do trabalhador integra direta e indiretamente o
conteúdo essencial do direito fundamental ao meio ambiente do trabalho
equilibrado. A propriedade deve buscar atender sua função social, conforme
previsão constitucional, abandonando o modelo tão somente capitalista, mas
visando atender o objetivo maior de atendimento aos interesses socialmente
relevantes na preservação de um sadio meio ambiente de trabalho. A função
social da empresa incide no conteúdo do próprio direito de propriedade,
impondo-lhe um conceito constitucional, onde deve atuar de forma a atender
não apenas aos interesses individuais, mas de toda coletividade. Tal função
rompeu com a teoria simples e pura da busca pelo lucro, instituindo uma nova
missão às organizações econômicas, visando atender às necessidades sociais.
Assim, em virtude dos avanços tecnológicos e científicos experimentados pela
humanidade cada vez mais restam potencializados os riscos nos ambientes de
trabalho e tais riscos são agravados diante das diretrizes estabelecidas pelo
capitalismo globalizado, que não priorizam soluções para as questões sociais e
humanitárias. Diante de tais situações é relevante que sejam elaboradas e
cumpridas pela empresa estratégias preventivas, contribuindo para a
promoção da saúde do trabalhador e prevenção de doenças ocupacionais.
Palavras Chaves: Função Social; Dignidade; Saúde do Trabalhador; Empresa
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INTERNACIONALIZAÇÃO ECONÔMICA E TRANSFORMAÇÕES NO
ESTADO CONTEMPORÂNEO E NA ORDEM INSTITUCIONAL
INTERNACIONAL:338
Área Temática: Direito empresarial, tributário e econômico
Lucas Franco de Paula339
Tânia Lobo Muniz340
RESUMO: Sempre acompanhado de uma revolução tecnológica contínua, o
processo de internacionalização da economia, também conhecido por
globalização econômica, concretizou e avançou na segunda metade do século
XX, trazendo amplas transformações estruturais, sob o ponto de vista
econômico, para o então vigente modelo de Estado Nacional, e também nas
instituições e organismos internacionais responsáveis pelo cada vez mais
amplo, interdependente e transnacionalizado tratamento sobre as questões
econômicas. Por meio de uma releitura dos principais marcos que caracterizam
a internacionalização econômica, busca-se estabelecer uma relação entre
referidos acontecimentos e processos e a atual a configuração institucional
internacional e o Estado contemporâneo tendo-se em como referência um setor
específico da economia: o setor bancário e de produtos financeiros, em análise
de notável relevância em tempos de rediscussão sobre regulação financeira e
poderes do Estado em razão das crises financeiras atualmente vividas.
Pretender-se demonstrar que o processo de internacionalização econômica e
as opções de economia política guardam relação direta com o atual arcabouço
institucional para o mercado bancário e alguns produtos financeiros e algumas
de suas características específicas.
PALAVRAS-CHAVE: Estado Contemporâneo; Globalização Econômica;
Internacionalização da Economia.
338
Artigo desenvolvido no projeto de pesquisa (UEL) “Perspectivas do Direito Internacional
Contemporâneo nas Relações Sociais, Políticas e Negociais da Atualidade”, em 2011. 339
Lucas Franco de Paula, mestrando em Direito Negocial pela Universidade Estadual de Londrina –
UEL, email:[email protected] 340
Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professora Adjunta da
Universidade Estadual de Londrina – email:[email protected]
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A DEFESA DO EXECUTADO COM FUNDAMENTO NOS ARTS. 475-L, § 1º E
741, PARÁGRAFO ÚNICO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: A COISA
JULGADA INCONSTITUCIONAL
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE
CONFLITOS
Nathália Mariáh Mazzeo Sánchez341
, [email protected], Universidade Estadual de Londrina (UEL);
Marcos Antônio Striquer Soares342
, [email protected], Universidade Estadual de Londrina (UEL)
RESUMO
O artigo 475-L, §1º do Código de Processo Civil, juntamente com o artigo 741,
parágrafo único do mesmo diploma legal estabelecem a possibilidade de a
defesa do executado (em cumprimento de sentença ou em execuções contra a
Fazenda Pública) versar sobre a inexigibildiade do título executivo judicial.
Inexigibilidade esta fundada na declaração de inconstitucionaldiade de lei ou
ato normativo (em que se fundou a sentença) pelo Supremo Tribunal Federal.
Ocorre que tal possibilidade, ao menos à primeira vista, vai de encontro à
garantia constitucional da coisa julgada, trazendo instabilidade às relações
jurídico-processuais. Pretende-se, desta forma, analisar a questão, verificando
a natureza jurídica das normas que fixam tais meios de defesa do executado,
num esforço interpretativo condizente com as premisssas constitucionais
processuais e com os escopos a que se submete o processo.
Palavras-chave: Processo civil; Defesa do executado; Art. 475-L, § 1º; Art.
741, parágrafo único; Coisa julgada inconstitucional.
341
Advogada, Professora do Curso de Direito da Faculdade Dom Bosco – Cornélio Procópio/PR, Mestranda do Programa de Direito Negocial da Universidade Estadual de Londrina. 342
Doutor em Direito pela PUC/SP, docente do Programa de Direito Negocial da Universidade Estadual de Londrina
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PRINCÍPIO DA UNIVERSALIDADE NO TRIBUNAL PENAL
INTERNACIONAL: CASO PROMOTOR V. OMAR HASSAN AHMAD AL
BASHIR
Área temática: Direito trabalhista, internacional e direitos humanos
Alessandra Caria Buges.
[email protected]. Universidade Estadual de Londrina
Patrícia Ayub da Costa Ligmanovski.
[email protected]. Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
Uma das peculiaridades do Tribunal Penal Internacional (TPI), em vigor desde
1º de julho de 2002, é sua jurisdição de caráter universal. Infere-se do texto do
Estatuto de Roma de 1998 que o TPI tem legitimidade para dar início à
persecução criminal com relação a indivíduos de quaisquer Estados,
signatários ou não do Estatuto. Desta forma, ainda que o suspeito de prática de
crimes da competência do Tribunal seja cidadão de Estado não-signatário do
Estatuto de Roma, contra ele poderá expedir-se mandado de prisão, cujo
cumprimento se dará no momento em que o indivíduo ingressar em território de
Estado membro. Tal hipótese se dará, todavia, apenas quando o Conselho de
Segurança da Organização das Nações Unidas levar o respectivo caso ao
Tribunal. O caso Promotor v. Omar Al-Bashir foi instaurado nestes termos,
após grande comoção da comunidade internacional para que se desse fim ao
conflito na região de Darfur, no Sudão, iniciado no ano de 2003. Contra o
ditador sudanês já foram expedidos dois mandados prisão, o primeiro em 2009
e o segundo em 2012, sendo aquele o primeiro contra um chefe de Estado
ainda em exercício. Al-Bashir é acusado de sete crimes de guerra (ataque a
civis e pilhagem) e contra a humanidade (homicídio, extermínio, deslocamento
forçado, tortura e estupro) na região de Darfur. Segundo dados da Organização
das Nações Unidas, desde 2003, até 300 mil pessoas morreram e outras 2,7
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milhões foram deslocadas devido à disputa. O presente trabalho analisa o
instituto da responsabilização criminal de pessoa física no cenário internacional
dentro do sistema proposto pelo Estatuto de Roma, em específico o caso Omar
Al-Bashir v. Promotor. Aponta também as regras procedimentais relativas ao
inquérito, juízo de pré-julgamento e sentença final imposta ao acusado.
Palavras-chave: Tribunal Penal Internacional; responsabilidade criminal
internacional; Omar Al-Bashir.
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REFÚGIO E SUAS TRANSFORMAÇÕES SOB A ÓTICA DAS NORMAS
Área temática: Direito Internacional
Bruna Gabriela Eches Perugini;
Profa. Mª Juliana Kiyosen Nakayama;
E-mail: [email protected]
O presente resumo objetiva apresentar uma análise sobre a evolução mundial
das normas e das organizações que se referem ao tratamento internacional
dos refugiados. Pode-se dizer que foi a partir de meados do século XX, que os
Estados participantes do sistema internacional começaram a reconhecer a
prática do refúgio, por motivo de medo ou real perseguição em razão de raça,
religião, opiniões políticas, filiação social e nacionalidade – direitos do indivíduo
que deveriam ser protegidos por uma legislação internacional. Em meio à
Guerra Fria, precisamente em dezembro de 1950, a ONU decidiu criar o Alto
Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), ainda que
com resistência da União Soviética, atuando em prol dos refugiados europeus.
Além da criação do organismo, era necessária a conceituação de “refugiado”
que veio logo em seguida, através da Convenção Relativa ao Estatuto dos
Refugiados, de 1951. Neste contexto pós-guerra, buscou-se a proteção dos
direitos humanos diante da comunidade internacional. Desta forma, os direitos
individuais da Declaração Universal de 1948 foram ampliados a nível
internacional, reconhecendo o direito do individuo de buscar asilo político,
dirigindo-se a outro país e solicitando-lhe a proteção, mas não obrigando os
Estados a concederem este, visto que trata de um ato Soberano do Estado. Em
sua redação original, a convenção considerava um limite temporal para a
concessão do refúgio: perseguição, ou perigo, resultante de acontecimentos
ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951. Também é possível a interpretação
de um limite geográfico, ou seja, a Convenção de 1951 foi originalmente
designada pelos países ocidentais para prover refúgio aos anticomunistas que
fugiam do leste europeu após a II Guerra Mundial. Na década de 1960,
percebeu-se a existência de um grande fluxo de refugiados provenientes da
África e Ásia, devido aos movimentos de descolonização de tais. Em 1967 foi
gerado o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados, que visou solucionar as
questões geradas pelas duas limitações da Convenção – temporal e
geográfica. A Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados foi assinada pelo
Brasil em 15/07/1952, e teve seu texto aprovado para ratificação pelo Decreto-
Legislativo n.º11, de 07/07/1960. Porém, ainda que tenha se comprometido na
década de 50, nosso país somente foi abrir-se definitivamente à sua acolhida
após a última redemocratização, nos anos 70. Até havia a imagem de país
aberto à migração, passada ao senso comum, entretanto, se confrontava com
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a realidade de um país que somente se abria à imigração segundo seus
interesses econômicos e que oferecia árdua resistência à integração jurídica e
social de determinados grupos de estrangeiros, especialmente de refugiados.
Durante a ditadura militar, instaurada no Golpe de Estado de 1964, a acolhida a
estes indivíduos foi feita em termos mínimos – adotara-se a limitação
geográfica como interpretação à definição do termo refugiado do Estatuto e
sustentava as reservas aos artigos 15 e 17, que tratam respectivamente de
direitos de associação e de direitos de trabalho, possibilitando somente que o
país, em relação aos refugiados, fosse um “território de transição”, no sentido
de que os refugiados eram admitidos no território nacional apenas para
reassentamento em outro país. No ano de 1977, o ACNUR celebrou com o
Brasil, a abertura de um escritório localizado na cidade do Rio de Janeiro,
oficialmente para tratar das questões relacionadas ao reassentamento, o
escritório trabalhava informalmente na acolhida destas pessoas enquanto
permaneciam no território nacional, através de organizações internas da
sociedade civil de proteção de direitos humanos. Foi apenas em 1982 que o
nosso país reconheceu oficialmente o ACNUR como uma agência da ONU, e
lhe conferiu todo o tratamento jurídico decorrente desta situação. Em 1988,
promulgou-se a nova Constituição Federal – marco da redemocratização –
focada, principalmente, nos direitos humanos e na democracia. A partir de
então o país não mais se utilizava da limitação geográfica na interpretação do
termo “refugiado”, e no ano de 1991 surgiu a primeira disciplina jurídica
brasileira que reconhecia e concedia alguns direitos aos refugiados – ainda que
no âmbito interno, podemos dizer que aplicava de modo precário as
disposições do Estatuto internacional de 1951 e do Protocolo de 1967, o que
revelava a necessidade de edição de lei específica. Esta somente veio a ser
estabelecida em 1997, na chamada Lei do Refúgio brasileira (Lei 9.474/97).
Seu artigo 1.º estabelece que refugiado é todo indivíduo que: a) devido a
fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião , nacionalidade,
grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de
nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção daquele país;
b) não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua
residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das
circunstâncias de fundado temor de perseguição por motivos de raça, religião,
nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas; c) devido à grave e
generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de
nacionalidade para buscar refúgio em outro país. Também, o reconhecimento
da condição de refugiado de um indivíduo e estende ao seu cônjuge e aos seus
ascendentes e descendentes, também aos membros familiares do refugiado
que dele dependerem economicamente, se estes se encontrarem em território
nacional. Da mesma forma, ficaram expressamente excluídos da possibilidade
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de reconhecimento da condição de refugiados pelo Brasil os indivíduos que: a)
já desfrutem de proteção ou assistência por parte de organismos ou instituições
das Nações Unidas que não o ACNUR; b) sejam residentes no território
nacional e tenham direitos e obrigações relacionados com a condição de
nacional brasileiro; c) tenham cometido crime contra a paz, crime de guerra,
crime contra a humanidade, crime hediondo, participado de atos terroristas ou
tráfico de drogas; d) sejam considerados culpados de atos contrários aos fins e
princípios das Nações Unidas. Ainda, a lei 9.474/97 estabelece as cláusulas de
cessação. Tais ocorrem quando o estrangeiro: a) voltar a se valer da proteção
do seu país de nacionalidade; b) recuperar voluntariamente a nacionalidade
perdida; c) adquirir nova nacionalidade e passar a gozar da proteção do país
de sua nova nacionalidade. d) estabelecer-se novamente, de modo voluntário,
no país de que é nacional por haverem deixado de existir as circunstâncias
pelas quais foi reconhecido como refugiado; e) sendo apátrida, estiver em
condições de voltar ao país no qual tinha sua residência habitual, uma vez que
tenham deixado de existir as circunstâncias sem conseqüência das quais tenha
sido reconhecido como refugiado. E, por fim, a condição de refugiado pode ser
perdida por: a) renúncia voluntária; b) prova da falsidade dos fundamentos
invocados para o reconhecimento da condição de refugiado ou a existência de
fatos que, se fossem conhecidos quando do reconhecimento, teriam ensejado
uma declaração negativa de reconhecimento; c) exercício de atividades
contrárias à segurança nacional ou à ordem pública; d) saída do território
nacional sem a prévia autorização do governo brasileiro. A referida lei também
define o procedimento a ser seguido para a solicitação de refúgio. Desta forma,
o estrangeiro pode solicitar a qualquer autoridade migratória o reconhecimento
do seu status de refugiado, protegendo sua estada no país, sem que qualquer
irregularidade desta seja alegada e usada contra si, visto a exclusão da
condição de permanência no território nacional, além de ser proibida a
deportação taxativa do requerente do refugio. Após o pedido de refúgio, a
autoridade pela qual ele for realizado reduzirá a termo as declarações do
requerente, elaborando assim o Termo de Declarações – documento inicial do
processo administrativo, de natureza declaratória e não contenciosa, no qual o
governo brasileiro decidirá se reconhece ou não a condição de refugiado do
requerente. Tal processo de solicitação é composto por três fases: o
preenchimento de questionário de reconhecimento da condição de refugiado,
entrevista e elaboração de parecer sobre a solicitação. Ao fim do processo é
negada ou aceita a condição de refugiado do individuo. Por fim, a lei 9.474, cria
o Comitê Nacional para Refugiados (CONARE). Órgão de deliberação coletiva,
no âmbito do Ministério da Justiça que tem as funções de a) analisar o pedido e
declarar o reconhecimento, em primeira instância, da condição de refugiado; b)
decidir a cessação, em primeira instância, ex officio ou mediante requerimento
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das autoridades competentes, da condição de refugiado; c) determinar a perda,
em primeira instância, da condição de refugiado; d) orientar e coordenar as
ações necessárias à eficácia da proteção, assistência e apoio jurídico aos
refugiados; e) aprovar instruções normativas esclarecedoras à execução da Lei
9474/97. Reunindo-se mensalmente, o CONARE é composto por: a)
representante do Ministério da Justiça, a quem compete à presidência do
Comitê; b) representante do Ministério das Relações Exteriores; c)
representante do Ministério do Trabalho e do Emprego; d) representante do
Ministério da Saúde; e) representante do Ministério da Educação; f)
representante do Departamento da Polícia Federal; g) representante de
organização não-governamental que se dedica a atividade de assistência e
proteção de refugiados no país – Cáritas Arquidiocesana de São Paulo e do
Rio de Janeiro; h) representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para
Refugiados no Brasil – ACNUR, com direito a voz, mas sem direito a voto.
Desta forma, conclui-se que o conceito de “refugiado” gerado em meados do
século XX, no contexto do pós-guerra, apresentou-se defasado para enfrentar
os complexos desafios do cenário contemporâneo, e precisou ser modificado
em conformidade com as necessidades do mundo moderno. Modificações que,
ainda hoje, não são suficientes para acompanhar a rapidez com que a
sociedade se transmuta. No mundo moderno a qual estamos inseridos, em que
existe um número significativo de pessoas deslocadas que precisam de
proteção (independentemente das várias categorias em que se encontram), é
imprescindível repensar o sistema, as soluções que oferece e a maneira como
foi implementado, não se atendo apenas à realidade do Brasil, mas do sistema
internacional como um todo.
Palavras-chave: refugiados; ACNUR; CONARE; organização internacional;
Direitos Humanos.
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O CONFLITO ENTRE A LIBERDADE DE INFORMAÇÃO E A PRESUNÇÃO
DE INOCÊNCIA
Direito Constitucional
Amanda Querino Barbosa
Guilherme Barbosa da Silva
Faculdade do Norte Pioneiro – FANORPI (Amanda)
Faculdades Integradas de Ourinhos – FIO (Guilherme)
Palavras-chave: conflito; liberdade de informação; presunção de inocência.
O poder constituinte originário, quando da promulgação da Constituição
Federal de 1988, estabeleceu a todos os cidadãos brasileiros certas garantias
e direitos individuais que estão insculpidos em seu artigo quinto. Tais garantias
foram, inclusive, estendidas aos estrangeiros que, mesmo não residentes, em
solo brasileiro se encontrarem. Ocorre que há dois destes direitos que
corriqueiramente se entrelaçam e se conflitam, quais sejam: a liberdade de
informação e a presunção de inocência. O direito à informação, garantido por
meio o inciso XIV do artigo 5º, se subdivide em direito a recebê-la, repassá-la e
busca-la. Todavia a informação a ser repassada deve ser a verdadeira, não se
pode utilizar tal direito sem fronteiras. Há ainda a informação jornalística, e, no
momento em que uma notícia é repassada aos receptores, o que ocorre é a
efetivação do direito de informação, amplamente garantido. O direito à
presunção da inocência, por sua vez, visa uma tutela ainda maior, o da
liberdade pessoal, tendo em vista que garante ao indiciado o direito de não ser
considerado culpado, até a sentença penal condenatória transitada em julgado.
Quando uma notícia é repassada, muitas vezes pela mídia, acaba por emitir
fatos que levam os receptores a acreditarem que o então indiciado é realmente
o culpado. Certo então que a livre informação colide com a presunção de
inocência. Para tal conflito, como não há direito absoluto, e tendo em vista a
característica da limitabilidade dos direitos fundamentais, deve o magistrado,
ao se deparar com o fato concreto, preponderar qual o direito deve ser
tutelado, afim de que se busque verdadeiramente a justiça, efetivando, desta
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forma, o Estado democrático de direito garantido pela CF em seu artigo
primeiro.
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A DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO E A CRISE DE GESTÃO NO
JUDICIÁRIO.
Direito constitucional
Eduardo Gomes da Silva
Universidade Estadual de Londrina
Palavras-Chave: Duração, Estrutural, Gestão, Razoável.
O principio da duração razoável do processo, encontra-se disposto em nossa
Constituição Federal no seu artigo 5º, inciso LXXVIII, mostrando dessa maneira
sua relevância, uma vez que este é tido como uma garantia fundamental. Tal
principio é de tamanha relevância, que diversas outras nações têm mostrado
interesse em acolhê-lo em suas constituições, a título de exemplo podemos
citar a Espanha,Itália, temos inclusive esse tema é discutido na Convenção
Americana de Direitos Humanos.
Por obvio, todo processo tem um tempo necessário para se resolver, e devido
a sua carga subjetiva é muito difícil mensurar qual seria o tempo adequado de
duração para cada processo, dependendo assim de cada caso concreto.
Embora seja difícil de mensurar a duração razoável para um o processo, é
evidente que um processo que demora décadas para se resolver não trouxe
justiça às partes, pois como diria Rui Barbosa, justiça tardia não é justiça e,
mas sim injustiça qualificada.
O judiciário brasileiro vem sofrendo um grave problema estrutural, pois devido
a vários fatores, como por exemplo, problemas de gestão vêm ferindo de
maneira severa duração razoável do processo. O fato de nossos processos
demorarem tanto para se resolverem não está em nossas leis, pois estas são
bem fundamentadas e concatenadas. O foco do problema está na falta de
preparo de alguns funcionários de cartórios, na forma de como os processos
são distribuídos e na falta de critério para remeter os processos aos gabinetes.
Esses são apenas alguns fatores que causam lentidão em nossa justiça.
Uma forma de se resolver isso, não é criando novas leis, é promover uma
reforma em toda a estrutura gestacional do judiciário, pois desta maneira
poderemos ver o principio da duração razoável do processo se efetivando.
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ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES;
GÓIS, Paula Barbosa;
BANNWART JÚNIOR, Clodomiro José.
Resumo: Robert Henry Srour em sua obra “Poder, Cultura e Ética nas
Organizações” afirma que: ética vem do grego – ethos - que significa caráter
distintivo, disposição, modo de ser adquirido. Esta categoria refere-se ao
conjunto de costumes tradicionais de uma sociedade, a obrigações sociais e,
por conseguinte, a fenômenos de natureza histórica; não ao resultado de
reflexões sistemáticas. A acepção do conceito remete ao valor cultural de
integridade, seriedade e de probidade. A questão ética nas organizações passa
pela compreensão da sua cultura organizacional. Como suas questões do
cotidiano da organização são resolvidas? E quais os valores e crenças desta?
O modo como a organização opera, a partir da experiência em diferentes
situações, reflete a crença de cada instituição. Essa crença é minuciosa no
modelo de gestão que tem como ponto de partida a visão e a missão da
organização. Mesmo quando uma organização não tem um código de ética
formal, sempre existe um conjunto de princípios e normas que sustentam as
suas práticas. A ética numa organização, seja ela empresarial ou
governamental, deve ser pautada pelos mesmos princípios. Qualquer ação ou
decisão, coletiva ou pessoal, não pode prescindir de um comportamento ético,
já que os códigos de conduta devem ser uma ferramenta de gestão para
estabelecer e articular os valores corporativos, as responsabilidades sociais, e
as obrigações da organização que, em última análise, vão definir a forma como
atua para atingir os fins coletivos a que se propõe.
Palavras-chave: Ética; ética nas organizações; valores e crenças.
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TUTELA INIBITÓRIA: PREVENÇÃO, CESSAÇÃO OU EVITAÇÃO DA
PRÁTICA DO ILÍCITO.
Aldo Aranha de Castro
– Mestrando em Direito – UNIMAR.
E-mail: [email protected] ; [email protected] .
Maria de Fátima Ribeiro
– Coordenadora e Professora do Curso de Mestrado em Direito da
Universidade de Marília – UNIMAR
E-mail: [email protected] .
RESUMO
O presente artigo tem por escopo fazer uma abordagem sobre o tema da
Tutela Inibitória, que visa prevenir a prática de um ilícito, cessar a sua
continuação ou evitar a sua repetição. Para tanto, faz-se necessária uma
análise da tutela inibitória positiva e negativa do ilícito e do dano. No
desenvolvimento do presente trabalho, faz-se de suma importância a
conceituação de tutela inibitória e, a partir desta, poder-se-á fazer uma análise
do que vem a ser a tutela inibitória positiva (quando se faz presente a
obrigação de fazer) e a negativa (aplicada nos casos de obrigação de não
fazer). Por consequência, embasar-se-á com mais firmeza e profundidade
sobre o modo como pode se originar essa tutela, qual seja, como mencionado,
através de obrigações de fazer ou não fazer. Cumpre destacar também que,
quando se dá o descumprimento da tutela inibitória, é cabível astreinte, por
exemplo. Após a análise estrutural sobre o tema, faz-se importante também,
abordar a questão da sentença e execução de referida tutela. Em relação à
sentença, analisar-se-á seu conceito e aplicação, devendo-se, para tanto,
considerar a classificação quinária da sentença (declaratória, condenatória,
constitutiva, executiva e mandamental), a qual é defendida pela doutrina
majoritária, cumprindo-se destacar que, sobre o tema em análise, a tutela
inibitória possui caráter principalmente mandamental. Quanto à Execução, na
tutela inibitória ela ocorre no próprio bojo do processo, uma vez que, no
processo de conhecimento, encontrar-se-á presente a fase executiva, não
havendo necessidade de uma fase de execução própria, após a prolação da
sentença por parte do magistrado. E nesta fase, ela pode se dar,
principalmente, por meio da multa, que é um meio de coerção indireta da tutela
inibitória, mas também podem existir outros meios de coerção direta e sub-
rogatórios. Assim, por ser um tema pouco abordado na doutrina, espera-se
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com o desenvolver do presente artigo, que haja uma compreensão maior
acerca do instituto da Tutela Inibitória, que tão importante se faz, para que o
juiz se valha dos meios proporcional e legalmente necessários, para garantir o
cumprimento in natura da obrigação, ou alcançar o resultado prático
equivalente.
Palavras-chave: Tutela Inibitória; Tutela Positiva e Negativa; Tutela Inibitória
nas obrigações de Fazer e Não Fazer; Sentença; Execução
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A BOA-FÉ OBJETIVA COMO LIMITAÇÃO DA AUTONOMIA DA VONTADE
NO DIREITO CONTRATUAL.
Marília Vizzoto343
Como reação ao Estado Absolutista surge, no fim do século XVII, o liberalismo,
que pregava a limitação do poder estatal, o reconhecimento de direitos
individuais e o Estado mínimo. A autonomia da vontade, no sentido de definir a
conveniência e o conteúdo do contrato, era absoluta e havia uma presunção de
igualdade entre os contratantes, desse modo, o contrato, desde que livremente
pactuado, era legítimo e obrigatório. Porém a história mostrou que a liberdade
absoluta leva à injustiças, e o modelo vigente foi substituído pelo Estado Social,
que reconhecendo a desigualdade material entre os contratantes e visando a
efetivação dos valores constitucionais passou a limitar a vontade individual
através do dirigismo contratual. É sobre essa limitação, veiculada pelos
princípios da boa-fé objetiva e função social, trazidos pelo Código Civil, que
trata esse estudo. Explica que a boa-fé objetiva, diferentemente da sua
acepção subjetiva, é cláusula geral que impõe um parâmetro ético, leal e
solidário de conduta aos contratantes, é aplicada em todas as fases do contrato
e cumpre três funções, quais sejam, auxiliar na interpretação contratual, criar
deveres anexos e limitar o exercício de direitos subjetivos. Busca concluir,
através de análise doutrinária e jurisprudencial, que o princípio da autonomia
privada continua válido e eficaz. Contudo, o atual ordenamento jurídico coloca
a pessoa e sua dignidade como fundamento do sistema e em consequência
disso, para garantir a justiça social e o bem-estar coletivo, a autonomia da
vontade deve ser informada pelos princípios sociais.
Palavras-chave: Direito Civil Constitucional; Contrato; Autonomia da Vontade;
Boa-fé Objetiva.
343
[email protected], pós-graduanda em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade
Estadual de Londrina.
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DIREITOS SOCIAIS COMO LIMITES MATERIAIS À REFORMA
CONSTITUCIONAL
Dhyego Câmara de Araujo
Universidade Estadual de Londrina
Muito se discute acerca da inclusão dos direitos sociais no rol de
cláusulas pétreas. Esses limites materiais impostos à reforma constitucional
estão prescritos na própria Constituição, nos incisos do §4° do artigo 60. O que
indica a preocupação do legislador constituinte em estabelecer expressamente
o que deveria ser observado na ocorrência de uma emenda constitucional.
Esse núcleo intangível configura-se, desse modo, como proteção à
própria ordem constitucional, que além de resguardar a identidade do Estado e
a estabilidade dos princípios que fundamentam o Estado Democrático de
Direito, especialmente o princípio da dignidade da pessoa humana, protege a
Constituição dos casuísmos políticos e dos sabores das maiorias
parlamentares.
Os direitos sociais têm como núcleo fundamental a efetividade do
princípio da dignidade da pessoa humana, que é o valor vinculante de toda a
ordem jurídica, uma vez que representam condição necessária para o exercício
dos direitos e garantias individuais. São, portanto, direitos fundamentais, na
medida em que se traduzem como extensão dos direitos de primeira dimensão.
Ora, se uma das finalidades da Constituição Federal ao estabelecer
limites à sua reforma é preservar e proteger a dignidade da pessoa humana e,
se os direitos sociais são expressão e concretização, em nível individual e
coletivo, deste princípio, nada mais coerente do que elevar os direitos sociais à
condição de cláusulas pétreas.
A elaboração e proclamação de direitos por meio de regras e princípios
sociais pela Constituição Federal de 1988 atribuíram a esta a condição de
reguladora e garantidora da cidadania social. Tendo as cláusulas pétreas como
uma de suas justificativas prevenir um processo de erosão da Constituição, é a
garantia da cidadania social elementar à proteção da ordem constitucional.
PALAVRAS-CHAVE: CLÁUSULAS PÉTREAS – DIREITOS SOCIAIS –
CIDADANIA SOCIAL – REFORMA CONSTITUCIONAL – DIGNIDADE DA
PESSOA HUMANA.
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PRINCÍPIO DA INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO
Direito Constitucional
Dhyego Câmara de Araujo
Universidade Estadual de Londrina
A interpretação conforme a Constituição, desenvolvida pela doutrina e
jurisprudência alemãs, vem sendo amplamente aplicada no âmbito da
jurisdição brasileira e guarda algumas sutilezas que merecem destaque.
Este princípio destina-se à preservação da validade de determinadas
normas suspeitas de inconstitucionalidade, visando antes “salvá-las”, de modo
que se lhe atribua um sentido em conformidade com a ordem constitucional, do
que declarar sua inconstitucionalidade, provocando um vazio normativo.
A aplicação deste princípio nada mais é do que aplicar o princípio da
supremacia da Constituição. Como decorrência de sua posição hierárquica
superior, a Constituição é o fundamento último de validade de todas as normas
de um ordenamento, e, portanto, capaz de conferir unidade ao Direito.
O princípio da interpretação conforme a Constituição estabelece que
quando uma norma ordinária apresentar dúvidas em relação ao seu significado,
o intérprete deverá vincular-se àquele que melhor se coaduna com a
Constituição. Assim, diante de uma norma polissêmica, isto é, que comporte
diversas interpretações, deverá o aplicador escolher aquela que realize de
maneira mais adequada os valores e finalidades constitucionais.
Ao proceder dessa maneira, a Corte Constitucional, além de declarar a
constitucionalidade da norma de acordo com um determinado entendimento
que a salva, ela afasta as demais interpretações possíveis.
Desse modo, a interpretação conforme a Constituição realiza-se também
como um mecanismo de controle de constitucionalidade, uma vez que ao
excluir a incidência de todas as outras possibilidades interpretativas da norma
em apreço, age no sentido de declará-las inconstitucionais.
PALAVRAS-CHAVE: INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO –
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE – NORMAS POLISSÊMICAS.
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A TRIBUTAÇÃO COMO FORMA DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NA
ECONOMIA
Área temática: Direito empresarial, tributário e econômico.
Aldo Aranha de Castro
– Mestrando em Direito – UNIMAR.
E-mail: [email protected] ; [email protected] .
Maria de Fátima Ribeiro
– Coordenadora e Professora do Curso de Mestrado em Direito da
Universidade de Marília – UNIMAR
E-mail: [email protected] .
RESUMO
O presente trabalho tem por escopo estudar o modo como o Estado pode
intervir na economia por meio da tributação. Para tanto, faz-se necessário um
estudo sobre o Estado e seu desenvolvimento, abordando a questão da
globalização, do crescimento e do desenvolvimento, descrevendo qual o papel
do Estado no desenvolvimento econômico e social. Adentrando-se nesta seara,
far-se-á a análise acerca da ordem econômica nos moldes da Constituição
Federal, bem como o estudo dos princípios constitucionais fundamentais e os
objetivos garantidores da ordem econômica. A partir desta abordagem inicial,
estudar-se-á acerca dos reflexos da tributação no desenvolvimento econômico
e social, aprofundando-se quanto ao sistema constitucional tributário, à política
tributária e tributação, aos princípios constitucionais tributários e sua
aplicabilidade com vistas ao desenvolvimento econômico e social, entre outros.
Falar-se-á também, sobre a política fiscal e extrafiscalidade, fazendo-se uma
análise quando poderá existir exoneração tributária e quando esta não poderá
ocorrer. Como parte final da Dissertação, abordar-se-á acerca da efetividade
das políticas públicas no contexto tributário, analisando o Plano de
Desenvolvimento Nacional com base em incentivos fiscais e isenções, bem
como pontuar-se-á o que vem a ser a função social do tributo e como deve se
proceder com intuito de alcançar a justiça tributária e a efetividade na
implementação de políticas públicas. Por derradeiro, concluir-se-á abordando-
se a política tributária e a repercussão da carga tributária que incide sobre os
setores produtivos, para assim, dirimir quaisquer dúvidas bem como esclarecer
detalhadamente os pontos delineados no presente trabalho. Deste modo,
objetiva-se com esta Dissertação, uma melhor compreensão de como o Estado
intervém na economia através da Tributação.
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Palavras-chave: Tributação; Ordem Constitucional Econômica; Sistema
Constitucional Tributário; Políticas Públicas
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ACESSO À JUSTIÇA E GLOBALIZAÇÃO: O PROCESSO NA
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO
Rafael de Souza Borelli,
[email protected], UEL;
Marcos Antônio Striquer Soares,
[email protected], UEL;
O estudo do acesso à justiça foi propulsionado pela obra de Garth e
Cappelletti, os quais apontaram uma série de obstáculos e soluções para o
problema do acesso à Justiça. No Brasil, algumas dessas soluções foram
adotadas pelo legislador, através da Lei 7.347/85, da Lei 8.078/90, da Lei
9.099/95, entre outras. De maneira tangencial, verifica-se que a da
globalização vem retirando dos Estados competências a eles anteriormente
reservadas, destinando-as ao mercado e a organismos internacionais. Em
contrapartida, entende-se que mesmo nesse contexto houve um avanço no
acesso à justiça no plano internacional. Nesta linha, analisar-se-á o rito
processual e o acesso à justiça através do Órgão de Solução de Controvérsias
(OSC) da Organização Mundial do Comércio (OMC). Existem quatro fases
procedimentais: a primeira é a das consultas bilaterais, que terá início quando
um dos Estados-membros considerar que outro tenha adotado medidas
violadoras de acordos comerciais internacionais. Após negociação de 60 dias,
não havendo acordo, passa-se à segunda fase, quando o Estado reclamante
requererá a constituição de grupo especial (composto de 03 membros) para
examinar a controvérsia em sessenta dias. Caso haja inconformismo da
decisão do grupo especial, poderá o Estado-membro apelar da decisão para o
Órgão de Apelação, o qual poderá confirmar, modificar ou revogar as
conclusões do grupo especial (terceira fase). Após a decisão final (seja do
grupo especial ou do Órgão de Apelação), inicia-se a fase de implementação
do teor da decisão pelo Estado-membro vencido na demanda (quarta fase).
Para fins de exemplo, utilizar-se-ão como base do estudo duas decisões do
OSC envolvendo Brasil e Canadá: os casos Embraer e Bombardier.
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DIREITO E DECISÃO
Direito Constitucional
Larissa Moya Nascimento
Universidade Estadual de Londrina
Palavras chave: Constituição; decisão; limites.
A Constituição de 1988 trouxe em seu corpo um exaustivo rol de direitos
fundamentais que precisam ser observados. Nesse ponto, o Poder Judiciário
se apresenta como efetivo instrumento social, e com a finalidade máxima de
concretizar is direitos individuais previstos pelo Constituinte Originário. Há
casos, porém, em que o juiz precisa agir em meio a uma omissão legislativa,
pautando-se pela hermenêutica constitucional nos casos difíceis. Essa técnica
de interpretação pressupõe referência em conceitos técnico-jurídicos e também
em bases morais decorrentes dos juízos de valor e aceitabilidade raciona do
juiz. Assim, a normatividade situa-se no texto da norma e na decisão que
deriva de sua interpretação. Nesse campo, contudo, as muitas margens à
atuação jurisdicional em face das omissões trazem consigo a possibilidade de
desvio da finalidade para a qual foram constituídos os magistrados. O julgar
conforme a própria consciência traz à sociedade a questão da notória
preponderância de atuação do Poder Judiciário em detrimento da inércia ou
insuficiência no exercício das funções dos demais poderes, ensejando maiores
preocupações sociais e democráticas. Historicamente é possível observar que
a tirania já visitou os poderes públicos. Evidencia-se tal fato na razão pela qual
Montesquieu teorizou a Tripartição dos Poderes. Essa proposta teria como
objetivo a fiscalização mútua do exercício do poder, bem como a
desconcentração deste das mãos do soberano. No entanto, o Judiciário não
tem se mostrado afeto a preservar tal característica que lhe é originária. De
forma inevitável surgem situações as convicções se sobrepõem em uma
decisão. Nesse cenário, cabe aos juristas questionar os limites constitucionais
da atividade judicial de forma a conferir segurança e estabilidade às relações
jurídicas.
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ESTUDOS PARA A CONSTRUÇÃO DE UM ENSINO JURÍDICO
EMANCIPATÓRIO
Autieres Oliveira Costa
- [email protected] - UEL
Palavras-chave: educação; construção conjunta; efetivação fática.
O presente trabalho tem como objetivo problematizar o ensino jurídico
frente à crise atual do Direito, constatada em seu foco primário, ou seja, o
ensino jurídico, o qual se restringe ao aspecto legal não correspondendo à
complexidade social exigida.
Dessa forma, pela metodologia de pesquisa bibliográfica e observação
de campo, verificamos que a classificação de eficácia normativa dada por José
Afonso da Silva é insatisfatória, pois aquela não abrange o aspecto fático de
efetividade, apenas garantindo plenitude normativa. Pois, sendo o direito à
educação uma norma de eficácia limitada e a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional que tenta operar sua lacuna ter característica programática,
a eficácia plena esperada pela norma limitada atinge apenas o ordenamento
jurídico, o que deixa a eficácia real do direito insuscetível.
Para tentar superar tais contradições e no intuito de romper com o
estudo dogmático corrente no ensino do direito, nosso projeto (Carreiras
Jurídicas In Loco – O Papel dos advogados nos movimentos sociais), por meio
de um marco teórico libertário garantido por Paulo Freire, tenta possibilitar a
produção de um Direito emancipatório. Este viável por uma construção
conjunta, feita pela pessoa comum e pelo operador do Direito, permitindo assim
a atualização das aspirações legais às fáticas com o intuito de dar a
dinamicidade que a efetivação dos direitos fundamentais exige.
Nesse passo, acreditamos contribuir na efetivação fática da norma
programática infraconstitucional da educação (LDBEN) na sua finalidade de
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garantir o “pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício
da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
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DA INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ECONOMIA: NO CASO DA
SUPRANACIONALIDADE
Ygor Marcel Carli Albino (Discente UEL) [email protected]
Elve Miguel Cenci (Docente UEL) [email protected]
Devido a adoção do modelo do Estado de Bem Estar social na maioria dos
países que vieram a compor a União Europeia. Esse tornou-se um paradigma
quando da fundação dessa União. Criou-se então uma econômica forte
baseada no plano de estabilidade econômica, com a fixação de uma taxa de
cambio fixa entre seus países. Um plano de estabilidade, para a manutenção
desse modelo de Estado, foi traçado com metas a serem cumpridas por todos
os países signatários, tais como: a) A taxa de inflação do pais precisa ser no
máximo 1,5 % maior que a media dos três países membros da UE de menor
inflação; b) O país precisa manter uma taxa de cambio estável dentro do
mecanismo de taxa de cambio sem desvalorizar por sua própria alternativa; c)
O país deve ter um déficit do setor publico de no máximo 3% de seu PIB; d) O
pais precisa ter uma divida publica inferior ou próxima a um nível de referencia
de 60 % de seu PIB. Porém este pacto, devido a falta de sanções impostas aos
países descumpridores das metas, não pode ser cumprido. O que resultou no
endividamento de muitos países, sendo estes alvos de uma forte especulação
financeira, desestabilizando a área do Euro. Para sanar a economia,
diminuindo o déficit público, medidas austeras estão sendo exigidas pelos
países que lideram a politica econômica do grupo. Fato este que influi
consideravelmente na soberania dos países, criando pressões externas
capazes de influenciar a politica econômica doméstica dos Estados dentro da
arena supranacional.
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50ª Semana Jurídica da Universidade Estadual de Londrina
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O ACORDO TRIP E A INSERÇÃO DE NOVOS PARÂMETROS POR MEIO
DA LEI DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL.
Ygor Marcel Carli Albino (Discente UEL) [email protected]
Marlene Kempfer (Docente UEL) [email protected]
Com o objetivo de promover o desenvolvimento industrial e concorrencial, o
Brasil em 1994 assinou o tratado internacional TRIP (Trade-related Aspects of
Intellectual Property Rights) obrigando-se a definir critérios objetivos para a
garantia da proteção da propriedade intelectual. Para cumprir essa obrigação
foi aprovada a Lei 9.279 de 1996 disciplinando este objeto jurídico. Esta lei veio
a substituir a Lei 5.772 de 1971 e trouxe ao ordenamento jurídico critérios mais
objetivos e diminui as restrições na concessão de licenças para o uso
econômico das inovações tecnológicas. A nova lei regula também as hipóteses
de licenças, entre elas, a licença compulsória nos termos do capítulo VIII,
seção III, para que nestes casos e diante de conduta anticoncorrenciais seja
possível a relativização deste direito de propriedade em nome do interesse
público. No Brasil desde o ano de 2003 a intervenção estatal começa a ocorrer
por meio destas licenças no caso dos medicamentos de combate a AIDS,
permitindo o acesso ao tratamento sem custo aos usuários do Sistema Único
de Saúde. Foi uma atuação governamental na defesa de direitos fundamentais
que positivam uma ética jurídica. Tem-se, neste sentido, o encontro de tutelas
constitucionais tais como a proteção da propriedade privada, acrescida da
proteção à sua função social, que será atendida desde que promova o
desenvolvimento social e tecnológico.
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O ACESSO À MAGISTRATURA DO TRABALHO EM SEUS DIFERENTES
GRAUS DE JURISDIÇÃO
Nelson Luiz Pereira Junior
Acadêmico do Curso de Direito da UEL
Juliana Kiyosen Nakayama
Docente pela Universidade Estadual de Londrina. Orientadora.
O presente trabalho tem por objetivo delinear de que maneira ocorre o acesso
aos cargos da magistratura do trabalho em seus três graus de jurisdição. Em
primeiro grau, o acesso se dá mediante concurso público de provas e títulos,
com a necessária participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as
fases, sendo exigido, no mínimo, três anos de atividade jurídica do bacharel em
Direito, conforme dispõe o inciso I do art. 93 da Carta Magna. A Resolução
Administrativa n. 907/02, do TST, regula o concurso de ingresso na
magistratura do trabalho, delineando-o em cinco fases, nas quais quatro são de
caráter eliminatório (objetiva, dissertativa, prática de sentença e oral) e uma
classificatória (títulos). Os três anos de atividade jurídica são comprovados, em
prazo máximo, no ato de inscrição definitiva do concurso. Os Tribunais
Regionais do Trabalho, órgão do segundo grau de jurisdição, tem sua
composição feita por Juízes do Trabalho promovidos por antiguidade e
merecimento, alternadamente, apurados na última ou única entrância. Um
quinto desses assentos é ocupado por membros do Ministério Público ou da
advocacia com mais de dez anos de carreira ou atividade profissional. O
Tribunal Superior do Trabalho, última instância e órgão de cúpula da Justiça do
Trabalho, é composto por vinte e sete ministros oriundos dos Tribunais
Regionais do Trabalho nomeados pelo Presidente da República após figurarem
em lista tríplice formada pelo próprio Tribunal Superior. Subsiste para o
Tribunal Superior a mesma regra do quinto constitucional presente no Tribunal
Regional.
Palavras-chave: Acesso à magistratura do trabalho, concurso público,
nomeação, promoção.
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O PACTO GLOBAL DA ORGANIZAÇÃO DAS NACÕES UNIDAS, A
VALORIZAÇÃO DO TRABALHO E A INCLUSÃO DE EGRESSOS DO
SISTEMA PENITENCIÁRIO NO MERCADO DE TRABALHO
Lara Caxico ([email protected]) -UEL
Marlene Kempfer ([email protected]) - UEL
Os princípios que compõem o Pacto Global anunciado pela ONU, em 1999,
representam mais um conjunto de referências que devem ser considerados
pelos Estados e empresas diante da necessidade contemporânea de
efetividade dos direitos humanos e direitos fundamentais. O aspecto que neste
estudo se destaca diz respeito ao princípio que proclama a eliminação da
descriminação no ambiente de trabalho, da valorização do trabalho humano,
que poderá ser vivenciado por meio da geração de oportunidades de emprego
para reinserção socioeconômica do egresso do sistema penitenciário. A
responsabilidade para que os princípios humanos e fundamentais no plano das
relações do trabalho sejam vivenciados é dos governos, dos empregadores e
dos empregados, nos termos propugnados pela OIT (Organização
Internacional do Trabalho), em 1998. Quanto às atribuições do Estado, tem o
dever de promover ações que possibilitem caminhos para sua recuperação
desestimulando reincidências, nos termos do um dos objetivos das políticas
públicas de assistência social enumeradas no artigo 203, III da CF/88. Entre os
instrumentos à disposição dos governos, apontados no artigo 174 da CF/88,
são as normas de incentivos empresariais para aquelas que aderirem a
políticas públicas com este objetivo. As empresas sensibilizadas com esta
questão demonstram sua responsabilidade social e praticam uma cultura de
negócios sustentáveis. Assim, o Estado e as empresas aproximam seus
interesses e acompanham um discurso internacional amparado em uma moral
universal e ética jurídica, necessárias para melhorar as relações humanas em
uma sociedade que deseja ser plural e sem preconceitos.
PALAVRAS-CHAVE: OIT; Egressos; Trabalho humano; Reincidências
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INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO: O
PLANEJAMENTO ECONÔMICO COMO MEIO DE INTEGRAÇÃO PÚBLICO-
PRIVADO
Edvania Fátima Fontes Godoy; [email protected]; UEL
Marlene Kempfer; [email protected]; UEL
O Estado Liberal nasceu da Revolução Francesa e predominou durante o
século XIX, época em que havia nítida dissociação entre a atividade econômica
e a atividade política. A posição que o Estado assumiu nesse período
caracteriza-se por mínima intervenção no domínio econômico. Com a
bipolarização política entre o capitalismo liberal e socialismo experiências
foram vivenciadas permitiram identificar diferentes atribuições ao Estado nos
aspectos econômico e social. As conquistas de direitos individuais (fruto dos
ideais do liberalismo) foram fundamentais, destacando-se a livre iniciativa, que
permite o exercício de atividades econômicas promotoras do desenvolvimento
econômico. As conquistas sociais (fruto dos ideais do socialismo), por sua vez,
permitiram oportunidades para a igualdade material. Na contemporaneidade, o
compromisso dos Estados é uma atuação que concretize estes direitos
fundamentais. Para tanto, a CF/88, atribui competência para os governos
intervirem nas relações econômicas e sociais. Entre as formas de intervenção
prevista no Art. 174 destaca-se o planejamento econômico. Por meio dele é
possível apresentar as metas que cada governo tem (Planos Plurianuais),
permitindo conhecer as políticas governamentais e que podem ter reflexos no
âmbito econômico. A partir do planejamento o Estado poderá atrair tais
interesses em prol dos ideais de desenvolvimento nacional, conforme Art. 3º da
CF/88. Esta integração entre interesse público-privado deverá ser incentivada
de modo a estabelecer, de forma objetiva, pontos de convergência em face do
que a Constituição estabelece como políticas do Estado brasileiro. As parcerias
referidas em que esta aproximação não seja possível permitem o julgamento
quanto ao seu mérito na esfera social, legislativa e judicial.
Palavras-chave: Intervenção do Estado. Planejamento Econômico. Integração
Público-Privada.
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COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA E A TUTELA DO MEIO
AMBIENTE
Direito Negocial - Bolsistas de Iniciação Científica - Projeto “As novas
tendências do processo civil transindividual”
Kawane Caroline Kubaski Silva
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO: Na sociedade contemporânea muito se tem debatido a cerca das
questões ambientais. A degradação dos recursos naturais, ocorrida pelo uso
indevido e desenfreado pelos homens, exige dos ordenamentos jurídicos
atuais, conjunto ou isoladamente, a impor regras, limites à exploração
ambiental, visando o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e uso
consciente dos recursos naturais. Por muito tempo o desenvolvimento
econômico e o meio ambiente eram duas ideias que andavam paralelamente.
Hoje, caminham juntas, em atenção aos impactos ambientais dos sistemas
produtivos. A questão ambiental é um tema que vem remodelando os meios de
produção em prol do meio ambiente, no desenvolvimento de meios produtivos
e de bens de consumo menos poluentes, por exemplo. Essa perspectiva
voltada ao interesse coletivo de proteção ambiental impôs às empresas o
ajustamento de seus meios de produção às novas exigências de proteção
ambiental, bem como atribuiu maior responsabilidade aos danos ambientais
causados em decorrência de sua atividade produtiva.
Embora a Constituição Federal assegure a livre iniciativa, e a
atividade empresarial está inserida em um contexto de produção e lucro,
beneficiando o desenvolvimento social e econômico de um Estado, não se
pode olvidar que a maioria dos problemas ambientais são gerados em
decorrência dessa atividade produtiva.
Surge, portanto, a necessidade de se estabelecer um equilíbrio entre
o desenvolvimento econômico e a preservação do meio ambiente. É o que se
denomina desenvolvimento sustentável. É a partir dessa ideia que a atividade
empresarial vai se adequando a determinados limites legais à produção;
políticas de preservação ambiental, estabelecendo, por exemplo, metas
visando diminuir a poluição ou outros danos decorrentes de sua atividade; o
dever de abstenção ou reparação por prejuízos já causados, bem como a
implantação de mudanças no processo produtivo.
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Surge também, nesse contexto, a desenvolvimento de tecnologias
“limpas”, ou seja, fontes de produção ou bens de consumo, que tendem a
declinar os danos ambientais e exigir menor utilização dos recursos naturais.
Disso resulta, por vezes, menor custo da produção e preservação dos recursos
naturais, ou seja, desenvolvimento sustentável.
Como um meio de frear as atividades prejudiciais, surgem meios
voltados a coibir e punir ações nocivas ao meio ambiente. Hoje um direito de
natureza transindividual, pois pertence a indetermináveis titulares. Dentro
dessa perspectiva pretende-se estudar o compromisso de ajustamento de
conduta, “justamente por se constituir em um método alternativo às soluções
de conflitos nos quais estejam inseridos interesses difusos, coletivos e
individuais homogêneos, quer na fase pré-processual (inquérito civil) quer na
processual, ou seja, quando já há ação civil pública em andamento.” (SOUZA;
FONTES, 2007 p.36).
Em que pese a Lei da Ação Civil Pública seja um meio importante na
defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, ela não é o
único meio viável na defesa de tais direitos, sendo também possível a
utilização do compromisso de ajustamento de conduta.
Esse instituto foi inserido em nosso ordenamento pelo artigo 211 da
Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), posteriormente no
artigo 113 do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) que inseriu o
§ 6º ao artigo 5º da lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85) como uma
medida alternativa para o cumprimento das exigências legais. Cita-se também
a Lei 9.605/98 que dispõe sobre as sanções penais e administrativas às
condutas lesivas ao meio ambiente.
O compromisso de ajustamento de conduta constitui uma assunção,
ocorrida numa fase extrajudicial (evitando, assim, a instauração de uma ação
civil pública), ou, ainda, numa fase processual que porá fim a um processo
judicial. Trata-se de um mecanismo útil à resolução de conflitos, que tem por
objetivo um ajuste entre as partes, em que o causador do dano se compromete
a fazer ou não fazer algo visando reparar ou evitar um dano, em consonância
com as exigências legais, ao passo que o órgão público legitimado se abstém
de promover uma ação judicial, o que seria oneroso e demorado. Tal
alternativa se mostra como um procedimento célere à pacificação de um
conflito de interesses entre aquele que deseja produzir e o que pretende a
tutela do bem jurídico.
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Ponto controvertido na doutrina é quanto à natureza jurídica do
compromisso de ajustamento. Ele não tem a natureza jurídica de um contrato
ou transação, pois o ente público legitimado a ajustá-lo não tem a disposição
do direito material, mas tão somente a estipular a forma e o tempo de
reparação do dano causado. O ente público não atua, em regra, na defesa de
um direito próprio, mas sim de uma coletividade, de um direito metaindividual
que não torna possível determinar todos os seus destinatários. Do mesmo
modo, a vontade do compromitente se restringe a aceitar ou não o
compromisso de ajustamento, não dispondo de condições a estabelecer
cláusulas quanto ao cumprimento da obrigação. Busca-se, tão somente,
adequar a conduta do infrator com os comandos legais.
É, pois, o compromisso de ajustamento, segundo palavras de Hugo
Nigro Mazzili “ato administrativo negocial por meio do qual só o causador do
dano se compromete; o órgão público que o toma, a nada se compromete,
exceto, implicitamente, a não propor ação de conhecimento para pedir aquilo
que já está reconhecido no” (2005, p. 359).
Assim, embora o compromisso de ajustamento não seja um contrato
ou uma transação, ele possui um caráter negocial na medida em que o
compromitente expressa sua vontade em aceitar os termos estipulados, a fim
de se evitar uma Ação Civil Pública; e cria-se uma relação jurídica entre o
tomador e o compromitente, gerando efeitos jurídicos caso o compromisso
venha ser descumprido.
O ente público, além de promover o compromisso de ajustamento,
atua na fiscalização do que foi ajustado entre ele o compromitente. Cumprido o
ajuste extrajudicial, por parte do compromitente, razão não há para acionar o
judiciário. No entanto, a inobservância do que fora ajustado possibilita ao ente
público a execução judicial do compromisso de ajustamento, uma vez que o
considera título executivo extrajudicial.
A Constituição Federal em seu artigo 5º, XXXV dispõe que “a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Logo, o
Estado não pode afastar a prestação jurisdicional de seus jurisdicionados. Ele
procura de forma ampla, propiciar a tutela dos direitos consagrados na Carta
Constitucional, sejam através de ações individuais ou coletivas ou, ainda,
outros instrumentos aptos a assegurar tais direitos.
O Estado tomou para si o poder de pacificação dos conflitos entre os
indivíduos de uma dada sociedade. Ele deve, portanto, quando provocado, dar
uma solução ao caso concreto. Ocorre que, por vezes, a prestação jurisdicional
não tem uma duração razoável. O excesso de controvérsias postas à
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apreciação do Estado gera a cumulação de trabalho e prejudica a celeridade
processual, tendo, como consequência, a demora dos processos judiciais.
Há determinadas situações, no entanto, que necessitam de uma
rápida solução, pois que ao dano gerado difícil será a sua reparação,
prejudicando a efetivação dos direitos ou interesses individuais ou coletivos.
Por essas razões o legislador busca métodos alternativos para se
por fim aos conflitos, favorecendo a prestação e efetivação da tutela jurídica.
Nesse sentido, o compromisso de ajustamento de conduta, por ser instrumento
extrajudicial, torna-se interessante para se dirimir conflitos, na medida em que
torna possível a célere resolução entre a empresa poluidora e o ente público,
pois uma vez oferecido e cumprido, evita-se a sujeição à demora e
onerosidade de um processo judicial e ao mesmo tempo, cessa ou se evita a
violação a um direito metaindividual e previne ou encerra um litígio judicial.
Portanto, antes de se buscar um meio mais complexo, moroso de
resolução de conflito, qual seja o judiciário, é perfeitamente viável e vantajoso
para ambas as partes, utilizarem-se de um meio substitutivo à Ação Civil
Pública, que se espera ter a mesma finalidade desta, porém de modo rápido,
em que o compromitente afirma respeitar as obrigações estipuladas no
compromisso.
PALAVRAS – CHAVE: termo de ajustamento; direitos transindividuais; meio
ambiente.
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A QUESTÃO AMBIENTAL-URBANA: OBSTÁCULOS POLÍTICOS À
EFETIVAÇÃO DO DIREITO À MORADIA.
Direito constitucional, administrativo e ambiental
Rodolfo Carvalho Neves dos Santos
UEL
Miguel Etinger de Araujo Junior
UEL
Palavras chave: Moradia, Legalidade, Segregação, Planejamento Urbano,
Função Social.
O meio urbano está segregado sob duas realidades que constituem, dentro do
mesmo cenário, uma cidade oficial, representada pelo centro urbano com
desenvolvimento social, e uma cidade ilegal, constituída por assentamentos
ilegais em fundos de vale, zonas alagáveis e morros. As causas desta
realidade são inúmeras, entre elas: o custo da moradia formal inacessível à
população de baixa renda; a falta de planejamento urbano; e, a má gestão
pública baseada em interesses particulares, sendo esta precedente daquelas.
Isto se explica, pois, a Administração Pública está ligada a uma concepção
modernista/funcional de desenvolvimento social, utilizando-se da realidade
para permanecer no poder, com a prática de clientelismo e através de políticas
direcionadas à cidade oficial com o escopo da valorização fundiária, promoção
política através de mega obras urbanas e ligação especulativa com interesses
imobiliários. Desta forma, a cidade ilegal, esquecida, não se desenvolve, e fica
sujeita a uma predação ambiental resultante da falta de infraestrutura urbana,
além do crescente índice de violência e insegurança da posse da moradia. A
solução desta situação não é simples, e deve ser exercida em longo prazo.
Essencialmente deverá ser produzida uma diretriz urbana baseada em um
plano de ação que enxergue a práxis social através de ampla participação da
sociedade, aplicação de técnicas urbanísticas que reduzam a segregação e
utilização de instrumentos jurídicos com base nos novos paradigmas
ambientais urbanos que abrigam em sua gênese o cumprimento da função
social da propriedade urbana e a justa distribuição dos ônus e benefícios do
processo de urbanização.
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BREVE HISTÓRICO E ATRIBUIÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO
Direito Constitucional, Administrativo e Ambiental
Juliana Kiyosen Nakayama
– [email protected] – Universidade Estadual de Londrina (Docente)
Raquel Viotto Martins
– [email protected] – Universidade Estadual de Londrina
O Ministério Público da União (MPU) foi criado em 30 de janeiro de 1951 pela
Lei Orgânica nº 1.341, o qual pertencia ao poder executivo e tinha quatro
ramificações: Ministério Público Federal, Militar, Eleitoral e do Trabalho. Em 14
de dezembro de 1981, a Lei Complementar nº 40 dispôs acerca do Estatuto do
MPU, estabelecendo normas gerais que deveriam ser adotadas e instituindo
garantias, atribuições e vedações aos membros do órgão. Ainda, é importante
mencionar que somente com o advento da Lei nº 7.347 de 24 de julho de 1985,
que dispõe sobre a Ação Civil Pública, é que o este órgão passou a ter como
atribuição a tutela de interesses difusos e coletivos, uma vez que, antes, atuava
somente na área criminal. Atualmente, o MPU continua ramificado em quatro
ramos, no entanto, o Ministério Público Eleitoral deixou de existir, dando lugar
ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. O mesmo rege-se pela
Lei Complementar nº 75 de 20 de maio de 1993 e possui autonomia funcional,
administrativa e financeira. Atua como fiscal da lei e defensor do povo, além de
defender os interesses sociais e individuais indisponíveis e atuar no controle
externo de atividade policial, sendo que seus membros tem total liberdade de
ação para pedir absolvição do réu e também para acusá-lo. Tem como principal
membro o Procurador-Geral da República, o qual é nomeado pelo Presidente
da República entre os integrantes da carreira, devendo ser maior de 35 anos. O
Ministério Público da União é o resultado da democracia e do desenvolvimento
do Estado brasileiro.
Palavras-chave: União, garantias, atribuições.
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FLEXIBILIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO E O ASPECTO NEGOCIAL DA
FUNÇÃO DO JUIZ À LUZ DO FORMALISMO-VALORATIVO NO PROCESSO
CIVIL
Direito processual civil e meios alternativos de solução de conflitos
Maitê Pereira Lamesa344
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
O processo civil passa por transformações em diversos países, no sentido de
uma flexibilização do procedimento, as quais influenciam sobremaneira o
direito brasileiro. A flexibilização corresponde à abertura do processo a novos
caminhos para a cognição e a solução do mérito, com o objetivo de se alcançar
novas respostas para problemas cruciais no direito quando se fala em “acesso
à justiça”, como o formalismo excessivo e a morosidade da Justiça. Não são
poucas as vezes em que tais questões esbarram em princípios constitucionais
que regem o processo civil, sobretudo o princípio da celeridade processual e do
acesso à justiça, afrontando-os. Essa abertura pode representar uma solução a
esses problemas, desde que devidamente observados os princípios
fundamentais do processo. No entanto, devem ser discutidos os efeitos dessa
flexibilização, precipuamente no que toca à função do juiz, que passa a ser
mais de um negociador ou de um gerente do processo, ampliando-se seu
poder instrutório. Algumas dessas características estão presentes no artigo
461, parágrafo 5º, do Código de Processo Civil atual, porém a tendência é a
ampliação desses poderes.
Maitê Pereira Lamesa é graduanda do 5º ano de direito da Universidade Estadual de Londrina,
faz iniciação científica na área de processo civil, no tema “Acesso à Justiça: a Instrumentalidade do
Processo frente à Jurisdição”, sob orientação do Prof. Dr. Francisco Emílio Baleotti.
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PALAVRAS-CHAVE
Processo civil.Flexibilização. Acesso à justiça. Princípios Constitucionais.
Função do juiz.
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DESAFIO DA ANÁLISE PRÉVIA DOS ATOS DE CONCENTRAÇÃO
Direito empresarial, tributário e econômico.
VIEIRA, Ariane Saccon; PRADO, Martha Asuncíon Enríquez.
[email protected], [email protected]; Universidade Estadual
de Londrina.
A promulgação da lei 12.529/2011 que entrará em vigência no dia 29 de maio
de 2012 trouxe importantes modificações para o sistema antritruste brasileiro,
sendo que uma das mudanças mais significativas se deu no tocante à “Análise
prévia dos atos de concentração”. Na revogada lei 8884/1994 os atos de
concentração eram executados e, posteriormente levados à análise do CADE
para sua aprovação. Este procedimento gerava insegurança jurídica no
ambiente negocial, já que quaisquer atos realizados poderiam ser desfeitos por
meio da decisão do órgão administrativo responsável. Assim, consoante
grande parte das legislações estrangeiras, tais como dos Estados Unidos da
América e da União Europeia, o Brasil modificou sua lei antitruste, com o
objetivo de torná-la mais efetiva e moderna a fim de proporcionar maior
segurança jurídica para o segmento empresarial, assim como proteger a livre
concorrência e a livre iniciativa. Entretanto, observam-se importantes desafios
a serem enfrentados pela nova lei, como o rol taxativo dos atos de
concentração (art.90), já que é sabido que o ambiente empresarial é
extremamente dinâmico, podendo surgir no dia a dia outras formas de
concentração que não aquelas exatamente fixadas em lei. De maneira que a
taxatividade poderá engessar o sistema antitruste, inviabilizando uma
flexibilização das várias formas de concentração. Também o veto presidencial
previsto no art. 92, deixou um vazio legislativo quanto às medidas a serem
tomadas no caso da análise prévia, nas hipóteses de passar do tempo máximo
para análise. Em suma, a intenção da lei é proporcionar um sistema de
proteção mais efetivo e adequado à livre concorrência e à livre iniciativa de
conformidade com os ditames da Constituição, todavia é preciso se atentar
para tais falhas no sentido do sistema antitruste não se tornar obsoleto e sem
efetividade.
Palavras-chaves: Análise prévia dos atos de concentração; direito
concorrencial; sistema antitruste brasileiro.
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A CRIANÇA E O ADOLESCENTE NA PRAÇA: ANÁLISE DO CASO DA
PRAÇA PEDRO PEZZARINI.
Gustavo Mello dos Santos.
[email protected]. Universidade Estadual de Londrina.
Erika Juliana Dmitruk.
End. Eletr.: [email protected]. Universidade Estadual de Londrina.
Trata-se de investigação acerca do respeito aos direitos das crianças e
adolescentes no caso concreto de reforma da Praça Pedro Pezzarini, sita no
Jardim Igapó, em Londrina/PR. Tal praça possui cerca de 10.000m², divididos
historicamente em três grandes áreas: um campo de futebol – utilizado por
homens adultos; uma quadra de bocha, utilizada por idosos; e uma terceira
parte, não edificada, onde costumavam ficar as mães e as crianças. Todavia,
desde 2009, a Prefeitura Municipal de Londrina (PML) vem, irregularmente,
promovendo reformas na praça. Estas reformas foram oficializadas somente
em agosto de 2011, e consistiram na ampliação da quadra de bocha e
construção de uma quadra de maia, aumentando o espaço dos idosos em
184m². Para esta ampliação, retirou-se a área onde costumeiramente ficavam
mães e filhos. Além disso, foram restringidas atividades escolares na praça.
Ainda em 2011, por conta das reformas, crianças, adolescentes, professores e
membros da comunidade foram retirados da praça mediante uso do poder de
polícia municipal. Constatou-se, a partir de visitas ao local e entrevistas com
moradores, uma significativa diminuição do exercício do direito ao lazer e de
educação das crianças na praça. Insta salientar, ainda, que os idosos, na sua
jogatina diária, chegam até mesmo a induzir adolescentes à apostas em
dinheiro. Averiguou-se, a partir da análise dos documentos oriundos da PML e
do MP, o total descaso das autoridades diante deste problema, e desrespeito
ao estatuído no artigo 227, caput, da Constituição Federal e ao art. 4°, da Lei
8.069/1990. Palavras-chave: Direito Constitucional; criança e adolescente;
gestão democrática da cidade.
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A POSSIBILIDADE DA ALTERAÇÃO DE PRENOME NO REGISTRO CIVIL
EM CASOS DE TRANSEXUALISMO
Juliana Kiyosen Nakayama
– [email protected] – Universidade Estadual de Londrina (Docente)
Whander Inácio Marques
– [email protected] – Universidade Estadual de Londrina
A lei 6015/1973 traz em seu corpo as disposições sobre os registros públicos.
Mais especificamente no Art. 58, traz a possibilidade de alteração do nome por
apelidos públicos notórios. Levando em consideração que dentre os
fundamentos da República Federativa do Brasil está a dignidade da pessoa
humana (CF, art. 1º, III), que há determinação constitucional de que um de
seus objetivos fundamentais é a promoção do bem de todos, sem preconceitos
de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação
(CF, art. 3º, IV) e que o próprio Estado tem criado programas com a intenção
de erradicar o preconceito, como por exemplo o programa “Brasil Sem
Homofobia – Programa de combate à violência e à discriminação contra gays,
lésbicas, bissexuais e transgêneros (GLBT)”, pode-se vislumbrar que existe
uma tendência cada vez mais crescente da possibilidade da alteração do
prenome para aquilo que alguns doutrinadores costumam chamar de nome
social, ou seja, nome pelo qual é conhecido em seu convívio. Tal fato pode ser
avistado levando-se em consideração decisões recentes do Tribunal de Justiça
do Rio Grande Do Sul e do próprio STJ. Existe também um projeto de lei
tramitando na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, para garantir tal
direito aos seus cidadãos. Manter uma posição rígida no que diz respeito a
interpretação legal, privando os transexuais de tal possibilidade, seria ferir
diversos princípios constitucionais, dentre eles o princípio da dignidade
humana.
Palavras-chave: Dignidade Humana, Prenome, Alteração, Transexualismo.
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DA APLICABILIDADE DO ARTIGO 475-J DO CPC NO PROCESSO
TRABALHISTA
Sobreira, Rafael Miaki;
[email protected]; IDCC/UENP
RESUMO
Versa a presente exposição acerca da aplicabilidade da multa imposta pelo
artigo 475-J do CPC nas execuções trabalhistas. A multa em comento pune em
dez por cento do valor da condenação, o devedor que não pague em quinze
dias montante determinado em sentença. Em que pese o TST adotar
entendimetno contrário a sua aplicabilidade, sustentando haver manifestação
expressa da CLT com relação ao rito executório, a mesma consolidação
agasalha, de forma subsidiária, o direito processual comum naquilo em que for
omissa e seja compatível. Evidente a compatibilidade do institudo invocado
com a dinâmica justrabalhista, porquanto inerente desta a busca da razoável
duração do processo, inclusive tutelando a celeridade, dinamicidade e
eficiência como princípios norteadores, de forma a atender aos anseios do
trabalhador hipossuficiente. Trabalhador este, que carece de prestação
jurisdicional veloz e eficaz, posto que, frequentemente, debate em juízo verbas
alimentares. Ademais, a eficiência do instituto é indubtável, compelindo o
devedor a adimplir com o pagamento e garantindo resultado satisfatório ao
credor. Nessa toada, refuta-se a idéia de não ser silente o ordenamento
trabalhista com relação ao procedimento executório apresentado alhures,
atentando para o anacronismo do dispositivo. Enquanto a CLT é datada de
1943, a regra defendida é incorporada no ano de 2005 à legislação criada em
1973. Evidente que a lei não se manifestaria acerca de algo inexistente, razão
pela qual não pode ser interpretada taxativamente, mas sim sob a égide
teleológica, a qual, invariavelmente, socorrerá o vulnerável, devendo, pois, ser
considerada válida a postura civilista, no intuito de afastar eventuais interesses
protelatórios à satisfação do crédito trabalhista e garantir plenamente a tutela
jurisdicional.
Palavras-chave: 475-J; CPC; multa; aplicabilidade; execução trabalhista.
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DA APLICAÇÃO DOS INSTITUTOS DE GERENCIAMENTO DO PROCESSO
NORTE-AMERICANOS NA REDUÇÃO DA DURAÇÃO DO PROCESSO
FRENTE À VIABILIDADE DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS
HENRIQUE VOLPATO MALUTA
Francisco Emilio Baleotti
É patente a todos os aplicadores do direito a morosidade da justiça. Tal demora
implica na ineficácia do processo em um mundo com transações cada vez
rápidas. Diante desse novo paradigma para a realização dos negócios e seus
consequentes conflitos a atual administração da justiça está se mostrando por
todo ineficiente, deixando de dar a segurança jurídica do provável amparo
judicial. Com fito de solucionar esse problema, a corte federal norte americanas
impôs algumas medidas de gerenciamento processual em busca da diminuição
da duração das demandas. Apesar das diferenças existentes entres os
sistemas legais é possível aplicação de forma semelhante desses mesmos
institutos nos Brasil. Dentre as modificações impostas está a obrigação dos
juízes provocar a mediação, arbitragem e conciliação. Outro instituto muito
mais inovador para o sistema jurídico brasileiro é a gestão prática (valorativa)
de cada caso judicial, de modo que o papel do juiz no processo aumente em
muito quanto ao seu caráter ativo. Em decorrência desse instituto realizam-se
já na audiência inaugural a integral gestão do caso, estabelecendo os pontos
controvertidos, plano para produção de provas, discussão acerca de outros
métodos de solução do conflito e por fim a definição dos prazos para a
realização das provas, audiências futuras e o julgamento. Tais mecanismos
garantem a celeridade processual sem olvidar dos princípios e garantias
processuais que fundamentam um processo justo. A morosidade processual
prejudica em muito a realização dos negócios, portanto deve ser
veementemente combatida.
PALAVRAS-CHAVE: DIREITO COMPARADO. GERENCIAMENTO
PROCESSUAL. SEGURANÇA NOS NEGÓCIOS JURÍDICOS.
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A AUTONOMIA DA VONTADE NOS NEGÓCIOS JURÍDICOS
INTERNACIONAIS SEGUNDO UMA CONCEPÇÃO PÓS-MODERNA DO
DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO: UM ESTUDO SEGUNDO A ANÁLISE
ECONÔMICA DO DIREITO
Tânia Lobo Muniz.
Docente na Universidade Estadual de Londrina-UEL. [email protected];
Victor Hugo Alcalde do Nascimento,
Mestrando em Direito Negocial pela Universidade Estadual de Londrina-UEL.
São características da cultura jurídica pós-moderna os valores de liberdade, a
abolição de tendências universalistas e a emancipação do indivíduo perante o
Estado. Dentre um rol extenso de institutos jurídicos nenhum agrega melhor
tais características do que a autonomia da vontade. Trata-se de um instituto em
cujo conceito autores, nacionais e estrangeiros, tergiversam. Há quem o
qualifique como sinônimo de liberdade contratual, a qual concede às partes
contraentes no negócio jurídico, liberdade quanto ao conteúdo negocial, assim
como na escolha das partes àquele vinculadas. Outros autores discorrem sobre
o instituto da autonomia privada como instituto comparável à liberdade
contratual, esta, restrita ao plano jurídico doméstico dos Estados. O consenso,
entretanto, funda-se na liberdade de escolha do direito material apropriado a
reger determinada relação jurídica, o verdadeiro exercício da liberdade como
parte integrante dos Direitos Humanos. Seu emprego, todavia, é autorizado e
limitado pelas disposições normativas internas dos Estados. O presente estudo
visa explanar quais são as justificativas, notadamente, a tendência irrefutável e
irretroagível da adoção do instituto jurídico, assim como expor as limitações ao
exercício desta liberdade e os meios necessários para tal. A metodologia
utilizada é a Análise Econômica do Direito, cujo ramo positivo justifica o
emprego do instituto vez que demonstra é melhor apropriado às partes do
negócio jurídico alocarem as externalidades que por ventura possa haver, no
decorrer das negociações e execução do negócio jurídico. Perante tal
metodologia, as limitações ao exercício da autonomia da vontade somente se
justificam nas hipóteses das externalidades recaírem sobre terceiros ou quando
aferido comportamentos oportunistas e assimetria de informações entre os
sujeitos do negócio. No intuito para a não retroação da concessão jurídica da
instituição da autonomia da vontade, adota-se novos métodos para o Direito
Internacional Privado, o direto e o uso de normas de aplicação imediata ou
normas de polícia.
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PALAVRAS-CHAVE: Autonomia da Vontade. Direito Internacional Privado.
Análise Econômica do Direito.
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DIREITO E INTERPRETAÇÃO: REFLEXÕES CRÍTICAS DE DWORKIN AO
POSITIVISMO E A CONCEPÇÃO DE DIREITO COMO INTEGRIDADE
Área: Direito Constitucional, Administrativo e Ambiental
José Eduardo Ribeiro Balera
Acadêmico pela Universidade Estadual de Londrina
Patrícia Ayub Costa Ligmanovski
Professora da Universidade Estadual de Londrina
É evidente a necessidade de compreender a dinâmica do direito frente às
novas demandas suscitadas, principalmente por uma leitura baseada no texto
principiológico da Constituição e que garanta uma segurança jurídica à
sociedade. Assim, o presente trabalho tem por objetivo compreender as
possíveis fragilidades do positivismo de Austin e Herbert Hart, segundo críticas
elaboradas por Ronald Dworkin, em especial quanto à discricionariedade da
autoridade pública na decisão de casos não abrangidos por regras jurídicas.
Para ele, a existência de uma sociedade plural, complexa e em constante
transformação, como a atual, impossibilita a definição do “soberano”
responsável por emanar as regras (ordens), conforme expresso na teoria de
Austin, além de que este trata de forma indistinta a coercibilidade advinda da
“ordem da lei” como também da ameaça do “fora da lei”. Já a pretensa
proposta de Hart em desenvolver um projeto descritivo, neutro e desvinculado
de avaliações do âmbito da moral e da ética também é contestado por Dworkin,
pois ele defende que a teoria do direito decorre do processo de interpretação
que busca justificar a prática jurídica, de modo que se fundamente em
julgamentos e convicções de ordem moral e ética. Ele propõe uma perspectiva
de direito como integridade, que deve garantir uma coerência com o passado e
com o que já foi decidido, recorrendo-se aos princípios que regem tal
sociedade e seu sistema jurídico. Para Dworkin, o direito é um ramo da
chamada moralidade política e não um sistema separado da moral como
defendido pelos positivistas.
Palavras-chave: Positivismo, interpretação, integridade.
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ANÁLISE DA SOBERANIA NO CASO CESARE BATTISTI NA
SUSTENTAÇÃO ORAL DE LUIZ ROBERTO BARROSO
Direito Internacional
Carolina Itimura de Camargo
Universidade Estadual de Londrina
PALAVRAS-CHAVE: soberania, Luiz Roberto Barroso, caso Cesare Battisti,
O presente trabalho tem por escopo a análise aplicada do conceito de
soberania, no caso Cesare Battisti, especificamente na sustentação oral de
Luiz Roberto Barroso, advogado do réu.
Utiliza-se do método empírico dedutivo, por meio de análise do caso prático
para aplicação do conteúdo jurídico. O conceito é utilizado por Barroso
veementemente em sua sustentação, o que serve de fonte para a observância
de tal conceito oralmente.
Utilizando-se de diferentes palavras para ilustrar um único conceito de
soberania, como Barroso faz sua defesa. Através de pesquisas aplicadas feitas
para o presente trabalho, foi possível identificar as claras disparidades
doutrinárias em relação às oralidades. Este trabalho apresenta essas
divergências, bem como as tendências orais de representação de um conceito.
Acima de tudo, é fundamental ressaltar as circunstâncias de utilização da
palavra soberania, bem como qualquer outra palavra representando o mesmo
sentido. Além disso, as características orais de Barroso como entonação,
pausas e ritmo de fala, mostram como as particularidades de uma sustentação
oral podem transformar o discurso, além de ampliar as capacidades expositivas
do interlocutor.
Questiona-se por fim, se tais características são ou não benéficas a uma
sustentação, na medida em que o conceito é utilizado de forma plural,
tornando-se, além de mais versátil, mais facilmente sujeito a equívocos.
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O DIREITO DE ASSOCIAÇÃO NO ÂMBITO DA ORGANIZAÇÃO
INTERNACIONAL DO TRABALHO
SOUZA, Mayra do Amaral Gurgel Alves de; MUNIZ, Tânia Lobo;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina.
RESUMO: A consagração da garantia do Direito de Associação, expresso na
Liberdade de Associação, e seus vários desdobramentos, tem seu incremento
e relevância demonstrados quando se verifica a história do desenvolvimento do
trabalho e do surgimento de tal direito. A análise histórica, por sua vez, nos
remete às Organizações Internacionais, como a Organização das Nações
Unidas e, em especial, à Organização Internacional do Trabalho e à sua
estrutura e composição tripartite, assim como de seus principais Órgãos e ao
papel fundamental desempenhado na construção, disseminação e
consequente tutela do direito em questão. A atuação internacional pode ser
percebida e se reflete nas Convenções Internacionais que contemplam o
Direito de Associação, a exemplo da: Convenção da OIT n.º 87 (1948),
Convenção da OIT n.º 98 (1949) e Declaração relativa aos Princípios e Diretos
Fundamentais do Trabalho (1998) frutos do trabalho e discussões
desenvolvidas no âmbito da OIT. Nesses documentos internacionais se
constata que o ideal que fundamenta o Direito à Associação não pode ser
destacado de conceitos que lhe dão sustentabilidade e formam a realidade em
que deve estar inserido, quais sejam: Desenvolvimento, Democracia e respeito
aos Direitos Sociais, ou seja, deve estar necessariamente conectado à tutela
dos direitos sociais, ao desenvolvimento e à Democracia para atingir seu fim.
Portanto, somente em uma sociedade igualitária e assegurado o Estado
Democrático de Direito, haverá a possibilidade de ocorrer o desenvolvimento e
o máximo respeito ao Direito de Associação.
PALAVRAS-CHAVE: Organização Internacional do Trabalho; Direito de
Associação; Liberdade de Associação.
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DOS DIREITOS TRABALHISTAS DAS GESTANTES
Direito trabalhista, internacional e direitos humanos
Lívia Nobuko Moriyama
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Através da atribuição de direitos às gestantes, protege-se, principalmente, o
nascituro. Assim, o ADCT, art. 10, II, “b” veda a dispensa arbitrária ou sem
justa causa da empregada gestante desde a confirmação da gravidez até cinco
meses após o parto, com o intuito de proteger a maternidade e a infância,
assegurando-se a dignidade da pessoa humana.
Sendo período tão importante e delicado na vida da mãe e do bebê, faz-se
necessário assegurar direitos que possibilitem a proteção da saúde e da
integridade de ambos. Dentro da esfera trabalhista, à gestante é garantida a
estabilidade de seu emprego, a fim de se assegurar condições básicas de
sustento do nascituro através dos rendimentos da genitora.
Tema controverso atual é a incidência ou não da estabilidade da gestante que
engravidou durante contrato de prazo determinado. A súmula 244, III do TST
entende que não se deve conferir tal garantia neste caso, pois não configuraria
dispensa arbitrária ou sem justa causa, visto que a duração do contrato já
estava determinada. Contudo, atuais julgados do STF têm garantido o direito
de emprego à gestante, sob o fundamento de que a única condição imposta
pela CF/88 seria a confirmação da gravidez, independentemente da
modalidade de contratação.
A 1ª Turma do TST já julgou conforme o STF. Porém, ainda não se pode
afirmar tal entendimento, pois o item III da súmula 244 ainda vigora e as
demais Turmas o seguem.
Por conseguinte, mister se faz questionar até que ponto deve-se favorecer a
gestante em detrimento do empregador. Ou seja, como identificar o liame que
separa a proteção dos devidos direitos à gestante da brecha que se abre à
utilização dessa proteção para fins escusos. Por trás disso, ainda, não se deve
olvidar aquele que mais necessita da proteção estatal, o nascituro.
PALAVRAS- CHAVE
Direitos Trabalhistas; Gestante; Estabilidade de emprego; Contrato de Prazo
Determinado.
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DA MEDIAÇÃO E DA ARBITRAGEM
Direito processual civil e meios alternativos de solução de conflitos
Lívia Nobuko Moriyama
| [email protected] | UEL
É de se notar que a tendência atual do direito processual civil está voltada a
busca de novos meios de solução de conflitos que possibilitem resoluções mais
céleres e que permitam uma justiça mais acessível. Dentro desse contexto,
encontram-se a mediação e a arbitragem, amparadas pela Lei 9.307/96. A
primeira é meio extrajudicial de resolução de conflito por meio do qual o
mediador encaminha as partes à elaboração, entre elas, de acordos, através
do restabelecimento do diálogo e da comunicação. Já a arbitragem consiste na
convenção privada em que se escolhe um terceiro para decidir o litígio,
baseando-se nos princípios gerais do direito e nos costumes vigentes, sem que
haja intervenção direta do Estado.
Todavia, dados atuais mostram que a utilização dos institutos supra citados
ainda é muito tímida, não alcançando nem um décimo das causas julgadas
pelos Juizados Especiais.
Em Londrina, existem Tribunais Especiais de Mediação e Arbitragem, que são
referência de iniciativa, principalmente da área privada. Um exemplo é o
Instituto Jurídico Empresarial, existente desde 1997.
Dentre as vantagens que detem em relação à Justiça Comum, estão o menor
valor das custas processuais, o tempo de solução diminuído, o sigilo, a
flexibilidade dos prazos processuais, o julgamento por especialistas e o maior
número de oportunidades de estabelecimento de acordos.
Portanto, combinando-se autonomia e liberdade, é possível o alcance de
resultados legais, com maior rapidez e conformidade com o caso concreto.
Cabe salientar que a decisão proferida pelo árbitro/mediador é investida da
mesma força que a sentença judicial.
PALAVRAS-CHAVE
Direito Processual Civil; Meios Alternativos de Solução de Conflito; Mediação e
Arbitragem; Tribunal Especial de Mediação e Arbitragem de Londrina.
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REINTEGRAÇÃO SOCIAL DO DETENTO: O TRABALHO PENITENCIÁRIO
EXTRAMUROS E AS ENTIDADES BRASILEIRAS DO SISTEMA “S”
PEZARINI, Mariana de Oliveira.
KEMPFER, Marlene.
[email protected]. Universidade Estadual de Londrina.
A reintegração social dos detentos e ex-detentos é dever jurídico do Estado e
moral das empresas. Porém o sistema carcerário brasileiro não possibilita a
recuperação, pois, entre outros entraves, não proporciona a preparação
profissional. A dificuldade de reintegração do detento não é exclusividade
brasileira, conforme se pode concluir a partir da análise dos estudos de Rodrigo
Sanches Rios, em sua obra Prisão e Trabalho – uma análise comparativa do
sistema penitenciário italiano e do sistema brasileiro, na qual afirma, em
síntese, que só se poderá diminuir a segregação do egresso no meio social,
quando as medidas tomadas colocarem o preso “pra fora” da prisão, pois é
translúcido que, dentro da cadeia, se esgotaram quaisquer meios de
reintegração social. Portanto, é preciso unir forças para que tais exclusões
sejam discutidas e políticas públicas sejam implementadas, de modo a
preparar o detento. Defende-se que o Brasil tem uma importante estrutura
para preparar e reintegrar o egresso. São as entidades do denominado sistema
“S”, entre elas o SESI, SEBRAE, SENAC, em favor de quem é pago o tributo
Contribuições de Intervenção sobre o Domínio Econômico (CIDE), além dos
repasses de verbas públicas por meio de transferências voluntárias, fruto de
convênios, para facilitar o acesso gratuito a programas de educação
profissional e tecnológica. Desta forma, as empresas que possuem a cultura da
responsabilidade social poderão receber os detentos e com isto contribuir para
geração de empregos (Art. 170, VII CF), erradicar a pobreza e a
marginalização (Art. 3º, II CF) e promover o bem superando os preconceitos
(Art. III, CF).
Palavras-chave: Reintegração social do egresso; Trabalho penitenciário;
Sistema S.
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O DIREITO DE ESCOLHA DO CONSUMIDOR NA AQUISIÇÃO DE
PRODUTOS TRANSGÊNICOS
Desirée Bahls Tomeleri
Tatiane Ribeiro Campos
Universidade Norte do Paraná – UNOPAR
Uma das relações que mais se configura e mais fácil se estabelece na
sociedade atual é a relação de consumo. Em contrapartida, devido a essas
características, é a relação que mais está sujeita a futuros problemas.
Percebendo - se esta peculiaridade, tal relação ganhou especial proteção por
meio do Código de Defesa do Consumidor.
O consumidor, dotado de hipossuficiência, deve sempre ser informado sobre a
origem e composição daquilo que está adquirindo. Esta é a exteriorização do
princípio da transparência, pois será por meio das informações que lhes são
passadas que o consumidor garante a livre escolha dos produtos ou serviços
de forma precisa e consciente sendo que não possui conhecimentos técnicos
para constatá-los por si só.
Contudo, mesmo prestando tais informações, elementos utilizados na
fabricação de determinados produtos não estavam sendo elucidados o
suficiente para cientificar o consumidor de sua presença. Tais elementos se
tratam do Organismos Geneticamente Modificados ou simplesmente OGMs
que mesmo por meio de conhecimentos técnicos, não podem ser detectados,
sendo possível apenas por exames laboratoriais.
Entendendo - se que tal omissão feria o princípio da transparência e a livre
escolha do consumidor pois ainda são incertos os efeitos que tais elementos
causam ao organismo humano a longo prazo, foi que fez-se o decreto 4.680 de
24 de abril de 2003. Nele ficou determinado que todo produto, industrializado
ou em natura, embalado ou a granel, devem conter em sua embalagem um
símbolo (triângulo amarelo com uma letra ''T'' maiúscula no centro) que indique
que 1% (no mínimo e que pode ser modificado por determinação da CTNBio)
daquele produto é composto ou produzido a partir de Organismo
Geneticamente Modificado.
Apesar de regulamentado, poucas pessoas sabem da existência da norma ou
do significado do símbolo, não exercendo seu direito de escolha.
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PALAVRAS - CHAVE: Consumidor, escolha, produto, transgênico
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SANEAMENTO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE: ESSENCIALIDADE À
VIDA HUMANA E À PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE
Direito constitucional, administrativo e ambiental
Desirée Bahls Tomeleri
Tatiane Ribeiro Campos
Universidade Norte do Paraná – UNOPAR
A Constituição Federal de 1988 traz expressamente em seu conteúdo a
dignidade da pessoa humana como um fundamento para a construção de um
Estado Democrático de Direito. Tal princípio não pode ser claramente definido
por reunir em seu conteúdo questões tão grandiosas que enumerá-los
taxativamente seria tarefa por deveras difícil, quiçá, impossível.
Inegavelmente, por diversas vezes, ao exemplificar a dignidade humana, vários
doutrinadores se referem a saúde, qualidade de vida, e a não submissão a
condições miseráveis que estão diretamente relacionadas aos ambientes
insalubres. Com a Carta Magna traz normas de conteúdo programático, a plena
garantia a dignidade humana não verifica-se sendo que ainda são inexistentes
efetivas políticas públicas que promovam o meio mais eficaz de garantia da
saúde, qualidade de vida e condições apropriadas de higiene que consolidam-
se por meio do saneamento ambiental. Será ele, que promovido pelo poder
público, irá evitar ou diminuir problemas relacionados a epidemias ou endemias
ocasionadas por meio ambiente contaminado ou mal utilizado. Sendo assim, o
saneamento ambiental e o básico, como um objetivo coletivo, diante de ser
algo indispensável à vida humana e à proteção ambiental, confirmam seu
caráter público e dever do Estado em realizá-lo, estabelecendo-se como um
direito da sociedade.
A não promoção do saneamento ambiental de forma abrangente não se
justifica, pois esta iniciativa estaria promovendo além do direito social e política
pública, a exteriorização do princípio da sustentabilidade que equilibra
preservação do ambiente com desenvolvimento econômico, fazendo com que
ambientes melhores resultem em melhor qualidade de vida e maiores
investimentos em saneamento resultem em menores gastos com saúde
evitando os frequentes colapsos deste setor.
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PALAVRAS-CHAVE: Desenvolvimento sustentável; saneamento ambiental;
saneamento básico
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PROJETO QUEM AMA CUIDA: UMA ANÁLISE DA GESTÃO DAS PRAÇAS
DE LONDRINA A PARTIR DOS MECANISMOS DE GESTÃO
DEMOCRÁTICA DA CIDADE
Deíse Camargo Maito
, [email protected], Acadêmica, UEL;
Nádia Mami Marcolino,
[email protected], Acadêmica, UEL.
A análise da gestão democrática das cidades como um direito constitucional
regulamentado pelo Estatuto da Cidade, aliado ao estudo de um caso concreto,
uma praça situada na cidade de Londrina e também revisão bibliográfica sobre
a matéria, permitiram o presente estudo. Lançando um olhar crítico acerca do
cumprimento do artigo 43 do Estatuto da Cidade, analisou o processo de
reforma da praça, a qual vem sofrendo intervenções firmadas por um convênio
entre a Prefeitura de Londrina e particulares, submetidos a um “projeto”
chamado “Quem Ama Cuida”, repleto de irregularidades. Por serem as praças
bens públicos de uso comum, quando seu uso implicar a ocupação de parte
dele com caráter de exclusividade, a licitação é imprescindível. No entanto, isso
não ocorreu, pois, o espaço antes usado por todos foi totalmente destinado aos
idosos, com a construção de campos de malha e bocha. Porém, o edital de
chamamento do “projeto” estabelece como critério de seleção da pessoa
jurídica, além de cumprir os pré-requisitos, a assiduidade no protocolo, ou seja,
quem o efetuar primeiro, tendo como desempate um sorteio. Além disso, a obra
permite a publicidade da empresa no bem público, o que já desrespeita a
própria natureza jurídica de convênios - contratos administrativos que todas as
partes têm interesses em comum. Além desses abusos administrativos, o mais
paradigmático neste caso é a ausência de um projeto discutido pela
comunidade, que sequer participou da escolha das reformas, afrontando além
dos princípios que regem a Administração Pública, os instrumentos do Estatuto
das Cidades.
Palavras-chave: Estatuto da Cidade; Gestão Democrática; Bens de Uso
Comum; Praça.
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ESTADO DE DIREITO, INVESTIGAÇÕES BIOANTROPOLÓGICAS DE
DELINQUÊNCIA E ÉTICA EM PESQUISA
José Eduardo Ribeiro Balera
Acadêmico pela Universidade Estadual de Londrina
Nilza Maria Diniz
Professora Associada pela Universidade Estadual de Londrina. Orientadora.
O presente trabalho tem por objetivo evidenciar a partir da perspectiva
constitucional contemporâneo, marcada pelo primado do ideal de Estado de
Direito, a problemática da ética em pesquisa envolvendo seres humanos,
especificamente quanto à plausibilidade de investigações criminológicas que
busquem demonstrar a existência de modelos ou fundamentos
bioantropológicos de predisposição a delinquência. Assim, é essencial para
esta análise considerar princípios fundamentais previstos pela Carta Magna
como o respeito à dignidade da pessoa humana, a igualdade, o combate a
ações discriminatórias negativas ou estigmatizantes, conjugados a elementos
basilares previstos em instrumentos normativos do âmbito da bioética, que
destacam peculiarmente os princípios da autonomia, da seleção equitativa, da
beneficência e não maleficência, da relação risco-benefício e da justiça. De tal
forma, é possível observar a consonância de definições constitucionais e
infraconstitucionais, em especial ao disposto pelas resoluções 196/96 e 340/04
do Conselho Nacional de Saúde, além de parâmetros de ordem internacional
como estabelecidos pela Declaração de Helsinki. Torna-se ainda necessário
avaliar algumas consequências que poderiam advir de tais propostas de
pesquisa, por exemplo, o estímulo a conclusões reducionistas, a criação de
estereótipos de “ameaças” sociais e o regaste de um Direito Penal do Inimigo,
que representaria um retrocesso perante fatos que marcaram a história da
humanidade e influenciaram substancialmente ao desenvolvimento da ideia de
direitos humanos.
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Palavras-Chave: Dignidade da Pessoa Humana, Bioética, Estigmatização.
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NEGÓCIO JURÍDICO AMBIENTAL: A EFETIVIDADE DO PROCESSO
ATRAVÉS DA TUTELA ESPECÍFICA
Lívia Rossi De Rosis Peixotoiv
Francisco Emilio Baleottiv
RESUMO
A nossa Constituição declara em seu artigo 1º. que a República Federativa do
Brasil constituiu-se em Estado Democrático de Direito e como tal, absorve para
si responsabilidade de garantir o bem estar da sociedade e dos indivíduos que
a compõe. Estando o bem estar social turbado pelas crises ou conflitos entre
as pessoas, o Estado se vale do sistema processual para, eliminando os
conflitos, devolver à sociedade a paz desejada. Diante da evolução das
sociedades nos últimos séculos e do surgimento da necessidade de proteção
aos novos direitos sociais como o direito fundamental ao meio ambiente sadio,
é preciso encontrar no processo civil um instrumento eficaz e funcional para
que a lesão ou ameaça ao meio ambiente possa ser revertida de forma eficaz,
independentemente de tutela ressarcitória. Em se tratando dos direitos
massificados, oriundos da evolução e reorganização social a partir da segunda
metade do século XX, o processo, ainda mais, deve ser verdadeiro instrumento
de pacificação social, como aparelho hábil a por fim aos conflitos, e, no que
concerne especificamente ao meio ambiente, proporcionando resultado
equivalente àquele obtido caso não houvesse ocorrido o dano. É imperioso, no
momento social em que vivemos, que a garantia à efetividade tome contornos
concretistas; para tanto, é fundamental que se encontre uma tutela apta e
adequada a garantir a produção de resultados práticos que seriam equivalentes
a não ocorrência do dano, lesão ou ameaça aos direitos relativos ao meio
ambiente, portanto, a tutela específica.
Palavras-chave: Processo Civil - Efetividade – Tutela Específica – Direito
Ambiental
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A IMPORTÂNCIA DA DEMOCRACIA DELIBERATIVA PARA A
CONCRETIZAÇÃO DA CIDADANIA
Direito Constitucional
Ana Paula de Oliveira Mazoni345
Docente da Faculdade Norte Paranaense (UNINORTE)
A sociedade contemporânea é cenário de disputas complexas que necessitam
da instrumentalização de maneiras de preservar o debate público e
participação dos cidadãos nas decisões sociais de cunho significativo sem
cercear o cunho democrático da deliberação. Ou seja, em meio a um
emaranhado de opiniões e interesses conflitantes, o debate público deve ser
garantido a fim de possibilitar a democracia concreta do ponto de vista
deliberativo, resguardando aos cidadãos o direito de interagir e influir nas
decisões políticas de forma eficaz. A democracia – enquanto possibilidade
política concreta de governo do povo - assume especificidade deliberativa
quando se discute e analisa os processos de deliberação, suas conclusões e
seus instrumentos institucionalizados, bem como os reflexos efetivos na esfera
de decisão popular e na vida política do Estado. Duas são as principais
acepções do termo deliberação, uma se referindo ao momento da tomada de
decisão e outra se remetendo ao processo reflexivo que visa otimizar as
compreensões a respeito da decisão a ser tomada, momento anterior –
portanto, à tomada pura e simples da referida decisão. A democracia
deliberativa não se preocupa – apenas – com a deliberação enquanto tomada
pura e simples de decisão, sendo mister que se congregue ao processo
deliberativo a verificação dos fundamentos justificativos da mesma decisão a
ser tomada, o que além de aumentar – ainda que minimamente – as chances
de vitória do posicionamento justificado, fomenta ambiente mais colaborativo e
menos conflituoso. Assim, se considerada a democracia deliberativa como
procedimento de tomada pública de decisões que podem influir diretamente na
vida dos cidadãos, a justificação da decisão, enquanto razão pública, pode
diminuir os riscos de conflitualidade destemperada e devastadora, garantindo a
345
Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (2003-2007). Especialista em Direito do
Estado pela Universidade Estadual de Londrina (2008-2009), pós-graduanda em Direito Constitucional
Contemporâneo pelo Instituto de Direito Constitucional e Cidadania de Londrina (2011-) e aluna especial
do programa de Mestrado em Filosofia da Universidade Estadual de Londrina. Atua, principalmente, nas
áreas de Direito Constitucional, Direito Administrativo, Teoria Geral do Direito e Teoria Geral do Estado.
É assessora jurídica da Vara Criminal e Anexos da Comarca de Ibiporã - Paraná e docente das disciplinas
de Organização dos Poderes (Direito Constitucional) e Serviços/Servidores Públicos (Direito do Trabalho
Público/Direito Administrativo) da Faculdade Norte Paranaense (UNINORTE).
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liberdade de consciência e manifestação de pensamento e respeito às minorias
deliberativas.
Palavras-chave: Democracia deliberativa. Justificação. Razão pública.
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A DISCRICIONARIEDADE DO MAGISTRADO NAS DIFERENTES ESPÉCIES
DE VALORAÇÃO DA PROVA
Edleide de Almeida Costa
Universidade Estadual de Londrina
O presente trabalho tem por finalidade estudar as variações dos
sistemas de prova que se formaram e se transformaram em nosso
ordenamento jurídico. No processo de conhecimento as provas são as
responsáveis pela formação do juízo de valor com relação aos fatos alegados
nas causas, tanto pelo autor como pelo réu. Essa valoração é uma atividade
realizada pelo juiz e com o passar do tempo sobreveio por grandes evoluções e
mudanças não só na forma de valoração de cada prova em espécie, mas
também na questão da discricionariedade do próprio magistrado no
desenvolvimento dessa atividade. Na análise dessa evolução a doutrina
costuma dizer que existem três grandes sistemas no que diz respeito aos
critérios de formação do convencimento do juiz: (i) o sistema da prova legal
(tarifada); (ii) o sistema do convencimento íntimo (íntima convicção); e (iii) o
sistema do livre convencimento motivado (persuasão racional). Como se verá,
essas mudanças seguiram um desenvolvimento histórico, e, conforme a
maneira de entender o Direito, também se mudou a forma de valorar as
diferentes espécies de prova, bem como se verificou a abolição de algumas
dessas modalidades. Não obstante, há hoje um novo (e talvez não tão novo
assim) elemento no sistema de valoração das provas. Uma graduação do
poder de convicção em relação às várias espécies de prova. Este novo
elemento não está presente em normas, mas subjetivamente nos magistrados,
pela experiência comum destes e não, como se viu, pela experiência comum
do legislador. Assim, não é uma observância obrigatória aos juízos e nem
mesmo imposta regularmente em todos os casos.
Palavras-chave: prova tarifada, convencimento íntimo, livre convencimento
motivado.
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JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA E POLITIZAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO
Ana Paula de Oliveira Mazoni346
Docente da Faculdade Norte Paranaense (UNINORTE)
A judicialização da política se caracteriza pelo protagonismo judicial nas
decisões acerca das políticas públicas. Diverso do ativismo judiciário, já que
neste se observa uma carregada crítica ao excesso de liberdade dos
magistrados, implica em certa transferência dos embates políticas com relação
a questões de relevância para a esfera de atuação da função judiciária,
alterando o método majoritário pelo argumentativo. O que se questiona é se a
escolha política partida da via judicial seria democrática, considerando que não
se consubstancia por representantes eleitos pelo povo (detentor do poder no
Estado de direito democrático), contudo, é mister considerar a existência de
instrumentos que possibilitam a legitimação das decisões judiciais a respeito de
políticas públicas sem que seja considerado como antidemocrático. Neste
sentido, consideram-se as normas constitucionais como pré-compromissos a
serem mantidos pelos Poderes constituídos, ou seja, compromissos assumidos
em momentos de sobriedade constitucional e que devem ser orientados em
momentos de conjecturas políticas transitórias, sendo a função judiciária a
grande sustentáculo dessa justificação, não atuando de maneira
excessivamente livre, mas pugnando pelo controle do que foi assumido
anteriormente (função garantidora). Por outro lado, a politização do Poder
Judiciário, distorção indesejável da influência judiciária nas decisões políticas,
se evidencia quando agentes externos empregam as vias judiciais para
perseguir seus objetivos políticos, inviabilizando propostas governamentais de
partidos políticos contrários por meio de ações judiciais protelatórias, o que não
pode ser tomado como óbice para atuação judiciária sob pena de afastar-se as
minorias que buscam reinvindicações. Assim, tem-se que a judicialização da
política, quando coerente com os pré-compromissos constitucionais e abertura
ao debate é favorável à democracia, sendo imperioso coibir os excessos
oriundos da politização da função judiciária.
346
Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (2003-2007). Especialista em Direito do
Estado pela Universidade Estadual de Londrina (2008-2009), pós-graduanda em Direito Constitucional
Contemporâneo pelo Instituto de Direito Constitucional e Cidadania de Londrina (2011-) e aluna especial
do programa de Mestrado em Filosofia da Universidade Estadual de Londrina. Atua, principalmente, nas
áreas de Direito Constitucional, Direito Administrativo, Teoria Geral do Direito e Teoria Geral do Estado.
É assessora jurídica da Vara Criminal e Anexos da Comarca de Ibiporã - Paraná e docente das disciplinas
de Organização dos Poderes (Direito Constitucional) e Serviços/Servidores Públicos (Direito do Trabalho
Público/Direito Administrativo) da Faculdade Norte Paranaense (UNINORTE).
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Palavras-chave: Judicialização da política. Ativismo judicial. Politização do
Poder Judiciário.
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O ACESSO À JUSTIÇA VIABILIZADO PELO USO DA MEDIAÇÃO COMO
MEIO ALTERNATIVO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS NA SEARA
EMPRESARIAL.
Renata Mayumi Sanomya e Francisco Emílio Baleotti.
E-mail: [email protected]
Instituição de ensino: Universidade Estadual de Londrina.
RESUMO
A necessidade de ruptura com o formalismo processual excessivo e os novos
desafios de uma economia globalizada demonstram a importância da utilização
dos meios alternativos de soluções de conflitos, entre os quais merece especial
enfoque o instituto da mediação.
O congestionamento dos tribunais e o consequente acúmulo de litígios que
ficam sem julgamento corroboram as inúmeras vantagens que esse
instrumento de complementação dos mecanismos judiciais pode proporcionar,
quais sejam: a resolução de disputas de forma construtiva, o fortalecimento das
relações sociais, a promoção de relacionamentos cooperativos, a exploração
de estratégias que possam prevenir ou resolver futuras controvérsias, a
humanização das disputas, etc.
É inevitável admitir que os mecanismos tradicionais disponíveis se mostram
insuficientes na resolução desses conflitos, seja no aspecto quantitativo e
qualitativo, seja no sentido de acessibilidade do sistema à todos os titulares de
direitos. Nesse sentido, vislumbra-se a necessidade da superação desses
obstáculos de ordem econômica e cultural que impedem a pacificação social e
o efetivo acesso à ordem jurídica justa.
Cabe analisar, ainda, a possibilidade de utilização da mediação no mundo
empresarial devido ao considerável aumento da importância e da quantidade
de litígios nessa seara e o tratamento diferenciado que merecem em função de
suas características específicas.
Pelo fato dessas relações empresariais terem como característica
relacionamentos prolongados e complexos, mecanismos de interferência
apaziguadora como a mediação constituem os métodos mais apropriados na
medida em que permitem a cooperação entre os empresários e o consequente
cumprimento espontâneo das obrigações assumidas.
Tem-se, portanto, que a adoção de um “modelo mediacional” de resolução de
conflitos aliado a uma mudança de cultura dos operadores do Direito será
capaz de promover o bem comum e a pacificação social por meio da efetiva
realização dos direitos materiais e do acesso à justiça.
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Palavras-chave: mediação, acesso à justiça, seara empresarial
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A GÊNESE DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
Victor Hayashi
, [email protected], Graduação - Universidade Estadual de Londrina,
PR.
Marinno Arthur Berno
, [email protected], Graduação - Universidade Estadual de Londrina,
PR.
O tema Controle de Convencionalidade está cada vez mais desenvolvido
sendo considerado o novo paradigma de controle normativo que vai dialogar
com o texto constitucional, segundo parte dos estudiosos internacionalistas. O
nome Controle de Convencionalidade nasceu na França na década de 70,
quando então se alegou perante a Corte Constitucional Francesa que certa lei
cunhada pelo legislativo, que permitia a interrupção da gravidez, seria
inconstitucional. A Corte declarou a inconstitucionalidade na interrupção do
aborto, contudo, alegou-se que a lei que permitia a interrupção forçada da
gravidez estaria violando a Convenção Europeia de Direitos humanos de 1950.
Naquela época, questões relacionadas a tratados internacionais eram
exclusivamente conteúdo de competência administrativa, sendo assim, matéria
do Conselho de Estado. A Corte Constitucional deu parecer de que não havia
inconstitucionalidade notada, mas havia sim violação da Convenção para
Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (outro nome
para o mesmo tratado). A questão desta primeira aparição do Controle de
Convencionalidade é que se a Corte poderia ou não dar pareceres no conflito
com as normas de Direito Internacional Público, pelo fato da matéria ser
específica do Conselho de Estado. Então surge a expressão e o instituto da
“Controle de Convencionalidade”, onde se dá ao judiciário poder de reconhecer
e declarar que certa lei está em conflito com norma internacional. Segundo
certos autores o Controle de Convencionalidade é uma prova da expressão
“Ontem, os Códigos; hoje, as Constituições; amanhã os Tratados”.
Palavras-chave: Controle de Convencionalidade; Direito Internacional Público;
Tratados Internacionais; Direito Internacional dos Direitos Humanos;
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A OMC E A PROMOÇÃO DO DESENVOLVIMENTO.347
MENIN, Christian Eduardo; MUNIZ, Tânia Lobo.
[email protected]; [email protected]
Universidade Estadual de Londrina.
RESUMO: Na economia globalizada de hoje, percebe-se uma disparidade
grande quando observado o poder econômico de cada país, poder este – ou a
falta dele - que influencia na capacidade dos países em comercializar
internacionalmente, de influenciar outros países, ou de melhorar sua própria
condição econômico-social.
Os países menos desenvolvidos são os que estão mais vulneráveis aos
movimentos econômicos e financeiros gerados pelos “poderosos”, vendo-se
prejudicados em suas perspectivas de comércio e, por causa desta falta de
desenvolvimento – atrelada também a fatores políticos e jurídicos – veem
corroída sua força para promover uma melhora de sua situação por si mesmos,
acabando por negar às suas populações o direito humano ao desenvolvimento.
Diante desta situação, quando o Estado é prejudicado, assim como o mercado
mundial pela ausência deste país nas suas atividades, a OMC, na crença de
que o comércio internacional pode ser motor de crescimento e
desenvolvimento, tem um papel muito importante com seu regramento
construído de forma a incentivar os menos desenvolvidos e a equalizar, na
medida do possível, as relações comerciais globais.
Além disso, a OMC, também em conjunto com outras instituições financeiras
internacionais, tem projetos de capacitação dos países menos desenvolvidos,
com a realização de investimentos em suas estruturas básicas, fomentando
seu desenvolvimento de forma a fornecer-lhes condições para participar do
comércio internacional e a beneficiarem-se disso.
PALAVRAS-CHAVE: Comércio Internacional; Desenvolvimento Econômico-
social; OMC; Cooperação.
347
Pesquisa desenvolvida no projeto de pesquisa (UEL) “Perspectivas do Direito Internacional
Contemporâneo nas Relações Sociais, Políticas e Negociais da Atualidade”, em 2012.
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ARBITRAGEM NOS CONFLITOS NEGOCIAIS DO COMÉRCIO
INTERNACIONAL*
LEAL JÚNIOR, João Carlos
; [email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
MUNIZ, Tânia Lobo
; [email protected]; Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
O presente esboço volta-se à análise do instituto da arbitragem no que respeita
à solução de controvérsias surgidas em negócios no contexto do comércio
internacional. A arbitragem, no Brasil regulada pela lei nº 9.307/96, consiste em
meio alternativo de resolução de conflitos em que a decisão, tomada por
particular eleito pelas partes e em substituição ao Poder Judiciário, assume a
mesma eficácia da sentença judicial. A demora no julgamento de conflitos
relativos a negócios na seara internacional costuma refletir em inúmeros e
consideráveis prejuízos, não só às partes, mas também a economias
nacionais. Isso porque, no mercado global contemporâneo, a interdependência
de agentes econômicos, e mesmo de Estados e suas economias, faz com que
as lesões em comento, demasiadas vezes, extravasem os interesses privados
dos proprietários das empresas, atingindo acionistas, consumidores,
empregados, credores, e até mesmo o Poder Público, ultrapassando, além
disso, então, as fronteiras do Estado brasileiro. A morosidade em tela é fator de
insegurança jurídica e econômica, razão pela qual a utilização da arbitragem
mostra-se como saída viável e segura no âmbito do comércio internacional.
Este instrumento, em razão de vantagens das mais diversas, tem sido cada vez
mais utilizado no mundo contemporâneo, que exige rapidez nas soluções de
crises interpessoais, ainda mais quando envolvam temas empresariais. As
principais proficuidades da arbitragem na seara dos negócios internacionais
privados são as seguintes: proporciona celeridade na decisão e na
consequente solução do conflito; viabiliza a manutenção destas relações;
garante e reforça a autonomia das partes na escolha do procedimento, tribunal
e direito a ser aplicado; diminui os custos econômicos e não econômicos,
principalmente relativos ao binômio tempo-morosidade; garante, na quase
* Trabalho resultante do projeto de pesquisa “Perspectivas do direito internacional contemporâneo nas
relações sociais, políticas e negociais da atualidade”, desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina
(UEL/PR).
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totalidade das vezes, a melhor técnica a ser empregada na construção da
decisão; e, por fim, proporciona segurança em diversos aspectos,
principalmente de caráter econômico e jurídico. Por tudo isso, deve ser
incentivado seu uso no Brasil e valorizado o emprego da arbitragem na solução
de conflitos do comércio internacional.
Palavras-chave: arbitragem; comércio internacional; morosidade; razoável
duração do processo; segurança jurídica.
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ADEQUAÇÃO PROCEDIMENTAL E DURAÇÃO RAZOÁVEL DO
PROCESSO: EFETIVANDO O ACESSO À JUSTIÇA*
LEAL JÚNIOR, João Carlos;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
Assim como se dá com outros institutos jurídicos, vislumbra-se, na
contemporaneidade, uma função social no processo, a qual deve ser
desempenhada como forma de legitimá-lo. O processo é o instrumento
necessário para o exercício da Jurisdição. Não é um fim em si mesmo, já que
voltado à realização do direito material violado ou sob ameaça. Sob essa
perspectiva, é ele encarado como ferramenta para a concretização da justiça,
viabilizando que o Estado cumpra seu dever de dirimir conflitos de interesses e
promover a pacificação social. Como instrumento que é, o processo deve se
adequar ao objeto com que se opera. E uma tal adequação ocorre por meio de
alterações na forma procedimental. Assim, conforme o objeto em discussão, o
procedimento será mais ou menos delongado; será composto de mais ou
menos fases; terá peculiaridades ou seguirá uma regra geral; tudo isso voltado
a que o juiz conheça adequadamente da matéria que terá de julgar.
Paralelamente a isso, o processo deve, na medida do possível, desenvolver-se
mediante um procedimento célere, de modo que o provimento jurisdicional se
faça efetivo. A ideia de efetividade do processo, de fato, está intrinsecamente
associada à razoabilidade da duração do feito. E por essa última expressão
deve-se entender o tempo adequado à solução justa do conflito, sem qualquer
dilação maior que não se volte única e exclusivamente para a obtenção desta
meta. Assim, o procedimento adequado ao direito tutelado e a duração
razoável do processo vinculam-se na medida em que: i) por meio de um rito
adaptado ao direito material em discussão ter-se-á, ao em tese, uma duração
temporal razoável para a análise que o específico objeto requer e ii) ambos são
pressupostos para a concretização do direito fundamental ao acesso à justiça,
corolário do princípio da dignidade da pessoa humana.
* Trabalho resultante do projeto de pesquisa “Acesso à justiça: a instrumentalidade do processo frente à
Jurisdição”, desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina (UEL/PR).
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Palavras-chave: adequação procedimental; razoável duração do processo;
acesso à justiça.
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A RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO NO ÂMBITO
DO SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA:
SEGURANÇA JURÍDICA PARA OS NEGÓCIOS PRIVADOS
LEAL JÚNIOR, João Carlos
; [email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
KEMPFER, Marlene
; [email protected]; Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
O direito fundamental à razoável duração do processo judicial e administrativo,
incorporado ao texto constitucional com a promulgação da Emenda
Constitucional nº 45/04, positiva o valor da eficiência a que se refere o Art. 37
da Constituição de 1988. Introduzido pela Emenda Constitucional nº 19/98,
este valor é o fundamento para uma gestão gerencial dos interesses públicos
que deve orientar a atuação do Estado por meio dos seus três órgãos políticos.
Esta interpretação dirigida aos processos administrativos econômicos tem
especial relevância, pois a dinâmica da vida econômica contemporânea é
incompatível com fluxos e exigências processuais ou imposições que retardam,
sem motivação válida, as decisões que têm repercussão na gestão empresarial
e no mercado interno. É fato que o direito à razoável duração do processo não
autoriza desconsiderar os demais direitos fundamentais como o devido
processo, que possibilita o contraditório e a ampla defesa, a transparência e as
demais normas que estruturam o processo para alcançar manifestação estatal
justa sobre a pretensão do administrado. Sendo assim, diante dos pleitos
administrativos econômicos, o Sistema Brasileiro da Concorrência (SBDC), por
meio dos seus órgãos, entre eles, o Conselho Administrativo de Defesa da
Concorrência (CADE) deve agir considerando as importantes consequências
de sua atuação para as relações econômicas. Este destaque se comprova a
partir das competências do CADE nos termos da Lei nº 12.529/2011. A sua
atuação para julgar as condutas anticoncorrenciais ou a pretensão de
reestruturação societária demonstra a possibilidade jurídica da forte
intervenção estatal. Este grau de interferência será justificado se, além de
defender o regime econômico brasileiro (Art. 170, CF/88), não prejudicar os
negócios jurídicos privados pela ineficiência da atuação quanto às pretensões
dos administrados.
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Palavras-chave: razoável duração do processo; processo administrativo
econômico; Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência; CADE; segurança
jurídica.
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MUDANÇAS NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL: EMBATE ENTRE
LIBERALIDADE E CONSTITUCIONALIDADE
Desirée Bahls Tomeleri
Tatiane Ribeiro Campos
Universidade Norte do Paraná – UNOPAR
A lei 12.403/11 alterou o Código de Processo Penal no que tange à prisão
processual, fiança, liberdade provisória e medidas cautelares, equilibrando e
adaptando a política criminal brasileira conforme políticas modernas, tornando-
a eficaz no controle da violência e a criminalidade. Dentre as mudanças,
podemos destacar a aplicação de medidas cautelares alternativas a prisão
preventiva, quando possível; a mudança no valor da fiança, podendo alcançar
o valor de 200 salários mínimos e ser aumentada até 100 vezes e a
obrigatoriedade de separar os presos processuais dos definitivos.
Tais mudanças possuem o intuito de obter um tratamento melhor de acordo
com o caso concreto, realizando uma conexão com a Constituição Federal de
1988 e a dignidade da pessoa humana, mantendo os procedimentos de
repreensão necessários para os atos cometidos que são contrários a lei. Há o
escopo de ressaltar o novo conteúdo e refletir sobre as consequências desse
formato e sua aplicação no sistema criminal e na sociedade.
Com essa alteração se iniciaram diversas discussões, analisando se a
mudança é uma medida constitucional e justa, respeitando princípios como o
postulado da proporcionalidade e adequando-se ao princípio constitucional da
presunção da inocência (artigo 5º, inciso LVII), onde com a aplicação de
alguma das medidas cautelares seria menos gravosa do que a prisão
preventiva, ou se tais mudanças poderiam surtir o efeito contrário ao desejado,
facilitando a realização de condutas criminosas e colocando criminosos nas
ruas ao invés de prendê-los, não agindo com rigidez e proporcionando
segurança social, ocasionando desta maneira um embate.
Plavras-chave: Código de Processo Penal. Medidas cautelares. Fiança.
Liberalidade. Constitucionalidade.
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O DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA DA
FORMAÇÃO HUMANA INTEGRAL E DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL NO
CONTEXTO DO MUNDO GLOBALIZADO: ATIVIDADE ORÇAMENTÁRIA E
“RESERVA DO POSSÍVEL”
Fernanda Raquel Thomaz de Araújo
Luiz Fernando Bellinetti
Universidade Estadual de Londrina
O processo de globalização, a par da tônica progressista que irradia, é fonte de
dilemas e contrastes insuflados com a perigosa priorização do desenvolvimento
econômico - em detrimento do elemento humano e social -, dinâmica que
auxilia uma temerária consciência de flexibilização de direitos sociais, com
reflexos agravadores da exclusão e abismos sociais. O tratamento da crítica
realidade que disso emerge requer a premência da conjugação de esforços
(para o progresso) que tenham por força-motriz o cuidado do avanço social e
da formação humana plena, para o atendimento à necessidade (e ao direito) de
desenvolvimento das gerações presentes e futuras. Daí que, na profunda
complexidade do novo contexto global, a educação - enquanto processo
formador e socializador - é identificada como um excelente recurso para
enfrentamento do desafio de nova estruturação do mundo, determinante para
os rumos do atual processo de crescimento econômico e social. Nesta
essência, a realização do acesso universal ao direito à educação - em moldes
de qualidade e equidade – representa, necessariamente, tarefa que condensa
as aspirações da liberdade, da democracia, da cidadania e do desenvolvimento
humano. Na forma preconizada na Carta Constitucional, o direito social à
educação há de ser encarado como determinação vinculativa para a
Administração Pública, incumbindo ao Administrador a adoção de medidas que
viabilizem seu gozo e fruição, não se admitindo que a implementação deste
direito de importância basilar para a edificação do Estado Democrático esteja
adstrita a decisões de índole administrativa, pautadas nos critérios de
conveniência e oportunidade. A articulação dos gastos públicos não se reserva
exclusivamente à deliberação política, já que considerável espectro das
escolhas públicas já está marcado por opções constitucionalmente definidas.
Qualquer escolha alocativa de recursos deve respeitar os padrões mínimos
fixados pela Constituição, assim como o rol de prioridades por ela estabelecido.
Opções orçamentárias podem ser invalidadas pelo Poder Judiciário para
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permitir a concretização dos direitos fundamentais sociais (ou, ao menos, do
mínimo existencial) lesionados pela omissão estatal, com a determinação de
que os demais Poderes promovam a prática de atos orçamentários cabíveis e
afinados à diretriz constitucional. A projeção da reserva do possível não pode
ser admitida como uma limitação absoluta, tampouco como complacente
fundamento para a evasiva do estado frente à exigência da promoção de
direitos que integram a composição do mínimo existencial – como o é o direito
fundamental social à educação (§ 1º do art. 208 da Constituição).
PALAVRAS-CHAVE: Direito fundamental social à educação –
Desenvolvimento pleno humano e social – Omissão estatal – Orçamento
público – Reserva do possível.
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DANOS CIVIS DECORRENTES DO PREJUÍZO AO ACESSO À JUSTIÇA
Marinno Arthur Berno
, [email protected], Graduação - Universidade Estadual de Londrina,
PR.
Ivan Martins Tristão
, [email protected], Docente - Universidade Estadual de Londrina, PR.
Acesso à justiça é assunto discutido reiteradamente hoje em dia, contudo
sempre se focando nos motivos da dificuldade ao acesso à ordem jurídica
justa, que é defendida como um direito fundamental. Pouco se discute sobre os
danos causados ao indivíduo que se vê privado da justiça, independente de
qual seja o motivo e qual seja o momento do processo em que isso ocorre
(desde a dificuldade para ingressar petição inicial até a sentença má
fundamentada do juiz). O indivíduo cujo acesso à justiça foi negado ou
dificultado sofre uma série de danos, isto é pacificado. Contudo, há de se
analisar quais foram estes danos. Há algumas esferas a serem entendidas
como: dano moral, pois houve participação no processo visando a tutela
jurisdicional e quando há frustração de tal tutela o indivíduo se sente
desamparado; dano material, com a perda de seu patrimônio, gastos e custas
processuais, supondo que o caso foi interrompido ou anulado; e citando as
novas teorias sobre os danos tem-se o dano social, afinal, pessoas que
circundam com o indivíduo também tem ciência da perda deste e podem
empatizar com o prejudicado e ainda o dano por ricochete, quando havia
expectativa de terceiro em cima de tal processo. Constatado que há dano, cabe
indenização e reparação do dano, contudo, quem deve responder pelo dano
causado? Segundo o artigo 37 da Constituição de 1988, o Estado pode
responder por falta de eficiência, por exemplo, contudo, não se abarca todos os
motivos que dificultam o acesso à justiça. Pode se processar o Estado
provando a Responsabilidade Objetiva, não havendo aqui pacificação entre
doutrinadores, visto que alguns defendem a não responsabilidade do Estado
em diversos aspectos.
Palavras-chave: Direito Processual Civil; Direitos fundamentais; Acesso à
justiça; Perdas e danos; Responsabilidade do Estado;
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A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA E A RESPONSABILIDADE PELO
RESPEITO AO MEIO AMBIENTE NATURAL ECOLOGICAMENTE
EQUILIBRADO
Direito trabalhista, internacional e direitos humanos
Marinno Arthur Berno
(UEL), [email protected], Graduação - Universidade Estadual de
Londrina, PR.
Joao Carlos Leal Junior
(UEL), [email protected], Mestrado - Universidade Estadual de
Londrina, PR
Adotando a teoria da empresa, forjada na Itália em meados do século XX,o
Estado Brasileiro vivenciou o nascimento e a expansão do objeto de estudos
do Direito Empresarial. Na atualidade, importante temática trabalhada diz
respeito à função social da empresaA função social da propriedade positivada
no ordenamento brasileiro com a Emenda Constitucional nº 1 de 1969,alcançou
patamar de destaque na Constituição de 1988, eis que presente no rol de
direitos e garantias fundamentais do indivíduo, além de constar dos princípios
que regem a ordem. A Função Social da Empresa impõe ao agente econômico
o dever de respeito à soberania nacional, à propriedade privada funcionalizada,
à livre concorrência, ao consumidor, ao meio ambiente e ao pleno emprego; a
promoção da justiça social; a valorização do trabalho humano e a redução das
desigualdades sociais. Trata-se das diretrizes que autorizam a livre iniciativa
empresarial no Estado brasileiro. Destaca-se, para esta pesquisa, o dever de
respeito (negativo) e de proteção (positivo) ao meio ambiente natural, que é
aquele que independe da ação humana para existir. O dever jurídico de
respeito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado encontra respaldo tanto
em tratados internacionais (Convenção da Biodiversidade, por exemplo), como
na Constituição (arts. 170 e 225), e exige a atenção às diretrizes da prevenção,
da precaução, da responsabilidade e do desenvolvimento sustentável, dentre
outras. No recorte proposto neste estudo, busca-se tratar do princípio da
responsabilidade que preconiza que quando houver dano ao meio ambiente, a
empresa causadora poderá ser responsabilizadanas esferas civil,
administrativa e, até mesmo penal, a depender do caso. A empresa, no século
Trabalho resultante do Projeto de Pesquisa (UEL)“A função social da empresa frente o novo direito
concursal”.
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XXI, deve proteger o meio ambiente natural principalmente por estar este
ligado à manutenção da vida humana , ou seja: protegendo o meio ambiente,
além de cuidar do locus onde se insere e respeitar sua fonte precípua de
recursos,a empresa protege o ser humano.
Palavras Chave: Empresa; Função Social da Empresa; Responsabilidade; Meio
ambiente equilibrado; Dignidade humana
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OS PROBLEMAS DA ATUAÇÃO ESTATAL FRENTE AOS DESAFIOS DA
SUSTENTABILIDADE.
Fábio yuji yoshida hayashida
Miguel etinguer de araujo junior
RESUMO.
O tema aguça discussão teórica no contexto contemporâneo, a
sustentabilidade, tem diversas implicações no Estado, economia, empresas e
sociedade. A intensificação do processo de degradação ocorrido no período da
revolução industrial e a acelerada dinâmica do capitalismo produziram efeitos
nefastos ao meio ambiental. . A compatibilização das exigências trazidas pelo
artigo 225 da Constituição e a limitação da atuação do estado frente à limitação
da iniciativa privada, é um tema delicado. Uma vez que a realidade econômica
é complexa e ultrapassa as barreiras estatais, se tornando hoje um desafio
global Bem como os efeitos transnacionais da degradação ambiental, geram
desafios ao estado e a sua intervenção. Esse desafio tem que levar em
consideração uma atuação de responsabilidade tanto estatal como social, que
deve considerar os interesses da iniciativa privada e os interesses ambientais,
na tentativa de criar uma simbiose, que a prima face não existe. Dessa forma
cabe a ciência jurídica se valer de seus mecanismos para criar um ambiente
propicio ao desenvolvimento de uma interação harmônica.
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O ACESSO À JUSTIÇA PROPORCIONADO AOS ACIONISTAS
MINORITÁRIOS NOS TERMOS DO ARTIGO 246 DA LEI 6.404/66
VICENTINI, Fernanda;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
MARQUES FILHO, Vicente de Paula;
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
Como consequência das transformações que vêm ocorrendo, nos últimos anos,
no mercado de capitais e na estrutura das sociedades anônimas, torna-se
imprescindível analisar estas últimas, bem como os meios processuais de
proteção conferidos aos acionistas minoritários e às empresas controladas. O
presente trabalho analisa a aplicação do artigo 246 da Lei das Sociedades
Anônimas, que sujeita a sociedade controladora aos princípios, deveres e
responsabilidades previstas nos artigos 116 e 117 do diploma, obrigando-a a
pagar os danos causados à controlada pela não observância de tais
dispositivos, bem como examina as principais implicações processuais e as
consequências da substituição processual disposta no aludido artigo 246, em
seu § 1º. Antes de adentrar à discussão do ponto nevrálgico, serão
apresentados e analisados temas fundamentais à compreensão do instituto da
substituição processual, e também ao entendimento e interpretação do artigo
246, mais especificamente em seu §1º, que garante o acesso à jurisdição aos
acionistas minoritários.
Palavras-chave: sociedades anônimas; função social; jurisdição; direito
processual civil; substituição processual.
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COGNIÇÃO, COISA JULGADA E EXECUÇÃO EM SEDE DE ARBITRAGEM:
NOVAS CONCEPÇÕES À LUZ DA LEI N. 9.307/96*
SANTOS, Luciano Alves Rodrigues dos
; [email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
BALEOTTI, Francisco Emilio
; Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
Serão expostas as técnicas de cognição empregadas em processo
jurisdicional, de modo que se atraque, com maior profundidade, às formas
mantidas em sede de arbitragem, sob a luz da Lei n. 9.307/96, que regula todo
o instituto. Expor-se-ão breves ponderações acerca da coisa julgada em meio
judicial, como comparativo inicial à sua formação e à possibilidade de
relativização em foro arbitral. Uma vez proferida, pelo árbitro, a sentença em
sede de arbitragem, escoimada de quaisquer vícios, pode a parte executá-la no
Poder Judiciário, de posse do título executivo judicial, que, além de todas as
características que guarda, é meio possibilitador de força. Não se despreza
também que, ao ser demandada, a parte devedora ingresse com ação de
embargos do devedor, de modo a suscitar possível nulidade no processo
privado. Esta ação, ainda que de modo equiparado, possui natureza idêntica à
ação rescisória do juízo processual civil. Enfim, em que pese haver
coincidência largamente exteriorizada entre arbitragem e jurisdição, não se
retira daquela a força resolutiva célere e desburocratizada que contém, que
cada dia mais ganha espaço entre as relações contemporâneas de direito
negocial.
Palavras-chave: cognição; coisa julgada; relativização; execução; embargos;
rescisória.
* Trabalho resultante do projeto de pesquisa “Acesso à justiça: a instrumentalidade do processo frente à jurisdição”,
desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina (UEL/PR).
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OS LIMITES JURÍDICOS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS EM FACE DA
HIERARQUIA NORMATIVA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS*
NASCIMENTO, Victor Hugo Alcalde do;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
MUNIZ, Tânia Lobo;
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
Os fatos jurídicos são responsáveis pelo nascimento e extinção das diversas
relações jurídicas. Deles decorrem os atos jurídicos stricto sensu e os negócios
jurídicos, dada a distinção entre ambos pela doutrina alemã. Estes preconizam
a autonomia privada, na qual os sujeitos contraentes estipulam, por livre
manifestação de vontade, os efeitos jurídicos que desejam alcançar. A partir de
alguns limites constitucionais e legais, o ordenamento lhes dá eficácia e
concede a força estatal para o cumprimento. A matéria questionada neste
trabalho é a possibilidade desses limites à celebração de negócios jurídicos
serem determinados por tratados internacionais. A resposta reside no Direito
Constitucional, vez que cabe à Constituição Federal disciplinar a celebração,
extinção e relação entre os demais atos normativos. Dada a ausência expressa
no texto constitucional, a matéria fora deixada à doutrina e aos tribunais. A
doutrina desenvolveu várias teses quanto à hierarquia entre convenções
internacionais e leis infraconstitucionais, conforme o conteúdo e forma das
normas internacionais. Dentre as interpretações dos tribunais, vige a proferida
pelo Supremo Tribunal Federal, que divide a hierarquia dos tratados
internacionais conforme a matéria: aqueles que versarem sobre direitos
humanos e que forem aprovados, internamente, por quorum de emenda
constitucional terão status infraconstitucional, porém supra legal; os demais
tratados equivalem às leis infraconstitucionais. Neste sentido, limites à
celebração de negócios jurídicos podem ser determinados por tratados, e sua
observância dependerá da observação da hierarquia estabelecida pela decisão
do Supremo Tribunal Federal.
Palavras-chave: tratados internacionais; negócios jurídicos; limites.
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SEGURANÇA HUMANA E O DEVER JURÍDICO DAS EMPRESAS
BRASILEIRAS*
KEMPFER, Marlene;
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) tem por
objetivo contribuir para promover melhores condições de vida e de emprego,
bem como o desenvolvimento econômico e social nos países onde atua. Entre
os estudos que realiza e ações que promove volta-se à temática da segurança
humana, nos termos do relatório PNUD de 1994, ampliando o conceito
tradicional de segurança de foco estatocêntrico. O núcleo deste conceito é a
Declaração dos Direito Humanos (1948), pois sua efetividade possibilitará a
convivência com os valores da dignidade, fraternidade, liberdade e igualdade.
É a convicção de que as pessoas têm capacidade de dotar-se de uma vida
mais plena. Assim, pode-se afirmar que as condições para viver em meio onde
haverá segurança humana dizem respeito à promoção de ambiente
socioeconômico com segurança econômica, alimentar, de saúde, ambiental,
pessoal, política e a comunidade de segurança. Os obstáculos para vivenciar
estas dimensões devem ser enfrentados por meio de ações convergentes entre
Estado, sociedade civil e mercado. A presente pesquisa volta-se para avaliar
se a ordem jurídica constitucional brasileira atual (1988) reúne os parâmetros
deste programa da ONU, com recorte para indicar as principais
responsabilidades das empresas nacionais diante deste desafio. Esta avaliação
contribui para apontar se o Brasil pode ser integrado ao seleto grupo de
Estados com competências para intervirem sobre as condutas humanas, em
especial, sobre o domínio econômico, com a finalidade de enfrentar focos de
insegurança presentes no longo caminho a percorrer em busca da justiça
social.
* Trabalho resultante do projeto de pesquisa “Diálogos jurídicos e filosóficos sobre a intervenção do Estado no
domínio econômico: ética empresarial à luz do regime econômico constitucional”, desenvolvido na Universidade
Estadual de Londrina (UEL/PR).
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Palavras-chaves: segurança humana; deveres jurídicos empresariais;
negócios jurídicos empresariais; direitos humanos.
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DO ESTADO LIBERAL AO AMBIENTAL: A SUSTENTABILIDADE NOS
NEGÓCIOS JURÍDICOS*
SOUZA, Maria Claudia de;
Universidade Estadual de Londrina
BANNWART JÚNIOR, Clodomiro;
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo avaliar como o negócio jurídico e os
pressupostos da sustentabilidade se movimentaram na interface dos Estados
Liberal e Social, aduzindo as razões pelas quais estes modelos políticos não
responderam satisfatoriamente, nas suas respectivas constelações históricas e
teóricas, às demandas ambientais. Projeta-se o modelo de Democracia
Deliberativa, tal como expresso pelo filósofo Jürgen Habermas, como possível
solução aos déficits dos Estados Liberal e Social. Contudo, cabe avaliar até
que ponto a Democracia Deliberativa, ao incorporar o procedimentalismo como
quesito fundamental de legitimidade normativa, responde à tensão, no plano
ambiental, entre as posições éticas concorrentes que objetivam respostas às
demandas atuais, entre as quais, o antropocentrismo, o biocentrismo e o
ecocentrismo, aliadas a permanente tensão entre autonomia privada e
autonomia pública, marca característica do Estado Democrático de Direito
contemporâneo.
Palavras-chave: Estado; democracia; negócios jurídicos; sustentabilidade;
meio ambiente.
* Trabalho resultante do projeto de pesquisa “Diálogos jurídicos e filosóficos sobre a intervenção do Estado no
domínio econômico: ética empresarial à luz do regime econômico constitucional”, desenvolvido na Universidade
Estadual de Londrina (UEL/PR).
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O ARTIGO 2.035 DO CÓDIGO CIVIL E A INCIDÊNCIA DA FUNÇÃO SOCIAL
DA PROPRIEDADE E DO CONTRATO NOS NEGÓCIOS CELEBRADOS
ANTERIORMENTE À SUA VIGÊNCIA
RIBAS, Thaís Casado;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
LEAL JÚNIOR, João Carlos;
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
A propriedade privada e a sua função social são dois dos princípios que regem
a ordem econômica constitucional, além de constarem do rol de garantias
fundamentais da Constituição, de forma que o dever de cumprimento desse
papel (princípio da função social da propriedade) não foi introduzido no
ordenamento jurídico com a promulgação do Código Civil; ao contrário, já se
encontrava posto no ordenamento e deveria, portanto, guiar os negócios
jurídicos relacionados ao direito de propriedade mesmo quando celebrados
antes da entrada em vigor do atual Código Civil. O art. 2.035 da lei nº
10.406/02 disciplina a validade dos negócios e demais atos jurídicos realizados
antes de sua vigência, prescrevendo sua obediência às leis sob a égide das
quais foram celebrados, mas ressalvando a subordinação a ele dos efeitos
produzidos após o início de sua vigência. Em seu parágrafo único, garante que
nenhuma convenção, mesmo que celebrada antes da vigência desta lei,
poderá contrariar preceito de ordem pública, enaltecendo, com isso, a função
social da propriedade e do contrato. A redação do dispositivo pode levar à
impressão de que está sendo defendida a retroatividade da lei (incidência em
atos jurídicos anteriores a ela), porém, o que se discute nele não é
necessariamente a retroatividade: é, em verdade, preceito que dita a aplicação
de príncipios aos negócios nascidos antes da edição desta lei, mas cujos
efeitos continuam sendo produzidos. Na verdade, quanto à função social
destes tradicionais institutos do direito privado, o Código Civil de 2002 só
tornou expressos (no que tange ao contrato) e/ou repetiu (quanto à
propriedade) princípios que já estavam na Constituição Federal e que já
vinham, por isso, sendo aplicados pelos Tribunais, notadamente por
consistirem em derivação lógica do princípio da dignidade da pessoa humana.
Portanto, não há que se falar em retroatividade de norma que já estava em
vigor (em diploma de patamar superior, aliás – a Constituição). Logo, não há
ofensa à segurança jurídica, sendo totalmente constitucional o dispositivo em
apreço.
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Palavras-chave: Função social da propriedade; função social do contrato; art.
2.035/CC; reatroatividade; constitucionalidade.
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SUPERENDIVIDAMENTO E OS NEGÓCIOS JURÍDICOS CONSUMERISTAS:
PERSPECTIVA LEGISLATIVA ANTE A AUSÊNCIA DE TUTELA LEGAL NO
BRASIL
KADRI, Nádia Safade El;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
ESPOLADOR, Rita Tarifa;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
Diante da criação uma Comissão Especial de Juristas no Senado Federal para
elaborar proposta de atualização da Lei 8.078/90, cujo tema é o
superendividamento, pretende-se investigar a necessidade de legislação
específica a respeito do superendividamento do consumidor, através do estudo
dos Contratos de Crédito, das partes envolvidas e da dinâmica do
posicionamento doutrinário brasileiro, uma vez que a Constituição Federal e a
Lei Consumerista já contêm normas gerais sobre o tema. O presente trabalho
vincula-se à necessidade de soluções aos anseios da sociedade e a eficácia
dos direitos garantidos na Constituição Federal de 1988, que erigiu ao nível de
direito fundamental a defesa do consumidor, incluída também na ordem
econômica constitucional como um princípio limitador da livre iniciativa dos
fornecedores, tendo em vista que a origem da Lei 8.078/90 é o mandamento
constitucional contido no artigo 48 dos Atos e Disposições Constitucionais
Transitórias. Portanto, uma possível atualização do Código de Defesa do
Consumidor, voltada a uma concepção de cooperação e lealdade entre os
envolvidos nos negócios jurídicos consumeristas, sob a ótica dos princípios da
dignidade da pessoa humana e da boa-fé, vem de encontro aos anseios da
sociedade diante de uma proteção legal que vise ao crédito responsável.
Palavras-chave: negócios jurídicos de consumo; crédito; superendividamento;
lei; dignidade.
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A RESPONSABILIDADE CIVIL DAS CLÍNICAS DE REPRODUÇÃO
ASSISTIDA EM RELAÇÃO AO CONSUMIDOR
FRANÇA, Loreanne Manuella de Castro;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
AMARAL, Ana Claudia Corrêa Zuin Mattos do;
[email protected].; Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
O presente estudo tem como objetivo demonstrar a possibilidade de
responsabilização civil das clínicas de reprodução assistida, utilizando como
parâmetro o Código de Defesa do Consumidor, elencando algumas de suas
causas, estabelecendo limites e escusa de responsabilidade nas situações
determinadas previamente pela lei. Primeiramente, são tecidas considerações
sobre as causas que podem ensejar a responsabilização civil das clínicas de
reprodução assistida, como a falta ou falha de informação dada ao paciente, a
possibilidade de dano à gestante e/ou ao filho gerado e a falta de manutenção
de características entre o paciente e o filho advindo dessa técnica de
reprodução humana. Após, partindo-se para a imputação de responsabilidade
propriamente dita, investiga-se a espécie de obrigação contratada pelo
paciente, o tipo de responsabilidade civil a ser considerada no caso, a
possibilidade de o paciente ser enquadrado como consumidor e a clínica como
fornecedora do serviço, tendo por base o Direito do Consumidor, bem como a
análise do privilégio contido no artigo 14, §4º, do Código de Defesa do
Consumidor. Ao final, são apresentadas conclusões, no sentido de que as
clínicas de reprodução assistida podem ser responsabilizadas pelas suas
falhas ou omissões, aplicando-se as disposições constantes da codificação
consumerista, mas considerando os ajustes realizados entre as partes dessa
relação negocial, consubstanciada nas cláusulas previstas no contrato
celebrado entre o paciente e a clínica.
Palavras-chave: responsabilidade civil; reprodução assistida; relação negocial
consumerista; obrigação médica; dano médico.
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COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA: ATO
ADMINISTRATIVO NEGOCIAL EFICAZ NA TUTELA DO MEIO AMBIENTE
SILVA, Kawane Caroline Kubaski;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
MARQUES FILHO, Vicente de Paula;
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
Na sociedade contemporânea, muito se tem debatido acerca das questões
ambientais. A degradação dos recursos naturais, ocorrida pelo uso indevido e
desenfreado pelos homens, exige dos ordenamentos jurídicos atuais a
imposição de regras, limites à exploração ambiental, visando ao equilíbrio entre
o desenvolvimento econômico e o uso consciente dos recursos naturais. Por
muito tempo o desenvolvimento econômico e o meio ambiente eram duas
ideias que andavam paralelamente. Hoje, caminham juntas, em atenção aos
impactos ambientais dos sistemas produtivos. A questão ambiental é um tema
que vem remodelando os meios de produção em prol do meio ambiente, no
desenvolvimento de meios produtivos e de bens de consumo menos poluentes,
por exemplo. Essa perspectiva voltada ao interesse coletivo de proteção
ambiental impôs às empresas o ajustamento de seus meios de produção às
novas exigências de proteção ambiental, bem como atribuiu maior
responsabilidade aos danos ambientais causados em decorrência de sua
atividade produtiva. Como forma de frear as atividades prejudiciais, surgem
meios voltados a coibir e punir ações nocivas ao meio ambiente. Nesse
particular, o compromisso de ajustamento de conduta é mecanismo de
destaque, justamente por se constituir em um método alternativo às soluções
de conflitos nos quais estejam inseridos interesses difusos, coletivos e
individuais homogêneos, quer na fase pré-processual, quer na processual.
Mostra-se como tática célere à pacificação de um conflito de interesses entre
aquele que deseja produzir e o que pretende a tutela do bem jurídico. Quanto à
natureza jurídica, constitui ato administrativo negocial por meio do qual só o
causador do dano se compromete; o órgão público que o toma, a nada se
compromete, exceto, implicitamente, a não propor ação de conhecimento para
pedir aquilo que já está reconhecido no documento. Assim, embora o
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compromisso de ajustamento não seja um contrato ou uma transação, ele
possui um caráter negocial na medida em que o compromitente expressa sua
vontade em aceitar os termos estipulados, a fim de se evitar uma Ação Civil
Pública; e cria-se uma relação jurídica entre o tomador e o compromitente,
gerando efeitos jurídicos caso o compromisso venha ser descumprido.
Palavras-chave: compromisso de ajustamento de conduta; ato administrativo
negocial; direitos transindividuais; tutela do meio ambiente.
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DA APLICAÇÃO DOS INSTITUTOS DE GERENCIAMENTO DO PROCESSO
NORTE-AMERICANOS NA REDUÇÃO DA DURAÇÃO DO PROCESSO SOB
A ÓTICA DA REALIZAÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS *
MALUTA, Henrique Volpato;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
BALEOTTI, Francisco;
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
É patente a todos os aplicadores do direito a morosidade da justiça. Tal demora
implica ineficácia do processo em um mundo com transações cada vez
rápidas. Diante desse novo paradigma para a realização dos negócios e seus
consequentes conflitos, a atual administração da justiça está se mostrando por
todo ineficiente, deixando de dar a segurança jurídica do provável amparo
judicial. Com fito de solucionar esse problema, a corte federal norte-americana
impôs algumas medidas de gerenciamento processual em busca da diminuição
da duração das demandas. Apesar das diferenças existentes entres os
sistemas legais é possível aplicação de forma semelhante desses mesmos
institutos nos Brasil. Dentre as modificações impostas está a obrigação dos
juízes de provocar mediação, arbitragem e conciliação. Outro instituto muito
mais inovador para o sistema jurídico brasileiro é a gestão prática (valorativa)
de cada caso judicial, de modo que o papel do juiz no processo aumente em
muito quanto ao seu caráter ativo. Em decorrência desse instituto, realizam-se
já na audiência inaugural a integral gestão do caso, estabelecendo os pontos
controvertidos, plano para produção de provas, discussão acerca de outros
métodos de solução do conflito e por fim a definição dos prazos para a
realização das provas, audiências futuras e o julgamento. Tais mecanismos
garantem a celeridade processual sem olvidar dos princípios e garantias
processuais que fundamentam um processo justo. A morosidade processual
prejudica em muito a realização dos negócios, o que constitui importante
argumento para ser veementemente combatida.
* Trabalho resultante do projeto de pesquisa “Acesso à justiça: a instrumentalidade do processo frente à
Jurisdição”, desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina (UEL/PR).
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Palavras-chave: direito comparado; gerenciamento processual; segurança nos
negócios jurídicos.
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FLEXIBILIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO E O ASPECTO NEGOCIAL DA
FUNÇÃO DO JUIZ À LUZ DO FORMALISMO-VALORATIVO NO PROCESSO
CIVIL*
LAMESA, Maitê Pereira;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
BALEOTTI, Francisco;
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
O processo civil passa por transformações em diversos países, no sentido de
uma flexibilização do procedimento, as quais influenciam sobremaneira o
direito brasileiro. A flexibilização corresponde à abertura do processo a novos
caminhos para a cognição e a solução do mérito, com o objetivo de se alcançar
novas respostas para problemas cruciais no direito quando se fala em “acesso
à justiça”, como o formalismo excessivo e a morosidade da Justiça. Não são
poucas as vezes em que tais questões esbarram em princípios constitucionais
que regem o processo civil, sobretudo o princípio da celeridade processual e do
acesso à justiça, afrontando-os. Essa abertura pode representar uma solução a
esses problemas, desde que devidamente observados os princípios
fundamentais do processo. No entanto, devem ser discutidos os efeitos dessa
flexibilização, precipuamente no que toca à função do juiz, que passa a ser
mais de um negociador ou de um gerente do processo, ampliando-se seu
poder instrutório. Algumas dessas características estão presentes no artigo
461, parágrafo 5º, do Código de Processo Civil atual, porém a tendência é a
ampliação desses poderes.
Palavras-chave: processo civil; flexibilização; acesso à justiça; princípios
constitucionais; função do juiz.
* Trabalho resultante do projeto de pesquisa “Acesso à justiça: a instrumentalidade do processo frente à
Jurisdição”, desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina (UEL/PR).
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A IMUTABILIDADE DO JUIZ NATURAL FIXADO EM RAZÃO DA
COMPETÊNCIA PELA PRERROGATIVA DE FUNÇÃO;
RODRIGUES, Renan Mendes;
[email protected]; UNIVERSIDADE ESTADUAL DE
LONDRINA
Tratando-se de competência originária ratione persone vel muneris, a Súmula
394 do Supremo Tribunal Federal estabelecia que cometido o crime durante o
exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de
função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação
daquele exercício. Tal preceito sumular se mostrava deveras acertado,
porquanto a orientação nele inserida homenageava o princípio do juiz natural, o
qual tem a sua importância alçada ao patamar de garantia constitucional,
abrigada no artigo 5°, incisos XXXVII e LIII, da Lex Mater. Todavia, o pleno do
Pretório Excelso, ao julgar o Inquérito n° 687/SP em 25/08/1999, cancelou a
supracitada súmula, determinando que os processos que estivessem no
tribunal voltassem à 1ª instância, por entender que a Constituição, em seu art.
102, I, b, somente lhe conferia competência para processar e julgar os
membros do Congresso Federal, nos crimes comuns, e, por conseguinte, uma
vez cessado o mandato, deixaria de existir a competência por prerrogativa de
função. Data maxima venia, tal decisão se mostra equivocada, mormente
porque viola o princípio do juiz natural, eis que é cediço que o processo e
julgamento do acusado competem à autoridade competente à época da prática
da infração. Destarte, ao cometer um ilícito penal ao tempo em que, em razão
de seu cargo ou função, gozava de foro ratione muneris, o indivíduo tem o seu
juízo natural fixado, o qual se torna o único competente para processá-lo e
julgá-lo por tal conduta e, ainda que cessada a função, não poderá ser
alterado, sob pena de grave atentado à garantia insculpida no artigo 5°, inciso
LIII, da Lei Maior.
Palavras-chave: Competência pela prerrogativa de função. Juiz natural.
Cessação da função.
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A CONSTITUCIONALIDADE DA LEI MARIA DA PENHA
FACHIN, Jéssica;
Pontifícia Universidade Católica do Paraná; [email protected].
SARAUZA, Shayara,
Pontifícia Universidade Católica do Paraná; [email protected] .
O presente trabalho visa estabelecer alguns pensamentos sobre a lei
11.340/2006, em especial no que tange a sua constitucionalidade. A lei Maria
da Penha (como é mais conhecida) foi promulgada no ano de 2006 com o
intuito de inibir a violência doméstica contra a mulher no âmbito familiar,
justificando-se pela situação de vulnerabilidade e hipossuficiência em que se
encontram.Trouxe importantes mudanças na legislação brasileira como
proibição da aplicação das penas alternativas, a criação de Juizados de
Violência Doméstica, entre outras. Tal lei visa tutelar uma parcela da sociedade
que se encontra em uma condição de hipossuficiência como supra
mencionado, objetivando assim proteger a mulher no âmbito doméstico. Esse
tipo de tutela específica à grupos minoritários é constitucionalmente previsto. A
lei trouxe algumas discórdias no corpo jurídico brasileiro que perduram até os
dias atuais. Discutem a sua constitucionalidade com o fundamento no princípio
da isonomia, também com previsão constitucional.O Supremo Tribunal Federal
tem o entendimento unanime de que a mencionada Lei não ofende o princípio
da isonomia.Para o relator, ministro Marco Aurélio, isso se perfaz por ser a
figura feminina “eminentemente vulverável quando se trata de
constrangimentos físicos, morais e psicológicos sofridos em âmbito privado”.
Tal princípio deve ser cuidadosamente interpretado observando sua
materialidade. É por esta última que nos posicionamos no sentido de estar a lei
nos ditames constitucionais e, que ainda, é neste sentido que buscamos trazer
tal discussão a este trabalho.
Palavras-chave: 11.340/2006, lei Maria da Penha, constitucionalidade,
isonomia material.
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CONFLITO ENTRE ÁREA DE PROTEÇÃO PERMANENTE E DIREITO À
MORADIA: REFLEXÕES A PARTIR DO VALE DOS TUCANOS EM
LONDRINA
Deíse Camargo Maito,
[email protected], Acadêmica, UEL;
Miguel Etinger de Araujo Junior,
[email protected], Docente, UEL.
A análise da desocupação das terras do Vale dos Tucanos localizadas na Zona
Sul da cidade de Londrina/PR e a revisão bibliográfica sobre a matéria
resultaram no presente estudo. De acordo com o art. 1º, § 2o, II e art. 2º, a, da
Lei 4.771/65 – Código Florestal, Fundos de Vale são Áreas de Proteção
Permanente, ou seja, áreas florestais de suma importância para o equilíbrio
ecológico de todo um sistema, sendo vedada sua supressão e ocupação
humana para moradia, salvo situações excepcionais. Sua função ambiental
consiste, principalmente, na promoção do bem-estar da coletividade, com base
no art. 225 da Constituição Federal de 1988. Da mesma forma, a Carta Magna
protege o direito à moradia em seu art. 6º, declarando-os como direito social
fundamental, exigindo-se, assim, uma postura ativa do poder público em sua
efetivação. Por serem ambos direitos fundamentais constitucionais, merecem
proteção estatal. Dessa forma, quando em conflito, como no caso em tela,
surge a dúvida de como garanti-los, sem que um inviabilize o outro. No caso
em questão, o direito à preservação ambiental, em tese, prevaleceu, pois, no
dia 15 de março de 2012, foi realizada a reintegração de posse das terras ao
Município, ficando as famílias, algumas que habitavam o local há cerca de 30
anos, à mercê de lentos procedimentos do poder público para a possibilidade
de conseguirem uma nova moradia. Dessa forma, à luz dos princípios da
proporcionalidade,da ponderação e da razoabilidade, poderia se vislumbrar
uma hipótese na qual os direitos em tela seriam protegidos, sem a
sobreposição de um ao outro.
Palavras-chave: Área de Proteção Permanente; Direito À Moradia; Conflitos.
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PROTEÇÃO AOS INVESTIDORES NO MERCADO DE CAPITAIS E A
GARANTIA DE ACESSO À JUSTIÇA
Fernanda Vicentini
(UEL), [email protected];
Vicente de Paula Marques Filho
(UEL), [email protected]; Universidade Estadual de Londrina
O escopo do trabalho é a análise dos principais aspectos da tutela coletiva dos
investidores no mercado de capitais e o acesso à justiça, como garantia
constitucional do cidadão à ordem jurídica justa. Contudo, não basta o mero
acesso formal ao sistema jurídico, deve-se garantir a efetividade dos direitos,
sejam esses individuais ou coletivos como no caso dos interesses dos
investidores no mercado de capitais. Nas ultimas décadas a S/A reuniu
recursos de um grande número de pessoas para financiar empreendimentos
produtivos e contribuir para desenvolver o mercado de capitais capaz de
alcançar ganho de produtividade e aumento dos níveis de consumo. Desde a
sua criação, devido ao seu potencial econômico a S.A. tornou-se fonte de
abusos e fraudes fazendo-se necessárias a tomada e medidas judiciais para
reparação de danos. Considerando que o grau de proteção legal conferido aos
investidores e acionistas tem impacto direto sobre o crescimento do próprio
mercado e da economia do país, como consequência das transformações que
vêm ocorrendo nos últimos anos no mercado de capitais tornou-se
imprescindível a defesa coletiva dos interesses dos investidores. Foram
editadas para proteção. A Lei nº 7.913/1989 instituiu a Ação Civil Pública para
reparação de danos causados aos investidores no mercado de valores
mobiliários e conferiu ao MP a legitimidade ativa, contudo é importante
destacar a necessidade de aumentar o rol dos legitimados ativos à propositura
da Ação Civil Pública. A adequada utilização da ação coletiva pode significar
um importante meio de participação mais ativa dos investidores e garantir a
efetividade de seus direitos e o acesso à Justiça.
Palavras-chave: acesso à justiça; mercado de capitais; tutela coletiva
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ACESSO À JUSTIÇA E AS AÇÕES COLETIVAS CONSUMERISTAS:
EFEITOS NA FORMAÇÃO DE RELAÇÕES NEGOCIAIS FUTURAS
BUGES, Alessandra Caria
; [email protected]; Universidade Estadual de Londrina;
MARQUES FILHO, Vicente de Paula;
[email protected]; Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
RESUMO: O direito básico do consumidor ao acesso a "órgãos judiciários e
administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e
morais, individuais, coletivos ou difusos [...]", previsto no artigo 6º, III, do
Código de Defesa do Consumidor, vem sendo exercido, sobretudo, pela
atuação proeminente do Ministério Público, a partir da legitimidade que lhe foi
conferida para a propositura da ação civil pública, nos termos do artigo 129, III,
da Constituição Federal. A tutela coletiva de direitos existe, portanto, para que
tais direitos sejam protegidos da melhor forma de garantir sua efetividade: a
partir de um debate público, que abarque aspectos sociais, políticos e jurídicos.
Nas demandas coletivas, a coisa julgada concretiza-se segundo o resultado da
demanda e terá efeito erga omnes ou ultra partes, conforme previsão expressa
nos artigos 16 da Lei de Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) e 103 do Código de
Defesa do Consumidor. Os limites objetivos da coisa julgada nas ações
coletivas são também especiais: a coisa julgada deve beneficiar todos os
titulares de direitos ou interesses quando houver o acolhimento da demanda.
Adotou-se, portanto, a coisa julgada “secundum eventum litis”, por comparação
ao sistema norte-americano, no qual as class actions surtem os mesmos
efeitos, em sendo procedente a demanda. Considerando-se a importância da
class action na garantia de um acesso mais amplo e eficaz à justiça, bem como
na construção de uma sociedade fundada no princípio da segurança jurídica,
propõe-se o estudo da formação da coisa julgada no âmbito da ação coletiva
consumerista e seus efeitos na conformação das futuras relações negociais no
Brasil.
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Palavras chave: acesso à justiça; ações coletivas consumeristas; coisa
julgada; relações negociais.
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O ATUAL REGIME DE PRECATÓRIOS E SUA OFENSA À CONSTITUIÇÃO
Conrado Augusto Carvalho de Magalhães
Criado com o escopo de conferir moralidade, impessoalidade e
efetividade ao pagamento dos débitos da Fazenda Pública, o precatório tornou-
se ao longo do tempo um instituto descredibilizado perante à sociedade. Tal
fato se deu pelas inúmeras alterações sofridas por esse sistema de
pagamentos, sobretudo nas últimas duas décadas, em que a protelação nos
pagamentos tornou-se algo banal.
O acúmulo de dívidas oriundas de más gestões foi a causa de
um enorme endividamento dos entes públicos, fato que ensejou, a partir da
Constituição de 1988, a promulgação de 4 emendas constitucionais, sendo que
a última delas, a Emenda Constitucional nº 62/2009 alterou significativamente o
regime de pagamento de precatórios. Essa emenda alterou o artigo 100 da
Constituição Federal e acrescentou o artigo 97 ao Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias.
Ocorre que com essas inovações da EC nº 62/2009, a demora
no pagamento de precatórios foi praticamente institucionalizada, na medida em
que foi criado um Regime Especial para pagamentos de precatórios, que
permite o pagamento dos débitos vencidos em até 15 anos, além da
possibilidade de a Fazenda Públlica quitar seus débitos por meio de leilões,
acordos, dentre outras inovações que tem gerado grande polêmica na
comunidade jurídica. Eis que, inúmeros artigos da referida emenda estão
eivados de inconstitucionalidade, fato que ensejou a propositura de 4 Ações
Diretas de Inconstitucionalidade (ADI), por importantes entidades
representativas no meio jurídico, perante o Supremo Tribunal Federal. Essas
ADIs se encontram ainda pendentes de julgamento e por este fato os debates
em torno do tema, podendo se inclui, continuam alimentando a questão.
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RESPONSABILIDADE CIVIL APLICADA AO CONTRATO DE ASSISTÊNCIA
MÉDICA
Loreanne Manuella de Castro França
, mestranda em Direito Negocial pela UEL/PR, especialista em Direito Civil e
Processo Civil pela UEL; [email protected].
Ana Claudia Corrêa Zuin Mattos do Amaral
, doutora em Direito Civil Comparado pela PUC/SP, mestre em Direito Negocial
pela UEL/PR; [email protected].
Trata-se de pesquisa envolvendo o tema da responsabilidade civil aplicada ao
contrato de assistência médica. A relevância do assunto estudado se dá,
primeiramente, tendo em vista os recentes e significativos avanços que
surgiram na área da saúde – com o escopo primordial de melhorar a qualidade
de vida e prolongar a existência humana – e, em segundo lugar, considerando
a possibilidade de falha médica. De acordo com a doutrina majoritária, de
forma geral a obrigação assumida pelo médico é entendida como uma
obrigação de meio, o que significa afirmar que a atividade não comporta o
dever de curar o paciente, mas sim de prestar-lhe os cuidados atentamente,
conforme os conhecimentos e progressos da Medicina. No entanto, tal
prestação pode ser qualificada como obrigação de resultado em situações
excepcionais, como na cirurgia plástica estética e em exames laboratoriais. A
importância de tal diferenciação é vinculada à imputação de responsabilidade
ao médico por qualquer dano causado ao seu paciente. A responsabilização do
médico pode se dar pela teoria objetiva, se a obrigação assumida for de
resultado, ou pela teoria subjetiva, se a obrigação assumida for de meio,
valendo também a análise do instrumento contratual que estabelece a relação
jurídica entre as partes. Referido instrumento contratual é o denominado
contrato de assistência médica, que se subdivide em contrato de assistência
médica puro, o qual compreende a prestação de serviços médicos, e contrato
de assistência médico-hospitalar, o qual abrange, além da prestação do serviço
médico, a internação em clínica ou hospital, alimentação e outros cuidados. O
fundamento para a imputação de responsabilidade para o profissional da
Medicina pode se dar tanto pelo Código Civil, com a incidência dos artigos 948
a 951, quanto pelo Código de Defesa do Consumidor, equiparando-se o
médico como fornecedor do serviço e o paciente como consumidor. Nesse
ponto, deve-se verificar a possibilidade de aplicação do privilégio contido no
artigo 14, §4º, do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece como
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subjetiva a responsabilização dos profissionais liberais. Por fim, vale ressaltar a
possibilidade de o contrato de assistência médica tentar, em suas cláusulas,
estipular hipóteses de não indenização, o que é vedado pelo artigo 25 pelo
Código de Defesa do Consumidor.
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A RESPONSABILIDADE ÉTICA DA EMPRESA PELA PROMOÇÃO DO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Clodomiro José Bannwart Júnior
[email protected]. Universidade Estadual de Londrina.
Cinthia Okazaki Terasaca.
[email protected]. Universidade Estadual de Londrina.
A emergência de um mercado global em que empresas disputam por um
mesmo mercado consumidor faz com que quaisquer variáveis nos preços
exerçam significativa vantagem no que tange à concorrência internacional.
Assim, aumenta-se a procura por países em que a legislação ambiental seja
mais branda, para que se obtenha determinados produtos por preços mais
baixos, atuando-se conforme a chamada “ética de fronteira” em que, a partir do
momento em que a legislação de um Estado se torne mais severa com relação
à tutela ambiental, a solução é encontrar outro que seja mais “maleável”.
Ocorre, no entanto, que esta prática é extremamente prejudicial, não somente
ao meio ambiente, como ao próprio mercado e à população em geral, uma vez
que a diminuição nos custos de uma produção representará a diminuição dos
salários dos empregados da empresa, redução na qualidade dos produtos e
elevação na prejudicialidade que esta produção acarretará ao meio ambiente.
A empresa possui, pois, responsabilidade ética, no sentido de que não pode
visar ao lucro a qualquer custo, mas deve observar alguns padrões de
comportamento para que não cause malefícios à sociedade ou ao meio
ambiente. Deve, assim, promover o desenvolvimento sustentável.
Este pode ser caracterizado como o desenvolvimento que garante as
necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações
futuras de atenderem suas necessidades.
Desse modo, para alcançar o desenvolvimento sustentável é necessário que os
agentes econômicos atuem dentro dos limites de possibilidades do meio
ambiente, sendo dever dos Estados e da população em geral sua tutela,
conforme disposto no art. 225 da Constituição Federal.
Palavras-chave: Mercado global, empresas, meio ambiente, desenvolvimento
sustentável.
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O TRÁFICO DE PESSOAS COM FINS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL.
Cinthia Okazaki Terasaca.
[email protected]. Universidade Estadual de Londrina.
O tráfico de pessoas é um tema que se origina na época da escravidão. Desde
o tráfico de negros, até o de mulheres brancas com fins sexuais, é assunto que
sempre preocupou devido ao cerceamento dos mais básicos direitos tais quais
os da liberdade, dignidade e igualdade.
O tráfico de pessoas é uma das áreas de maior crescimento dentre os atos
ilícitos internacionais, sendo que a maioria das vítimas são mulheres e
crianças.
É um abuso aos direitos humanos assim como um crime que concerne a
jurisdições regionais, nacionais e internacionais, é utilizado para uma variedade
de propósitos tais quais domésticos, laborais, para casamento e prostituição.
Envolve a manipulação de pessoas que desejam migrar a fim de encontrar
melhores condições de emprego e uma vida melhor por traficantes que
desejam apenas explorá-las.
O tráfico de pessoas com fins de exploração sexual representa um problema
contemporâneo com o qual muitos Governos não sabem lidar. São,
malogradas as medidas de prevenção, as campanhas informativas a respeito
de seus malefícios e quase inexistem programas de reintegração às vítimas.
Diversos Estados não apresentam legislação concernente ao tráfico, sendo
preocupante que as vítimas destas Nações possam ficar sem qualquer amparo
jurídico e sem ter seus direitos resguardados.
A questão do consentimento da vítima torna-se extremamente pertinente
quanto à temática abordada, sendo que se questiona se o aceite desta em ser
transportada a outro local para a prostituição anula a idéia do tráfico, ou se
existiria uma flexibilização desta noção, sendo que, caso a pessoa sofresse
algum abuso que violasse direito humano, estaria caracterizado o crime.
Por fim, existe a indagação se a legalização da prostituição serviria para
aumentar ou diminuir o número de pessoas traficadas. Diversos estudos
realizados complementam-se em alguns pontos e divergem quanto a outros,
tornando a questão ainda mais relevante e controversa.
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Palavras-chave: Tráfico de pessoas com fins de exploração sexual, vítima,
consentimento, legalização da prostituição.
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A LIVRE CONCORRÊNCIA COMO INSTRUMENTO DE EFETIVAÇÃO DE
DIREITOS FUNDAMENTAIS
ESTRALIOTO, Wildemar Roberto
Mestrando do programa de Mestrado em Direito/UNIMAR.
CARNEIRO, Ruy de Jesus Marçal
Docente do Programa de Mestrado em Direito/UNIMAR
O presente trabalho analisa o liame existente entre o princípio da ordem
econômica que garante a liberdade de concorrência, e o direito de informação
assegurado ao consumidor. Discorre sobre a importância da preservação e
ampliação deste direito de informação, e sua correlação com o direito à vida,
liberdade, e segurança. Estuda as formas de concentração da atividade
econômica, e os reflexos que produz no desenvolvimento social e cultural.
Expõe que em um mercado sem concorrentes, ou que não tenha consumidores
devidamente informados quanto aos seus direitos, a ordem econômica não
cumpre seus fins, e os direitos fundamentais passam a estar suscetíveis à
violação. Aborda a ordem econômica e o princípio da livre concorrência como
instrumentos de efetivação dos direitos fundamentais; a defesa do consumidor
enquanto meio garantidor da inviolabilidade dos direitos fundamentais; as
correlações entre a defesa do consumidor e a livre concorrência. Conclui-se
com o estudo dos pontos de convergência existentes entre a efetivação da
concorrência e a concretização dos direitos fundamentais; os reflexos da
atuação do consumidor na organização do mercado; e a ingerência que o
exercício da livre concorrência pode produzir na efetivação de direitos
fundamentais.
Palavras-chave: Ordem Econômica. Direitos Difusos. Efetividade.
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ANÁLISE DA SOBERANIA NO CASO CESARE BATTISTI NA
SUSTENTAÇÃO ORAL DE LUIZ ROBERTO BARROSO
Direito Internacional
Carolina Itimura de Camargo
Universidade Estadual de Londrina
PALAVRAS-CHAVE: soberania, Luiz Roberto Barroso, caso Cesare Battisti,
O presente trabalho tem por escopo a análise aplicada do conceito de
soberania, no caso Cesare Battisti, especificamente na sustentação oral de
Luiz Roberto Barroso, advogado do réu.
Utiliza-se do método empírico dedutivo, por meio de análise do caso prático
para aplicação do conteúdo jurídico. O conceito é utilizado por Barroso
veementemente em sua sustentação, o que serve de fonte para a observância
de tal conceito oralmente.
Utilizando-se de diferentes palavras para ilustrar um único conceito de
soberania, Barroso faz sua defesa. Através de pesquisas aplicadas feitas para
o presente trabalho, foi possível identificar as claras disparidades doutrinárias
em relação às oralidades. Este trabalho apresenta essas divergências, bem
como as tendências orais de representação de um conceito.
Acima de tudo, é fundamental ressaltar as circunstâncias de utilização da
palavra soberania, bem como qualquer outra palavra representando o mesmo
sentido. Além disso, as características orais de Barroso como entonação,
pausas e ritmo de fala, mostram como as particularidades de uma sustentação
oral podem transformar o discurso, além de ampliar as capacidades expositivas
do interlocutor.
Questiona-se por fim, se tais características são ou não benéficas a uma
sustentação, na medida em que o conceito é utilizado de forma plural,
tornando-se, além de mais versátil, mais facilmente sujeito a equívocos.
II Encontro Científico da Semana
Jurídica da UEL
50ª Semana Jurídica da Universidade Estadual de Londrina
Anais do I Encontro Científico da Semana Jurídica da UEL |
24.05.2012 | UEL | Londrina/PR ISSN 2237-5287
i “a prerrogativa de direito público que, calcada na lei, autoriza a Administração Pública a
restringir o uso e o gozo da liberdade e da propriedade em favor do interesse da coletividade”. (FILHO, 2011. P. 70). ii O autor Jorge de Oliveira Vargas, citado por Amaral, sustenta que “a obra pública da qual
decorre a legitimidade da cobrança da contribuição de melhoria tem como requisito a valorização de imóveis particulares, e isso não é o objetivo do ambientalismo, pois este visa o benefício de todos e não só de alguns”. AMARAL, 2007, p.180 iii “(...) citam-se os impostos sobre o enxofre, o gás carbônico (CO2) e os óxidos de nitrogênio,
bem como os esquemas de diferenciação fiscal dos combustíveis (na Suécia o teor médio do enxofre dos combustíveis caiu 40% em dois anos, com reduções significativas das respectivas emissões. O chumbo foi erradicado da gasolina e as emissões de óxidos de nitrogênio foram reduzidas em 35% em dois anos) e o imposto sobre a poluição de recursos hídricos (na Holanda, o tributo gerou verbas que possibilitaram rápido aumento da capacidade de tratamento, melhorando substancialmente a qualidade das águas em dez a quinze anos). Os tributos ambientais analisados revelaram benefícios ambientais e, na maioria dos casos, pareceram ter uma boa relação custo-benefício, com resultados significativos em períodos relativamente curtos (dois a quatro anos). (AMARAL, 2007, p. 44). iv Mestranda em Direito Negocial pela Universidade Estadual de Londrina, [email protected]
v Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Professor no Programa de
Mestrado em Direito Negocial da Universidade Estadual de Londrina