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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA - UFU ORÍGENES ROSENDO DA SILVA NETO O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS OMISSÕES LEGISLATIVAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 1

o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

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Monografia de conclusão de pós graduação em Direito Constitucional.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA - UFUORÍGENES ROSENDO DA SILVA NETO

O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS OMISSÕES LEGISLATIVAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

UBERLÂNDIA2013

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ORÍGENES ROSENDO DA SILVA NETO

O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS OMISSÕES LEGISLATIVAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Federal de Uberlândia, como requisito parcial para obtenção do certificado de conclusão de curso de especialização em Direito Constitucional.

Orientador: Dr. Alexandre Walmott Borges

UBERLÂNDIA2013

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ORÍGENES ROSENDO DA SILVA NETO

O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS OMISSÕES LEGISLATIVAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Federal de Uberlândia, como requisito parcial para obtenção do certificado de conclusão de curso de especialização em Direito Constitucional.

Orientador(a): Dr. Alexandre Walmott Borges

Aprovado em: dia/mês/anoBanca Examinadora:

___________________________________________________

Professor(a) Orientador(a): Universidade Federal de Uberlândia

___________________________________________________

Professor(a) Examinador(a):

___________________________________________________

Professor(a) Examinador(a):

UBERLÂNDIA – MG2013

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RESUMO

O objetivo deste trabalho é analisar juridicamente o controle de

constitucionalidade no ordenamento jurídico brasileiro, especificamente quanto às

omissões legislativas.

Com o advento da Constituição Cidadã, em 1988, foram

previstos dois instrumentos para a controle de constitucionalidade das omissões

legislativas, ou seja, quando falta uma norma que é exigida pela Constituição ou que

inviabilize o exercício de algum direito constitucionalmente consagrado.

Tais instrumentos são a Ação Direta de Inconstitucionalidade

por Omissão e o Mandado de Injunção, que embora tenham características semelhantes

tem diferentes implicações no plano concreto dos efeitos, os quais serão tema deste

estudo.

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ABSTRACT

The objective of this work is to analyze the legal constitutional

control in the Brazilian legal system, specifically regarding legislative omissions.

With the advent of the Citizens' Constitution in 1988, two

instruments were provided for judicial review of legislative omissions, so, when there is

a standard required by the Constitution or to impede the exercise of a constitutionally

guaranteed right.

These instruments are Ação Direta de Inconstitucionalidade

por Omissão and Mandado de Injunção, though they have similar characteristics have

different implications on the effects of concrete, which will be the subject of this study.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................................07

2 A HISTÓRIA DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE.....................................08

2.1 O embrião jurídico: caso Marbury X Madison ................................................................. 09

2.2 Evolução no direito brasileiro anterior à Constituição de 1988 .........................................10

2.3 O Controle de Constitucionalidade na Constituição de 1988.............................................13

3 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ABSTRATO DA OMISSÃO:

A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO ........................... 16

3.1 Noções conceituais: a preocupação do constituinte com as omissões legislativas.............16

3.2 Procedimento e características: legitimidade e competência.............................................16

3.3 Omissão legislativa total e parcial......................................................................................20

3.4 Os efeitos da decisão na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão

(ADO) .........................................................................................................................................

..........25

4 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DIFUSO DA OMISSÃO: ANDADO DE

INJUNÇÃO .............................................................................................................................. 30

4.1 A Retrospecto histórico: origem e conceito....................................................................... 30

4.2 Procedimento e legitimidade para o Mandado de Injunção .............................................. 31

4.3 Diferença entre o Mandado de Injunção e a Ação Direta de Inconstitucionalidade por

Omissão .................................................................................................................................... 32

4.4 A evolução do STF quanto aos efeitos da decisão proferida no Mandado de Injunção..... 34

4.5 O Mandado de Injunção e o princípio da separação dos poderes ...................................... 37

5 CONCLUSÃO ......................................................................................................................40

REFERÊNCIAS ......................................................................................................................43

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1 INTRODUÇÃO

O controle de constitucionalidade das leis é mecanismo

destinado a conferir se as normas emanadas pelos poderes do Estado, executivo,

legislativo e judiciário, estão de acordo com a Lei Fundamental da República: a

Constituição.

Este tipo de controle é normalmente previsto em Constituições

escritas, assim como a brasileira.

A questão inicial a ser analisada é como foi conferido ao poder

judiciário o ofício de dizer se uma lei é ou não de acordo com a Constituição.

Essa indagação tem resposta analisando-se o caso Marbury X

Madison, que se passou nos Estados Unidos da América, e que será analisado já no

primeiro capítulo deste estudo.

Adiante verificar-se-á o histórico das Constituições brasileiras

desde o império até chegar à atual Carta Magna, dando ênfase a como era exercido o

controle de constitucionalidade em cada um dos diplomas.

Isto feito, passa-se ao tema central deste trabalho, qual seja as

formas de controle das omissões legislativas. Uma inovação trazida pela Constituição

democrática, mas que ainda mostra-se pouco eficaz na solução das demandas que lhe

são peculiares.

Por conseguinte, este estudo abordará a Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão e também o Mandado de Injunção, especificando o

objeto dos denominados institutos, legitimidade para proposição da ação, procedimento

e efeitos da decisão dentre outras particularidades que lhe são inerentes.

Enquanto se explana o modo com o Supremo Tribunal Federal

interpretou o objetivo e peculiaridades destes dois instrumentos de controle de

constitucionalidade das leis, demonstrar-se-á a evolução do entendimento da Suprema

Corte brasileira quanto ao alcance das decisões proferidas, o que ensejou em uma maior

aplicabilidade dos dois institutos coadunando-se com os princípios gerais expressos na

Constituição Federal.

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2 A HISTÓRIA DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

2.1 O EMBRIÃO JURÍDICO: CASO MARBURY X MADISON

A história do controle de constitucionalidade remonta ao

emblemático caso Marbury X Madison, nos Estados Unidos da América, no ano de

1803. Naquela oportunidade, concluiu a Suprema Corte americana pela possibilidade da

não aplicação, pelo poder judiciário e a própria legitimidade deste para julgar casos de

uma lei que se considerasse contra a Constituição.

Nas eleições realizadas no final de 1800, o presidente Jhon

Adams e seus aliados federalistas foram derrotados pela oposição republicana, tanto

para o Legislativo, quanto para o Executivo. No apagar das luzes de seu governo, Jhon

Adams e o Congresso, articularam-se para conservar sua influência política através do

Poder Judiciário.1

Desta feita, realizaram uma manobra política, alterando a

composição do poder judiciário federal, a qual diminuía o número de juízes da Suprema

Corte, impedindo o próximo presidente de indicar os que faltavam naquele momento.

Logo à frente, em 27 de fevereiro de 1801, uma nova lei

autorizou o presidente a nomear quarenta e dois juízes de paz, tendo os nomes indicados

sido confirmados pelo Senado em 3 de março, véspera da posse de Thomas Jefferson.

Jhon Adams assinou os atos de investidura dos novos juízes no último dia de seu

governo, ficando seu secretário de Estado, Jhon Marshall, encarregado de entregá-los

aos nomeados.2

Contudo, pelo pouco tempo que dispunha, Marshall não

conseguiu entregar o documento a todos os juízes. Assim, assumindo o mandato, o

presidente Thomas Jefferson se negou, por meio de seu secretário, James Madison, a

nomear os juízes faltantes.

Nesse ínterim, William Marbury, que estava entre os juízes não

nomeados, ingressou com ação judicial para ter reconhecido seu direito à investidura no

cargo.

1 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2ªed. São Paulo: Saraiva, 2006. pág. 3.2 Ibidem, pág. 4.

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Ao julgar o caso em 1803, Marshall, agora Presidente da

Suprema Corte, se deparou com algumas questões: poderia a Suprema Corte emitir

decisões de caráter mandamental ao poder executivo?

Para responder à questão, Marshall dividiu os atos do poder

executivo em duas categorias, os políticos e os que a lei lhe permitia discricionariedade.

Nesses casos, não poderia o poder judiciário interferir. Já quando se tratasse de um

dever do executivo, poderia o judiciário determinar seu cumprimento.

A segunda indagação seria: a Suprema Corte poderia considerar

inválida uma lei que contrariasse a Constituição e deixar de aplicá-la?

Na construção de sua resposta, Marshall esclareceu:

“[...]é de todo evidente que ou a Constituição prepondera sobre os atos legislativos que com ela contrastam ou o poder legislativo pode mudar a Constituição através de lei ordinária. Não há meio termo entre essas duas alternativas. Ou a Constituição é uma lei fundamental, superior e não mutável pelos meios ordinários, ou ela é colocada no mesmo nível dos atos legislativos ordinários e, como estes, pode ser alterada ao gosto do poder legislativo. Se é correta a primeira alternativa, então é preciso concluir que um ato legislativo contrário à Constituição não é lei, se é correta, ao contrário, a segunda alternativa, então quer dizer que as Constituições escritas outra coisa não são que absurdas tentativas de limitar um poder que é, por sua natureza, ilimitável.”3

Fica cristalino que Marshall, numa ousada decisão de coragem,

preferiu não se contrapor diretamente ao governo e moldou um sistema no qual a

vontade do constituinte é que sobrepunha-se os todos os poderes, não podendo nenhum

ato do executivo, legislativo ou judiciário ir contra a Carta Magna de 1787. Ainda que

admirável o voto de Marshall, a idéia já havia sido exposta anos atrás por Alexander

Hamilton, no Federalista n.78:

Nenhum ato legislativo contrário à Constituição pode ser válido. (...) A presunção natural, à falta de norma expressa, não pode ser a de que o próprio Legislativo seja o juiz de seus poderes e que sua interpretação sobre eles vincula os outros poderes. (...) É muito mais racional supor que os Tribunais é que tenham a missão de figurar como corpo intermediário entre o povo e o Legislativo, dentre outras razões, para assegurar que este último se contenha dentro dos poderes que lhe foram deferidos. A interpretação das leis é o campo próprio e peculiar dos tribunais. Aos juízes cabe determinar o sentido da

3 CAPELLETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado. Porto Alegre: Fabris, 1984, pág. 47.

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Constituição e das leis emanadas do órgão legislativo. (...) Onde a vontade do Legislativo, declarada nas leis que edita, situar-se em oposição à vontade do povo, declarada na Constituição, os juízes devem curvar-se à última e não à primeira.4

Desta forma consagrou-se nos Estados Unidos da América que

o controle de constitucionalidade das Leis deveria ser exercido pelos juízes. Note-se que

no sistema americano, de tradição da “commom law”, o controle de constitucionalidade

pode ser realizado por qualquer juiz ao analisar um caso concreto, se naquele caso

específico surgir contraposição de uma lei à Constituição. É o que chamamos de

controle difuso e incidental, como será explanado no item 2.3 deste estudo.

2.2 EVOLUÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO DE 1988

Até os tempos hodiernos, o Brasil teve diversas Constituições.

Iniciando-se pela Constituição Imperial de 1824, o controle de constitucionalidade das

leis era função era exercida pelo chamado “Poder Moderador”. O próprio Imperador era

responsável pela fiscalização da constitucionalidade dos seus atos e dos atos do

legislativo. Ele estava acima do bem e do mal, já que a sua pessoa era “inviolável e

sagrada”, não estando “sujeito a responsabilidade alguma” (art. 99 da Constituição

Imperial de 1824), tendo absoluto controle sobre o Judiciário, cuja missão restringia-se

a solucionar os conflitos entre particulares. O Poder Moderador poderia, inclusive,

suspender os magistrados e modificar sentenças judiciais (art. 101 da Constituição

Imperial de 1824).5

Com a República é que o controle de constitucionalidade

passou a ser exercido pelo poder judiciário. O eminente jurista Rui Barbosa, que ficou

encarregado do texto da Constituição de 1891, instituiu naquele diploma, o controle de

constitucionalidade difuso, reconhecendo a competência do Supremo Tribunal Federal

para:

4 HAMILTON, Alexander APUD BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2ªed. São Paulo: Saraiva, 2006. pág. 6.

5 MARMELSTEIN, George. Quando tudo começou: o surgimento da jurisdição constitucional no Brasil. Disponível em: <http://georgemlima.blogspot.com.br/search/label/controle%20de%20constitucionalidade>. Acesso em 10 de junho de 2013.

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[...] rever as sentenças das Justiças dos Estados, em última instância, quando se questionasse a validade ou aplicação de tratados e leis federais e a decisão do Tribunal fosse contra ela, ou quando se contestasse a validade de leis ou atos federais, em face da Constituição ou das leis federais, e a decisão do Tribunal considerasse válidos esses atos ou leis impugnadas (art. 59, § 1º, a e b).

Ainda deve-se observar que a competência para realizar o

controle de constitucionalidade não era exclusiva do Supremo Tribunal Federal, pois

este a realizaria por via recursal, enquanto era garantido aos juízes e Tribunais Federais

(art. 60, a), o julgamento em que alguma das partes alegasse disposição contrária à

Constituição.

O primeiro caso de destaque sobre controle de

constitucionalidade no Brasil (nosso Marbury X Madison, exemplificativamente

falando) ocorreu quando o Marechal Floriano Peixoto reformou compulsoriamente os

militares que eram contra sua permanência na presidência da República, ainda que

àquela época fosse garantida a vitaliciedade ao cargo militar.

O próprio Rui Barbosa, na qualidade de advogado dos

militares, ajuizou ação na justiça federal, requerendo a nulidade do ato do executivo que

reformou os militares, pois contra a Constituição. O eminente jurista obteve sucesso já

em primeiro grau e teve a confirmação da decisão pelo Supremo Tribunal Federal, cuja

parte do acórdão transcreve-se abaixo:

É manifesta a competência do Poder Judiciário para dizer em espécie de ofensas ao poder político contra os direitos individuais com preterição das leis e da Constituição (...). Pelas opiniões da corrente geral dos constitucionalistas, firmando de modo claro e positivo que ao Poder Judiciário, no regímen americano (que é o da nossa Constituição) cabe a suprema missão de garantir a verdade constitucional e legal e proteger os direitos individuais contra as exorbitâncias do Executivo e Legislativo. (...) O Poder Judiciário se acha que a lei do congresso viola a Constituição, pronuncia-se por esta. Mister, porém, é que haja controvérsia entre as partes acêrca de algum caso sujeito. Dá-se aos cidadãos o meio de tornar efetivos os direitos individuais quando violados por lei contrária a êles; mas ainda que o Tribunal Supremo declare que a aplicação dela no caso debatido é inconstitucional, de nenhum valor nem efeito, não deixa por isso a lei de continuar em vigor. Continua a ser obrigatória para todos, mas cada qual quando lhe chega a vez em caso submetido à justiça, tem o mesmo recurso acima indicado para evitar-lhe a aplicação. (Florentino Gonzales – Lição de Dir. Const.). É manifesto, pois, lei ou ato administrativo que ataque um direito subjetivo, o

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lesado pode recorrer ao departamento judiciário e êste tem competência. (...) Não há poderes, quer legislativos, quer executivos, com exercício legal, senão dentro das normas constitucionais, lei suprema que domina e avassala tôdas as outras leis, atos administrativos, decisões judiciárias, desde que a violem. (...) Não há onipotência no Congresso, como não há no Executivo – têm atribuições constitucionais e legais e fora delas são exorbitantes e seus atos nulos. ”6

Embora, diferentemente dos EUA, o controle de

constitucionalidade estivesse expresso na Carta Magna, restava ainda saber se haveria

obediência do primeiro governo republicano à Lei Maior; o que efetivamente ocorreu

com a decisão do Supremo Tribunal Federal acima citada, pela qual o executivo

respeitou e anulou os atos arbitrários de reforma dos militares.

Na Constituição de 1934, a novidade se deu pelo incremento da

ação interventiva, na qual cabia ao Supremo Tribunal Federal julgar a

constitucionalidade da lei que declarava intervenção nas unidades federativas, por

ofensa aos chamados princípios constitucionais sensíveis.

Ainda, sagrou-se que a declaração de inconstitucionalidade

deveria se dar por maioria absoluta dos membros dos tribunais e conferiu ao Senado a

tarefa de suspender em todo ou parcialmente a lei ou ato que houve sido julgado

inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

Seguindo adiante no rumo da história, a Carta Magna de 1937,

nada alterou quanto ao controle difuso de constitucionalidade. Contudo, trouxe inovação

muito criticada por juristas, qual seja, a possibilidade de o Presidente da República, à

sua discricionariedade quanto ao melhor interesse público, submeter as leis declaradas

inconstitucionais ao parlamento, podendo este confirmar a validade destas leis por 2/3

dos votos em cada uma das casas legislativas.

Já na Constituição de 1946, a mudança mais significativa se

deu com a Emenda Constitucional 16/1965, a qual instituiu um modelo de sistema

concentrado de constitucionalidade, pelo que poderia o Procurador Geral da República

acionar o Supremo Tribunal Federal para declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato

federal, por meio da intitulada ação de inconstitucionalidade genérica.

6 BARBOSA, Rui APUD MARMELSTEIN, George. Quando tudo começou: o surgimento da jurisdição constitucional no Brasil. Disponível em: <http://georgemlima.blogspot.com.br/search/label/controle%20de%20constitucionalidade>. Acesso em 10 de junho de 2013.

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A Constituição de 1967 não trouxe grandes modificações,

manteve o controle difuso, já previsto em todas as Cartas Magnas desde o início da

República, o controle concentrado por meio de ação direta e aumentou o objeto da

representação interventiva, para fins de assegurar não só a observância dos princípios

constitucionais sensíveis (art. 10, VII), mas também de prover a execução de lei federal

(art. 10, VI, 1ª parte).7

No período militar, com a Emenda Constitucional de 1969,

acresceu-se previsão de controle de constitucionalidade interventivo em virtude de lei

municipal que fosse contra a Constituição Estadual. E mais uma vez, através da Emenda

Constitucional 7/1977, foi reconhecido expressamente o poder de o Supremo Tribunal

Federal deferir medida cautelar em representação de inconstitucionalidade.

2.3 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

Após o período negro da era militar no Brasil, tivemos grande

inovação na esfera jurídica para a instituição de um Estado Democrático de Direito com

o advento da Carta Magna de 1988. A partir dali pretendeu-se o fortalecimento das

instituições democráticas e o poder judiciário veio ganhando, cada vez mais, um papel

de destaque na sociedade.

Grandes questões, de cunho social, político e moral foram

debatidas e decidas pelo Supremo Tribunal Federal, devendo isso ter se dado em grande

parte pelo complexo sistema de controle de constitucionalidade vigente no país com a

Constituição de 1988.

O novo diploma manteve o controle de constitucionalidade

difuso e incidental. Desse modo qualquer juiz pode declarar e negar a aplicação de lei

que reputar contra a Constituição, desde o juiz de primeiro grau até o Ministro do

Supremo Tribunal Federal em causas de sua competência originária. O controle, além

de difuso, é incidental, isso significa dizer que se dá de forma prejudicial à anàlise de

um caso concreto submetido à apreciação do poder judiciário. Ou seja, a causa de pedir

da ação não é a declaração de inconstitucionalidade de uma lei face à Constituição,

contudo, a questão pode ser argüida por qualquer das partes, inclusive de ofício pelo

7 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade: Estudos de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2004, pág. 206.

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juiz, de forma incidental, uma vez que a constitucionalidade ou não da lei aplicável ao

caso, interferiria no resultado prático da demanda.

Tratando-se de Tribunais Superiores, a inconstitucionalidade só

poderá ser declarada pelo pleno ou órgão especial, por maioria absoluta de seus

membros, vedada a declaração por órgão fracionário, o qual julgará apenas o caso

específico que deu origem ao incidente de inconstitucionalidade (após manifestação do

pleno).

No caso de Recurso Extraordinário para o Supremo Tribunal

Federal, o pleno da Corte julgará e declarando a inconstitucionalidade comunicará ao

Senado Federal para suspender, no todo ou em parte, a execução da lei (art.52, X).

Ainda no controle difuso, o constituinte inovou com o instituto

do Mandado de injunção, referente às omissões legislativas e que será melhor abordado

em capítulo específico, por ser tema central deste estudo.

As maiores inovações, entretanto, ficaram por conta do controle

concentrado e abstrato de constitucionalidade.

O controle é abstrato, tendo em vista que confronta diretamente

uma lei ou ato normativo (ou a falta destes) perante a Constituição, ou seja, não advém

de uma demanda determinada, é a própria demanda.

É concentrado o controle, pois há previsão de um órgão

específico para julgar tais tipos de demanda, o Supremo Tribunal Federal quando

houver afronta direta à Constituição da República ou os Tribunais Estaduais se o

confronto for entre norma municipal e a Constituição Estadual.

Os mecanismos atuais do controle de constitucionalidade

concentrado no Brasil são: a Ação Direta de Inconstitucionalidade, a Ação Declaratória

de Constitucionalidade (introduzida pela Emenda Constitucional 3/1993), a Ação Direta

de Inconstitucionalidade por Omissão, a Ação Direta Interventiva e a Argüição de

Descumprimento de Preceito Fundamental.

Mudança substancial também ocorreu quanto à ampliação dos

legitimados para a propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade, estendida

também à a Ação Declaratória de Constitucionalidade, à Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão, à Ação Direta Interventiva e à Argüição de

Descumprimento de Preceito Fundamental, cujos legitimados são os previstos no artigo

103 da Constituição Federal, abaixo transcrito:

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Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:

 I - o Presidente da República;

II - a Mesa do Senado Federal;

III - a Mesa da Câmara dos Deputados;

IV a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; 

V o Governador de Estado ou do Distrito Federal; 

VI - o Procurador-Geral da República;

VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;

IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

Com isso se pôs fim ao monopólio que era exercido nos

regimes constitucionais anteriores pelo Procurador Geral da República, que era o único

legitimado por excelência a deflagrar o processo de controle de constitucionalidade

concentrado perante o Supremo Tribunal Federal.

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3 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ABSTRATO DA OMISSÃO: A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO

3.1NOÇÕES CONCEITUAIS: A PREOCUPAÇÃO DO CONSTITUINTE COM AS OMISSÕES LEGISLATIVAS

A história política do Brasil nos revela uma faceta um tanto

inapropriada de promessas não cumpridas, que ficaram sempre no plano programático.

O constituinte da Carta Magna de 1988, sabedor de tal situação,

e preocupado com a aplicabilidade das normas e princípios constantes do diploma

constitucional, trouxe instrumentos próprios para tratar da chamada omissão legislativa,

como trata de esclarecer Luis Roberto Barroso:

Como regra geral o legislador tem a faculdade discricionária de legislar e não um dever jurídico de fazê-lo. Todavia, há casos em que a Constituição impõe ao órgão legislativo uma atuação positiva, mediante a edição de norma necessária à efetivação de um mandamento constitucional. Nessa hipótese sua inércia será ilegítima e configurará caso de inconstitucionalidade por omissão. [...] a omissão, como regra, ocorrerá em relação a uma norma de organização ou em relação a uma norma definidora de direito.8

Para resolver a questão, portanto, foram criados os institutos da

Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, no controle concentrado e abstrato

de constitucionalidade e o Mandado de Injunção, no controle difuso.

Neste capítulo, será tratado especificamente a Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão, dedicando-se o seguinte ao Mandado de Injunção.

3.2 PROCEDIMENTO E CARACTERÍSTICAS: LEGITIMIDADE E COMPETÊNCIA

A Constituição Federal faz menção à Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) no art. 103, §2º, dispondo que:

Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente

8 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2ªed. São Paulo: Saraiva, 2006. pág. 225.

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para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.

Nesse tipo de omissão, ocorre que por falta de norma, o sistema

inconstitucional fica impossibilitado de ter efetividade plena, podendo ser a omissão

total ou parcial.

Ao estabelecer que o objetivo da declaração de inconstitucionalidade por omissão é tornar efetiva norma constitucional, nota-se que a ADO está relacionada a um direito objetivo. Ou seja, ela não está voltada à defesa de direitos subjetivos – como o mandado de injunção - mas sim à defesa do sistema constitucional. Por meio da ação direta de inconstitucionalidade por omissão pretende-se “preencher” de forma geral e abstrata, as lacunas inconstitucionais do ordenamento.9

Nota-se pelo texto constitucional que essa é a única menção à

ADO, pelo que os procedimentos e legitimação, ficaram a cargo da interpretação

jurisprudencial. É certo que o artigo 103 e seus incisos tratam da legitimação ativa para

propositura de ação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo que afronte a

constituição, referindo-se, portanto, à Ação Direta de Inconstitucionalidade ou à

Declaratória de Constitucionalidade.

Nestes casos há uma lei, houve a prestação legislativa, já para a

Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, há um na fazer do legislador ou uma

lei defeituosa por abarcar parcialmente a finalidade a que devia se prestar (omissão

parcial). Por falta de previsão legal e considerando que não deve haver interpretação

restritiva quanto a direitos fundamentais, reconheceu o STF, no julgamento da ADIn

3682-MT, que a legitimidade para a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão

é a mesma da Ação Direta de Inconstitucionalidade ou da Declaratória de

Constitucionalidade:

[...] no tocante à ação direta de inconstitucionalidade, a fórmula escolhida pelo constituinte, já do ponto de vista estritamente formal, não se afigura isenta de críticas. O artigo 102 da Constituição que contém o elenco das competências do Supremo Tribunal Federal, não contempla ação direta por omissão, limitando-se a mencionar a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal e estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal. [...] diante da indefinição existente será inevitável, com base mesmo na hermenêutica que recomenda a adoção da

9 PIOVESAN, Flávia. Proteção judicial contra omissões legislativas. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, pág. 113.

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interpretação que assegure maior eficácia possível à norma constitucional, que os entes ou órgãos legitimados à propor a ação direta contra ato normativo – desde que sejam contempladas as peculiaridades mencionadas – possam instaurar o controle abstrato de omissão.10

As mencionadas peculiaridades citadas no trecho da decisão

acima transcrita são de caráter do próprio ente que se omitiu na edição da norma que

inviabiliza o exercício de direito constitucional. Nesse diapasão, não poderia o

Presidente da República ingressar com Ação Direta de Inconstitucionalidade por

Omissão perante o Supremo Tribunal Federal, quando a iniciativa para o projeto de lei

for privativa de sua própria alçada. Ou seja, não pode o órgão emissor, insurgir-se

judicialmente contra si mesmo.

Quanto aos legitimados, houve significativa ampliação de quem

pode promover a Ação Direta de Inconstitucionalidade, o que antes da Constituição de

1988 era restrito ao Procurador Geral da República. Tal alteração tornou mais eficaz o

controle concentrado de constitucionalidade no Brasil, permitindo melhor análise da

aplicabilidade das normas perante os princípios assumidos pelo Estado com a Carta de

1988, vejamos:

Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:

 I - o Presidente da República;

II - a Mesa do Senado Federal;

III - a Mesa da Câmara dos Deputados;

IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; 

V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal; 

VI - o Procurador-Geral da República;

VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;

IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

10 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Tribunal do Pleno. Ação Direta de Inconstitucionalidade 3682 MT , Relator: GILMAR MENDES, data de publicação: 06/09/2007, DJe-096.

18

Page 19: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

Os primeiros – o presidente da República, o procurador-geral

da República, as mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, os partidos

políticos com representação no Congresso Nacional e o Conselho Federal da Ordem dos

Advogados do Brasil – têm legitimidade para preservar a supremacia da Constituição

por força de suas próprias atribuições institucionais. 11 São estes os legitimados

universais, enquanto os demais legitimados seriam os especiais.

Importante ressaltar a aplicação da denominada pertinência

temática, quando a propositura da Ação se der por governadores de Estado e

mesas das Assembléias Estaduais, confederação sindical ou entidade de classe de

âmbito nacional (legitimados especiais). Isso significa dizer que a propositura da ação

por essas entidades só poderá ocorrer quando o a lei ou ato impugnado referir-se aos

interesses das respectivas unidades federadas (Estados) ou aos interesses centrais

exercidos pelas confederações sindicais ou entidades de classe.

Assim considerando, não se admite, a título exemplificativo,

que a Confederação Nacional dos Bancários proponha Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão em virtude de faltar lei que viabilize determinado

direito à educação. Tal demanda, porém, poderia ser proposta pela Confederação

Nacional da Educação, pois eles sim têm pertinência temática quanto ao objeto da ação.

A competência para o julgamento da ação direta de

inconstitucionalidade por omissão em âmbito de lei ou norma federal ou estadual que

afronte a Constituição não traz maiores controvérsias, sendo o Supremo Tribunal

Federal o órgão competente.

Há, contudo, na doutrina e jurisprudência, discussão sobre a

possibilidade da aplicação da Ação Direta de Inconstitucionalidade em âmbito estadual.

O professor Luis Roberto Barroso, agora também Ministro do Supremo Tribunal

Federal, expõe seu entendimento sobre a questão:

Conquanto não haja previsão expressa de mecanismo análogo à ação direta de inconstitucionalidade por omissão no plano estadual, a doutrina admite em geral essa possibilidade. Sua instituição harmoniza-se com a autonomia reconhecida ao Estado em matéria de auto-organização e autogoverno, desde que observado o modelo federal. Em favor da tese há também a idéia acima enunciada da unicidade do fenômeno da inconstitucionalidade, de modo que,

11 FLAKS, Milton. Instrumentos processuais de defesa coletiva. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, out/dez, 1992, pág. 69.

19

Page 20: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

existindo a previsão da representação de inconstitucionalidade, em seu âmbito deve ser compreendido o reconhecimento da omissão violadora da Constituição. 12

Interessante observar que os Estados Federados, trouxeram

inclusive inovações quanto aos efeitos da decisão na Ação Direta de

Inconstitucionalidade por omissão, suprindo em parte a falta de efeito prático das

decisões (como será visto adiante):

No caso da ADO estadual, por exemplo, várias Constituições adotaram técnicas próprias de controle, algumas inclusive estabelecendo sanções distintas das previstas pela Constituição Federal. A Constituição do Piauí, por exemplo, prevê que o não cumprimento da solicitação para suprir a lacuna normativa dentro do prazo assinalado pelo Tribunal de Justiça resulta na perda do cargo e, além disso, configura crime de responsabilidade da autoridade competente para editar a norma. 13

Por certo, as experiências obtidas com as Constituições dos

Estados e representação de inconstitucionalidade por omissão, notadamente quanto aos

efeitos da decisão, serviriam de grande valia para a adoção de medidas que disciplinem

a matéria também no âmbito federal.

No que tange ao procedimento adotado para o julgamento da

ação direta de inconstitucionalidade por omissão deve-se seguir o rito previsto na Lei

9868/1999, a mesma que disciplina a ação direta de inconstitucionalidade e a ação

declaratória de constitucionalidade.

3.3 OMISSÃO LEGISLATIVA TOTAL E PARCIAL

A omissão que pode deflagrar o controle de constitucionalidade

das leis pode ser tanto de forma total, como parcial. Sobre tal constatação pronunciou-se

o Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADIn 1458-7 DF, de relatoria do

Ministro Celso de Mello:

12 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2ªed. São Paulo: Saraiva, 2006. pág. 226.13 FERNANDES, Erico Baracho Dore, FERREIRA, Siddharta Legale. O Controle jurisdicional das omissões legislativas no novo constitucionalismo latino americano: um estudo comparado entre Brasil e Colômbia. Disponível em: < http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=f9fd2624beefbc78>. Acesso em 11 de junho de 2013.

20

Page 21: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

O desrespeito à Constituição tanto pode ocorrer mediante ação estatal quanto mediante inércia governamental. A situação de inconstitucionalidade pode derivar de um comportamento ativo do Poder Público, que age ou edita normas em desacordo com o que dispõe a Constituição, ofendendo-lhe, assim, os preceitos e princípios que nela se acham consignados. Essa conduta estatal, que importa em um facere(atuação positiva), gera a inconstitucionalidade por ação. Se o Estado deixar de adotar medidas necessárias à realização concreta dos preceitos da Constituição, em ordem a torná-los efetivos, operantes e exeqüíveis, abstendo-se, em conseqüência, de cumprir o dever de prestação que a Constituição lhe impôs, incidirá em violação negativa do texto constitucional. Desse non facere ou non praestare, resultará a inconstitucionalidade por omissão, que pode ser total, quando é nenhuma a providência adotada, ou parcial, quando é insuficiente a medida efetivada pelo Poder Público.14

A omissão total ocorre quando não há lei ou ato normativo,

inviabilizando o efetivo cumprimento de uma determinação constitucional. É a inércia

legislativa em tratar da matéria específica.

O caminho mais adequado para a concretização dos ditames

constitucionais, é por evidente, a lei. Mas na falta dela, já previu o constituinte o

“remédio” aplicável. Nesse sentido manifesta-se Gilmar Mendes:

Não parece subsistir dúvida de que a concretização da Constituição há de ser efetivada, fundamentalmente, mediante a promulgação de lei. Os princípios da democracia e do Estado de Direito (art. 1º) têm na lei instrumento essencial. Não se trata aqui apenas de editar normas reguladoras das mais diversas relações, mas de assegurar a sua legitimidade mediante a aprovação por órgãos democraticamente eleitos. A concretização da ordem fundamental estabelecida na Constituição de 1988 carece, nas linhas essenciais, de lei. Compete às instâncias políticas e, precipuamente, ao legislador, a tarefa de construção do Estado constitucional. Como a Constituição não basta em si mesma, têm os órgãos legislativos o poder e o dever de emprestar conformação à realidade social. A omissão legislativa constitui, portanto, objeto fundamental da ação direta de inconstitucionalidade em apreço.15

Passados quase 25 anos da promulgação da atual Constituição,

esse tipo de omissão estará cada vez menos presente, considerando que o congresso veio

14 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Tribunal do Pleno. Ação Direta de Inconstitucionalidade 1458-7. Publicado no Diário de Justiça em 20/09/96. Disponível em:<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=347068>. Acesso em 11 de junho de 2013.15 MENDES, Gilmar. Jurisdição constitucional no Brasil: o problema da omissão. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaArtigoDiscurso/anexo/Lituania.pdf>. Acesso em 11 de junho de 2013.

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Page 22: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

legislando as matérias que necessitam de regulamentação. Contudo, há ainda há casos

em que falta a norma.

Há precedentes, inclusive recentes, da utilização da Ação Direta

de Inconstitucionalidade por Omissão Total em julgamentos do Supremo Tribunal

Federal, como os casos que tratam da edição de norma que regulamente o direito de

greve dos servidores públicos e da previsão constitucional (extinta por emenda

constitucional) de que as taxas de juros não poderiam ser superiores a doze por cento ao

ano.

Questão que pode mostrar-se controversa em relação ao tema é

sobre a demasiada demora de discussão de projetos de lei no Congresso Nacional.

Inicialmente, o Supremo Tribunal Federal entendeu que iniciado o processo legislativo

sobre uma questão específica, não caberia mais Ação Direta de Inconstitucionalidade

por Omissão.

Contudo, no julgamento da ADIn 3682-MT, de relatoria do

Ministro Gilmar Mendes, ficou consignado que:

Não obstante os vários projetos de lei complementar apresentados e discutidos no âmbito das duas casas legislativas, entendeu-se que a inertia deliberandi(discussão e votação) também poderia configurar omissão passível de ser reputada inconstitucional no caso de os órgãos legislativos não deliberarem dentro de um prazo razoável sobre o projeto de lei em tramitação. No caso o lapso temporal de mais de 10 anos desde a data da publicação da Emenda Constitucional 15/1996, evidenciou a inatividade do legislador. Ademais a omissão legislativa produziu incontestáveis efeitos durante o longo tempo transcorrido, no qual vários Estados-membros legislaram sobre o tema e diversos municípios foram efetivamente criados com base em requisitos definidos em antigas legislações estaduais, alguns, inclusive, declarados inconstitucionais pelo STF.16

No precedente acima colacionado, de Ação Direta de

Inconstitucionalidade por omissão ajuizada pela Assembléia Legislativa do Estado do

Mato Grosso, restou claro que, mesmo com projeto de lei em discussão no congresso, o

tempo de deliberação sobre a matéria tornou-se totalmente desarrazoado causando

insegurança jurídica sobre a fusão, criação e extinção de municípios, pois não editada

pelo congresso a Lei complementar devida sobre a matéria.

16 MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnold; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais. 32ª ed. São Paulo: Malheiros editores, 2009, pág. 448.

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Page 23: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

Privativamente às omissões parciais, tem-se que existe lei

atendendo ao ditame constitucional, todavia a norma é incompleta ou defeituosa, o que

em alguns casos, exclui determinada parcela de pessoas de sua abrangência:

A omissão legislativa parcial ocorre quando o legislador promulga a norma, mas essa não corresponde, em absoluto, o dever constitucional que lhe incumbia, ou, ainda, porque há uma mudança nas relações (sejam elas jurídicas ou fáticas), que impõe uma obrigação de adequação às essas modificações. [...] Grande parte da doutrina afirma que na omissão legislativa parcial pode ocorrer ofensa ao princípio da igualdade, pois direitos de determinados grupos foram concretizados, deixando, todavia, um vácuo legislativo no que tange aos demais grupos.17

Luis Roberto Barroso ainda divide a omissão parcial em duas

espécies, em omissão parcial propriamente dita e a omissão parcial relativa:

Na omissão parcial propriamente dita, a norma existe, mas não satisfaz plenamente o mandamento constitucional, por insuficiência ou deficiência de seu texto. É o que ocorre, por exemplo, com a lei que institui o salário mínimo em patamar incapaz de atender aos parâmetros impostos pelo art. 7º, IV, da Constituição. Por outro lado, a omissão será relativa quando um ato normativo outorgar a alguma categoria de pessoas determinado benefício, com exclusão de outra ou outras categorias que deveriam ter sido contempladas, em violação ao princípio da isonomia. Exemplo típico é a concessão de reajuste a servidores militares, sem estendê-lo aos civis, ao tempo em que a Constituição impunha o tratamento paritário (regra suprimida pela EC19/1998).18

A divisão proposta por Barroso não traz grandes repercussões,

embora seja didática. Contudo, da análise realizada sobre as modalidades de omissão

legislativa (total ou parcial), haverá intervenção imediata sobre os efeitos da decisão

proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, estudo realizado no

tópico seguinte.

17 LOPES, Carolina Villar. O processo constitucional das omissões legislativas: possibilidade de aplicação do princípio da fungibilidade entre a ação direta de inconstitucionalidade e a ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Disponível em: <http://www.tex.pro.br/tex/listagem-de-artigos/371-artigos-out-2012/8860-o-processo-constitucional-das-omissoes-legislativas-possibilidade-de-aplicacao-do-principio-da-fungibilidade-entre-a-acao-direta-de-inconstitucionalidade-e-acao-direta-de-inconstitucionalidade-por-omissao>, Acesso em 12 de junho de 2013.18 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2ªed. São Paulo: Saraiva, 2006. pág. 224.

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Questão por demais relevante é também a fungibilidade entre a

Ação de Inconstitucionalidade por omissão (parcial) e a Ação Direta de

Inconstitucionalidade.

Em mais uma superação de entendimentos, primeiramente o

Supremo se inclinou a não fungibilidade das ações quando do julgamento da ADI-

MC986, na argumentação do Ministro Sepúlveda Pertence:

Ora, o pedido da ação direta de inconstitucionalidade de norma é de todo diverso do pedido da ação de inconstitucionalidade por omissão. Por isso, creio, de fato, inadmissível a conversão da ação de inconstitucionalidade positiva, que se propôs, em ação de inconstitucionalidade por omissão de normas.19

Passados alguns anos, em 2010, quando julgamento de matéria

referente ao Fundo de Participação dos Estados, o Ministro Gilmar Mendes reconheceu

a fungibilidade entre as ações de inconstitucionalidade e inconstitucionalidade por

omissão (ADI 875, 1987, 2727 e 3243):

Dado que no caso de uma omissão parcial existe uma conduta positiva, não há como deixar de reconhecer a admissibilidade, em princípio, da aferição da legitimidade do ato defeituoso ou incompleto no processo de controle de normas, ainda que abstrato. Tem-se, pois, aqui, uma relativa, mas inequívoca fungibilidade entre a ação direta de inconstitucionalidade (da lei ou ato normativo) e o processo de controle abstrato da omissão, uma vez que os dois processos — o de controle de normas e o de controle da omissão — acabam por ter — formal e substancialmente — o mesmo objeto, isto é, a inconstitucionalidade da norma em razão de sua incompletude.20

Com esse julgamento, admitiu-se na Corte a fungibilidade das

de duas espécies de ação destinadas ao controle de constitucionalidade, visando a

instrumentalização do processo, bem como a economia processual. O que se considerou

é que a norma confrontada com a Constituição poderia tanto ser inconstitucional quanto

19 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Tribunal do Pleno. Ação Direta de Inconstitucionalidade – Medida Cautelar 986. Publicada no Diário de Justiça em 08.04.1994. Disponível em <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=346737>. Acesso em 13 de junho de 2013.20 MENDES, Gilmar. Jurisdição constitucional no Brasil: o problema da omissão. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaArtigoDiscurso/anexo/Lituania.pdf>. Acesso em 11 de junho de 2013.

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inconstitucional por omissão parcial (norma defeituosa ou incompleta), o que poderia

ensejar ambas as formas de controle de constitucionalidade citadas.

3.4 OS EFEITOS DA DECISÃO NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (ADO)

Realizadas as considerações gerais sobre a ação direta de

inconstitucionalidade por omissão, chega o momento de definir a sua efetividade dentro

do plano constitucional, estabelecer quais os efeitos da decisão proferida pelo Supremo

Tribunal Federal, ressaltando, inicialmente, que por ser objeto do controle de

constitucionalidade abstrato e concentrado a decisão sobre a ADO possuirá efeitos erga

omnis.

Depreende-se da própria Constituição que declarada a

inconstitucionalidade por omissão, o Supremo dará ciência ao órgão omissor para que

tome as providências cabíveis, ou seja, para editar a norma faltante. Foi essa a

interpretação inicial da Corte, no sentido de que só poderia declarar a omissão do

legislador e dar ciência a este, colocando-lhe em mora, mas sem poder-lhe impor o

mandamento de legislar em virtude do princípio basilar da separação dos poderes.

Essa interpretação foi intensamente criticada por jurisprudência

e doutrina, pois esvaziava quase que totalmente os efeitos práticos da ação direta de

inconstitucionalidade por omissão e também do Mandado de Injunção (cujo primeiro

entendimento da Corte seguiu o mesmo raciocínio). Alguns juristas chegaram a dizer

que a Constituição então previu dois instrumentos para dar ciência ao legislador de que

falta a norma, mas nenhum instrumento eficaz para resolver a problemática de forma

prática.

Com a mudança da composição dos Ministros da Corte

Suprema e a adoção de uma posição mais voltada à efetiva concretização dos ditames

constitucionais, no julgamento da ADIn 3682-MT a Corte enfrentou a problemática

referente a criação, fusão e extinção de municípios.

De acordo com o disposto no art. 18, § 4º, da CF, tal matéria

deveria ser regulamentada por lei complementar. Contudo, o Congresso Nacional não

editou a lei, passados mais de dez anos da Emenda Constitucional que lhe impôs tal

dever. Nesse período vários municípios foram criados e estruturados

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administrativamente com base em legislação estadual, as quais foram declaradas

inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, que estabeleceu um prazo de 24

meses para que as leis estaduais continuassem vigendo até a edição da lei complementar

federal.

Irresignado com a inércia do Congresso em editar a norma

complementar, a Assembléia Legislativa do Estado do Mato Grosso ajuizou ação direta

de inconstitucionalidade por omissão perante o Supremo, cuja parte do voto do relator

Gilmar Mendes, transcreve-se:

[...] voto no sentido de declarar o estado de mora em que se encontra o Congresso Nacional, a fim de que, em prazo razoável de 18 meses, adote ele todas as providencias legislativas necessárias ao cumprimento do dever constitucional imposto pelo art. 18, § 4º, da CF, devendo ser contempladas as situações imperfeitas decorrentes do estado de inconstitucionalidade geradas pela omissão. Não se trata de impor um prazo para a atuação legislativa do Congresso Nacional, mas apenas da fixação de um parâmetro temporal razoável, tendo em vista o prazo de 24 meses determinado pelo Tribunal nas ADIn ns. 2240, 3316, 3489 e 3689 para que as leis estaduais que criam municípios ou alteram seus limites territoriais continuem vigendo, até que a lei complementar federal seja promulgada contemplando as realidades desses Municípios.21

Nesse julgamento a Corte inovou no sentido de além de

notificar o legislativo da falta da norma, também estabelecer um prazo razoável para a

edição da norma.

Embora louvável a tentativa de dar efetividade à decisão, no

plano realístico, ainda inexiste a Lei complementar mencionada, cujo projeto de lei

416/08, do senado, foi aprovado pelo plenário da câmara apenas neste mês de junho de

2013, exaurindo-se todos os prazos já estipulados pelo Supremo.

Já tratando dos casos decididos em ação direta de

inconstitucionalidade por omissão parcial, os efeitos da decisão figuram-se diversos,

pois nesta, ao invés de uma omissão completa do legislador, há uma atuação positiva, há

norma, mas defeituosa.

Assim considerando, poderia o Supremo Tribunal Federal

declarar a inconstitucionalidade da norma e suspender sua eficácia, restabelecendo a

isonomia, com a melhoria dos excluídos, mas com a generalização da situação menos

21 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Tribunal do Pleno. Ação Direta de Inconstitucionalidade 3682 MT , Relator: GILMAR MENDES, data de publicação: 06/09/2007, DJe-096.

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favorável.22Essa possibilidade não é a melhor das soluções, pois prejudicaria o direito de

terceiros sem resolver efetivamente o problema dos excluídos pela norma.

Outra possibilidade é a declaração de inconstitucionalidade sem

redução de texto, técnica importada do direito alemão e utilizada pelo Supremo no

Julgamento da ADIn 1458-DF, de relatoria do Ministro Celso de Mello:

SALÁRIO MÍNIMO - VALOR INSUFICIENTE SITUAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO PARCIAL. - A insuficiência do valor correspondente ao salário mínimo, definido em importância que se revele incapaz de atender as necessidades vitais básicas do trabalhador e dos membros de sua família, configura um claro descumprimento, ainda que parcial, da Constituição da República, pois o legislador, em tal hipótese, longe de atuar como o sujeito concretizante do postulado constitucional que garante à classe trabalhadora um piso geral de remuneração (CF, art. 7º, IV), estará realizando, de modo imperfeito, o programa social assumido pelo Estado na ordem jurídica. - A omissão do Estado - que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional - qualifica-se como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental. - As situações configuradoras de omissão inconstitucional - ainda que se cuide de omissão parcial, derivada da insuficiente concretização, pelo Poder Público, do conteúdo material da norma impositiva fundada na Carta Política, de que é destinatário - refletem comportamento estatal que deve ser repelido, pois a inércia do Estado qualifica-se, perigosamente, como um dos processos informais de mudança da Constituição, expondo-se, por isso mesmo, à censura do Poder Judiciário. 

No julgamento da ADO acima transcrita a declaração de

inconstitucionalidade positiva da lei que instituiu o salário mínimo, tirando-lhe a

eficácia, seria mais prejudicial que a própria manutenção da lei no ordenamento

jurídico. Mediante isso, preferiu o Supremo declarar a inconstitucionalidade da lei por

omissão parcial, sem pronunciar a nulidade da lei em questão e apenas dar ciência ao

legislador sobre o estado de incompletude da norma perante os ditames constitucionais.

Mais uma vez não é uma solução plenamente eficaz, pois

persistindo o legislador na omissão, não haveria conseqüências práticas da declaração.

22 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2ªed. São Paulo: Saraiva, 2006. pág. 239.

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Outra hipótese seria estender os benefícios impostos pela norma

a todos os destinatários de forma isonômica mediante uma sentença aditiva. Entretanto,

tal postura não costuma ser adotada pelo Supremo Tribunal Federal por considerar não

ser tua função atuar como legislador positivo, além de esbarrar no princípio da

separação dos poderes, orçamento e reserva legal absoluta.

Neste sentido, o julgamento da ADIn 529-DF, tratando sobre a

diferenciação estabelecida entre os vencimentos dos servidores militares e civis:

A extensão jurisdicional em favor dos servidores preteridos do benefício pecuniário que lhes foi indevidamente negado pelo legislador encontra obstáculo no princípio da separação dos poderes. A disciplina jurídica da remuneração devida aos agentes públicos em geral está sujeita ao principio da reserva legal absoluta. 23

Portanto, dentro das três possibilidades aventadas pela doutrina

e jurisprudência, entende-se que nenhuma delas é plenamente eficaz pra suprir a falta da

norma requerida pela Constituição, tendo a ação direta de inconstitucionalidade por

omissão um caráter mais político, uma vez que ciente pelo poder judiciário de falta da

norma, pode ficar comprometido o legislativo se o grupo político no poder não assumir

a sua própria responsabilidade pela edição da lei reclamada.

A doutrina sustenta, por conseguinte, que a omissão do

legislador em editar a norma pode gerar a responsabilização do Estado:

A esse dever jurídico rigoroso [de tomar as medidas necessárias para tornar exeqüível a norma constitucional], fruto do principio maior de efetividade da Constituição, corresponde como seu corolário necessário a responsabilidade no caso de descumprimento daquilo que foi constitucionalmente preceituado. A responsabilidade civil agasalhada na Constituição é ampla e abrange todos os danos resultantes da ação ou omissão dos agentes do Estado. O ato de legislar ou deixar de fazê-lo não é livremente discricionário, está vinculado aos preceitos constitucionais e, assim, está juridicizado, não tendo característica de ato exclusivamente político que o tornaria insuscetível de responsabilização. 24

Portanto, se a falta de norma prejudicar o destinatário a que ela

se refira, pode o Estado ser compelido a indenizar o prejudicado. Para isso deve-se,

23 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Tribunal do Pleno. Ação Direta de Inconstitucionalidade 529 DF , Relator: CELSO DE MELLO, DJU 20 de maio de 1994.24 MOTTA, Maurício Jorge Pereira APUD BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2ªed. São Paulo: Saraiva, 2006. pág. 236.

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contudo, analisar de que forma se deu a omissão, se a Constituição estabelece prazo

determinado para a edição da norma ou se não há prazo estabelecido.

Caso haja previsão constitucional de prazo e o legislativo

quedou-se inerte, nasce ali o dever de indenizar caso haja dano efetivo (prejuízo

material ou moral ao destinatário da norma):

Assim, conclui-se que, descumprido o prazo fixado na Constituição para que o Poder Legislativo edite determinada lei, resta indeclinável o direito a indenização pelos danos ocasionados pela referida omissão inconstitucional. Na verdade, verifica-se que decorrido o prazo constitucionalmente estabelecido sem que haja a edição de lei pelo Poder Legislativo, ou seja, violada a obrigação estatuída pela Constituição, nasce para o particular o direito subjetivo de ressarcimento por eventuais danos oriundos dessa omissão, ou em outras palavras, de se obter o bem da vida garantido pelo constituinte através de prazo.25

No que tange à omissão quando não há prazo estabelecido,

entende-se que primeiramente seria necessária a declaração da inconstitucionalidade por

omissão pelo Supremo Tribunal Federal, caso em que se mantendo em mora, poderia o

Legislativo e União ser responsáveis por eventual dano.

Deve-se salientar ainda quando a omissão se dever a falta de

regulamentação de norma por parte da administração pública. Esses casos são muito

mais raros do que a falta de norma legislativa estritamente considerando, tendo em vista

que, em regra, a Constituição exige lei para a concretização de seus fundamentos.

Contudo, nestes casos de omissão administrativa, a Constituição é taxativa no sentido de

que há prazo de 30 dias para que o órgão demandado supra a ilegalidade editando a

norma faltante. Caso isso não seja feito o agente imputado pode sofrer sanção de crime

de responsabilidade.

4 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DIFUSO DA OMISSÃO: MANDADO DE INJUNÇÃO

4.1 RETROSPECTO HISTÓRICO: ORIGEM E CONCEITO

25 ROCHA, Tiago do Amaral; QUEIROZ, Mariana de Oliveira Barreiros. A responsabilidade civil do Estado perante a omissão legislativa inconstitucional. Disponível em:< http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10683>. Acesso em 13 de junho de 2013.

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Segundo a Constituição brasileira, art. 5º, LXXI, “Conceder-se-

á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o

exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à

nacionalidade, à soberania e à cidadania.”

A doutrina busca no direito comparado as possíveis inspirações

para esse instituto brasileiro, o qual se pode ressaltar o “writ of injunction”, do Direito

inglês e do Direito norte-americano (uma ordem judicial voltada para a defesa de

direitos civis fundados na Constituição, e editada num caso por equidade, para

determinar que uma parte se abstenha de fazer ou continuar a produzir algo, seja um ato

particular, seja uma atividade, porque isto causaria dano irreparável.26

Em um exercício de comparação das origens históricas do writ,

se destaca o estudo de Afonso Arinos de Mello Franco, segundo o qual trata-se o

mandado de injunção, de uma ação constitucional que autoriza o juiz a romper com a

tradicional aplicação rígida de lei ao caso concreto para, de acordo com o pedido e o

ordenamento jurídico, construir uma solução satisfatória, de modo a concretizar o

direito constitucional do impetrante.27

O doutrinador Marcelo de Oliveira Fausto Figueiredo Santos

(1991, p. 32) entende que o mandado de injunção é a única ação constitucional que

autoriza o juiz a romper com a tradicional aplicação rígida de lei ao caso concreto para,

de acordo com o pedido e o ordenamento jurídico, construir uma solução satisfatória, de

modo a concretizar o direito constitucional do impetrante. [...] Assim, a doutrina

majoritária defende, com propriedade, que o mandado de injunção conforme concebido

pela Constituição Federal brasileira, sofreu influências do direito anglo-saxão, norte-

americano e português, especialmente quanto a sua finalidade de concretizar o direito

constitucionalmente garantido ao impetrante, tendo o legislador adequado o instituto à

realidade brasileira.28

Neste aspecto serve o mandado de injunção a garantir o

exercício de direitos e liberdades constitucionais assegurados pela Carta Magna, cuja

26 CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição, Direito Constitucional positivo. 15ª Ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2009, pág. 895.27 ARAGON, Célio da Silva. Mandado de injunção. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 43, 1 jul. 2000 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/125>. Acesso em: 5 fev. 201328 OLIVEIRA, Ana Carolina Ribeiro de. Mandado de injunção à luz da separação dos poderes. Disponível em: <http://www.osconstitucionalistas.com.br/mandado-de-injuncao-a-luz-da-separacao-dos-poderes.> Acesso em 29 de jan. 2013

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Page 31: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

regulamentação esteja em falta por inércia do poder legislativo em editar a norma

necessária.

4.2 PROCEDIMENTO E LEGITIMIDADE PARA O MANDADO DE INJUNÇÃO

Reputa-se como legitimado ativo para o mandado de injunção

qualquer pessoa, seja física ou jurídica, cuja falta de norma regulamentadora esteja

impedindo o exercício de direitos ou liberdade constitucionais previstos no art. 5º,

LXXI, CF.

Como sujeitos passivos, impetrados, o mandado de injunção

terá de outro lado da lide todas as pessoas órgãos ou entidades que obstaculizem a

fruição dos direitos constitucionais do impetrante, podendo, inclusive, ser empresas

privadas, o que é mais raro de ocorrer, já que a falta de regra regulamentadora de

qualquer natureza, normalmente, é função do Estado.29

Quanto ao procedimento, serão observadas, no que couber, as

normas do mandado de segurança, enquanto não editada legislação específica (art. 24,

parágrafo único, da Lei n. 8038, de 28 de maio de 1990).30

Em relação à competência, dispõe o art. 102, I, p, da

Constituição Federal:

"Art. 102 – Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I – processar e julgar, originalmente:

[...]

q) o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição do Presidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, das Mesas de uma dessas casas Legislativas, do Tribunal de Contas da União, de um dos Tribunais Superiores, ou do próprio Supremo Tribunal Federal.”

29 ARAGON, Célio da Silva. Mandado de injunção. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 43, 1 jul. 2000 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/125>. Acesso em: 5 fev. 201330 CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição, Direito Constitucional positivo. 15ª Ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2009, pág. 896.

31

Page 32: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

Além disso, o diploma constitucional também atribui

competência para a apreciação do mandado de injunção pelo o STJ no artigo 105, inciso

I, da alínea "h":

"Art. 105 – Compete ao Supremo Tribunal de Justiça:

I – processar e julgar, originalmente:

[...]

h) o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição de órgão, entidade ou autoridade federal, da administração direta ou indireta, excetuados os casos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos órgãos da Justiça Militar, da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal.”

4.3 DIFERENÇA ENTRE O MANDADO DE INJUNÇÃO E A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO

O constituinte da carta de 1988 mostrou grande preocupação

em garantir a efetiva aplicação das normas previstas no texto do diploma magno, tanto

que invocou dois instrumentos para o caso de inércia do legislador em regulamentar as

normas necessárias à consecução dos direitos constitucionais, são eles o Mandado de

Injunção e a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão.

Embora tenham semelhanças, não se deve confundir os dois

institutos, pois a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão tem objeto mais

amplo que o Mandado de Injunção, o qual obedece as limitações do art. 5º, LXXI, CF.

Ainda assim, a eficácia do Mandado de Injunção é, atualmente, deveras maior que a da

ADO.

Dispõe o artigo 103, parágrafo segundo da Constituição

Federal:

Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.

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Page 33: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

Os legitimados para propositura da Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão estão previstos no artigo 103 da Constituição

Federal, sendo o Supremo Tribunal Federal competente para o julgamento, e também os

Tribunais de Justiça Estaduais quando a omissão for frente à Constituição Estadual.

Declarada a inconstitucionalidade por omissão, o STF dá

ciência ao poder competente para que seja elaborada a lei, não tendo sido fixado prazo.

Tratando-se de órgão administrativo, este deverá elaborar a lei no prazo de trinta dias,

sob pena de responsabilidade (artigo 103, § 2º da Constituição Federal). E, no caso do

Poder Legislativo, não existe a fixação de prazo para preparação da norma

regulamentadora, entretanto demonstrada a omissão o prejudicado será indenizado. A

Ação Direta de Inconstitucionalidade por omissão produz efeitos erga omnes.31

Postas tais considerações podemos destacar algumas

características que diferem os dois institutos, conforme ensinamentos do professor

Kildare Gonçalves Carvalho32:

1 – O Mandado de Injunção tutela direito subjetivo, pelo que por interesse individual, pode-se requerer a imediata implementação da norma. Já a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão tutela direito objetivo e destina-se a tornar efetiva norma constitucional, independente do que se trate;2 – O Mandado de Injunção tem amplo rol de legitimados, podendo ser impetrado por qualquer pessoa, diferentemente da ADO que tem rol taxativo definido pelo art. 103, CF;3 – Quando da procedência do pedido no Mandado de Injunção o direito é garantido pela própria corte que viabiliza uma regulamentação para o caso, já na ADO o STF apenas declara inconstitucional a omissão constitucional, dando ciência ao órgão competente para a adoção das providências necessárias.

Figura, portanto, o Mandado de Injunção como instrumento do

controle difuso de constitucionalidade no ordenamento brasileiro e a Ação Direta de

Inconstitucionalidade por omissão como objeto do controle abstrato de

constitucionalidade.

31 MARTINS, Rachel Figueiredo Viana. O conceito de mandado de injunção e da ação direta de inconstitucionalidade por omissão e as diferenças entre as duas garantias constitucionais. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/5621/Mandado-de-injuncao-e-a-acao-direta-de-inconstitucionalidade-por-omissao> Acesso em: 2 de fev. 2013.32 CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição, Direito Constitucional positivo. 15ª Ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2009, pág. 512.

33

Page 34: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

4.4 A EVOLUÇÃO DO STF QUANTO AOS EFEITOS DA DECISÃO PROFERIDA NO MANDADO DE INJUNÇÃO

Desde a adoção do Mandado de Injunção pela Constituição de

1988 o STF já se confrontou várias vezes com julgamentos que vieram por mudar o

entendimento da corte sobre o alcance das decisões proferidas.

Em um primeiro momento, tendo como base o julgamento do

MI 107, a Corte Suprema adotou uma posição mais conservadora, na qual reconhece

que falta a norma regulamentadora a viabilizar o exercício de direito constitucional,

contudo, apenas dá ciência ao legislador para que tome as providências cabíveis – o

período da chamada teoria não concretista.

Segundo entendimento dos ministros daquela época a

regulamentação de norma geral, ainda que provisória, encontrava obstáculos na própria

Constituição, principalmente nos princípios da separação dos poderes e da democracia.

Tal posição foi bastante criticada, pois praticamente enterrava o

Mandado de Injunção, uma vez que o instituto não poderia, na prática, gerar nenhum

efeito, pois embora o STF desse ciência ao congresso da falta de norma, este não se

subordina à Corte neste sentido, podendo ou não cumprir a edição da norma.

Algum tempo após, com o julgamento do MI 283, cujo relator

foi o Ministro Sepúlveda Pertence, a Corte evoluiu no sentido de que se o legislador não

editasse norma em determinado lapso temporal, o impetrante então teria direito à

satisfação das garantias constitucionais, sem prejuízo de eventual indenização, podendo

para isso recorrer às vias ordinárias para obtenção de uma sentença líquida – a chamada

teoria não concretista com fixação de prazo.

Vejamos a ementa do referido acórdão:

- Mandado de injunção: mora legislativa na edição da lei necessária ao gozo do direito a reparação econômica contra a União, outorgado pelo art. 8., par.3., ADCT: deferimento parcial, com estabelecimento de prazo para a purgação da mora e, caso subsista a lacuna, facultando o titular do direito obstado a obter, em juízo, contra a União, sentença liquida de indenização por perdas e danos.

1. O STF admite - não obstante a natureza mandamental do mandado de injunção (MI 107 - QO) - que, no pedido constitutivo ou condenatório, formulado pelo impetrante, mas, de atendimento impossível, se contem o pedido, de atendimento possível, de declaração de inconstitucionalidade da omissão normativa, com

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Page 35: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

ciência ao órgão competente para que a supra (cf. Mandados de Injunção 168, 107 e 232).2. A norma constitucional invocada (ADCT, art. 8., par.3. - "Aos cidadãos que foram impedidos de exercer, na vida civil, atividade profissional especifica, em decorrência das Portarias Reservadas do Ministério da Aeronáutica n. S-50-GM5, de 19 de junho de 1964, e n. S-285-GM5 será concedida reparação econômica, na forma que dispuser lei de iniciativa do Congresso Nacional e a entrar em vigor no prazo de doze meses a contar da promulgação da Constituição" - vencido o prazo nela previsto, legitima o beneficiário da reparação mandada conceder a impetrar mandado de injunção, dada a existência, no caso, de um direito subjetivo constitucional de exercício obstado pela omissão legislativa denunciada.3. Se o sujeito passivo do direito constitucional obstado e a entidade estatal a qual igualmente se deva imputar a mora legislativa que obsta ao seu exercício, e dado ao Judiciário, ao deferir a injunção, somar, aos seus efeitos mandamentais típicos, o provimento necessário a acautelar o interessado contra a eventualidade de não se ultimar o processo legislativo, no prazo razoável que fixar, de modo a facultar-lhe, quanto possível, a satisfação provisória do seu direito.4. Premissas, de que resultam, na espécie, o deferimento do mandado de injunção para: a) declarar em mora o legislador com relação a ordem de legislar contida no art. 8., par.3., ADCT, comunicando-o ao Congresso Nacional e a Presidência da Republica; b) assinar o prazo de 45 dias, mais 15 dias para a sanção presidencial, a fim de que se ultime o processo legislativo da lei reclamada; c) se ultrapassado o prazo acima, sem que esteja promulgada a lei, reconhecer ao impetrante a faculdade de obter, contra a União, pela via processual adequada, sentença liquida de condenação a reparação constitucional devida, pelas perdas e danos que se arbitrem; d) declarar que, prolatada a condenação, a superveniência de lei não prejudicara a coisa julgada, que, entretanto, não impedira o impetrante de obter os benefícios da lei posterior, nos pontos em que lhe for mais favorável.(283 DF , Relator: SEPÚLVEDA PERTENCE, Data de Julgamento: 19/03/1991, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: DJ 14-11-1991 PP-16355 EMENT VOL-01642-01 PP-00001 RTJ VOL-00135-03 PP-00882)

Em um terceiro momento, evoluindo mais a interpretação

quanto ao writ, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento de Mandado de Injunção

que tratava do direito de greve dos servidores públicos, norma pendente de

regulamentação prevista no art. 40, §4º, CF, passou a aplicar a chamada teoria

concretista, a qual regulamenta a norma que deve ser aplicada ao caso até que o

legislador edite legislação específica.

35

Page 36: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

Citando Ana Carolina Ribeiro de Oliveira33, a nova visão da

Corte Suprema fica bem clara nas palavras do ministro Celso de Mello:

Não se pode tolerar sob pena de fraudar-se a vontade da Constituição, esse estado de continuada, inaceitável, irrazoável e abusiva inércia do Congresso Nacional, cuja omissão, além de lesiva ao direito dos servidores públicos civis – a quem vem se negando, arbitrariamente, o exercício do direito de greve, já assegurado pelo texto constitucional -, traduz um incompreensível sentimento de desapreço pela autoridade, pelo valor e pelo alto significado de que se reveste a Constituição da República.

Quanto ao alcance da decisão no Mandado de Injunção,

inicialmente a eficácia era considerada inter partes, contudo, inovando mais uma vez, a

Corte já proferiu decisão no sentido de conferir eficácia erga omnis ao Mandado de

Injunção, como bem salienta Gilmar Mendes34:

O que se evidencia é a possibilidade de as decisões no mandado de injunção surgirem efeitos não somente em razão do interesse jurídico de seus impetrantes, estendendo também seus efeitos normativos para os demais casos que guardem similitude. Assim, em regra, a decisão em mandado de injunção, ainda que dotada de caráter subjetivo, comporta uma dimensão objetiva, com eficácia erga omnis, que servem para tantos quantos forem os casos que demandem a concretização de uma omissão geral do Poder Público, seja em relação a uma determinada conduta, seja em relação a uma determinada lei.

Este último entendimento adotado pelo STF é o que mais dá

efetividade ao Mandado de Injunção ao proferir sentenças aditivas. Por esse mesmo

motivo a Corte foi criticada por alguns doutrinadores e estudiosos pelo seu suposto

ativismo judicial e interferência no poder legislativo. Assunto este que será tratado no

próximo tópico.

4.5 O MANDADO DE INJUNÇÃO E O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS

PODERES

33 OLIVEIRA, Ana Carolina Ribeiro de. Mandado de injunção à luz da separação dos poderes. Disponível em: <http://www.osconstitucionalistas.com.br/mandado-de-injuncao-a-luz-da-separacao-dos-poderes.> Acesso em 29 de jan. 201334 MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional – 5ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010, pág. 1394.

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Page 37: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

Com o Mandado de Injunção a Corte Suprema foi confrontada

com um instituto previsto na Constituição, porém sem legislação específica que o

regulamente. Por tratar-se de instrumento garantidor de direitos e liberdades

constitucionais previstos na própria carta magna, necessário se faz que seja o writ

eficazmente aplicado para gerar os efeitos a que propunha o constituinte quando o

elencou na Carta Magna.

Com a adoção da teoria concretista, o STF foi criticado por

intervir no poder legislativo e afrontar o princípio da separação dos poderes. Afirmação

esta que não prevalecer, pelo que vejamos os motivos.

A Constituição Federal prevê no art. 5º, XXXV, que "a lei não

excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito".

O Estado Juiz tem o dever de verificar se o direito existe,

determinar o sentido da norma jurídica aplicável e compatibilizá-la ao fato "sub judice".

O instituto não subverteu o princípio da separação dos poderes, ou determina uma

inversão ou invasão de tarefas do Legislativo ao Judiciário. O ordenamento

constitucional determinou esta competência ao Poder Judiciário. Face à disposição da

injunção, o juiz tem o dever, uma vez atendidos os dispositivos da impetração,

traduzidos em seus pressupostos, de conceder a ordem, sob pena de responsabilidade

funcional.35

A querela quanto a separação dos poderes é muito bem

abordada no voto do Ministro Eros Grau, proferido no Mandado de Injunção 786.36

Vejamos:

[...]14. Toda a exposição que segue neste apartado do meu voto é extraída de justificativa de autoria do Professor JOSÉ IGNÁCIO BOTELHO DE MESQUITA [...] “1. É princípio assente em nosso direito positivo que, não havendo norma legal ou sendo omissa a norma existente, cumprirá ao juiz decidir o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito (Lei de Introdução ao Cód. Civil, art. 4º; Cód. Proc. Civil, art. 126). Assim, o que pode tornar inviável o exercício de algum direito, liberdade ou prerrogativa constitucionalmente assegurados não será nunca a ‘falta

35 ARAGON, Célio da Silva. Mandado de injunção. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 43, 1 jul. 2000 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/125>. Acesso em: 5 fev. 201336 OLIVEIRA, Ana Carolina Ribeiro de. Mandado de injunção à luz da separação dos poderes. Disponível em: <http://www.osconstitucionalistas.com.br/mandado-de-injuncao-a-luz-da-separacao-dos-poderes.> Acesso em 29 de jan. 2013

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Page 38: o Controle de Constitucionalidade Das Omissões Legislativas No Ordenamento Jurídico Brasileiro

de norma regulamentadora’ mas, sim, a existência de alguma regra ou princípio que proíba ao juiz recorrer à analogia, aos costumes ou aos princípios de direito para suprir a falta de norma regulamentadora. Havendo tal proibição, configura-se a hipótese de impossibilidade jurídica do pedido, diante da qual o juiz é obrigado a extinguir o processo sem julgamento de mérito (Cód. Proc. Civil, art. 267, VI), o que tornará inviável o exercício do direito, liberdade ou prerrogativa assegurados pela Constituição. O caso, pois, em que cabe o mandado de injunção é exatamente o oposto daquele em que cabe o mandado de segurança. Vale dizer, é o caso em que o requerente não tem direito de pretender a tutela jurisdicional e em que requerido teria o direito líquido e certo de resistir a essa pretensão, se acaso fosse ela deduzida em Juízo. Esta constatação — prossegue BOTELHO DE MESQUITA — é de primordial importância para o conhecimento da natureza e dos fins do mandado de injunção. Dela deriva a determinação dos casos em que se pode admitir o mandado de injunção e também dos objetivos que, por meio dele, podem ser alcançados”. O mandado de injunção “destina-se, apenas, à remoção do obstáculo criado pela omissão do poder competente para a norma regulamentadora. A remoção desse obstáculo se realiza mediante a formação supletiva da norma regulamentadora   faltante. É este o resultado prático que se pode esperar do julgamento da mandado de injunção. A intervenção supletiva do Poder Judiciário deve subordinar-se, porém, ao princípio da independência e da harmonia entre os Poderes (CB, art. 2º). A autorização constitucional para a formação de normas supletivas não importa permissão ao Poder Judiciário para imiscuir-se indiscriminadamente no que é da competência dos demais Poderes. Trata-se apenas de dar remédio para omissão do poder competente. Para que tal omissão se configure, é preciso que norma regulamentadora não tenha sido elaborada e posta em vigor no prazo constitucional ou legalmente estabelecido, quando houver, ou na sua falta, no prazo que o tribunal competente entenda razoável [...] O que cabe ao órgão da jurisdição não é, pois constranger alguém a dar cumprimento ao preceito constitucional, mas, sim, suprir a falta de norma regulamentadora, criando, a partir daí, uma coação da mesma natureza daquela que estaria contida na norma regulamentadora [...]. Deverá ela regular apenas o caso concreto submetido ao tribunal, ou abranger a totalidade dos casos constituídos pelos mesmos elementos objetivos, embora entre sujeitos diferentes? Dentre essas alternativas, é de se optar pela última, posto que atividade normativa é dominada pelo princípio da isonomia, que exclui a possibilidade de se criarem tantas normas regulamentadoras diferentes quantos sejam os casos concretos submetidos ao mesmo preceito constitucional. Também aqui é preciso ter presente que não cumpre ao tribunal remover um obstáculo que só diga respeito ao caso concreto, mas a todos os casos constituídos pelos mesmos elementos objetivos“. [...] constitui dever-poder deste Tribunal a formação supletiva, no caso, da norma regulamentadora faltante. 18.   O argumento de que a Corte estaria então a legislar — o que se afiguraria inconcebível, por ferir a independência e harmonia entre os poderes [art. 2o da Constituição do Brasil] e a separação dos poderes [art. 60, § 4o, III] — é insubsistente. 19.   Pois é certo que este Tribunal exercerá, ao formular supletivamente a norma regulamentadora de que carece o artigo 40, § 4º, da Constituição, função normativa, porém não

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legislativa [...]. 25.  Afastado, contudo o critério tradicional de classificação das funções estatais, cumpre fixarmo-nos naquele outro, que conduz à seguinte enunciação: [I] função normativa – de produção das normas jurídicas [= textos normativos]; [II] função administrativa – de execução das normas jurídicas; [III] função jurisdicional – de aplicação das normas jurídicas.   26.  A função legislativa é maior e menor do que a função normativa. Maior porque abrange a produção de atos administrativos sob a forma de leis [lei apenas em sentido formal, lei que não é norma, entendidas essas como preceito primário que se integra no ordenamento jurídico inovando-o]; menor porque a função normativa abrange não apenas normas jurídicas contidas em lei, mas também nos regimentos editados pelo Poder Judiciário e nos regulamentos expedidos pelo Poder Executivo. 27.  Daí que a função normativa compreende a função legislativa [enquanto produção de textos normativos], a função regimental e a função regulamentar. 28.  Quanto à regimental, não é a única atribuída, como dever-poder, ao Poder Judiciário, visto incumbir-lhe também, e por imposição da Constituição, a de formular supletivamente, nas hipóteses de concessão do mandado de injunção, a norma regulamentadora reclamada. Aqui o Judiciário — na dicção de JOSÉ IGNÁCIO BOTELHO DE MESQUITA — remove o obstáculo criado pela omissão do poder competente para editar a norma regulamentadora faltante, essa remoção realizando-se mediante a sua formulação supletiva. 29.  De resto, é ainda certo que, no caso de concessão do mandado de injunção, o Poder Judiciário formula a própria norma aplicável ao caso, embora ela atue como novo texto normativo. 30 Apenas para explicitar, lembro que texto e norma não se identificam 3 . O que em verdade se interpreta são os textos normativos; da interpretação dos textos resultam as normas. A norma é a interpretação do texto normativo. A interpretação é atividade que se presta a transformar textos — disposições, preceitos, enunciados — em normas. 31.  O Poder Judiciário, no mandado de injunção, produz norma. Interpreta o direito, na sua totalidade, para produzir a norma de decisão aplicável à omissão. É inevitável, porém, no caso, seja essa norma tomada como texto normativo que se incorpora ao ordenamento jurídico, a ser interpretado/aplicado. Dá-se, aqui, algo semelhante ao que se há de passar com a súmula vinculante, que, editada, atuará como texto normativo a ser interpretado/aplicado. 32.  Ademais, não há que falar em agressão à “separação dos poderes”, mesmo porque é a Constituição que institui o mandado de injunção e não existe uma assim chamada “separação dos poderes” provinda do direito natural. Ela existe, na Constituição do Brasil, tal como nela definida. Nada mais. No Brasil vale, em matéria de independência e harmonia entre os poderes e de “separação dos poderes”, o que está escrito na Constituição, não esta ou aquela doutrina em geral mal digerida por quem não leu Montesquieu no original. 33.   De resto, o Judiciário está vinculado pelo dever-poder de, no mandado de injunção, formular supletivamente a norma regulamentadora faltante. Note-se bem que não se trata de simples poder, mas de dever-poder, idéia já formulada por JEAN DOMAT 4 no final do século XVII, após retomada por LEÓN DUGUIT 5 e, entre nós, por RUI BARBOSA 6 , mais recentemente por CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO 7 . 34.   A este Tribunal incumbirá — permito-me repetir — se concedida a injunção, remover o obstáculo decorrente da omissão,

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definindo a norma adequada à regulação do caso concreto, norma enunciada como texto normativo, logo sujeito a interpretação pelo seu aplicador. 35.   No caso, o impetrante solicita seja julgada procedente a ação e, declarada a omissão do Poder Legislativo, determinada a supressão da lacuna legislativa mediante a regulamentação do artigo 40, § 4º, da Constituição do Brasil, que dispõe a propósito da aposentadoria especial de servidores públicos. 36.   Esses parâmetros hão de ser definidos por esta Corte de modo abstrato e geral, para regular todos os casos análogos, visto que norma jurídica é o preceito, abstrato, genérico e inovador — tendente a regular o comportamento social de sujeitos associados — que se integra no ordenamento jurídico 8 e não se dá norma para um só. 37. No mandado de injunção o Poder Judiciário não define norma de decisão, mas enuncia a norma regulamentadora que faltava para, no caso, tornar viável o exercício do direito da impetrante, servidora pública, à aposentadoria especial. [...] Julgo parcialmente procedente o pedido deste mandado de injunção, para, reconhecendo a falta de norma regulamentadora do direito à aposentadoria especial dos servidores públicos, remover o obstáculo criado por essa omissão e, supletivamente, tornar viável o exercício, pelo impetrante, do direito consagrado no artigo 40, § 4º, da Constituição do Brasil, nos termos do artigo 57 da Lei n. 8.213/91.  – Grifo nosso.

Da interpretação do voto acima mencionado, pode-se extrair

que a Suprema Corte optou por conferir legitimidade ao Mandado de Injunção com base

na própria Constituição, pois é esta que lhe dá poderes para julgamento do writ. Não há,

portanto, de se falar em agressão ao princípio de separação dos poderes.

É sabido que o princípio da separação dos poderes não é

absoluto, sendo norteado pelo sistema de freios e contrapesos, no qual um poder exerce

uma função que tipicamente seria de outro poder. Esse sistema vem para equacionar as

atribuições entre os poderes e permitir um melhor funcionamento do aparato estatal. Ao

atribuir efetividade ao Mandado de Injunção o STF não está fazendo nada mais do que a

própria Carta Magna lhe ordena e lhe confere poderes para tal em caso de inércia do

poder legislativo ao editar a norma pendente de regulamentação.

5 CONCLUSÃO

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A chamada Constituição Cidadã, promulgada em 1988, trouxe

uma preocupação do constituinte para que os direitos e garantias contidas na carta

magna fossem efetivamente passíveis de aplicabilidade à sociedade brasileira.

Para evitar que as normas e princípios elencados no texto

constitucional realmente fossem passíveis de ter efetividade diante da omissão dos

legisladores em tratar da edição de normas relevantes para a concretização da

constituição, foram previstos dois instrumentos para reclamar a edição da norma

faltante: a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão e o Mandado de Injunção.

No que tange a Ação Direta de Inconstitucionalidade por

Omissão, trata-se de controle concentrado e abstrato de constitucionalidade efetuado

pelo Supremo Tribunal Federal. Nesse caso não é necessário que a falta da norma esteja

inviabilizando o exercício de um direito em um caso concreto, mas a simples e pura

falta da norma prevista na constituição já pode deflagrar o controle de

constitucionalidade. Assim sendo, versa o instituto da defesa da própria Constituição.

Questões relevantes surgiram no julgamento das primeiras

Ações Diretas de Inconstitucionalidade por Omissão, o que levou o Supremo Tribunal

Federal a interpretar o instituto de formas diversas por algumas vezes até chegar ao

posicionamento atual.

Em regra, quando do julgamento da ADO, o Supremo Tribunal

Federal dá ciência ao poder legislativo da falta de norma para que este inicie o processo

legislativo. Contudo não há possibilidade de obrigar o legislativo a editar a norma,

principalmente em virtude do princípio basilar da separação dos poderes.

Entretanto, reconhecida a mora legislativa, se o Congresso

Nacional não tomar as providências necessárias para a edição da norma faltante, se

torna possível que o prejudicado requeira indenização por eventual prejuízo que sofra

em decorrência da referida omissão.

O segundo método de controle das omissões legislativas, desta

vez em sede de controle difuso de constitucionalidade, é o Mandado de Injunção, o qual

pode ser impetrado por qualquer pessoa que tenha direito ou liberdade constitucional,

prerrogativa quanto à nacionalidade, soberania e cidadania, obstaculizado pela falta de

norma regulamentadora.

De início o Supremo Tribunal Federal adotou uma postura

conservadora nos julgamentos dos Mandados de Injunção cuja competência era daquela

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corte, apenas dando ciência ao legislador para regulamentar a norma faltante, fato que

levou o instituto a ser desacreditado e ocasionou diversas críticas ao excelso Tribunal.

Mais tarde, revendo seu posicionamento para um entendimento

intermediário, o Supremo Tribunal Federal passou a fixar prazo ao congresso nacional

para a edição da norma faltante, salientando que o impetrante poderia reclamar na

justiça eventuais perdas e danos se não estabelecida a regulamentação.

Continuando na evolução da jurisprudência, a Corte Suprema,

finalmente entendeu ser competente para produzir uma sentença com efeitos aditivos,

suplementando a norma faltante por inércia do legislativo e modulando os efeitos da

decisão para todos os casos da mesma natureza, como no célebre exemplo do

julgamento dos Mandados de Injunção que tratavam da greve dos servidores públicos.

Com o atual entendimento a Corte consolidou a chamada

corrente concretista, que também foi criticada, especialmente porque alguns

doutrinadores acreditam que se trata de uma espécie de ativismo judicial do Tribunal

Supremo, o que poderia afrontar o princípio da separação dos poderes.

Contudo essa afirmação pode ser rebatida com fundamento no

poder que a própria Constituição confere ao Supremo Tribunal Federal de processar e

julgar o Mandado de Injunção no caso da falta de norma regulamentadora, nos moldes

do art. 5º, LXXI.

Além disso, outro princípio pode ser invocado, qual seja o da

inafastabilidade do poder judiciário, que deve apreciar toda lesão e ameaça a direito.

Desta feita, obedecidos os pressupostos do texto constitucional, estando o legislador em

falta para com a regulamentação de norma que trate de direitos e liberdades

constitucionais específicos, deve a Corte Suprema se manifestar, concretizando a

vontade moldada pelo poder constituinte originário ao elencar o Mandado de Injunção

como garantidor de direitos constitucionais.

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