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  • Educao (Porto Alegre, impresso), v. 36, n. 3, p. 352-362, set./dez. 2013

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    Prticas de alfabetizao com o mtodo Yo, s puedo em assentamento do MST

    Literacy practices using the Yes, I can method in an settlement of the Landless Movement

    Maria do Socorro alencar nuneS Macedo* ageu Mazilho Filho**

    RESUMO Este texto visa apresentar uma anlise acerca do uso do mtodo Yo, s puedo de alfabetizao num assentamento do MST. Os dados so analisados com base nos novos estudos sobre letramento que vm contribuir para uma ressignificao do conceito de alfabetizao. A metodologia de natureza etnogrfica, inspirada nos novos estudos sobre letramento. Ao tratarmos do Sim, eu posso, com foco na atuao do monitor da turma, conclumos que a sua mediao aponta uma prtica de alfabetizao a partir do que os novos estudos sobre letramento indicam sobre a escrita. Letramento como prtica social, apesar de no contemplado no material do Sim Eu Posso, pde concretizar-se no fato de os alunos perceberem a escrita como objeto social e cultural.Palavras-chave MST. Alfabetizao. Mtodo Sim eu posso. Letramento. Etnografia.

    ABSTRACT This paper aims to provide an analysis about the use of the Cuban literacy method Yes, I can, in a settlement of the Brazilian Landlees Movement. The data are analyzed based on the new literacy studies that have been contributing to a redefinition of the concept of literacy. The ethnographic methodology is inspired by the new literacy studies (NLS). In addressing the Yes I can, focusing on the role of teacher, we conclude that his mediation evidences a literacy practice based on NLS. Literacy as social practice, although not covered in the Yes I can method, could be realized in the fact that thought the teacher`s mediation, the students perceived writing as a social and cultural subject.Keywords Landless Movement. Literacy. Ethnography. Yes, I can method.

    ** Doutora em Educao pela Universidade Federal de Minas Gerais (Belo Horizonte, MG, Brasil) e Professora na Universidade Federal de So Joo del-Rei (So Joo del-Rei, MG, Brasil). E-mail: .

    ** Mestre em Educao pela Universidade Federal de So Joo del-Rei (So Joo del-Rei, MG, Brasil) e Professor na rede pblica de ensino da Prefeitura Municipal de So Joo del-Rei (So Joo del-Rei, MG, Brasil). E-mail: .

    Introduo

    Este texto tem por objetivo apresentar uma anlise acerca do uso do mtodo cubano Sim, eu posso (Yo, s puedo) de alfabetizao de jovens e adultos, em um assentamento do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). Algumas perguntas instigaram-nos durante a pesquisa: Como o MST apropriou-se desta proposta cubana? Como o mtodo foi utilizado numa determinada turma de alfabetizao de adultos? Qual a concepo de alfabetizao subjacente ao mtodo?

    Os dados desta pesquisa sero analisados com base nos referenciais dos novos estudos sobre letramento que vm contribuir para uma ressignificao do conceito de alfabetizao. De acordo com Brian Street, principal

    expoente da perspectiva aqui adotada, letramento o que fazemos com a leitura e a escrita, ou seja, so as prticas sociais de uso da escrita em contextos especficos, com objetivos especficos (STREET, 1984).

    O que o letramento depende essencialmente de como a leitura e a escrita so concebidas e praticadas em determinado contexto social; letramento um conjunto de prticas de leitura e escrita que resultam de uma concepo de que, como, quando e por que ler e escrever (SOARES, 1998). Sendo assim, a alfabetizao no pode se restringir ao domnio da tcnica da escrita, de um cdigo supostamente neutro e universal, que independe dos contextos socioculturais de uso. Soares (1998) defende que a alfabetizao deve ocorrer na perspectiva do letramento na medida em que so dimenses

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    interdependentes e indissociveis, prticas sociais de uso da escrita marcadas ideologicamente. O pressuposto o de que qualquer prtica de letramento e de alfabetizao ocorre mediada por relaes de poder.

    Aliado a essa perspectiva, apontamos um dilogo com as reflexes de Bakhtin acerca da linguagem. Para ele, a palavra o fenmeno ideolgico por excelncia (BAKHTIN, 1995, p. 36). Nesse sentido, as prticas de alfabetizao no so o resultado de um processo individual restrito esfera psquica. Pelo contrrio, quando o sujeito se apropria dos signos exteriores todo signo social por natureza, tanto o exterior quanto o interior (BAKHTIN, 1995, p. 58) , as letras, por exemplo, na formao de palavras, demonstra que assimilou os signos ideolgicos sociais, j que inscreve o pensamento de maneira objetiva no sistema do conhecimento, sendo que o prprio pensamento desde a origem, pertence ao sistema ideolgico e subordinado s suas leis (BAKHTIN, 1995, p. 59).

    MetodologIa

    A perspectiva metodolgica adotada de natureza etnogrfica, inspirada nos novos estudos sobre letramento (HEATH; STREET, 2008) e visou compreender as relaes global-local, numa perspectiva holstica via imerso no campo, em dilogo com as teorias que subsidiam o estudo.

    A etnografia na educao, conforme apontam Green e colaboradores (2005) apresenta uma lgica de investigao que, alm das caractersticas acima, tambm inclui a triangulao de dados, mtodos e teoria, a busca de compreenso do ponto de vista dos sujeitos informantes (perspectiva mica) e o uso de diferentes tcnicas de coleta de dados.

    Entendemos que qualquer objeto, fato ou fenmeno que o homem possa perceber ou criar faz parte de um todo. Em toda situao, defrontamo-nos com proble- mas interligados, da a necessidade de uma viso de conjunto, que sempre provisria e nunca pode pretender esgotar a realidade a que se refere na busca de resolues de tais problemas. Neste sentido, temos conscincia de que

    a realidade sempre mais rica do que o conhecimento que a gente tem dela. H sempre algo que escapa s nossas snteses; isso, porm, no nos dispensa do esforo de elaborar snteses, se quisermos entender melhor a nossa realidade. A sntese a viso de conjunto que permite ao homem descobrir a estrutura significativa da realidade com que se defronta, numa situao dada. E essa estrutura significativa que a viso de conjunto proporciona que chamada de totalidade (KONDER, 1985, p. 36-37).

    A escolha do local a ser estudado deveu-se a uma srie de dilogos com o MST. A princpio, a expectativa era de realizar a pesquisa de campo na Regio Sul do Brasil, pelas informaes que foram rastreadas sobre a aplicao do mtodo. Contudo, iniciadas as negociaes, condicionou-se a escolha do local ao melhor aproveitamento do tempo destinado pesquisa de campo, ficando, dessa forma, definida a regio onde estava prevista a prxima implantao do Sim, eu posso, no caso, o Estado do Cear.

    Dedicamos um perodo de cerca de cinco meses de total insero na vida da comunidade, uma vez que um dos pesquisadores morou no assentamento durante todo esse perodo. Desde o incio, foi feito uso de ferramentas como observaes, anotaes e descries densas em cadernos de campo, entrevistas, fotografias e filmagens com recurso de cmera digital, longas conversas e inquiries com os informantes locais.

    Foram realizadas, ainda, a fim de compor nosso banco de dados, a coleta de exemplares dos materiais didticos fornecidos pelo Sim, eu posso cartilhas, manuais, e conjunto de vdeos, fotocpia do material escrito produzido pelos educandos (cadernos e folhas de exerccios, e carta de avaliao final) , alm de entrevistas com o monitor, com os cinco educandos que participaram efetivamente do curso, com um produtor local de cultura escrita (um assentado autor de literatura de cordel), com uma secretria de educao do MST cearense, com um dos metodlogos cubanos que prestaram assessoria ao MST-CE prefeitura de Fortaleza, e, finalmente, uma entrevista com a prpria autora do mtodo Sim, eu posso, a professora Leonela Daz. Contudo, devido limitao de espao neste texto, focaremos os dados de entrevistas e as observaes de prticas no assentamento que indicam as formas de apropriao do mtodo pelo MST e, mais especificamente, pelo monitor da turma de alfabetizao.

    o Mtodo SIM, eu poSSo e a Sua concepo de alfabetIzao

    O mtodo de alfabetizao Yo, s puedo (Sim, eu posso) foi construdo por Leonela Relyz Diaz, pedagoga que atuou como alfabetizadora durante a revoluo cubana. Tal mtodo foi pensado originalmente para o contexto venezuelano (a partir de uma experincia no Haiti de alfabetizao via rdio), sob encomenda do governo Hugo Chaves e aplicado largamente naquele pas no ano de 2003. O Brasil foi o primeiro pas em que esse mtodo foi adaptado para outro idioma. O mtodo Sim, eu posso um dos mais propalados da atualidade por ter apresentado resultados positivos em mais de 15 pases, de acordo com parmetros da Unesco, que o premiou com

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    o Prmio Alfabetizao 2006 Rey Sejong. A Venezuela foi declarada territrio livre do analfabetismo, tendo-se atribudo esse resultado ao uso do referido mtodo.

    Consideramos que o protocolo internacional de cooperao com Cuba, realizado pelo Governo Federal, em 2005, pode ter sido um fator que contribuiu para a busca pelo MST da utilizao do Sim, eu posso. Foram, desde ento, instaladas experincias-piloto em assentamentos e acampamentos no Paran, Piau, Maranho, Cear, entre outros Estados, tendo sido o prprio MST o responsvel pela adaptao do mtodo para o contexto brasileiro. Segundo a autora do mtodo, um estudo psicossocial das caractersticas dos contextos realizado, para que o processo esteja de acordo com os contextos histricos, locais. No se faz a traduo friamente do Yo, s puedo de um pas a outro.

    Os vdeos que esto sendo usados no Brasil foram gravados em Cuba por brasileiros l residentes ou artistas brasileiros que quiseram colaborar, como o ator Chico Diaz, que o principal apresentador. O cenrio uma sala de aula onde os atores-alunos fazem perguntas estimulantes atriz-professora. O mtodo composto por um kit de DVDs e uma cartilha, em que 65 aulas de alfabetizao so propostas para um perodo de trs meses, mediadas por um monitor. Aps essas aulas, no caso brasileiro, o trabalho educativo deve seguir com base nos Crculos de Cultura, propostos por Paulo Freire. Mais especificamente, o mtodo organiza-se em torno da relao entre nmeros e letras, em que para cada letra h um nmero correspondente. Segundo Diaz, optou-se por atribuir os nmeros de 1 a 5 s vogais em ordem alfabtica; s consoantes se associou uma numerao a partir do 6, de acordo com a frequncia em que cada letra aparecia no vocabulrio.

    O mtodo Sim, eu posso parte do pressuposto de que os adultos, pela sua histria de vida e experincia acumulada, aprenderiam com mais facilidade e rapidez que as crianas em fase pr-escolar, e busca homogeneizar a prtica didtica para garantir a alfabetizao em cerca de trs meses, com a intensiva utilizao da tecnologia de vdeo TV & DVD.

    Perguntamos a Leonela sobre a sua concepo de alfabetizao com o objetivo de estabelecer relaes com o mtodo Yo, s puedo. Para ela, a alfabetizao

    tem causas multifatoriais, polticas, econmicas, so- ciais, geogrficas, histricas, culturais, religiosas, etc. E um fenmeno to complexo no pode ser tratado facilmente, tem que haver uma unidade de vontades, polticas, econmicas e sociais. [...] Para os analfabetos, a alfabetizao no tem credibilidade. No tem tambm perspectivas. Aprende-se a ler e escrever, tudo, e no muda nada depois, na vida (Entrevista concedida a Mazilo-Filho e Macedo, Havana, janeiro de 2011).

    A fala da autora destaca o contexto mais amplo no qual a alfabetizao dever ocorrer, que implica numa poltica de Estado que atente para as questes sociais e econmicas sem as quais a alfabetizao no teria o menor significado para os sujeitos. Ou seja, a mudana no poderia ocorrer apenas no mbito do ensino da leitura e da escrita, mas fundamentalmente deveria vir acompanhada de mudanas sociais mais amplas.

    A autora do mtodo reconhece que, mesmo cursan- do-se o programa por trs meses, por desuso, o aprendiz volta condio de analfabeto.

    Estamos conscientes que o Sim, eu posso pro- porciona os cdigos lingusticos necessrios para aprender a ler e escrever. Em nenhum momento, pensamos que o programa para fazer um exame de ingresso em uma universidade. para dar os primeiros passos, para enlaar uma letra com outras e formar palavras, para unir palavras e formar ideias, como o jardim de infncia, o pr-escolar, onde se desenvolvem habilidades, destrezas, hbitos e conhecimentos que permitem a comear e seguir (professora Leonela Diaz, entrevista concedida a Mazilo-Filho e Macedo, Havana, janeiro de 2011).

    A fala da autora revela que no se pode atribuir nica e exclusivamente ao mtodo a responsabilidade pela alfabetizao, visto que ele teria apenas a funo de propiciar os cdigos lingusticos necessrios ao aprendizado bsico da lngua escrita. Por outro lado, mesmo reconhecendo que a alfabetizao um fenmeno de causas mltiplas que tem implicaes polticas, econmicas, sociais, geogrficas, culturais, Leonela destaca no mtodo apenas o trabalho com o cdigo escrito, desvinculando-o dos usos e funes sociais que a escrita tem nos diferentes contextos. Ao analisar o papel do monitor da turma de alfabetizao, vimos que, embora o mtodo seja restrito ao ensino do cdigo da escrita, a sua mediao amplia a formao dos alunos no sentido de que em muitas das aulas foram observadas estratgias de contextualizao da alfabetizao relacionando-a a fatores sociais e culturais mais amplos.

    A viso de alfabetizao como um processo restrito ao domnio dos cdigos da escrita a que vem susten- tando as polticas de alfabetizao em larga escala no apenas no Brasil, mas no mundo. esta concepo, questionada pelos novos estudos sobre letramento, que est presente nos projetos de alfabetizao da Unesco, bem como no programa de alfabetizao do MST. Frequentemente associada ideia de progresso, a alfabetizao considerada fator determinante na classificao dos nveis de desenvolvimento econmico e social dos pases, como destacam Ribeiro, Vvio e Moura (2002, p. 50):

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    [...] desde que a Revoluo Industrial fez do urbano o modo de vida dominante, disseminando pelo globo o ideal da escolarizao elementar das massas, taxas de analfabetismo so tomadas como indicadores importantes da condio de desenvolvimento socioeconmico das naes. Organismos internacionais tomam esses ndices como referncia para comparar o desempenho de pases com distintas tradies culturais, estabelecendo, com base nele, metas para a promoo do desenvolvimento e a cooperao entre naes.

    A fala abaixo do lder do MST ao tratar do mtodo e de sua aplicao evidencia a mesma perspectiva apontada acima. O lder avalia positivamente o sucesso do mtodo, a sua eficincia na alfabetizao de mais de 2.400 sujeitos, embora no explicite e no haja documentos pblicos do MST que indiquem como a avaliao da eficcia do mtodo realizada. Embutida nesta viso est a crena de que a soluo para o analfabetismo do pas passaria pela escolha do mtodo mais apropriado, aquele que garantiria uma maior eficincia no ensino e na aprendizagem dos cdigos da escrita:

    [...] ns fizemos ao longo desse ano um teste, em todos os Estados. Acho que ns alfabetizamos umas 2.400 pessoas com o mtodo [at junho de 2007]. Agora que ns temos certeza da eficincia, estamos brigando pelas parcerias com o MEC e alguns governos estaduais (STEDILE, 2007).

    apreSentao do Mtodo naS reunIeS entre MetodlogoS

    cubanoS, MSt e repreSentanteS da prefeItura de fortaleza

    Dos dias 8 a 11 de maio de 2010, houve a apresentao, pelos assessores cubanos, do mtodo Sim, eu posso para o pessoal do MST e para a equipe da prefeitura (que trabalhava no projeto Fortaleza Alfabetizada). A apresentao teve incio com o filme Vida Maria,1 uma animao que mostra o resumo da vida de muitas Marias do Brasil, que teriam deixado de se alfabetizar para trabalhar pela casa e pelos filhos, enfatizando que a mesma histria de vida se repete com suas filhas. Em seguida, abre-se espao para comentrios. Erivando, representante do MST, aponta a necessidade de se desfazer os mitos de que o analfabeto no consegue mais aprender, questionar a naturalizao da evaso na EJA (Educao de Jovens e Adultos). Apresenta uma viso de que a maioria dos analfabetos constituda por mulheres (dados do Programa Bolsa Famlia) e diz que as pessoas no so analfabetas, mas sim analfabetizadas.

    Aps a discusso do curta-metragem de animao, inicia-se a apresentao em PowerPoint sobre o Sim,

    eu posso. A tela inicial traz uma bandeira cubana tremulando, onde est escrito logo abaixo: Programa de Alfabetizao Sim, eu posso. Um dos metodlogos cubanos, refletindo sobre o filme, reafirma os objetivos do mtodo: diminuir o nmero de Marias.

    [...] no vamos acabar, mas diminuir o ndice de analfabetismo no pas. Sim, eu posso: a palavra de ordem; sim, possvel aprender a ler e escrever, a maior alegria que o professor pode ter. um orgulho dizer eu ajudei na formao dele.

    Destacam-se os 26 pases onde o mtodo aplicado, entre eles o Haiti e a China, abrangendo nove dialetos e idiomas (espanhol, francs, portugus, chins...). Fala-se da viabilidade de uso do mtodo a distncia (via rdio, no Haiti) e presencial (sala de aula). O assessor complementa: [...] na aula de vdeo, no s se instrui, mas se educa. Alm das letras e nmeros, deve-se prepar-los para a vida.

    So apresentados dados sobre o analfabetismo no mundo: de 854 a 880 milhes; Amrica: 42; frica: 179 (54%), sendo a maioria composta por mulheres (64% mulheres e 36% homens). H estimativas de 1.000.000.000 de analfabetos funcionais. Para o metodlogo o analfabetismo limita o desenvolvimento do ser humano, o que refora a viso do analfabeto como um sujeito inferior, menos desenvolvido, viso esta bastante questionada pelos novos estudos sobre letramento. Quanto aos monitores (alfabetizadores), estes no precisariam ser profissionais da educao, mas deveriam ter algum nvel de escolaridade (preferencialmente o Ensino Mdio). A adoo do ttulo Sim, eu posso explicada pelo fato de tal denominao supostamente elevar a autoestima do educando todos conseguem o que quiserem, atribuindo ao sujeito a responsabilidade pelo seu processo de alfabetizao.

    A importncia da estimulao constante dos educandos pelo monitor alfabetizador muito destacada e justificar-se-ia como uma estratgia para reduzir a evaso: as velocidades de cada aluno variam, porm nunca se deve apontar isso; deve-se incentivar sempre, deve haver sempre respeito e amor pelo educando e, com isso, conseguir diminuir o ndice de evaso.

    A caracterizao do mtodo Sim, eu posso feita pelos assessores cubanos, apresentando-o como um mtodo para ensinar a ler e escrever, mtodo global-composto composto por mtodos analticos e sintticos e de alcance universal. A vinculao dos nmeros com letras se d apenas no incio; medida que o educando vai formando frases, deixa de necessariamente associar os nmeros com as vogais e letras. de destacar que em cada aula so apresentados assuntos relacionados vida, viso de mundo. Como exemplo, n a primeira aula sobre

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    vogais, trabalha-se a frase uma casa latino-americana. Nesta aula, segundo os assessores, deve-se trabalhar histria, geografia, qumica, cultura, lngua, etc., da a importncia de que as aulas sejam vistas previamente pelos monitores, para que possam prepar-las.

    Com a abertura para o debate do que fora apresentado at ento, uma professora da prefeitura observou que o vdeo no deve ser a nica fonte, mas que o monitor muito importante e, mesmo no tendo formao, deve ser orientado, pois, segundo ela, a aula tem muito contedo que nem todo monitor tem. Outra professora lembra a incluso das letras k, w e y, no portugus, pela nova reforma ortogrfica. O metodlogo cubano minimiza o problema ao afirmar que h um nmero reduzido de palavras com essas letras; contudo, outra professora lembra que grande parte dos filhos dos alunos tem nomes estrangeiros e tm essas letras.

    A apresentao segue com a explicao de que cada aula possui trs momentos: introduo (cerca de 5 min), onde h a retomada do contedo anterior e se introduz o tema de estudo do dia; aprendizagem da leitura e da escrita videoaula (30 min); e consolidao realizao dos exerccios (10 min, totalizando 45 min). importante salientar que os assessores cubanos sugerem que a videoaula seja toda exibida, sem pausa, antes da consolidao. No entanto, o que se vem praticando no MST a exibio do vdeo e a imediata pausa deste, assim que aparecem exerccios propostos, retomando-se a exibio do filme somente quando os educandos tiverem concludo tais exerccios, o que faz a exibio do vdeo de cerca de 30 min se prolongue por cerca de 2 horas.

    As etapas do processo geral, composto por 65 aulas, so divididas em trs: treinamento, em que so realizados exerccios psicomotores e familiarizao com o material didtico, como segurar o lpis, etc.; a segunda etapa a do ensino da leitura e da escrita, focado no cdigo escrito; a terceira inicia-se a partir da 46 aula, com a introduo s operaes fundamentais da matemtica; a ltima etapa a da consolidao das letras, redao de pargrafos e a avaliao final, realizada a partir da escrita de uma carta na ltima pgina da cartilha. Observa-se aqui uma viso de aprendizagem linear na qual parte-se de unidades menores, as letras, para se chegar a unidades mais amplas, como o pargrafo e a carta. A lgica presente no mtodo em questo semelhante dos tradicionais mtodos de alfabetizao para crianas, questionados nesses ltimos 30 anos pelas pesquisas no campo da alfabetizao (FERREIRO; TEBEROSKY, 1991; FRADE, 2003; SOARES, 2008).

    Segue a exibio da aula 62, que trata da escrita da carta, em que a professora escreve com letra cursiva e no de frma. Segundo a assessora cubana, a letra cursiva no ser introduzida no incio das aulas, mas ao longo delas e

    com a leitura de frases e redaes mais longas e trabalho com pontuao.

    Passa-se ao estudo da cartilha, que no oferece espao suficiente para a elaborao e registro de todos os exerccios previstos, necessitando-se de um caderno. Um assessor alerta para o cuidado com os educandos que tm problemas de viso, que devem ser postos mais prximos do televisor (de 29 polegadas). Em caso de o educando no conseguir fazer a carta final, pode-se considerar a avaliao contnua. Mas se mesmo assim no for alfabetizado, o monitor pode lhe dar reforo ou recuperao. E, se no houver sucesso, no h aprovao. A frequncia de 75% no ensino regular. Os exerccios que aparecem na cartilha servem para avaliar o desenvolvimento do aluno em relao aquisio do sistema de escrita, porm, no aconselhvel que o educando perceba que est sendo avaliado por meio desses exerccios. S o monitor observa tal desenvolvimento, considerando-se tambm as tarefas de casa ( visto como positivo que haja a realizao de exerccios em casa), a participao dos educandos nas aulas, entre outros fatores. A indicao da aprendizagem dos educandos deve ser registrada simplesmente como avana (a), ou no avana (na).

    Sobre a organizao do trabalho do coordenador e do alfabetizador, cada um dos 21 coordenadores ir trabalhar com 15 alfabetizadores. Os dados devem ser levados do monitor ao coordenador, a cada 15 dias (duas semanas).

    Pelo exposto neste tpico, podemos levantar alguns pontos que indicam a forma como os assessores cubanos e o MST pensam a funo do mtodo no processo de alfabetizao. Observamos que o analfabetismo cercado de preconceito e reproduz exatamente o que circula no nvel de senso comum na sociedade. Nas palavras do metodlogo, o analfabetismo limita o desenvolvimento do ser humano. Implcita nesta fala est a viso de que os sujeitos que dominam a escrita so mais desenvolvidos e a funo social da alfabetizao fazer com que os analfabetos tenham tambm a oportunidade de se tornaram sujeitos desenvolvidos. Galvo e Di Pierro (2007) apontam que incomum que pessoas analfabetas abordem a questo como problema coletivo ou expressem conscincia da violao de seus direitos educativos. O analfabetismo no percebido como expresso de processos de excluso social ou como violao de direitos coletivos, e sim como uma experincia individual de desvio ou fracasso, que provoca repetidas situaes de discriminao e humilhao, vividas com grande sofrimento e, por vezes, acompanhadas por sentimentos de culpa e vergonha.

    Alm disso, importante notar que a apresentao do mtodo pelos assessores, endossada pelo MST e equipe da Secretaria Municipal de Educao, traz o foco central no aluno, no trabalho com a sua autoestima, partindo

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    do pressuposto de que o sujeito analfabeto tem baixa autoestima e que o trabalho com esse aspecto decisivo para o sucesso do processo de alfabetizao, desde que se demonstre amor e respeito ao ritmo de cada um. Esse trabalho teria como base o incentivo do mesmo participao nas aulas, a partir de frases de efeito que indicam que todos conseguem o que quiserem.

    A crena a de que o mtodo, na forma como est estruturado, garantir a alfabetizao num tempo exguo de trs meses. Mas o mais importante a se destacar aqui a crena de que se o educando atingir o nvel mais elevado indicado pelo mtodo, que a escrita da carta, este poder ser considerado alfabetizado. Ignora-se a complexidade da escrita, os seus usos e funes sociais, desconsiderando-se que a carta um texto de funo social clara, utilizada com objetivos especficos de se manter comunicao com algum distante. Ignora-se tambm o fato de que existem diferentes tipos de cartas em uso na sociedade, desde as cartas pessoais at as cartas comerciais e oficiais. Os estudos sobre letramento (STREET, 1984; 1995; 2003; KLEIMAN, 1995; SOARES, 1998; HEATH, 1983; MACEDO, 2005;) contribuem para que, ao contrrio do que se observa no mtodo Sim, eu posso, possamos pensar a escrita na perspectiva da prtica social e definitivamente desconstruir a viso desta como objeto neutro, como uma tcnica universal que, uma vez dominada, poderia ser utilizada para atender a todas as demandas de escrita que a sociedade nos exige.

    o prIMeIro dIa de aula no aSSentaMento na VIla luIz gonzaga: IndIcaeS daS condIeS objetIVaS

    para o trabalho coM a alfabetIzao

    As aulas com o mtodo Sim, eu posso tiveram incio por volta das 19 h 30 min., do dia 11 de janeiro de 2010. O espao utilizado pela turma uma sala da casa de um dos educandos, espao utilizado pela famlia como sala de estar onde, cotidianamente, so assistidos os programas de televiso preferidos pela famlia, iluminado por uma lmpada incandescente. O espao provido de poucas cadeiras. Os educandos, por morarem na mesma rua, levam cadeiras de casa para a aula. No h mesa alm da que suporta os aparelhos de televiso e DVD, que pertencem Secretaria de Educao (SEDUC) do Estado do Cear, que tambm forneceu o material didtico impresso, idealizado pelo MST em parceria com o Instituto Pedaggico Latinoamericano y Caribeo (IPLAC) de Cuba.

    O monitor-alfabetizador responsvel pela turma Nelson, um jovem de 21 anos, morador da prpria comunidade e filho de pais assentados (que tambm so educandos nessa turma). Nlson possui o Ensino Mdio

    completo, passou por curso de formao para o Sim, eu posso (oferecido pelo MST) e foi responsvel por uma turma de alfabetizao, no ano de 2007. Os educandos2 com efetiva frequncia eram cinco: Antnio, Geraldina, Jos (Adacir), Francisca (Chagas) e Ernesto (o dono da casa onde ocorriam as aulas).

    A primeira aula inicia-se com o monitor justificando a criao e a origem do mtodo de alfabetizao a ser aplicado, enfatizando os resultados supostamente alcanados em outras turmas de alfabetizao de adultos num perodo de apenas trs meses. Esta estratgia visa motivar os alunos a participarem do programa:

    Essas pessoas idosas, que no sabiam ler, que nasceu na roa, foi criado na roa, trabalhando mesmo, pra poder ajudar, certo, l em Cuba foi criado esse mtodo, via televiso, j h algum tempo, no sei quando, ao certo, mas, em trs meses, todas as pessoas que passaram por essas aulas souberam escrever todas as letras, souberam escrever cartas para os filhos, pra uma pessoa que estava distante, para um pai, para uma me, [...] quem no sabia escrever o nome, aprendeu! Trs meses! Rapidamente! [...] A, depois desses trs meses, o certo, Deus queira, que vocs estejam escrevendo cartas para qualquer pessoa, quem vocs quiserem, pai, me, filho, qualquer pessoa que vocs quiserem escrever uma carta, alguma coisa, vocs podem.

    No trecho acima, evidente a tentativa de motivar os alunos com base na nfase no curto espao de tempo previsto para que todos saiam do programa alfabetizados. A expectativa que todos possam aprender a escrever as letras do alfabeto, o nome prprio e uma carta, no muito diferente da expectativa apontada por outros programas de alfabetizao de adultos como, por exemplo, o Brasil Alfabetizado, Programa Nacional de Alfabetizao do Governo Federal. Com isso, evidencia-se a concepo restrita de alfabetizao presente nos materiais que compem o mtodo, nas falas dos assessores cubanos e de lderes do MST, j tratadas neste texto.

    Nlson estabelece uma relao direta entre o mtodo e o perfil dos alunos, deixando claro que fora criado para atender a gente que nasceu e se criou, e nunca viram nem um lpis, os pais no tiveram oportunidade, no deram oportunidade a ele de estudar. Continua a criar estratgias de motivao dos alunos, infor- mando-os que A, depois, algumas pessoas foram pra escola, comearam a estudar mesmo, normalmente, da 1 srie a 8 srie, Ensino Mdio, tem at gente que estudou at faculdade. Destaca, portanto, a possi- bilidade de continuidade dos estudos, aps a alfabeti- zao.

    Reconhecendo a limitao das aulas mediadas pelo vdeo, o monitor informa:

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    E, depois desses trs meses aqui, vou passar a aula mesmo, na mo [escrevendo no ar, como se fosse lousa], porque, as aulas aqui [olhando para a TV] so muito limitadas, so muito presenciais3 [...] Ento, gente, o seguinte: era bom vocs no perderem nem um dia, porque essas aulas so televisuais, no podem ser voltadas, a no ser que seja em suas casas, por exemplo, voc chega e diz: eu faltei, d pra poder passar a aula de ontem? L em casa, tem uma hora vaga?; se tiver DVD, eu passo, tranquilo, tem problema no!

    A questo da necessidade de frequncia diria s aulas causa discusso entre os alunos, que explicitam suas dificuldades diante das outras tarefas que j assumiram na comunidade, como no caso do sr. Itamar, que no poderia frequentar todas as aulas, pois membro do conselho da escola: Isso vai acontecer comigo amanh: eu fao parte do conselho da escola e amanh tem reunio sete horas [da noite], e a gente tem que ir pra l tambm... mas, numa hora disponvel, l em casa tem o DVD, voc leva e passa, e pronto.

    O educando aponta como alternativa a possibili- dade de o DVD ser disponibilizado pelo monitor para aqueles que faltaram aula, e ele concorda, prontamente, porm esclarecendo que ele apenas o monitor e no o professor:

    Eu vou na casa de vocs, passo o dever, passo o texto; mas as aulas mesmo eu estou aqui s para, por exemplo, se vocs estiverem com dvidas, vocs podem me perguntar mas quem vai dar as aulas mesmo uma mulher que est a [apontando para a TV], certo? Ela vai dizer tudo, eu vou dar pausa, ela vai dizer, vai explicar.

    Nota-se nos fragmentos acima uma das variveis que afetaro de forma decisiva o processo de alfabeti- zao desses sujeitos: a dificuldade de se fazerem presentes nas aulas, o que, consequentemente, implica evaso e fracasso do trabalho do monitor. A questo da evaso na Educao de Jovens e Adultos (EJA) objeto de vrias pesquisas, e um dos fatores apontados como causa o fato de grande parte dos sujeitos serem trabalhadores, no sobrando tempo nem disposio suficientes para o estudo. No caso da turma em questo, todos so trabalhadores do campo, sujeitos a um trabalho duro, cansativo e sob a temperatura escaldante do Nordeste do Brasil.

    Em seguida, so destacados pelo monitor problemas relacionados falta de condies adequadas para o bom andamento do trabalho, como, por exemplo, a demora do governo em entregar os culos dos alunos, a falta de cadeiras, mesas e cadernos.

    Da outra vez, eu estava conversando com um pessoal... sobre uns exames de vista... de graa... voc faz o exame de vista e recebe os culos, de graa, tudo de graa... a, eles ficaram todos alegres... a, chegou o recado para eles irem, de madrugada, pro Papagaio, pegar o nibus, ia ser numa 5 feira... a, fora meus alunos, ainda teve gente que foi... a, o pessoal, chegaram l, fizeram os exames, l na Aldeota, a, da um tempo, chegou a notcia, de que no ia ter mais culos, que o Estado no ia mais pagar. (Nlson)

    o seguinte: chegou lpis, chegou borracha, chegou folha de papel almao, s que no veio caderno! A eu peguei e disse: rapaz, como que eu vou comear as aulas, sem caderno, s com lpis, borracha e papel? um papel vi [contrao de velho, expresso regional de desdenho, pronunciada, s vezes, com o som de ri], que o pessoal comea a escrever, quando pensa que no, est l embaixo! Comea aqui em cima... e t l em baixo! Atravessado! ... a, outro dia eu estava conversando com a Fernanda [monitora de outra turma, no assentamento], ela vai pra uma reunio, 4 feira, e vai falar sobre isso, e, com certeza, vai conseguir os cadernos... eu estava at pensando em comprar uns cadernos, mas o dinheiro est curto [...] se vocs tivessem uma tabuinha, ou um caderno assim, de um filho mesmo, de capa dura, vocs tragam, que para botar a folha em cima, que a folha mole... certo? um apoiozinho... um negcio assim duro, pra botar a folha em cima e escrever. (Nelson)

    Eu tenho livro l em casa, de uma aula que eu fiz aqui, d pra escrever nele... (Itamar)

    Esse tpico evidencia, claramente, a precariedade das condies de trabalho na implementao dessa proposta de alfabetizao de adultos, situao bastante comum no mbito da EJA, no Brasil. A infraestrutura que seria a contrapartida dos rgos governamentais, nesse caso a Secretaria de Educao do Estado do Cear, compromete o incio dos trabalhos. As nicas ferramentas a que esse grupo de alunos tem acesso so a TV e o DVD, folhas de papel sem pauta, lpis, as cadeiras que cada um leva para as aulas, e solidariedade dos prprios alunos, alm da disposio do monitor em cumprir o seu papel de alfabetizador. A perspectiva de reivindicao de melhores condies j se coloca desde a primeira aula, com a notcia de que a Fernanda, outra monitora, participar da reunio com os representantes da Prefeitura e far as reclamaes. Entretanto, o que observamos durante todas as 65 aulas que as condies materiais continuaram as mesmas, os alunos assistiram a todas as aulas na sala de estar do morador, no contaram com cadeiras e mesas adequadas e com materiais didticos alm daqueles j previstos pelo mtodo. So essas, portanto, as condies a que esto submetidos estes alunos da EJA no campo, condies essas absolutamente inadequadas para que um trabalho

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    educativo se efetive com qualidade. A seguir, destacamos fragmentos do trabalho do monitor na conduo das aulas.

    o papel do MonItor na conduo daS aulaS

    Neste tpico analisamos quatro fragmentos de v- rias aulas que exemplificam a forma como o monitor estabeleceu a mediao dos processos de alfabetizao da turma.

    Fragmento 1: Checando as experincias prvias dos alunos com a escrita

    Nlson: Quem tem dificuldade de aprender, eu acho que... quem sabe mais ou menos? Conhece as letras, mais ou menos, aqui?Sr. Itamar: Eu conheo! O ABC todinho eu conheo!Sra. Francisca: Eu tambm conheo!Nlson: Conhece Ernesto?Ernesto: No!...Nlson: Pois , porque o seguinte: depois que a pessoa conhecer as letras, por exemplo, a pessoa diz assim: Rapaz um A! Um A, eu j sei como um A! Mas, s que pega, sabe, tem hora que tem muita coisa de escrever ainda!Sr. Itamar: Estudei dois anos!Sr. Antnio: Eu estudei um ano s! Menos de um ano... s sei assinar meu nome... agora, s que era pago! Que eu aprendi. Do governo eu no aprendi no, eu ia todo dia! Agora, na hora que eu paguei, a... peguei...Sr. Itamar: O meu tambm era pago... o que era de graa nunca ia...[...]

    Essa sequncia evidencia, claramente, a importncia atribuda pelo monitor ao conhecimento das letras como ponto de partida para a alfabetizao, viso presente nos materiais do Sim, eu posso, cuja lgica de organizao das aulas pressupe o trabalho com cada letra separadamente e de forma linear. Fica evidente que a maior parte dos alunos assume conhecer as letras e alguns evidenciam que tiveram experincias anteriores de escolarizao. Alm disso, um deles assume que sabe assinar o nome, mas que teria aprendido no nos programas do governo, mas em um ano escola paga, j que ele no frequentava os projetos de graa. O que observamos no prximo fragmento a importncia efetiva que esses sujeitos atribuem ao aprendizado da escrita do nome, principal motivao para a frequncia s aulas.

    Fragmento 2: A importncia da escrita do nome

    Nessa aula destaca-se o uso social da escrita do no- me, a assinatura ou firma (como nomeada por alguns).

    O monitor, percebendo que alguns educandos haviam mudado o foco da ateno da TV para a cartilha recebida, volta o vdeo e frisa os resultados esperados, como escrever e ler bem, e com certa agilidade, o que provoca alguns educandos a relatar a ocorrncia de erros na assinatura de seus nomes, e o monitor complementa a observao, falando da importncia de se escrever corretamente, por exemplo, na assinatura de documentos:

    Adacir: Um dia desses, um papel l no Banco, a mulher mandou voltar, eu errei uma letra do meu nome, ela falou: volta, e escreva direitinho o seu nome... escrevi Jos Lima de Sousa, a faltou o S...Nlson: verdade! Tem muitos rgos a que voc escreve num documento certo; a, quando vai escrever em outro do mesmo jeito, falta uma letra e eles mandam voltar e escrever. J aconteceu isso aqui!

    O tema da escrita do nome retornar em outras aulas, como no fim da 8 aula,4 em que a professora (do vdeo) e o monitor pedem aos educandos que escrevam, primeiramente, da forma que sabem, o nome. Porm, alguns afirmam no saber escrever o prprio nome. Adacir pergunta: o nome do registro ou o apelido? [Adacir, na verdade, o apelido de Jos Lima de Sousa]. O monitor responde: O de registro!. Vemos aqui a relevncia dada ao apelido pelo qual o educando mais conhecido num contexto local imediato, contrastando com a alternativa de escrita do nome prprio de registro, atividade certamente menos constante no cotidiano desses sujeitos, mas de importncia inconteste numa perspectiva mais global, como seria o trato com rgos pblicos. Alguns educandos pedem para escrever o nome completo e perguntam sobre algumas letras, como so feitas; outros colocam as primeiras letras minsculas. O monitor os orienta e os aconselha a praticar sempre, tentar decorar as letras do nome.

    Na aula 23, o nome dos educandos volta a ser foco de ateno, quando o monitor enfatiza o avano do curso, uma vez que muitas letras j foram ensinadas e a partir das quais os nomes de trs dos educandos j poderiam ser escritos. Ele aproveita para reforar que a frequncia s aulas importante justamente para que ningum perca o ensino de letras relativas ao prprio nome.

    S para vocs verem, ns j estudamos 14 letras, no ? E essas 14 letras j tm o nome deles (alunos-atores), com essas letras que j estudamos j formamos os nomes deles! S o nome de certo que tem o sobrenome mas o nome deles, que nem Isaura, j estudamos todas as letras do nome da Isaura. Do Leo, ns j estudamos todas as letras, do Lus tambm j estudamos a ltima letra ns vimos ontem: o s, no ? Ana... da Joana, s mais pra frente... Esses nomes aqui so nomes de vocs: Ernesto, Antnio e

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    Francisca o nome da Chagas! No , Chagas? Bom, hoje, de Ernesto, de Antnio e de Francisca, est faltando para ns aprendermos, das letras que ns estamos estudando, est faltando destes nomes, a letra que ns estamos estudando hoje, que ns vamos aprender hoje, que o n... (Nlson)

    Adacir ainda no deu pra fazer... porque ainda falta uma letra, que o d; e o da me, que Geraldina, falta o d e o g, no estudamos ainda. Vamos estudar mais na frente [...]. A partir do dia que ns comeamos, j deu pra escrever trs nomes, e j d para vocs escreverem o nome de vocs, bem legal! Por isso que bom a gente no faltar aula, porque, se a gente falta aula, a gente no aprende a letra, j perde uma letra do nome da gente, pois , isso a que eu queria mostrar pra vocs. (Nlson)

    Nesses trechos, percebemos, mais uma vez, a importncia da escrita do nome prprio para os educandos, com a utilizao de exemplos de pessoas conhecidas da turma, como os atores-alunos dos vdeos j familiares e dos prprios educandos, o que percebido e trabalhado pelo monitor. Enquanto no incio da aula televisionada alguns alunos-atores escrevem seus nomes na lousa, Ernesto, sob orientao da esposa, escreve tambm seu nome na folha de papel.

    Os trechos exemplificam a importncia que o material, os alunos e o monitor atribuem a uma das funes sociais da escrita, que a assinatura do prprio nome, usada em diferentes prticas de letramento, reconhecida pelos prprios alunos: assinatura de documentos em banco e rgos pblicos. Por muitos anos, no Brasil consideravam-se alfabetizados aqueles que sabiam escrever o prprio nome, objeto de ateno das campanhas de alfabetizao de adultos tais como o MOBRAL. O prprio censo realizado pelo IBGE, at os anos 1940 (SOARES, 1998), tomava como referncia apenas o domnio da escrita do nome para considerar o sujeito alfabetizado. De certo modo, o domnio da escrita do nome prprio uma produo de material semitico, expresso do ser, em forma de signo ideolgico, sendo que em todo signo ideolgico confrontam-se ndices de valor contraditrios. O signo se torna a arena onde se desenvolve a luta de classes (BAKHTIN, 1995, p. 46). Assim, cada classe atribui diferentes ndices sociais de valor ao signo ideolgico aqui, a capacidade de assinatura do prprio nome de acordo com o horizonte social imediato desses sujeitos, alunos de um projeto de alfabetizao que tm como expectativa imediata escrever o prprio nome.

    Fragmento 3: Ampliando os conhecimentos sobre o tema da aula

    Outra forma de mediao estabelecida por Nlson pode ser percebida quando, durante a 6 aula, que tem

    como foco o estudo da letra A, feita uma introduo ao tema Amrica Latina. No vdeo, o apresentador explica o que Amrica Latina, os pases que a compem, a histria pr-colombiana, etc. Afirma que a Amrica foi invadida por outros pases, como Espanha, Portugal e Frana, e aponta tambm as diferenas entre os habitantes da Amrica. Mais adiante, o apresentador explica porque s no Brasil falado o portugus, enquanto na maioria dos pases americanos se fala o espanhol.

    O monitor complementa e, citando a teoria tradicional do descobrimento do Brasil, lembra que:

    Na escola, se diz que os europeus, querendo chegar na ndia, 500 anos atrs, em busca de pimenta, alho, diversos temperos, faziam um arrodeio [contorno] do continente africano para chegar ndia. Neste rumo, saram da rota e chegaram ao Brasil que, por ter sido dominado pelos portugueses, fala hoje o portu- gus. (Nlson)

    Destaca-se nesse trecho a traduo, realizada pelo monitor, dessa teoria para uma linguagem mais adequada ao seu pblico, com exemplos por eles conhecidos de especiarias indianas comercializadas pelos navegantes europeus, como a pimenta, alho e diversos temperos, e do desvio da rota de contorno arrodeio da frica que levou os lusitanos a dominarem o que hoje o Brasil que, por isso, fala portugus. Na sequncia da aula, o monitor lembra ainda que h diferenas na fala, como o sotaque entre o portugus e o brasileiro, e aponta a existncia de semelhanas entre as lnguas portuguesa e espanhola.

    Fragmento 4: Contextualizando o conhecimento a partir da discusso de um grafema

    Na 31 aula,5 o monitor explica como desenhar o J, novamente traduzindo para uma linguagem que potencialize o entendimento de todos, comparando com as formas de desenho conhecidas, como as de cabo de guarda-chuva, com a utilizao do recurso de escrita em cartolinas na parede:

    Nlson: Hoje ns vamos estudar a letra j. Abram a a apostila de vocs, certo? Tem um j, no ? Tem um nmero 21, no ? A tem um j minsculo um cabinho de guarda-chuva pode olhar: ele desce, a vem uma curvinha, a tem um pingo em cima, igual o i a diferena dele que, embaixo, ele tortinho, no ? E o J maisculo...Sr. Antnio: O maisculo tambm um cabo de guarda-chuva...Nlson: Todinho! No ?Sr. Antnio: No tem o pingo no!Nlson: Tem no!... no ? Vejam a, oh, eu vou escrever aqui [cartolina na parede], o nmero aqui da

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    letra, o 21, no ? A, o j minsculo, no ? Tem um pingozinho; e o maisculo, no ? Certo? A ento: esse o j minsculo, esse o J maisculo. [...] Com a letra j a gente pode escrever: jacar, no ? Que nem est aqui [na cartilha], no ? jaca, certo? Outro nome? Vocs sabem qual outro nome?Dona Francisca: Jarro!Sr. Antnio: Jardim!Nlson: Jardim, jarro, no ?Sr. Antnio: Com J, no ? , o que mais? Jos! nome de pessoa...Nlson: Jos, nome de pessoa... Jos, Joana, tudo com J, no ? Ento vamos comear a nossa aula.

    Na videoaula, a professora pede a Joana que escreva seu nome no quadro. O monitor pede aos educandos que escrevam seus primeiros nomes no papel, lembrando que a primeira letra deve ser maiscula. Recordando que todas as letras dos nomes dos educandos j haviam sido estudadas, o monitor escreve na cartolina da parede os cinco nomes: Antnio, Jos (Adacir), Francisca, Ernesto e Geraldina.

    A professora apresenta palavras indgenas com J: jaburu, japim, jacu, jandaia (aves), jata (abelha), jararaca e jiboia (cobras), jabuticaba, caju, caj, jenipapo, jerimum (frutas). O monitor observa que, na regio, a abelha jata chamada de jati e que jiboia conhecida como cobra de veado, em uma flagrante operao de produo de sentido com o intuito de possibilitar a construo de significados a partir de exemplos do contexto sociocultural dos alunos.

    conSIderaeS fInaIS

    O objetivo deste texto foi apresentar algumas an- lises do processo de implementao do mtodo de alfa- betizao Sim eu posso num assentamento do MST, que tem por objetivo erradicar o analfabetismo de todos os assentamentos e acampamentos no Brasil. No entanto, os dados indicam que a concepo de alfabetizao que subjaz proposta trata a escrita como uma tcnica neutra que, uma vez dominada, retira o sujeito da condio de analfa- beto e, consequentemente, da condio de sujeito excludo socialmente. exatamente esta concepo que vimos questionando nas trs ltimas dcadas de estudos da cultura escrita que evidenciam as mltiplas funes que esta tem na sociedade, vinculadas aos diferentes contextos de uso. No podemos, portanto, concordar com os parmetros da Unesco ao falar de xitos, porque, nesses casos, os sujeitos aprenderam apenas a codificar e decodificar, sem a incluso efetiva dos sujeitos em prticas de letramento, sem uma perspectiva mais ampla de uso social da escrita.

    Ao tratarmos do Sim, eu posso, com especial ateno atuao do monitor da turma, fatos nicos,

    no repetveis, singulares, de acordo com seus agentes e contextos puderam ser observados. A nica constncia existente no caso do mtodo Sim, eu posso talvez seja a de sua materialidade didtica que, de certa forma, fixa o contedo bsico e o mtodo de sua transmisso nos vdeos e cartilhas utilizados, especficos em cada pas em que implantado. Cada aula e cada mediao estabelecida pelo monitor/alfabetizador evidenciaram que o mtodo foi apenas um dos elementos presentes neste processo. Os conhecimentos prvios dos alunos, o conhecimento e viso de mundo do monitor aliados aos conhecimentos presentes nos vdeos constituram os processos de alfabetizao desses sujeitos.

    Pela breve exposio aqui realizada, conclumos que, embora o mtodo Sim eu posso possua uma concepo restrita e linear de alfabetizao, a mediao realizada pelo monitor aponta uma perspectiva de alfabetizao e letramento a partir do que os novos estudos sobre letramento consideram sobre a escrita (STREET, 1984). O letramento como uma prtica social, apesar de no contemplado no material do Sim eu posso, pde se concretizar no fato de os educandos perceberem a escrita como objeto social e cultural, como ficou explcito pela necessidade de aprenderem o prprio nome para que pudessem us-lo nos eventos de letramento socialmente apropriados. Buscamos, assim, insistir na viso da alfabetizao e do letramento no como um fenmeno individual, puramente psquico, mas de base social, ideologicamente marcado, j que sintetiza, dialeticamente, a vida interior (do indivduo educando) com a vida exterior (social), em forma de produto de interao das foras sociais, de signo ideolgico socialmente valorizado: a cultura escrita. Insistimos numa viso de alfabetizao que ultrapassa a questo do mtodo na medida em que esta deve ser pensada na perspectiva do letramento (MACEDO, 2001), num trabalho eficaz de interao com a escrita enquanto prtica social.

    O que vemos hoje, no Brasil, so os altos ndices de analfabetismo, passada j uma dcada do III Milnio, e a contradio de, tendo chegado posio de 6 maior economia do mundo, ser ultrapassado pelas naes menos ricas da Amrica Latina, na corrida pela diminuio do analfabetismo. Concordamos que no possvel democratizar o ensino de um pas sem democratizar sua economia e sem democratizar, finalmente, sua superestrutura poltica (MARITEGUI, 2010, p. 127). Tal situao de injustia, desigualdade, excluso social e negao de direito constitucional que nos move na luta constante no apenas pela alfabetizao na perspectiva do letramento, mas fundamentalmente pela elevao das condies de vida da populao, j que a erradicao do analfabetismo no , por si s, sinnimo de soluo dos problemas da humanidade.

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    ______. Alfabetizao e letramento. So Paulo: Contexto, 2008.

    notaS1 O filme Vida Maria pode ser encontrado no link .2 Toda identificao de sujeitos realizada no presente trabalho foi devi-

    damente consentida e autorizada por eles.3 As aulas tero continuidade com os Crculos de Cultura de Paulo Freire,

    segundo o programa proposto pelo MST.4 8 aula: Estudo da letra I. Quarta feira, dia 20/01/2010, s 19 h.5 31 aula: Estudo da letra J. Quarta-feira, 10/03/2010, s 19 h e 25 min.

    Artigo recebido em setembro 2012.Aprovado em agosto 2013.